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18 de Maio de 2024

Ação penal nos crimes contra a Dignidade Sexual à luz da Lei 13.718/2018

Uma breve análise da evolução da ação penal nos crimes sexuais do Código Penal

Publicado por Adriano Menechini
há 5 anos

1. Introdução

O instituto da ação penal é disciplinado pelo Código de Processo Penal nos seus artigos 24 a 62. Embora a ação penal seja um instituto de natureza eminentemente processual, o legislador pátrio achou por bem reproduzir algumas regras fundamentais acerca do seu exercício também no Código Penal, em seus artigos 100 a 106.

Como o objetivo do presente ensaio é expor a evolução do instituto da ação penal nos crimes sexuais do Código Penal, sobretudo à luz da Lei 13.718/2018, que promoveu a mais recente alteração na temática, faremos apenas uma breve análise sobre o conceito e a classificação da ação penal nesta parte introdutória, com o intuito de melhor expor o alcance da mais recente alteração legislativa.

A ação penal, nas palavras de José Frederico Marques, “é o direito de invocar-se o Poder Judiciário, no sentido de aplicar o Direito Penal objetivo”.

Sabe-se que o Estado, ao assumir o monopólio do exercício da função jurisdicional - uma das expressões mais caracterizadora da sua soberania -, baniu a autotutela do ordenamento jurídico[1], ressalvadas algumas poucas exceções[2]. Assim, cabe ao Estado, no exercício da função jurisdicional, solucionar os conflitos que afloram na sociedade, conforme a ordem jurídica vigente.

O Estado, no entanto, não age de ofício, via de regra. A jurisdição, que tem como uma de suas características a inércia, precisa ser provocada para que o Estado possa fazer atuar o direito objetivo no caso concreto e, dessa forma, promover a pacificação do conflito.

É nesse contexto que a ação surge como um direito ao exercício jurisdicional, ou seja, o poder de exigir do Estado que exerça a sua função jurisdicional e, dessa forma, aplique o Direito Penal objetivo no caso concreto[3]. Nesse sentido, a própria Constituição consagra o direito de ação ao prever o princípio da inafastabilidade da apreciação jurisdicional no art. , XXXV, com a seguinte redação: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Feita essa breve análise sobre o direito de ação, cabe-nos, agora, trazer à baila a principal classificação das ações penais, que tem por referência a titularidade do direito de ação.

As ações penais se distinguem, em apertada síntese, em:

a) Pública: hipótese em que é titularizada pelo Ministério Público, de forma privativa (CF, art. 129, I, e no CPP, art. 257, I), sendo que comporta duas espécies, a saber: a1) ação penal pública incondicionada: quando o seu exercício não se subordina a qualquer requisito; a2) ação penal pública condicionada: quando o seu exercício depende do preenchimento de uma condição de procedibilidade, ou seja, i) representação do ofendido ou ii) requisição do Ministro da Justiça. Essa ação é proposta através de uma peça inicial acusatória denominada denúncia.

b) Privada: na qual o direito de acusar pertence, exclusiva ou subsidiariamente, ao particular, ou seja, ao ofendido ou a quem tenha qualidade para representá-lo. Subdivide-se em: b1) ação penal privada exclusiva: que pode ser proposta pelo ofendido ou por quem tenha qualidade para representá-lo (CPP, arts. 30 e 31); b2) ação penal privada personalíssima: a única hipótese tratada pelo Código Penal está prevista no parágrafo único do art. 236 (induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento)[4], na qual o legislador conferiu a iniciativa da ação exclusivamente ao ofendido, sendo vedado o seu exercício ao representante legal, tampouco ao sucessor legal nos casos de morte ou ausência do ofendido; b3) ação penal privada subsidiária: finalizada a investigação criminal, se o Ministério Público deixar transcorrer in albis o prazo para o oferecimento da denúncia[5], quedando-se inerte, ou seja, deixando de denunciar, de requisitar diligência ou de promover o arquivamento do procedimento investigatório, legitimará o ofendido ou seu representante legal a intentar a ação penal privada subsidiária (CPP, art. 29, e CF, art. , LIX). Essa ação é proposta por meio de uma peça inicial acusatória que recebe o nome de queixa-crime.

