Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
28 de Maio de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Tribunal de Justiça de Minas Gerais TJ-MG - Ap Cível/Rem Necessária: AC XXXXX-53.2015.8.13.0024 - Inteiro Teor

Tribunal de Justiça de Minas Gerais
ano passado

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

7ª CÂMARA CÍVEL

Partes

Publicação

Julgamento

Relator

Des.(a) PEIXOTO HENRIQUES
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS - REMESSA NECESSÁRIA - TRANSPORTE DE PASSAGEIROS - MANDADO DE SEGURANÇA - LEI ESTADUAL Nº 19.445/2011 - CONSTITUCIONALIDADE - OBSERVÂNCIA DO RE Nº 661.702/DF - LIBERAÇÃO DO VEÍCULO CONDICIONADA AO PAGAMENTO DE ENCARGOS - IMPOSSIBILIDADE. Na esteira do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do RE nº 661.702/DF, julgado sob o rito da repercussão geral (Tema nº 546), tem-se por "constitucional previsão normativa local voltada a coibir fraude considerado o serviço público de transporte coletivo, e inconstitucional o condicionamento de liberação de veículo aprendido ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos decorrentes de infração".

________________________________________________________

AP CÍVEL/REM NECESSÁRIA Nº 1.0000.15.085694-6/004 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - REMETENTE: JUIZ DE DIREITO DA 5ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA E AUTARQUIAS DE BELO HORIZONTE - APELANTES: DALTON AUGUSTO DO NASCIMENTO FILHO E DEPARTAMENTO DE EDIFICAÇÕES E ESTRADAS DE RODAGEM DO ESTADO DE MINAS GERAIS - APELADOS: OS MESMOS

D E C I S Ã O

M O N O C R Á T I C A

Cuida-se aqui de apelações interpostas pelo Departamento de Edificações e Estradas de Rodagem do Estado de Minas Gerais - DEER/MG (doc. 28) e por Dalton Augusto do Nascimento Filho (doc. 31) contra sentença (doc. 25) que, dirimindo mandado de segurança impetrado pelo segundo apelante em face de ato atribuído ao Diretor do DEER/MG, concedeu a segurança. Determinado foi à autoridade coatora que se abstenha de apreender o veículo do impetrante, de placas GUG-4170, bem como de lhe aplicar as penalidades de transbordo, sob o fundamento da Lei nº 19.445/11, não ficando o impetrante, contudo, eximido de ser autuado ou multado por transporte ilegal de passageiros, tendo em vista que somente a apreensão do veículo é ilegal, estando a penalidade de multa prevista no CTB. Custas "ex lege".

Ordenada a remessa necessária.

Em síntese, após exposição "dos fatos", aduz o 1º apelante (DEER/MG): que, "se a atuação administrativa é respaldada em uma lei, por certo não há o direito do apelado de agir contrariamente à mesma"; que "tendo havido um regular processo legislativo, a lei deve ser observada, a não ser tenha sido considerada inconstitucional pelo judiciário em controle abstrato"; que "a Administração Pública ao proceder a apreensão de veículos que realizam transporte sem a devida autorização do poder concedente, por certo não está cometendo qualquer ilegalidade ou abusando do poder público, mas está, agindo de acordo com o seu regular poder de polícia e nos limites da lei"; que "é sabido que um dos mais relevantes princípios que norteiam a Administração Pública é o princípio da legalidade, através do qual a Administração Pública só pode agir respaldada por lei"; que "é certo que o artigo 6º da lei 19945/11 determina que sejam aplicadas as penalidades de multa e apreensão de veículos àqueles que realizarem transporte clandestino (...) desta forma, tendo verificado tal situação, há uma imposição legal ao administrador, que deverá agir de acordo com a lei, impondo a multa e apreendendo o veículo"; que "nos termos do art. 256 do CTB, cabem às autoridades de trânsito aplicar as sanções devidas, inclusive a apreensão do veículo"; que "o Código de Trânsito prevê expressamente entre suas sanções a apreensão dos veículos e, também de forma expressa prevê a possibilidade de aplicação de suas sanções pelos Estados e Distrito Federal no que se refere a fiscalização do trânsito"; que "a Lei Estadual n. 19.445/11 ao prever a sanção de apreensão do veículo, está em sintonia com o Código de Trânsito que, da mesma forma, prevê tal sanção, bem como sua aplicação aos Estados Membros"; que "o fato do art. 231 do CTB em seu inciso 'VIII' prever tão somente a medida administrativa de retenção do veículo, não é impedimento a que os Estados membros, dentro de sua competência e no âmbito de sua circunscrição, estabeleçam outras penalidades, ainda que mais gravosas"; que "procura demonstrar o equívoco daqueles que entendem que a referida lei mineira seria inconstitucional em face do dispositivo isolada e literal do art. 231 'VIII' do CTB"; que "deve-se procurar fazer uma interpretação sistemática, olhando-se o sistema, no caso o código de trânsito, como um todo", "assim, o referido art. 231 'VIII' do CTB deve ser aferido conjuntamente com os arts. 22 'I', 'V', 'VI' e art. 256 'IV' e § 2º do CTB"; que "os arts. 22 'I', 'V', 'VI' e art. 256 'IV' e § 2º do Código de Trânsito Brasileiro ( CTB) expressamente atribuem competência aos Estados cumprir e fazer cumprir a legislação no âmbito de suas atribuições, bem como aplicar as medidas de polícia administrativa (...) não há, portanto, que se falar em violação ao disposto no art. 22 'XI' da CF que estabelece competência privativa da União"; que "no regular exercício de seu poder de polícia, a administração pública, no exercício da parcela que lhe é outorgada do mesmo poder, regulamenta as leis e controla a sua aplicação, preventivamente (por meios de ordens, notificações, licenças ou autorizações) ou repressivamente (mediante a imposição de medidas coercitivas)"; que "a Constituição Federal não enumerou taxativamente as matérias de competência dos estados-membros, reservando a eles a denominada competência remanescente (art. 25§ 1º da CF)"; que "o CTB ao reconhecer a competência dos Estados para impor penalidades e medidas administrativas, o fez em consonância com a competência dos Estados para regulamentar o transporte intermunicipal"; e, ainda, que "a despeito da patente constitucionalidade da Lei Estadual nº 19.445/2011, conforme firme entendimento desta autarquia, a mesma somente poderá ser afastada com a observância do referido art. 97 da CF".

