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23 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Superior do Trabalho
há 2 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

3ª Turma

Publicação

Julgamento

Relator

Jose Roberto Freire Pimenta

Documentos anexos

Inteiro TeorTST_ED-AIRR_00109077220165030096_44243.pdf
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Inteiro Teor

A C Ó R D Ã O

3ª Turma

GMJRP/iv/ir

JUÍZO DE RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDO.

TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ARTIGO 71, § 1º, DA LEI Nº 8.666/1993 E RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. POSSIBILIDADE. QUESTÃO DECIDIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 760.931-DF. TEMA Nº 246 DO EMENTÁRIO TEMÁTICO DE REPERCUSSÃO GERAL.

Discute-se se a questão sub judice está, ou não, vinculada à ratio decidendi da controvérsia constitucional objeto do Processo nº RE nº 760.931-DF e ao disposto no Tema nº 246 do Ementário Temático de Repercussão Geral da Suprema Corte, bem como se cabe a esta Turma exercer o juízo de retratação. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 760.931-DF, fixou a seguinte tese de repercussão geral: "O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93". Em embargos de declaração, a Suprema Corte limitou-se a reafirmar o entendimento de que "a responsabilidade não é automática, conforme preconizou o legislador infraconstitucional, no artigo 71, § 1º, da Lei de Licitações, mas não pode o poder público dela eximir-se quando não cumpriu o seu dever de primar pela legalidade estrita na escolha ou fiscalização da empresa prestadora de serviços". Optou-se por uma redação "minimalista", sem enfrentar particularidades, a exemplo de a quem caberia o ônus da prova sobre a omissão fiscalizatória do Poder Público. Ao silenciar-se de forma eloquente, a Suprema Corte abre caminho para a manutenção do entendimento que já vinha sendo perfilhado no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, de que o ônus da prova acerca da efetiva fiscalização permaneceria a cargo da Administração Pública, por representar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do trabalhador, já que seria prova de natureza verdadeiramente "diabólica", de produção praticamente impossível pela parte hipossuficiente. Vale lembrar que no julgamento do recurso extraordinário em questão, os Ministros da Suprema Corte reafirmaram a constitucionalidade do artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, já declarada no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16-DF, bem como afastaram, de uma vez por todas, a possibilidade de responsabilização automática da Administração Pública, posicionamento que se harmoniza, inclusive, com a atual redação da Súmula nº 331, item V, do Tribunal Superior do Trabalho, que reconhece a responsabilidade subsidiária da Administração Pública direta e indireta apenas nos casos em que evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/1993. Não há dúvidas, portanto, de que a mera inadimplência da empresa prestadora dos serviços terceirizados não caracteriza, por si só, culpa da Administração Pública. A questão controvertida, ensejadora de questionamentos diversos no âmbito do Supremo Tribunal Federal e que poderia justificar eventual juízo de retratação, foi apenas aquela relacionada à distribuição do ônus da prova. Nestes autos, entretanto, a ratio decidendi da decisão ora impugnada é diversa e não versa sobre o ônus da prova, mas sim sobre a afirmação de culpa expressa. O Tribunal Regional do Trabalho, última e soberana instância apta a analisar e a valorar a prova a esse respeito, registrou expressamente a existência de culpa omissiva do ente público a partir dos elementos de prova produzidos, aspecto não sujeito a reexame por esta Corte superior, nos termos da Súmula nº 126 do TST. Por oportuno, não houve a transferência automática de responsabilidade à Administração Pública em decorrência do mero inadimplemento da empresa contratada, já que ficou evidenciada a sua culpa in vigilando , expressamente declarada no âmbito do Regional. Assim, este Tribunal Superior do Trabalho, ao manter a responsabilidade subsidiária da Administração Pública diante das premissas fáticas consignadas no acórdão regional, não descumpriu as referidas decisões do STF. Portanto, como, na hipótese sub judice, foi observada a tese firmada no STF, proferida no RE nº 760.931-DF , em repercussão geral, esta Turma não exerce o juízo de retratação previsto no artigo 1.030, inciso II, do CPC/2015, mantendo seu acórdão, e determina o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para prosseguimento do feito, como entender de direito.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Embargos de Declaração em Agravo de Instrumento em Recurso de Revista nº TST-ED-AIRR-XXXXX-72.2016.5.03.0096 , em que é Embargante MUNICÍPIO DE UNAÍ e são Embargados ELIVANIA RODRIGUES DE SOUSA e FLAVIO ALVES OLIVEIRA - ME.