Percebe-se que esse critério de classificação subjetiva da ação penal atende, basicamente, o objeto jurídico do delito e o respectivo interesse na persecução penal.

Assim, na hipótese de ação penal pública incondicionada, o Estado agirá impreterivelmente por meio de seus órgãos persecutórios oficiais (Polícia Judiciária, Ministério Público e juiz criminal), independentemente de qualquer manifestação de vontade da vítima, porque a infração penal praticada, neste caso, abala a ordem jurídica e coloca em risco a paz social de forma acentuada.

Na ação penal pública condicionada à representação da vítima, por outro lado, o interesse do ofendido se sobrepõe ao interesse público na repressão ao crime, razão pela qual o Estado confere à vítima, ou a seu representante legal, a faculdade de expressar seu desejo, ou não, de ver deflagrada a ação penal em face do infrator. A lei confere o prazo de seis meses, a contar do conhecimento da autoria (CPP, art. 38), para que a representação seja ofertada ao juiz, ao órgão do Parquet ou à autoridade policial (CPP, art. 39), sob risco de decadência e consequente extinção da punibilidade (CP, art. 107, IV).

Nas duas únicas hipóteses contempladas pelo Código Penal de condicionamento da ação à requisição do Ministro da Justiça (art. 7º, § 3º, b, e 145, parágrafo único), por questões políticas, a lei confere ao Ministro da Justiça a análise da conveniência de se iniciar a persecução penal. Esta condição de procedibilidade, que não está sujeita ao prazo decadencial citado, pode ser ofertada a qualquer tempo, enquanto não se operar a prescrição.

Por fim, na ação penal privada o Estado transfere ao particular o direito de acusar, por entender que o interesse dele também se sobrepõe ao interesse público de punir ao autor do crime[6], porém de forma proeminente. Como os crimes perseguidos mediante ação penal privada ofendem sobremaneira a intimidade da vítima, cabe a ela optar por deflagrar, ou não, a persecução penal, pois só a vítima saberá sopesar o constrangimento por toda a exposição que a persecução penal causará (strepitus iudicii). Por vezes, o sofrimento causado à vítima por toda a exposição à persecução penal é maior do que a própria impunidade do autor da infração penal, o que pode levá-la a preferir o silêncio à punição do culpado. Dessa forma, o legislador confere à vítima o prazo de seis meses, contado da data em que vier a saber quem é o autor do crime[7], para o exercício do direito de queixa, sob pena de decadência (CPP, art. 38) e consequente extinção da punibilidade (CP, art. 107, IV).

Como identificar a natureza da ação penal de cada infração penal?

A ação penal pública incondicionada é a regra geral das infrações penais, conforme redação do art. 100, caput, do Código Penal. Assim, se o legislador, após descrever o crime na parte especial do Código Penal ou na legislação penal extravagante, silenciar a respeito da ação penal, esta será pública incondicionada. No entanto, se o legislador fizer menção expressa à necessidade de condição de procedibilidade ou queixa-crime, a ação penal será pública condicionada ou privada, respectivamente.

Por fim, em relação às contravenções penais, a ação penal é pública incondicionada por força do art. 17 do Decreto-Lei 3.688/41.

2. Evolução da ação penal nos crimes sexuais do Código Penal.

Os crimes sexuais previstos no Título VI da parte especial do Código Penal, outrora denominado crimes contra os costumes, especialmente os previstos nos Capítulos I a III, historicamente eram perseguidos mediante ação penal privada, em regra. Ou seja, conforme exposto alhures, os crimes procediam-se mediante queixa, por força da antiga redação do art. 225, caput, do Código Penal.