Quer provido o apelo, reformando a sentença para se denegar a ordem.

A seu turno, sustenta o impetrante (2º apelante): que "o fundamento da sentença é todo favorável para a procedência total dos pedidos, mas ao final o mesmo é julgado parcialmente procedente, com a concessão parcial da segurança, com a não concessão da segurança para que os agentes do apelado se abstenham de aplicar as demais penalidades previstas na Lei 19.445/11, bem como a isenção da multa prevista no artigo 6º da referida lei"; que "a matéria foi alvo de debates neste e. Tribunal de Justiça de Minas Gerais, de sorte que a Lei Estadual foi considerada afronta ao art. 22, XI, da CF/88"; que "no caso do transporte clandestino de passageiros deve-se aplicar o previsto no art. 231, do Código de Trânsito Nacional, que possui as seguintes penalidades: multa e retenção do veículo (...) já a Lei Estadual n.º 19.445/11, no seu artigo 6º, prevê a penalidade de multa de 500 Ufemgs (reincidência este valor é duplicado) e apreensão do veículo"; que "a medida de retenção do veículo, de acordo com os artigos 256, IV e 269, I, da Lei Federal 9.503/97 não se confunde com a penalidade de apreensão"; que, "nos termos do artigo 22, XI, da Constituição Federal, compete privativamente a União Legislar sobre trânsito e transporte, de forma que a Lei estadual não pode criar penalidade mais gravosa do que o previsto na Lei Federal, Código de Trânsito Nacional"; que "fica reconhecida a ilegalidade do ato da apreensão do veículo do apelante, sendo, portanto, indevida também a aplicação e exigência ao pagamento das despesas decorrentes da apreensão"; que "condicionar a liberação do veículo ao pagamento de multa é, simultaneamente, dar auto-executoriedade a um poder que a Administração não possui e infringir a regra constitucional básica do devido processo legal, onde retira-se da outra parte qualquer oportunidade de defesa, sujeitando-se esta apenas ao pagamento, sob pena de sofrer verdadeira sanção política"; e, ainda, que "não se pode negar a usurpação de competência pelo Estado apelado ao tratar de matéria afeta a União".

Quer a reforma parcial da sentença para julgar totalmente procedente seus pedidos iniciais, além dos pedidos já deferidos, concedendo a totalidade da segurança, determinando ainda que os agentes do apelado se abstenham de aplicar as demais penalidades previstas na Lei nº 19.445/2011, entre elas a multa prevista no artigo 6º, I, da Lei nº 19.445/2011, sob pena de multa.

Os apelos dispensam o preparo (art. 1.007, § 1º, CPC/2015).

Contrarrazões somente pelo impetrante (doc. 35).

A PGJ/MG recomenda o parcial provimento dos recursos (doc. 37).

Intimadas a partes para se manifestarem sobre a aplicação ao caso versado da Lei nº 13.855/2019, que alterou a Lei nº 9.503/1997 ( CTB), bem como do que restou decidido pela ex. Corte Constitucional nos autos do RE nº 661.702/DF, bem como da alteração legislativa da LE nº 19.445/2011 promovida pela LE nº 23.941/2021, quedaram-se silentes.

Fiel ao breve, dou por relatado.

Conheço da remessa necessária na parte em que concedida a segurança (art. 14, § 1º, Lei nº 12.016/2009) e das apelações, presentes os requisitos de admissibilidade.