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, em acórdão de págs. 310-314, confirmado pelo acórdão de págs. 323-325, reconheceu a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, o que ensejou a interposição de recurso extraordinário pelo ente público (págs. 327-339).

O julgamento do Tema nº 246 do Ementário de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal, que diz respeito à "responsabilidade subsidiária da Administração Pública por encargos trabalhistas gerados pelo inadimplemento de empresa prestadora de serviço", foi concluído pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal em 26/4/2017, momento em que se fixou a tese de mérito no Processo RE nº 760.931-DF (Relator p/acórdão: Min. Luiz Fux, DJe-206, publicação 12/9/2017). Em 1º/8/2019, foram rejeitados os respectivos embargos de declaração (Relator p/acórdão: Min. Edson Fachin, DJe-194, publicação 6/9/2019), o que ensejou decisão definitiva de mérito para produzir eficácia contra todos e efeito vinculante, nos termos do que dispõe o § 2º do artigo 102 da Constituição Federal.

Após a publicação do acórdão do STF em embargos de declaração, a Vice-Presidência desta Corte, por meio do despacho de págs. 345-347, determinou o retorno dos autos ao órgão fracionário prolator da decisão recorrida, para os efeitos do artigo 1.030, inciso II, do CPC/2015.

Os autos retornaram à Terceira Turma.

É o relatório.

V O T O

JUÍZO DE RETRATAÇÃO NÃO EXERCIDO

TERCEIRIZAÇÃO TRABALHISTA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. ARTIGO 71, § 1º, DA LEI Nº 8.666/1993 E RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. POSSIBILIDADE. QUESTÃO DECIDIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 760.931-DF. TEMA Nº 246 DO EMENTÁRIO TEMÁTICO DE REPERCUSSÃO GERAL

Sobre o tema, manifestou-se o Regional:

"RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

O 2o reclamado (Município de Unaí) insurge-se quanto à sua responsabilização subsidiária.

Aprecio.

É fato incontroverso que a autora prestou serviços ao recorrente, por intermédio de sua empregadora (1ª reclamada).

A teor do artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93:

" Art. 71. O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1o A inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis."

A aludida norma, declarada constitucional pelo STF, no julgamento da ADC nº 16, em 24/11/2010, não tem o efeito de afastar a responsabilização subsidiária da Administração Pública, beneficiada que foi pela prestação dos serviços do trabalhador, quando evidenciada a culpa pelo advento da lesão suportada pelo obreiro.

Nesse sentido, o item V, incluído na Súmula 331 do TST:

V- Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada."

Estabelecida essa premissa, é de se notar que o Código Civil, em seus artigos 186 e 927, prevê a responsabilização civil subjetiva para a hipótese em que alguém, agindo em violação da lei, causa dano a outrem.

No presente caso, o contrato de prestação de serviços firmado pelos reclamados foi realizado de acordo com os ditames legais, precedido de licitação (ID f93af55). Logo, não se cogita da culpa in eligendo.

Todavia, o fato de ter havido contratação regular de um serviço, via procedimento licitatório realizado antes de ser firmado o contrato entre os reclamados, não se mostra suficiente, por si, para elidir a responsabilidade subsidiária do tomador.

Cabe averiguar a culpa in vigilando.

Isso porque o contrato de prestação de serviços decorrente daquele procedimento não é estanque, devendo o licitante, depois de contratado o vencedor do certame, acompanhar, efetivamente, a execução contratual, de forma adequada, sob pena de desvirtuar o contrato firmado.