Havia quatro exceções a essa regra geral, a saber:

a) a ação penal seria condicionada à representação na hipótese de miserabilidade da vítima, isto é, se a vítima ou seus pais não pudessem prover às despesas do processo sem se privar de recursos indispensáveis à manutenção própria ou da família (art. 225, § 1º, I)[8];

b) A ação penal seria incondicionada se o crime fosse cometido com abuso do pátrio poder ou da qualidade de padrasto, tutor ou curador (art. 225, § 1º, II);

c) A ação penal também seria pública incondicionada no caso de crimes contra os costumes dos quais resultassem lesões corporais de natureza grave (ou gravíssima) ou morte (CP, art. 223), segundo entendimento pacífico da época, porque essas qualificadoras (preterintencionais) estavam previstas em Capítulo do Código Penal não abrangido pelo art. 225 daquele diploma legal, logo estavam submetidas à regra do art. 100, caput, do CP;

d) Nos termos da súmula 608 do STF, a ação penal do crime de estupro seria pública incondicionada quando praticado mediante violência real, ou seja, com emprego de violência física.

Com a publicação da Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009, que promoveu uma alteração significativa no Título VI da parte especial do Código Penal, a regra geral passou a ser a ação penal pública condicionada à representação da vítima. A única hipótese legal de cabimento de ação penal pública incondicionada se dava quando a vítima fosse menor de 18 (dezoito) anos ou vulnerável[9] (ou seja, todo o Capítulo II do Título VI do Código Penal).

Vejamos o texto legal até então vigente:

"Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.

Parágrafo único. Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima é menor de 18 (dezoito) anos ou pessoa vulnerável".

Os Capítulos citados pelo dispositivo referem-se, respectivamente, aos crimes contra a liberdade sexual (arts. 213 a 216-A) e aos crimes sexuais contra vulnerável (arts. 217-A a 218-B). O Capítulo III, que tratava do rapto, foi revogado muito antes pela Lei 11.106/05.

Diante dessa alteração legislativa promovida em 2009, a doutrina passou a levantar alguns questionamentos relevantes.

A primeira dúvida que surgiu foi em relação à vigência da súmula 608 do STF. Rogério Greco, p. ex., entendia que a citada súmula era perfeitamente aplicável mesmo após a edição da Lei 12.015/09, ou seja, o crime de estupro, praticado mediante violência real, seria perseguido mediante ação penal pública incondicionada. No mesmo sentido caminhava a lição de Ricardo Antônio Andreucci. Guilherme de Souza Nucci, por outro lado, defendia que a súmula em questão foi eliminada com a edição da Lei 12.015/09, de forma a prevalecer a regra geral (ação penal pública condicionada à representação da vítima). Nestor Távora e Rosmar Rodrigues Alencar também entendiam pela revogação da súmula citada.

Outra dúvida que surgiu à época foi sobre a possibilidade do cabimento de ação penal pública incondicionada para os crimes de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave (ou gravíssima). Alguns defendiam a tese de que a então redação (ou omissão) do art. 225 do Código Penal permitia concluir que a ação penal, neste caso, fora transformada em pública condicionada. Outros, em posição antagônica, pregavam que a ação penal continuaria pública incondicionada, com base no art. 101 do Código Penal, por configurar hipótese de crime complexo, isto é, como a lesão grave (ou gravíssima) e o homicídio, fatos que compõem esse crime complexo, são perseguidos mediante ação penal pública incondicionada, essa também deveria ser a ação penal dos crimes de estupro com resultado morte ou lesão corporal grave (ou gravíssima).

O que se pôde observar claramente é que o legislador optou por alterar a política criminal no combate aos crimes sexuais, especialmente ao acabar com a previsão de persecutio criminis in judicio por meio da ação penal de iniciativa privada propriamente dita[10]. Os números alarmantes de crimes sexuais praticados Brasil afora fez com que o Estado despertasse maior interesse na repressão desse tipo de crime.

Muito embora a titularidade da ação penal tivesse sido transferida para o Ministério Público, à vítima restou, ainda, o direito de representação, como opção pela deflagração, ou não, da persecução penal, desde que fosse pessoa adulta e capaz. Ou seja, a vítima ainda poderia sopesar o eventual constrangimento causado por toda a exposição de sua intimidade durante a persecução penal (strepitus iudicii) no prazo decadencial de seis meses.

Mas o cenário mudou mais uma vez.

A Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018, novamente mudou a natureza da ação penal ao reescrever o art. 225, a saber:

"Art. 225. Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública incondicionada.