Por primeiro, convém ressalvar que, a par de datada a sentença de 6/10/2016 e as apelações de 14/10/2016 e 17/10/2016, respectivamente, os autos somente foram distribuídos a esta relatoria aos 16/2/2023 (v. Mapa de Distribuição).

Neste ínterim, a questão referente ao transporte clandestino de passageiros foi muito discutida por este Sodalício e, até mesmo, pelos tribunais superiores, sendo que, após intimadas as partes, cabível aplicar ao caso a jurisprudência mais recente do ex. STF, bem como as alterações legislativas efetivadas tanto no Código de Trânsito Brasileiro quanto na Lei Estadual nº 19.445/2011.

Pois bem...

Diz nosso vigente CPC/2015:

Art. 932. Incumbe ao relator:

(...)

IV - negar provimento a recurso que for contrário a:

(...)

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

(...)

V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a:

(...)

b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos;

Acerca do tema, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que "as disposições do art. 557 do CPC que conferem poderes ao Relator para negar seguimento ou dar provimento ao recurso são constitucionais" (STF - RTJ 173/948), estabelecendo a Súmula n.º 253 do STJ que "o art. 557 do CPC, que autoriza o relator a decidir o recurso, alcança o reexame necessário".

Apesar dos precedentes tratarem do art. 557 do CPC/1973, seu conteúdo foi abrangido pelo supracitado art. 932 do CPC/2015, não havendo motivos, portanto, para alteração de seu entendimento.

Nesse sentido, discorrendo acerca do tema, Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha assim ensinam:

Para negar provimento ao recurso, não há necessidade de ouvir previamente o recorrido - a lógica, aqui, é a mesma que preside a improcedência liminar do pedido (art. 332, CPC), autorizada antes da citação do réu. O relator pode negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência (art. 932, IV, CPC). Se o recorrente não apontar, em seu recurso, razões para distinção ou superação do precedente obrigatório, o caso, na verdade, é de exercício abusivo do direito de recorrer, a ensejar a condenação do recorrente às penas da litigância de má-fé (art. 80, VII, CPC). (...) As regras aplicam-se ao julgamento unipessoal da remessa necessária, que ostenta, como demonstrado no capitulo a ela dedicado, natureza recursal. (Curso de Direito Processual Civil, Vol. 3, 13ª ed., JusPodivm, p. 55/56)

Em nota de rodapé, tem-se, ainda, o seguinte:

FREIRE, Rodrigo da Cunha Lima. "Da ordem do processo nos tribunais", cit., p. 2.089; NERY Jr., Nelson; NERY, Rosa. Comentários ao Código de Processo Civil, cit., p. 1.852. Ao tempo do CPC-1973, o STJ entendeu aplicável, à remessa necessária, o respectivo art. 557, cujo conteúdo foi abrangido pelo art. 932, CPC-2015. Esse entendimento consolidou-se no enunciado n. 253 da súmula da jurisprudência predominante do STJ.

Faço, pois, o monocrático julgamento do feito porquanto existente recurso com repercussão geral no Supremo Tribunal Federal acerca da questão nele veiculada.

Inicialmente, cumpre salientar que o mandado de segurança encontra previsão expressa na Constituição da Republica e, por conseguinte, constitui direito fundamental do cidadão.

Quanto ao procedimento e cabimento do mandado de segurança, dispõem o art. , LXIX, da CR/88 e o art. da Lei nº 12.016/2009 que:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público;

Art. 1º. Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for ou sejam quais forem as funções que exerça.

É cabível, o mandado de segurança, portanto, para proteger o cidadão contra ato ilegal ou proferido com abuso de autoridade que viole ou cause receio de violação de direito líquido e certo, o qual deverá ser exercitado e comprovado de plano.

Além disso, nos termos do art. da Lei nº 12.016/2009, para reconhecer-se o cabimento do mandado de segurança, o direito ameaçado ou lesado não pode ser amparado por habeas corpus, e contra o ato impugnado não deve caber a interposição de recurso.

Sobre o direito líquido e certo, atente-se para a lição da Prof.ª Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

Hoje, está pacífico o entendimento de que a liquidez e certeza referem-se aos fatos; estando estes devidamente provados, as dificuldades com relação à interpretação do direito serão resolvidas pelo juiz. Esse entendimento ficou consagrado com a Súmula nº 625, do STF, segundo a qual controvérsia sobre matéria de direito não impede a concessão de mandado de segurança. Daí o conceito de direito líquido e certo como o direito comprovado de plano, ou seja, o direito comprovado juntamente com a petição inicial. No mandado de segurança, inexiste a fase de instrução, de modo que, havendo dúvidas quanto às provas produzidas na inicial, o juiz extinguirá o processo sem julgamento de mérito, por falta de um pressuposto básico, ou seja, a certeza e liquidez do direito. (Direito Administrativo, 18ª ed., Atlas, p. 677)

No mesmo sentido, confira-se Diogo de Figueiredo Moreira Neto em seu Curso de Direito Administrativo (Forense, 13ª ed., p. 597/598).