Assim, não basta que a empresa seja idônea no momento da seleção. Essa idoneidade deve permanecer durante todo o período contratual, o que não se verificou na presente hipótese.

O ônus probatório quanto à fiscalização, de forma eficaz, do cumprimento das obrigações trabalhistas pela prestadora de serviços competia à Administração Pública, na medida em que se trata de fato impeditivo do direito obreiro, além de a Administração possuir maior aptidão para a prova.

É certo que a contratação pactuada é a realização do serviço. Entretanto, uma vez definidos os empregados da empresa contratada a prestar os serviços, o contratante tem o dever de saber quantos e quais são e se os encargos trabalhistas estão sendo devidamente pagos.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento da Reclamação nº 14.947/RS, em 29/5/2013, fixou que o padrão fiscalizatório da Administração Pública deve ser extenso e profundo, inclusive com adoção dos parâmetros da Instrução Normativa nº 02/2008 do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, sendo a fiscalização dos direitos dos trabalhadores terceirizados elemento intrínseco ao contrato de prestação de serviços, in verbis :

"Cumpre assinalar, por necessário, que o dever legal das entidades públicas contratantes de fiscalizar a idoneidade das empresas que lhes prestam serviços abrange não apenas o controle prévio à contratação - consistente em exigir, das empresas licitantes, a apresentação dos documentos aptos a demonstrar a habilitação jurídica, a qualificação técnica, a situação econômico-financeira, a regularidade fiscal e o cumprimento do disposto no inciso XXXIII do artigo 7º da Constituição Federal (Lei nº 8.666/93, art. 27)-, mas compreende, também, o controle concomitante à execução contratual, viabilizador, dentre outras medidas, da vigilância efetiva e da adequada fiscalização do cumprimento das obrigações trabalhistas em relação aos empregados vinculados ao contrato celebrado (Lei nº 8.666/93, art. 67)" - Relator Ministro Celso de Mello.

A única forma de o tomador de serviços se eximir da responsabilidade em tela seria fiscalizar de modo efetivo o cumprimento das obrigações trabalhistas por parte da empresa prestado ra, de modo a impedir ou ao menos minorar os efeitos advindos da inadimplência em relação aos trabalhadores de cujo trabalho se beneficiou. Não havendo assim procedido, sujeita-se à responsabilização subsidiária pelo adimplemento das parcelas devidas a reclamante.

Veja-se que a 1ª reclamada não efetuou o pagamento salarial ao obreiro, por mais de três meses da contratualidade , só tendo quitado, a autora, o salário do mês de admissão, junho de 2016 - ID XXXXX, também descumprindo a obrigação patronal alusiva aos depósitos do FGTS, o que deu ensejo à declaração da rescisão indireta e ao corolário deferimento do pagamento das verbas rescisórias da modalidade. De se ressaltar, ainda, que a autora, na condição de gari, laborou em condições insalubres, sem receber o respectivo adicional por todo o pacto, conforme constatado na Origem.

Todos esses fatores atestam a culpa in vigilando do tomador de serviços, considerando-se que o Município réu não juntou nenhum documento acerca da quitação salarial, pela 1ª ré, a autora, ou alusivo aos depósitos do FGTS.

Por sua vez, a documentação de ID d1f91c7, colacionada pela reclamante, dá conta da falta dos depósitos do FGTS devidos ao obreiro.

E, se o 2o reclamado liberou os pagamentos contratuais ou eventuais créditos para a contratada sem proceder à devida fiscalização, por exemplo, do recolhimento do FGTS, de forma individual em relação a reclamante, incorreu na chamada culpa "in vigilando" .

Também sequer comprova o recorrente ter tomado quaisquer das outras medidas legais que lhe eram autorizadas, na hipótese.

Foi necessária a intervenção judicial, em outro feito, oficiando-se, ao Município de Unaí, no sentido de impor ao ente público que procedesse à retenção de crédito da empregadora - ID a9373e0 e f038549.