Parágrafo único. (revogado)"

Como se pode observar, o legislador curiosamente declarou expressamente a ação penal como sendo de natureza pública incondicionada, quando, segunda a tradição brasileira, bastaria ter simplesmente revogado o art. 225 do Código Penal. Ora, é cediço que, em regra, toda ação penal é pública incondicionada, exceto se o legislador expressamente a declarar privativa do ofendido (privada) ou exigir alguma condição de procedibilidade (pública condicionada), ex vi do art. 100, caput e § 1º, do CP, e art. 24 do CPP. Absolutamente desnecessário, portanto, dizer que a ação penal é pública incondicionada[11].

Portanto, por força da Lei 13.718, de 24 de setembro de 2018, que, dentre várias mudanças, alterou a redação do art. 225 do Código Penal, a ação penal agora é pública incondicionada em relação aos crimes sexuais (Capítulos I e II do Título VI). Referida lei entrou em vigor na data de sua publicação.

3. Direito intertemporal

É importante delinear a eficácia no tempo da nova disciplina relativa à ação penal dos crimes sexuais. Para tanto, o primordial é perquirir a natureza da norma que disciplina a ação penal.

A discussão não é nova e já foi enfrentada quando da publicação da Lei 12.015/09[12], oportunidade em que foi firmado o entendimento majoritário no sentido de que a norma que trata da natureza da ação penal é considerada norma processual penal material, também chamada de híbrida ou de conteúdo misto, porque a sua aplicação provoca efeitos no campo do Direito Penal, ou seja, torna a pretensão punitiva estatal mais intensa.

Assim, o preceito legal em questão (CP, art. 225), embora processual, também abriga uma regra de direito material, razão pela qual a sua eficácia no tempo não é disciplinada pelo art. do Código de Processo Penal (tempus regit actum), mas sim pelos princípios constitucionais que regem a aplicação da lei penal, ou seja, da ultratividade ou retroatividade da lei mais benigna (CF, art. , XXXIX e XL, e art. do CP).

A mudança promovida pela Lei 13.718/18 suprimiu uma condição específica da ação penal, isto é, uma condição de procedibilidade (representação da vítima), eliminando, a reboque, uma importante causa de extinção da punibilidade prevista no art. 107, IV, do Código Penal (decadência). Ou seja, as chances do réu se salvar da demanda criminal foram reduzidas, fazendo com que a nova lei seja mais severa.

Por tudo que foi dito, a ação penal dos crimes sexuais praticados antes da publicação da Lei 13.718/18 continua sendo pública condicionada à representação da vítima, com as exceções já citadas alhures. A nova redação do art. 225 do Código Penal, portanto, só passará a valer para os crimes sexuais praticados a partir de 25 de setembro de 2018.

4. Conclusão

A Lei 13.718/18 teve a virtude de simplificar a identificação da natureza da ação penal dos delitos sexuais, acabando de vez com toda a celeuma provocada pela Lei 12.015/09. Agora, os crimes são perseguidos mediante ação penal pública incondicionada, titularizada pelo Ministério Público que age independentemente de qualquer manifestação de vontade da vítima.

O aspecto negativo da Lei 13.718/18, por outro lado, fica por conta da supressão da deliberação da vítima em deflagrar, ou não, a persecução penal em relação a crimes que afetam demasiadamente a sua intimidade. Conforme já foi dito, às vezes o sofrimento causado à vítima por toda a exposição à persecução penal é maior do que a própria impunidade do autor da infração penal. O ideal é que permanecesse com a vítima, quando adulta e capaz, o poder de decidir pela persecução penal em face de seu algoz do crime sexual.

Bibliografia

Andreucci, Ricardo Antônio. Manual de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2016.

Costa Jr., Paulo José. Direito PenalCurso Completo. São Paulo: Saraiva, 2000.

Cunha, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – parte especial. Salvador: JusPodivm, 2016.

_____. Atualização legislativa: Lei 13.718/2018. Salvador: JusPodivm, 2018.

Greco, Rogério. Curso de Direito Penal – v. 3. Rio de Janeiro: Impetus: 2016.