Não se deve olvidar ainda que a impetração de mandado de segurança deve ocorrer em face de ato concreto de autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.

Acresço ser vedada a impetração de mandado de segurança contra lei em tese, ou seja, aquele que se ampara exclusivamente na legislação.

No caso, o impetrante alega ser o legítimo possuidor/proprietário do veículo IMP/MBENZ 310D SPRINTERC, placa GUG-4170, pretendendo que esse seu veículo não seja apreendido com base no disposto no art. 6ª da Lei nº 19.445/2011.

Indeferida a liminar (doc. 6).

Interposto agravo de instrumento (doc. 10), a ele foi dado provimento "para deferir a liminar pretendida e determinar que os agentes da autoridade agravada se abstenham de apreender o veículo de placa GUG-4170, de propriedade do agravante, e de aplicar a multa prevista no art. 6º da Lei Estadual 19.445/11, caso o único motivo da apreensão se trate do objeto da presente lide, ressalvada a possibilidade de aplicação de eventuais penalidades por outras infrações administrativas" (AI nº 1.0000.15.085694-6/004, 4ª CCív/TJMG, rel.ª Des.ª Ana Paula Caixeta, DJ 15/3/20161).

Após regular processamento, adveio a sentença em comento, concedendo parcialmente a segurança pleiteada.

I - PRELIMINARES

No caso, independente do que se possa definir como "lei" para fins da Súmula n.º 266 do STF, impossível desconsiderar que, consoante lição do respeitado Hely Lopes Meirelles:

Em geral, as leis, decretos e demais atos proibitivos são sempre de efeitos concretos, pois atuam direta e imediatamente sobre seus destinatários. (Mandado de Segurança e Ações Constitucionais, 34ª ed., Malheiros Editores, p. 40 - destaquei)

Logo, dado o inequívoco cunho proibitivo do ato normativo hostilizado, afasto a possibilidade de se fazer uso nesta impetração do entendimento consagrado pela ex. Corte Constitucional em sua Súmula nº 266.

Neste contexto, tenho por aqui aplicável o seguinte aresto:

Considerando que a Lei n. 19.445/11 possui efeitos concretos que incidem sobre seus destinatários, ela pode ser atacada pela via mandamental. ( AC n.º 1.0024.13.169286-5/002, 8ª CCív/TJMG, rel. Des. Paulo Balbino, DJ 9/11/2015 - ementa parcial)

Ora, como visto, o regramento estadual atacado possui efeitos concretos (apreensão de veículo), os quais são suportados por todos aqueles que desempenham atividade de transporte particular de passageiros.

Sem mais delongas, rejeito, as preliminares aventadas.

Defende o Diretor do DEER/MG inexistente o direito líquido e certo, condição para impetração do mandado de segurança.

Com todo respeito, o exame quanto à existência ou não de direito amparado por mandado de segurança é matéria de mérito da impetração e como tal deve ser enfrentada e resolvida.

II - MÉRITO

Em relação ao transporte irregular de pessoas e bens, o Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) dispunha o CTB à época da impetração, em seu art. 231, VIII, tratar-se de infração média, com penalidade de multa e medida administrativa de retenção do veículo.

De acordo com a LE nº 19.445/2011, também vigente à época, considera-se ilegal o transporte metropolitano ou intermunicipal remunerado de passageiros, realizado por pessoa física ou jurídica, em veículo particular ou de aluguel, que não possua a devida concessão, permissão ou autorização do poder concedente ou não obedeça a itinerário definido pela Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas de Minas Gerais - SETOP/MG (art. 2º), sujeitando o infrator às penalidades de:

Art. 6º. Serão aplicadas à pessoa física ou jurídica que realizar transporte clandestino de passageiros as seguintes sanções:

I - multa de 500 Ufemgs (quinhentas Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais);

II - apreensão do veículo.

§ 1º- O valor da multa prevista no inciso I deste artigo será duplicado a partir da primeira reincidência.

§ 2º- A autoridade competente instaurará o devido processo administrativo, observadas as disposições legais aplicáveis, para processamento do auto de infração.

Após diversas discussões sobre o assunto, inclusive com esta eg. Corte Mineira declarando a inconstitucionalidade dos "dispositivos de lei estadual que criam penalidades diversas, mais severas do que aquela estabelecida na legislação de trânsito ( CTB), para a infração de transporte clandestino de passageiros, expedida no exercício da competência privativa da União (...)" (Arg. Inconst. nº 1.0024.12.132317-4/004, OE/TJMG, rel. Des. Elias Camilo, DJ 20/3/2015), o Supremo Tribunal Federal, ao analisar a questão debatida nos autos, sob o cogente rito da repercussão geral no RE nº 661.702 (Tema nº 546), fixou a seguinte orientação:

TRANSPORTE COLETIVO - CONTRATO PÚBLICO DE CONCESSÃO - HIGIDEZ - DISCIPLINA NORMATIVA. Surge constitucional previsão normativa local voltada a coibir fraude considerado o serviço público de transporte coletivo, e inconstitucional o condicionamento de liberação de veículo aprendido ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos decorrentes de infração. ( RE nº 661.702, TP/STF, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 19/5/2020)

Como se pode deduzir da leitura do precedente acima, reconheceu-se como constitucional a Lei do Distrito Federal (ou Lei Municipal - LD nº 239/1992) que tratava sobre fraude à prestação do serviço de transporte coletivo de passageiros, de forma remunerada, sem prévia concessão, permissão ou autorização do Governo do Distrito Federal, posto que referida norma se enquadra na competência prevista no art. 30, V, da CR/882.