Logo, patente está que a Administração Pública foi negligente no dever de fiscalizar.

Esclareço que não prospera a alegação do recorrente no sentido de que, consoante artigo 27, IV, da Lei 8.666/93, a certidão negativa de débitos trabalhistas de ID 049d11e seria o único documento exigível, na espécie.

A referida certidão, emitida com base no artigo 642-A da CLT e na Resolução Administrativa 1470/2011 do c. TST, dando conta de que a empregadora "NÃO CONSTA do Banco Nacional de Devedores Trabalhistas" , foi expedida em 18/10/2016 e com validade até 15/04/2017.

Como expressamente consignado no referido documento:

"Do Banco Nacional de Devedores Trabalhistas constam os dados necessários à identificação das pessoas naturais e jurídicas inadimplentes perante a Justiça do Trabalho quanto às obrigações estabelecidas em sentença condenatória transitada em julgado ou em acordos judiciais trabalhistas, inclusive no concernente aos recolhimentos previdenciários, a honorários, a custas, a emolumentos ou a recolhimentos determinados em lei; ou decorrentes de execução de acordos firmados perante o Ministério Público do Trabalho ou Comissão de Conciliação Prévia."

O fato de a empregadora não ser considerada inadimplente perante esta Especializada até o momento da expedição da citada certidão, porquanto ainda não houve trânsito de julgado de sentença condenatória prolatada em reclamação ajuizada em face da aludida empresa ou ante a inexistência de acordos judiciais trabalhistas ou de execução de acordos firmados perante o MPT ou a CCP, não atrai a conclusão de que a 1ª ré estivesse cumprindo as obrigações trabalhistas devidas ao longo da contratualidade, tanto é assim que ficou constatado no processado, em relação a reclamante, o seu inadimplemento.

Neste contexto, a certidão negativa de débitos trabalhistas da prestadora de serviços não é suficiente para eximir a culpa do tomador.

Pontuo que o dispositivo invocado pelo recorrente (artigo 27, IV, da Lei 8.666/93) diz respeito apenas à documentação exigida dos interessados "para a habilitação nas licitações" , o que não altera a necessidade de o ente público seguir acompanhando, efetivamente, a execução e regularidade do contrato de prestação de serviços, mesmo depois de contratado o vencedor do certame, inclusive no que pertine ao adimplemento das obrigações trabalhistas por parte da prestadora, como já anteriormente mencionado, incumbência não devidamente observada pelo recorrente.

Nota-se que o próprio tomador, em suas razões recursais, sustenta que, nos termos dos artigos 58, III, e 66 da Lei 8.666/93, "o que se deve fiscalizar é a execução dos contratos administrativos (...), ou seja, (...) o cumprimento das normas da própria lei de licitações e as cláusulas do contrato. Ora, as cláusulas desses contratos dizem respeito ao objeto contratado (a realização das obras, o fornecimento dos produtos ou a execução dos serviços demandados pela Administração) não ao cumprimento de obrigações trabalhistas. Não se está afirmando que o empregador não tenha obrigação de cumprir a legislação trabalhista, mas que tais obrigações são objeto de outro contrato (o contrato de trabalho mantido entre o empregado e seu empregador), não do contrato administrativo." (ID a677747, páginas 5/6, destaquei).

Segue o Município afirmando, em seu apelo, que as cláusulas contratuais mencionadas no artigo 78, II, da Lei 8.666/93, "cujo cumprimento irregular possibilita a rescisão do contrato, não são as dos contratos de trabalho" (ID a677747, páginas 6/7, destaques acrescidos).

Também aduz o recorrente que o "Município não tem obrigação de fiscalizar os contratos mantidos entre seus fornecedores e terceiros. Assim, não pode ser responsabilizado pelo descumprimento de uma obrigação que não lhe pertence. Se não é obrigado a fiscalizar tais contratos de trabalho, não se lhe pode atribuir culpa por essa não fiscalização!" (ID a677747, página 9, destaquei)

Entretanto, como explanado ao longo da fundamentação deste acórdão, a fiscalização no cumprimento das obrigações trabalhistas por parte da prestadora é, sim, obrigação do ente público contratante, aspecto em que, inequivocamente, falhou o Município de Unaí.