Jesus, Damásio E. de. Direito Penal – V. 3. São Paulo: Saraiva, 1999.

Marques, José Federico. Tratado de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 1966.

Nucci, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

Távora, Nestor, e Alencar, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. Salvador: JusPodivm, 2018.


[1] O artigo 345 do Código Penal tipifica como crime a conduta daquele que faz justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite (exercício arbitrário das próprias razões).

[2] O direito admite excepcionalmente a autotutela, ou seja, somente quando prevista na norma jurídica, podendo-se citar como exemplo, na seara criminal, as hipóteses de exclusão da ilicitude (CP, art. 23, art. 146, § 3º, art. 150, § 3º etc.).

[3] É clássica a lição em teoria geral do processo de que através do exercício da ação provoca-se a jurisdição, que por sua vez se exerce através daquele complexo de atos que é o processo.

[4] A outra hipótese estava prevista no crime de adultério (CP, art. 240), revogado pela Lei 11.106/05.

[5] Nos termos do art. 46 do CPP, via de regra o prazo para o oferecimento da denúncia, estando o réu preso, é de 5 (cinco) dias, contado da data que o órgão acusador receber os autos do inquérito policial. Se o réu estiver solto, por outro lado, o prazo para oferecimento da denúncia passa a ser de 15 dias.

[6] Trata-se de hipótese de substituição processual, na qual o particular defende interesse alheio (interesse público na repressão dos crimes) em nome próprio. O Estado, portanto, preserva para si o direito de punir (jus puniendi).

[7] Na hipótese de ação penal privada subsidiária, o prazo decadencial de seis meses para o oferecimento da queixa começa ao término do prazo legal para o membro do Parquet oferecer a denúncia. Nesta hipótese, o Ministério Público atuará como interveniente adesivo obrigatório, tendo amplos poderes, inclusive podendo retomar a ação a qualquer sinal de desídia do querelante.

[8] A prova da miserabilidade da vítima se dava por qualquer meio, inclusive por atestado de pobreza expedido pela autoridade policial, conforme art. 32 e §§ do CPP. Vale ressaltar, no entanto, que a doutrina defende a revogação tácita do §º 2º do art. 32 pela Lei nº 1.060/50 (e, agora, pelo CPC/15), porque agora a parte goza dos benefícios da assistência judiciária mediante simples afirmação, na própria petição, de que não está em condições de pagar as custas do processo e os honorários de advogado, sem prejuízo próprio ou de sua família.

[9] Em 11.11.14, ao julgar o HC 276.510-RJ, o STJ decidiu que a ação penal continuaria a ser condicionada à representação da vítima na hipótese de vulnerabilidade transitória. Assim, segundo a Corte Cidadã, aquele que, p. ex., fosse agredido e ficasse desacordado, ou mesmo nos casos de embriaguez, deveria representar no prazo legal, porque não era considerada pessoa vulnerável de forma definitiva (havia incapacidade para oferecer resistência apenas na ocasião da ocorrência dos atos libidinosos).

[10] Ainda restou a possibilidade de se propor ação penal privada subsidiária da pública na hipótese de inércia do Ministério Público.

[11] Talvez as sucessivas alterações promovidas nos crimes contra a dignidade sexual, especialmente em relação à ação penal, fizeram com que o legislador se preocupasse em declarar expressamente a natureza pública incondicionada das ações penais, para não deixar dúvidas. Essa é a única justificativa plausível para enxergar o art. 225 com bons olhos.

[12] À época da publicação 12.015/09, em relação à ação penal que antes era de natureza pública incondicionada, entendeu-se por pertinente a intimação da vítima a fim de colher a manifestação dela pelo prosseguimento, ou não, da persecução penal (a Lei 12.015/09 retroagiu nesse ponto por ser mais benéfica). Já na hipótese em que a ação penal era privada, isto é, promovida pela própria vítima mediante queixa, a nova redação do art. 225 determinada pela Lei 12.015/09 não retroagiu, por ser a lei anterior mais benéfica para o acusado, que poderia, p. ex., beneficiar-se com o perdão e, conforme a fase da persecução penal, ter a seu favor a extinção da punibilidade.

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