Extrai-se das razões de decidir do julgado que as normas estabelecidas no Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) buscam resguardar a segurança no trânsito, enquanto que a legislação distrital, por força da competência constitucional alhures destacada, visa garantir a correta prestação do serviço público de transporte coletivo de passageiros.

A propósito no que aqui nos interessa, eis trecho do voto proferido pelo i. Min. Marco Aurélio:

O legislador federal, ao vedar, no artigo 231, inciso VIII, da Lei nº 9.503/1997 - Código de Trânsito Brasileiro -, a conduta de "transitar com o veículo efetuando transporte remunerado de pessoas ou bens, quando não for licenciado para esse fim, salvo casos de força maior ou com permissão da autoridade competente" visa tutelar bem jurídico diverso. É dizer: pretende obstar, sem nenhuma relação com o sistema de transporte coletivo de pessoas, a utilização de veículo automotor para transporte remunerado de pessoas e, até mesmo, de bens, quando não licenciado para tal fim.

A despeito da proximidade das aludidas infrações administrativas, possuem campos distintos. Enquanto, no âmbito distrital, o objeto é a higidez do serviço público de transporte coletivo de passageiros, no federal, o móvel é a segurança no trânsito, no que vedada a prática desautorizada não apenas da condução de pessoas, mas também de coisas, estas não alcançadas pela previsão distrital. No primeiro, o foco é o transporte coletivo de pessoas a ser procedido a partir da concessão. No segundo, a circulação viária de pessoas e coisas. A casuística é rica e o enquadramento de cada situação, num ou noutro tipo infracional, respeitada a vedação da dupla punição pelo mesmo fato, é tarefa das instâncias ordinárias, consideradas as provas reunidas no processo.

O artigo 28 da Lei nº 239/1992 foi editado no exercício regular da competência atribuída ao Distrito Federal pelo Constituinte originário.

Acumula o Distrito Federal, observado o artigo 32, § 1º, da Lei Maior, as competências legislativas reservadas aos Estados e Municípios, valendo notar caber a estes "organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial" - artigo 30, inciso V, da Constituição Federal. A organização pressupõe a edição das normas atinentes não apenas à prestação direta ou indireta do serviço, mas também à estipulação de infrações e penalidades a subordinar, sob o ângulo administrativo, os particulares. No campo da delegação, a concessionária vincula-se à Administração por meio de instrumento contratual próprio, mediante o qual o Poder Público exerce, quanto à contratada, o poder disciplinar, considerado o liame estabelecido. Inexistindo relação jurídica prévia, cabe à Administração zelar, presente o poder de polícia, pela observância das normas pertinentes.

O Pleno, ao apreciar a ação direta de inconstitucionalidade nº 2.751, relator ministro Carlos Velloso, em sessão ocorrida em 31 de agosto de 2005, admitiu, por maioria, a validade de lei do Estado do Rio de Janeiro na qual estipulada a sanção de apreensão e desemplacamento de veículos utilizados, em situação irregular, para transporte coletivo de passageiros. Concluiu que a providência está inserida no âmbito do poder de polícia do Estado, a quem cumpre o licenciamento de veículos, no que ausente invasão da competência federal para legislar sobre trânsito e transporte. Eis a ementa, publicada em 24 de fevereiro de 2006:

CONSTITUCIONAL. VEÍCULOS DE TRANSPORTE COLETIVO DE PASSAGEIROS. LEI 3.756, DE 2002, DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. I. - Lei 3.756/2002, do Estado do Rio de Janeiro, que autoriza o Poder Executivo a apreender e desemplacar veículos de transporte coletivo de passageiros encontrados em situação irregular: constitucionalidade, porque a norma legal insere-se no poder de polícia do Estado. II. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.

O entendimento corrobora a visão segundo a qual a previsão de infrações está englobada no exercício da competência administrativa local. Há mais: sob o ângulo da política tarifária, é dever do Poder Público - e direito da concessionária - a manutenção do equilíbrio econômicofinanceiro do contrato, de modo a viabilizar a exploração do serviço pela iniciativa privada. A equação mostra-se diretamente impactada pela ocorrência de fraudes consubstanciadas no transporte clandestino de passageiros, no que o cálculo do preço público leva em conta a quantidade de usuários do serviço. Incumbe, então, aos Municípios e, por cumulação, ao Distrito Federal a organização do transporte coletivo de passageiros. Nela está incluída a edição de normas visando a punição, no campo administrativo, de condutas configuradoras de fraude. Em última análise, a atuação ocorre visando a higidez do contrato público formalizado.