Portanto, nestes autos, não foi apresentada qualquer prova apta a elidir a responsabilização do tomador.

Acrescente-se, ainda, que, nos contratos firmados, a Administração comparece com uma série de prerrogativas que garantem a sua posição de supremacia sobre o particular.

Trata-se de cláusulas exorbitantes, de privilégios ou de prerrogativas.

A Lei nº 8.666/93 garante à Administração a faculdade de exigir garantia nos contratos de obras, serviços e compras (artigo 56, § 1º, da Lei 8.666/93). E o § 2º do artigo 31 permite que a exigência de garantia seja feita já na licitação: "§ 2º A Administração, nas compras para entrega futura e na execução de obras e serviços, poderá estabelecer, no instrumento convocatório da licitação, a exigência de capital mínimo ou de patrimônio líquido mínimo, ou ainda as garantias previstas no § 1º do art. 56 desta Lei, como dado objetivo de comprovação da qualificação econômico-financeira dos licitantes e para efeito de garantia ao adimplemento do contrato a ser ulteriormente celebrado." E ao licitar, por força da lei (até porque a Administração somente pode fazer o que a lei autoriza), deve selecionar a proposta mais vantajosa, em conformidade com os princípios da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos (artigo da Lei nº 8.666/93).

Deve a Administração fiscalizar a execução do contrato (artigos 58, III e 67 da Lei de Licitação) e rescindir unilateralmente na hipótese de descumprimento (artigo 78 da mesma lei), antes mesmo da ocorrência de dano a terceiros.

Não comprovada a atuação cautelosa, porquanto não exigida a caução, tampouco se rescindiu o contato de prestação de serviços por inadimplência prestadora de serviços, tem-se, também por este ângulo, atestada a conduta negligente ou culposa da Administração Pública.

Nesse sentido, o tomador de serviços deve responder subsidiariamente pelas obrigações decorrentes do contrato de trabalho entre o empregado e a empresa contratada, pois negligenciou sua obrigação e permitiu que a reclamante trabalhasse em seu proveito, sem receber justa contraprestação pelo esforço despendido.

Nem se diga que o entendimento aqui esposado viola a Súmula Vinculante nº 10 do excelso STF e esvazia a força vinculante da ADC 16, uma vez que a decisão da mais alta corte não teve por escopo excluir a responsabilidade do ente integrante da Administração Pública, mas, sim, orientar a jurisprudência no sentido de que, para a responsabilização, o julgador deve perquirir se o ente público agiu com esmero, de forma a fiscalizar o contrato de prestação de serviços, no caso concreto.

Dessa forma, não se está negando aplicação a dispositivo de lei, mas, somente, conferindo interpretação, em conformidade com o recente entendimento do STF.

Não é demais repetir que o tomador de serviços, ao não fiscalizar o cumprimento das obrigações relativas ao trabalho assalariado, assumiu para si a responsabilidade pelo cumprimento das obrigações trabalhistas firmadas pela prestadora, pois é beneficiário direto desses serviços.

Por tais razões, com fulcro no disposto nos artigos 186 e 927 do CCB e observados os termos da Súmula 331 do c. TST, deve ser mantida a r. sentença quanto à responsabilização subsidiária da Administração Pública.

Incólumes os princípios e dispositivos invocados, sobretudo os artigos 2º, 5º, II, LIV, 21, XXIV, 37, XXI, da CR/88, 27, caput , III, IV e V, 31, 54, caput , 55, XIII 70, 71, caput e § 1º, da Lei 8.666/93, 626 da CLT, 11 da Lei 10.593/02 e 141 do CPC/2015 e os princípios da especialidade, da relatividade dos contratos e da reserva do possível.