Descabe articular, no caso, considerado o artigo 22, parágrafo único, da Constituição de 1988, com a necessidade de lei complementar a respaldar a atuação do Distrito Federal quando em jogo a tutela do transporte coletivo urbano de passageiros. A competência distrital é própria e encontra respaldo no artigo 30, inciso V, da Constituição Federal. Coexistem, no plano normativo, os artigos 28 da Lei distrital nº 239/1992 e 231, inciso VIII, do Código de Trânsito Brasileiro. Ao adotar óptica excludente, a resultar na declaração de inconstitucionalidade do preceito local, a Turma Recursal acabou por violar a norma constitucional.

Sob o ângulo das sanções, é irrelevante a comparação das previsões contidas nos artigos 28 da Lei distrital e 231, inciso VIII, do referido Código, uma vez editados no exercício de competências legislativas distintas.

Logo, restou reconhecido que no âmbito do Poder de Polícia, a Administração Pública pode estabelecer infrações e penalidades em face do particular, sendo, pois, legítima a norma distrital que regulamenta o transporte irregular de passageiros.

Desse modo, por força do efeito vertical do precedente em referência (art. 927, III, CPC/2015), já revi meu entendimento ("e.g.": AC nº 1.0000.15.089273-5/002, DJ 23/8/2022; e, AgInt nº 1.0024.12.134156-4/003, DJ 12/7/2022) para reconhecer a constitucionalidade da LE nº 19.445/20113, em sua redação original, isso na parte em que previa a apreensão do veículo flagrado em transporte clandestino de passageiros (art. 6º, II e 7º). Por consequência lógica, imperativo seria se denegar a segurança reclamada na inicial em relação ao pedido de abstenção de apreender o veículo do impetrante.

Convém ressalvar, foi promovida pela LE nº 23.941/2021alteração legislativa na LE nº 19.445/2011, passando essa a assim dispor:

Art. 6º. Serão aplicadas à pessoa física ou jurídica que realizar transporte clandestino ou irregular de passageiros as seguintes sanções:

I - multa de 1.000 (mil) Unidades Fiscais do Estado de Minas Gerais - Ufemgs;

II - remoção do veículo;

III - suspensão do cadastro e cancelamento da autorização emitida pelo DER-MG, na forma de regulamento, se for o caso.

§ 1º- O valor da multa prevista no inciso I do caput será duplicado a partir da primeira reincidência.

§ 2º- A sanção prevista no inciso I do caput aplica-se também à pessoa física ou jurídica que promover ou intermediar serviço de fretamento em desacordo com a legislação aplicável.

Art. 7º. Nos casos da aplicação de penalidade prevista no art. 6º, os passageiros serão desembarcados e o veículo será recolhido ao depósito.

§ 1º- O infrator é responsável pelo pagamento da multa, das taxas e das despesas com transbordo dos passageiros, remoção e estada do veículo em depósito.

§ 2º- A despesa com a estada do veículo em depósito será de 25 (vinte e cinco) Ufemgs por dia.

§ 3º- O DER-MG ou entidade conveniada poderá inscrever as multas vencidas e não pagas decorrentes da aplicação desta lei no sistema de registro de veículos do Departamento de Trânsito do Estado de Minas Gerais - Detran-MG - e em sistema de registro de dívidas e de títulos não pagos de pessoas físicas ou jurídicas.

Destarte, diante do precedente vinculante do ex. STF, dúvidas não restam da constitucionalidade da referida alteração que, diga-se, se adequa ao disposto no Código de Trânsito Brasileiro (art. 231, VIII - redação dada pela Lei nº 13.855/2019) ao impor a medida administrativa de remoção do veículo.

Lado outro, tenho por procedente a pretensão deduzida na inicial para se determinar apenas que a liberação do veículo do impetrante não seja condicionada ao pagamento de multa e encargos previstos na legislação estadual; isso porque, o Supremo Tribunal Federal no paradigma em referência reconheceu a inconstitucionalidade da norma distrital de condicionar a liberação de veículo apreendido ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos decorrentes de infração.

Por pertinente, peço licença para colacionar parte do voto condutor do RE nº 661.702:

Há, contudo, vício material de inconstitucionalidade no § 7º do dispositivo da lei local. Eis o texto:

Art. 28. [...] [...] § 7º Os veículos apreendidos só poderão ser liberados após o pagamento das multas, preços públicos e demais encargos devidos ao Departamento Metropolitano de Transportes Urbanos - DMTU e Departamento de Trânsito do Distrito Federal - DETRAN/DF.