Nego provimento."(págs. 192-198, grifou-se e destacou-se)

A Terceira Turma desta Corte manteve a responsabilidade subsidiária da Administração Pública, mediante os seguintes fundamentos aqui sintetizados:

"(...)

Diante da salvaguarda inscrita no art. 71 da Lei nº 8.666/93, a responsabilidade subjetiva e subsidiária da Administração Pública Direta ou Indireta encontra lastro em caracterizadas ação ou omissão culposa na fiscalização e adoção de medidas preventivas ou sancionatórias ao inadimplemento de obrigações trabalhistas por parte de empresas prestadoras de serviços contratadas (arts. 58, III, e 67 da Lei nº 8.666/93).

Não se está em campo de cogitação do adimplemento das obrigações regulares e ínsitas ao contrato administrativo decorrente de licitação, mas, com olhos também postos no quanto dispõem os arts. 1º, incisos III e IV, e 170 da Constituição Federal, na trilha de evidência de culpa in vigilando e da consequente responsabilidade civil, pela omissão no poder-dever de fiscalizar.

Por outra face, o STF, ao apreciar a Ação Declaratória de Constitucionalidade 16-DF (Rel. Min. Cezar Peluso, julgado em 24.11.2010 e publicado no DJe de 9.9.2011), concluiu ser necessária, para o reconhecimento da responsabilidade subsidiária da Administração Pública, a efetiva demonstração de culpa, na linha da teoria da responsabilidade subjetiva extracontratual, não se aplicando, ao caso, o art. 37, § 6º, da Constituição Federal.

A interpretação sistemática do art. 29, IV, cominado com os arts. 27, IV, 55, XIII, e 58, II, todos da Lei nº 8.666/1993, conduz à conclusão irrefutável de que é obrigação da Administração Pública fiscalizar os recolhimentos previdenciários e do FGTS incidentes sobre as folhas de pagamento das prestadoras de serviço contratadas pelo regime da Lei de Licitações, durante a execução do contrato, isto é, mês a mês, o que, conforme consta do acórdão, não ocorreu.

Assim, a decisão regional, neste aspecto, evidencia a ausência de efetiva fiscalização sobre o contrato havido com a empregadora do autor, configurando a culpa in vigilando da agravante, circunstância que confirma a condenação subsidiária, conforme a compreensão da Súmula 331, V, desta Corte, assim redigida:

"V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993 , especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada."

Estando a decisão moldada aos parâmetros da Súmula 331, V, do TST, incide o óbice do art. 896, § 7º, da CLT e da Súmula 333/TST, não havendo que se cogitar de divergência jurisprudencial com os arestos trazidos, tampouco, ofensa aos dispositivos legais e constitucionais apontados.

Em síntese e pelo exposto, conheço do agravo de instrumento e, no mérito, nego-lhe provimento."(págs. 312-314)

Em embargos de declaração foram prestados os seguintes esclarecimentos:

"Alega o embargante a ocorrência de omissão no acórdão, ao argumento de que os dispositivos indicados no recurso não foram analisados por esta Turma, nomeadamente os arts. , II e LIV, 19, II, 21, XXIV, 37, XXI, 70 da Lei nº 8.666/93, 477, § 8º, da CLT, 10, 489 e 1.022 do CPC, e a Súmula 459 do TST.

No que tange à responsabilidade subsidiária, o acórdão embargado conclui que, "estando a decisão moldada aos parâmetros da Súmula 331, V, do TST, incide o óbice do art. 896, § 7º, da CLT e da Súmula 333/TST, não havendo que se cogitar de divergência jurisprudencial com os arestos trazidos, tampouco, ofensa aos dispositivos legais e constitucionais apontados."

No que diz respeito aos dispositivos relacionados à ausência de fundamentação da decisão regional, a Corte "a quo" concluiu que, "data vênia das alegações do recorrente, infere-se da r. sentença a devida exposição do entendimento do Juízo a quo sobre as razões da responsabilização subsidiária do ente público tomador de serviços, com observância à exigência contida no artigo 93, IX, da CR/88."

Com relação à insurgência respectiva à multa do art. 477, § 8º, da CLT, a responsabilidade subsidiária não está limitada à natureza da parcela, alcançando, assim, todos os direitos trabalhistas assegurados pelo ordenamento jurídico. A decorrência lógica da responsabilidade subsidiária é a satisfação de todos os direitos do reclamante, sem exceção.

Nesse sentido, o item VI da Súmula 331 do TST: "a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação".

Por fim, o acórdão regional é claro ao afirmar que "a documentação de ID d1f91c7, colacionada pela reclamante, dá conta da falta dos depósitos do FGTS devidos ao obreiro." (fl. 191-PE), circunstância que orientou a conclusão desta Turma, conforme trecho a seguir transcrito:

"A interpretação sistemática do art. 29, IV, cominado com os arts. 27, IV, 55, XIII, e 58, II, todos da Lei nº 8.666/1993, conduz à conclusão irrefutável de que é obrigação da Administração Pública fiscalizar os recolhimentos previdenciários e do FGTS incidentes sobre as folhas de pagamento das prestadoras de serviço contratadas pelo regime da Lei de Licitações, durante a execução do contrato, isto é, mês a mês, o que, conforme consta do acórdão, não ocorreu."

O fundamento adotado pela Turma, para manter a responsabilidade subsidiária do embargante, não pode ser considerado surpresa, pois a matéria foi ventilada no recurso ordinário da reclamante.

O Excelso Supremo Tribunal Federal já decidiu que "a garantia de acesso ao Judiciário não significa que as teses apresentadas pelas partes serão apreciadas de acordo com a sua conveniência" (AGAIRR XXXXX-2/PE; Rel. Min. Maurício Corrêa; in DJ de 2.10.1998, seção 1, pág. 008).

À vista do exposto, dou provimento aos embargos de declaração, apenas para prestar esclarecimentos."(págs. 323-325)

Discute-se se a questão sub judice está, ou não, vinculada à ratio decidendi da controvérsia constitucional objeto do Processo nº RE nº 760.931-DF e ao disposto no Tema nº 246 do Ementário Temático de Repercussão Geral da Suprema Corte, bem como se cabe a esta Turma exercer o juízo de retratação.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 760.931-DF, processo apreciado mediante o critério de repercussão geral, firmou tese de que:"O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93"( RE 760.931-DF Relator p/acórdão: Min. Luiz Fux. Tribunal Pleno. DJe-206, DIVULG 11/9/2017, PUBLIC 12/9/2017).

Consignou o entendimento de que não cabe a automática responsabilidade da Administração Pública, não obstante essa mesma responsabilidade possa ser reconhecida nos casos concretos em que comprovada a omissão fiscalizatória do Poder Público.

Deliberou, ainda, que a questão de haver, ou não, em cada caso concreto, prova específica da existência de culpa do ente público será definida nas instâncias ordinárias da Justiça do Trabalho, cujo pronunciamento é soberano em matéria fático-probatória. Trata-se, portanto, de controvérsia a ser esgotada nas instâncias ordinárias, após o exame circunstanciado de cada caso concreto, infensa, portanto, à revaloração em sede extraordinária.

Nos embargos de declaração, a Suprema Corte limitou-se a reafirmar o entendimento de que"a responsabilidade não é automática, conforme preconizou o legislador infraconstitucional, no artigo 71, § 1º, da Lei de Licitações, mas não pode o poder público dela eximir-se quando não cumpriu o seu dever de primar pela legalidade estrita na escolha ou fiscalização da empresa prestadora de serviços"( RE 760.931-DF ED Relator p/acórdão: Min. Edson Fachin. Tribunal Pleno. DJe-194, DIVULG 5/9/2019, PUBLIC 6/9/2019).

Na oportunidade de julgamento dos embargos de declaração, prevaleceu o voto do Ministro Edson Fachin, no sentido de que o Supremo Tribunal Federal, ao fixar a tese de repercussão geral no Tema nº 246, optou por uma redação" minimalista ", sem enfrentar particularidades, a exemplo de a quem caberia o ônus da prova sobre a omissão fiscalizatória do ente público.