Configurada a infração atinente à fraude contra o serviço público de transporte coletivo urbano, o legislador condicionou a liberação ou restituição do veículo apreendido ao pagamento da multa, preços públicos e encargos devidos ao Departamento Metropolitano de Transportes Urbanos - DMTU e Departamento de Trânsito do Distrito Federal - DETRAN/DF. A controvérsia alusiva à validade da prática não é novidade presente a jurisprudência do Tribunal, que já se debruçou sobre o tema ao apreciar situações análogas, especialmente sob o ângulo tributário.

O Supremo possui entendimento antigo a revelar a inadequação das chamadas sanções políticas. Consistem em restrições desproporcionais à propriedade e ao exercício de atividade econômica ou profissional lícitas, por meio das quais o Fisco induz ou coage o particular ao pagamento de tributos e acessórios. Procedimentos dessa natureza têm sido glosados pelo Tribunal. Deve a Fazenda buscar o Judiciário para a cobrança, via execução, do que devido, considerados a liberdade fundamental de exercício de atividades profissionais e econômicas e o devido processo legal, versados nos artigos , incisos XIII e LIV, e 170, parágrafo único, da Constituição Federal. Além dos verbetes nº 70, nº 323 e nº 547 da Súmula da Jurisprudência Predominante do Tribunal, há os seguintes precedentes: ação direta de inconstitucionalidade nº 173, relator ministro Joaquim Barbosa, Diário da Justiça eletrônico de 20 de março de 2009, e recurso extraordinário nº 565.048, de minha relatoria, Diário da Justiça eletrônico de 9 de outubro de 2014.

Embora não estejam em jogo, na situação concreta, créditos tributários e estes não ostentem natureza sancionatória, o raciocínio, ao menos sob o enfoque do devido processo legal, guarda pertinência com o caso. Presente o versado no § 7º do artigo 28 da Lei distrital nº 239/1922, é inadequado, constitucionalmente, condicionar a restituição de veículo apreendido ao pagamento da multa aplicada ante a prática da infração administrativa, bem assim de quaisquer valores devidos aos entes públicos envolvidos.

Sob o prisma processual, o executivo fiscal, disciplinado na Lei nº 6.830/1980, além de representar meio próprio e legítimo para a cobrança de créditos pertencentes a entes públicos, sejam eles de natureza tributária ou não, constitui garantia do particular, no que lhe permite, em momento próprio, o exercício do direito de defesa em face da pretensão estatal. Ao vincular a restituição do veículo ao pagamento da multa e outros encargos, valendo-se de mecanismo indireto e opressivo de cobrança, o legislador distrital avançou a linha do arbítrio e aniquilou o exercício do direito de defesa e contraditório assegurado na Lei Maior. Tornou exigível, antes mesmo da conclusão do processo administrativo deflagrado com a lavratura do auto de infração, a sanção que dele pode resultar. É a inversão da ordem natural das coisas.

No tocante ao aspecto substantivo, a estipulação de meio indireto de cobrança, substituindo as vias processuais ordinárias, resulta na imposição de restrição desprovida de razoabilidade, excessiva e arbitrária. Constitui atalho inaceitável, direcionado a forçar, de forma mais gravosa e injustificável, o mesmo resultado almejado com a observância do rito da execução fiscal. Atenta, inclusive, contra o direito de propriedade, ao limitar o exercício pleno deste com base em exigência de prestação pecuniária - multa e preços públicos porventura devidos -, em caráter antecipado e na via imprópria, apesar de o bem apreendido não constituir garantia do pagamento desses valores.

O abuso dos meios, com a consequente contaminação dos fins, é a nota essencial e autoritária da previsão do § 7º do artigo 28 da Lei nº 239/1992, a revelar caráter ditatorial e arbitrário. Em síntese, ao privar o cidadão do mecanismo idôneo - o executivo fiscal - e utilizar-se de ferramentas indiretas e desarrazoadas de cobrança, o legislador desrespeitou o direito de propriedade e o devido processo legal tanto na dimensão processual quanto na substancial. Olvidou as regras adequadas e moderadas do jogo público. ( RE nº 661.702, TP/STF, rel. Min. Marco Aurélio, DJ 19/5/2020)

Nesse sentido, esta Suprema Corte Estadual já decidiu:

Juízo de retratação - Artigo 1.030, II, do Código de Processo Civil - Mandado de segurança - Transporte irregular de passageiros - Lei Estadual 19.445, de 2011 - Constitucionalidade - Condicionamento ao pagamento de multas e taxas - Inviabilidade - Tese firmada - Tema 546 da repercussão geral - Acórdão retratado - Sentença parcialmente reformada em reexame necessário - Acórdão retratado parcialmente. Consoante entendimento sufragado pelo Supremo Tribunal Federal nos autos do RE 661.702-DF (tema 546 da repercussão geral), é constitucional previsão normativa local voltada a coibir fraude considerado o serviço público de transporte coletivo, vedado, contudo, o condicionamento de liberação de veículo apreendido ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos oriundos da infração. (AC/RN nº 1.0000.17.093436-8/002, 2ª CCív/TJMG, rel. Des. Marcelo Rodrigues, DJ 1º/10/2021)