Portanto, mesmo após o julgamento dos embargos de declaração, não se definiu a crucial questão controvertida sobre a qual parte cabe o ônus de comprovar se houve ou não, em cada caso concreto, a fiscalização do fiel cumprimento das obrigações descritas nos artigos 58, inciso III, e 67, caput e § 1º, da Lei nº 8.666/1993, dispositivos que clara e expressamente impõem à Administração Pública o poder-dever de fiscalizar o cumprimento de todas as obrigações assumidas pelo contratado selecionado no procedimento licitatório, entre elas, evidentemente, as que decorrem da observância das normas trabalhistas pelas empresas terceirizadas.

Ao silenciar-se de forma eloquente, a Suprema Corte abre caminho para a manutenção do entendimento que já vinha sendo perfilhado no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho, de que o ônus da prova acerca da efetiva fiscalização permaneceria a cargo da Administração Pública, por representar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do trabalhador, já que seria prova de natureza verdadeiramente" diabólica ", de produção praticamente impossível pela parte hipossuficiente.

Vale lembrar que no julgamento do recurso extraordinário em questão, os Ministros da Suprema Corte reafirmaram a constitucionalidade do artigo 71, § 1º, da Lei nº 8.666/1993, já declarada no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 16-DF, bem como afastaram, de uma vez por todas, a possibilidade de responsabilização automática da Administração Pública, posicionamento que se harmoniza, inclusive, com a atual redação da Súmula nº 331, item V, do Tribunal Superior do Trabalho, que reconhece a responsabilidade subsidiária da Administração Pública direta e indireta apenas nos casos em que evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei nº 8.666/1993 (Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31/5/2011).

Não há dúvidas, portanto, de que a mera inadimplência da empresa prestadora dos serviços terceirizados não caracteriza, por si só, culpa da Administração Pública. A questão controvertida, ensejadora de questionamentos diversos no âmbito do Supremo Tribunal Federal e que poderia justificar eventual juízo de retratação, foi apenas aquela relacionada à distribuição do ônus da prova.

Nestes autos, entretanto, a ratio decidendi da decisão ora impugnada é diversa e não versa sobre o ônus da prova, mas sim sobre a afirmação de culpa expressa.

O Tribunal Regional do Trabalho, última e soberana instância apta a analisar e a valorar a prova a esse respeito, registrou expressamente a existência de culpa omissiva do ente público a partir dos elementos de prova produzidos, aspecto não sujeito a reexame por esta Corte superior, nos termos da Súmula nº 126 do TST.

Por oportuno, não houve a transferência automática de responsabilidade à Administração Pública em decorrência do mero inadimplemento da empresa contratada, já que ficou evidenciada a sua culpa in vigilando , expressamente declarada no âmbito do Regional.

Assim, o Tribunal Superior do Trabalho, ao manter a responsabilidade subsidiária da Administração Pública diante das premissas fáticas consignadas no acórdão regional, não descumpriu as referidas decisões do STF.

Portanto, como, na hipótese sub judice, foi observada a tese firmada no STF, proferida no RE nº 760.931-DF , em repercussão geral, esta Turma não exerce o juízo de retratação previsto no artigo 1.030, inciso II, do CPC/2015, mantendo seu acórdão, e determina o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para prosseguimento do feito, como entender de direito.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, não exercer o juízo de retratação previsto no artigo 1.030, inciso II, do CPC/2015, mantendo os acórdãos de págs. 310-314 e 323-325 (ED), e determinar o retorno dos autos à Vice-Presidência desta Corte para prosseguimento do feito, como entender de direito.

Brasília, 14 de setembro de 2022.

Firmado por assinatura digital (MP XXXXX-2/2001)

JOSÉ ROBERTO FREIRE PIMENTA

Ministro Relator

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tst/1935738848/inteiro-teor-1935738883

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