Não é outro, aliás, o entendimento desta eg. 7ª CCív/TJMG:

JUÍZO DE RETRATAÇÃO. ART. 1.030, II, CPC. APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE CLANDESTINO DE PASSAGEIROS. PENALIDADE DE APREENSÃO. LEI ESTADUAL Nº 19.445/11. RE Nº 661.702 - TEMA 546. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Com a alteração do Código de Trânsito Brasileiro promovida pela Lei Federal nº 13.855/19, que prevê a medida administrativa de remoção do veículo, no caso de transporte clandestino de passageiros, é lícita a conduta do agente público de apreender o veículo com fulcro na norma estadual. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, Tema 546, sedimentou que "é inconstitucional o condicionamento de liberação de veículo aprendido ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos decorrentes de infração." ( RE XXXXX, Relator (a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 04/05/2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-123 DIVULG XXXXX-05-2020 PUBLIC XXXXX-05-2020). ( AC nº 1.0000.19.015910-3/002, 7ª CCív/TJMG, rel. Des. Belizário de Lacerda, DJ 6/8/2021)

Em assim sendo, reformo parcialmente a sentença, assim o fazendo apenas para, na remessa necessária, conceder parcialmente a segurança, afastando o condicionamento de eventual liberação do veículo do impetrante ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos da infração. No entanto, como já destacado na decisão recorrida, ao Estado é dado o poder de polícia para o controle do transporte de passageiros, o que lhe garante o direito de fiscalização e até aplicação de sanções contidas no CTB e na legislação estadual que não o extrapole.

Dito isso, embora não seja possível a aplicação da norma estadual quanto ao pagamento de multas, preços públicos e demais encargos decorrentes de infração para efeito de liberação do veículo, é certo que a impetrante não comprova, na via deste "mandamus", que faz o transporte regular de passageiros, de modo a afastar também a aplicação da multa (que encontra previsão no Código de Trânsito Brasileiro), o que impõe a possibilidade de aplicação de sanções contidas no CTB e na legislação estadual que não o extrapole.

Portanto, esta alteração deve ser feita na sentença revisanda.

Por fim, consigno isentos impetrante e impetrado do pagamento das custas processuais, a teor do art. 10, I e II, da Lei Estadual nº 14.939/2003 (v. doc. 6).

Em derradeiro arremate, aponto correto o não arbitramento de honorários sucumbenciais, isso em razão dos ditames do art. 25 da Lei nº 12.016/2009, da Súmula nº 105 do STJ e da Súmula nº 512 do STF.

Incabível o arbitramento de honorários de sucumbência na instância primeva, há óbice ao arbitramento de honorários recursais.

A propósito, no mesmo sentido, já manifestou a ex. Corte Constitucional:

RECURSO - HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Descabe a fixação de honorários recursais, preconizados no artigo 85, § 11, do Código de Processo Civil de 2015, quando tratar-se de extraordinário formalizado no curso de processo cujo rito os exclua. ( ARE nº 951589 AgR, 1ª T/STF, rel. Min. Marco Aurélio, DJe 4/8/2016 - ementa parcial/grifei)

Considerando que a matéria tratada em decorrência do reexame necessário engloba toda a irresignação dos apelos, julgo-os prejudicados.

Mediante tais considerações, nos termos do art. 932, IV, b e V, b, do CPC/2015, bem como da Súmula nº 253 do STJ, REFORMO EM PARTE A SENTENÇA, NA REMESSA NECESSÁRIA, isso para, reconhecendo a constitucionalidade da LE nº 19.445/2011, afastar apenas o condicionamento de eventual liberação do veículo de propriedade do impetrante (placa GUG-4170) ao pagamento de multas e despesas com o transbordo.

Julgo PREJUDICADAS as apelações.

Sem custas (art. 10, I e II, LE nº 14.939/2003) e sem honorários recursais.

Publique-se.

Cumpra-se.

Belo Horizonte, 25 de maio de 2023.

DES. PEIXOTO HENRIQUES

Relator

1 https://www5.tjmg.jus.br/jurisprudencia/pesquisaNumeroCNJEspelhoAcordao.do;jsessionid=0DE8168EF770623EE61432A5A79E192D.juri_node2?numeroRegistro=1&totalLinhas=1&linhasPorPagina=10&numeroUnico=1.0000.15.085694-6%2F001&pesquisaNumeroCNJ=Pesquisar

2 Art. 30. Compete aos Municípios:

(...)

V - organizar e prestar, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo, que tem caráter essencial;

3 https://www.almg.gov.br/consulte/legislacao/completa/completa.html?tipo=LEI&num=19445&comp=&ano=2011&aba=js_textoOriginal#texto

---------------

------------------------------------------------------------

---------------

------------------------------------------------------------

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/tj-mg/1847563966/inteiro-teor-1847563969