Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
3 de Junho de 2024
  • 2º Grau
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

Sexta Turma

Publicação

Julgamento

Relator

Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida
Entre no Jusbrasil para imprimir o conteúdo do Jusbrasil

Acesse: https://www.jusbrasil.com.br/cadastro

Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 03ª REGIÃO

PROCESSO nº XXXXX-18.2021.5.03.0099 (ROT)

RECORRENTE: MAIKON JOHN FERREIRA DOS SANTOS, ENGELMIG ELETRICA LTDA , CEMIG DISTRIBUICAO S.A

RECORRIDO: ENGELMIG ELETRICA LTDA , CEMIG DISTRIBUICAO S.A , MAIKON JOHN FERREIRA DOS SANTOS

RELATOR (A): LUCILDE D'AJUDA LYRA DE ALMEIDA

EMENTA

LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS PEDIDOS E VALOR DA CAUSA. RITO ORDINÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. Com o advento da Lei 13.467/2017, foi acrescentada na CLT, como requisito da reclamação trabalhista, a formulação de pedido certo, determinado e com indicação de seu valor, sob pena de extinção do feito sem resolução do mérito (art. 840, §§ 1º e , da CLT). No entanto, os valores dos pedidos indicados na petição inicial representam apenas uma estimativa do conteúdo pecuniário da pretensão e tem o objetivo de definir o rito processual a ser seguido, não havendo falar em limitação aos respectivos valores em eventual liquidação.

RELATÓRIO

O MM. Juízo da 2ª Vara do Trabalho de Governador Valadares, pela sentença de ID 7fec230 e f8b0bd3, cujo relatório adoto e a este incorporo, complementada pela decisão proferida em sede de embargos declaratórios, ID 318fb23, julgou parcialmente procedente a reclamação.

Recorre a segunda reclamada, CEMIG DISTRIBUIÇÃO S.A., ID 8d24213, insurgindo-se contra a responsabilidade subsidiária a ela atribuída.

Comprovantes do recolhimento de depósito recursal e custas ID 85d9658 e 7e48d27.

Após o julgamento dos embargos declaratórios, a segunda reclamada apresentou novamente seu recurso ordinário, acrescendo fundamentos (ID 40e2b5f), em especial no que tange à condenação ao pagamento de horas extras intervalares.

Recorre o reclamante, ID e796808, insistindo na valoração das provas em áudio e vídeo por ele juntadas e do depoimento da testemunha Lucas Martins de Souza e insistindo nos pedidos de rescisão indireta, com a condenação ao pagamento das parcelas daí decorrentes, multas dos artigos 467 e 477 da CLT, adicional por acúmulo de funções, indenizações pelo acidente de trabalho sofrido, indenização substitutiva da estabilidade acidentária, indenização por danos morais em razão das condições de trabalho, reconhecimento do caráter salarial do auxílio alimentação, horas extras, intervalo intrajornada e interjornadas, horas de sobreaviso, adicional noturno, vale-refeição, multas normativas, indenização dos gastos com transporte para visitar a família e litigância de má-fé da primeira reclamada. Insurge-se contra a sua condenação ao pagamento de honorários advocatícios e periciais e os critérios de apuração dos juros e correção monetária fixados.

Contrarrazões do reclamante ID af3bdc9 e 9f61798.

Contrarrazões da primeira reclamada, ENGELMIG ENERGIA LTDA., ID ee89c50, pugnando pelo não conhecimento do recurso obreiro, por ausência de fundamentação.

Recorre adesivamente a primeira reclamada, ENGELMIG ENERGIA LTDA., ID 1252d50, insurgindo-se contra a condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade e intervalo interjornadas. Requer seja a condenação limitada aos valores constantes na inicial, bem como seja afastada a suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios devidos pelo reclamante.

Comprovantes do recolhimento de custas ID 6db5123, e apólice de seguro garantia ID 2ea272a.

Contrarrazões do reclamante ID cbecdc5.

Não se vislumbra, no presente feito, interesse público a proteger.

É o relatório.

ADMISSIBILIDADE

Sem razão a primeira reclamada ao pugnar pelo não conhecimento do apelo obreiro, por suposta ausência de fundamentos.

As razões do reclamante impugnam, de forma suficiente, os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida.

Logo, não se verifica a alegada violação ao princípio da dialeticidade, quanto ao recurso do autor.

Ademais, ante a redação da Súmula 422 do TST, em especial de seu item III, o referido entendimento jurisprudencial, em regra, não se aplica ao recurso ordinário. Vejamos:

"RECURSO. FUNDAMENTO AUSENTE OU DEFICIENTE. NÃO CONHECIMENTO. I - Não se conhece de recurso para o Tribunal Superior do Trabalho se as razões do recorrente não impugnam os fundamentos da decisão recorrida, nos termos em que proferida. II - O entendimento referido no item anterior não se aplica em relação à motivação secundária e impertinente, consubstanciada em despacho de admissibilidade de recurso ou em decisão monocrática. III - Inaplicável a exigência do item I relativamente ao recurso ordinário da competência de Tribunal Regional do Trabalho, exceto em caso de recurso cuja motivação é inteiramente dissociada dos fundamentos da sentença".

Rejeito.

Satisfeitos os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos e das contrarrazões, regular e tempestivamente apresentados.

FUNDAMENTOS

RECURSO ORDINÁRIO DA SEGUNDA RECLAMADA - CEMIG DISTRIBUIÇÃO S.A.

RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA

A segunda reclamada não se conforma com a responsabilidade subsidiária a ela atribuída. Alega que, uma vez atendidos todos os preceitos legais para a contratação pelo ente público, segundo o artigo 37, XXI, da CF e a Lei 8.666/93, não há como estender à Administração Pública Indireta a responsabilidade, ainda que subsidiária, dos encargos trabalhistas devidos por suas contratadas.

Argumenta que o entendimento consolidado pelo STF é no sentido de que não é possível responsabilizar o ente público contratante, de forma automática, sendo necessária a prova de sua ação culposa no inadimplemento das verbas por parte da contratada. Afirma que, no caso em análise, não há prova de conduta negligente por parte da CEMIG, mas, ao contrário, houve efetiva fiscalização de sua parte.

Requer seja excluída sua responsabilidade pelo pagamento das parcelas deferidas.

Analiso.

É fato inconteste que o reclamante foi admitido pela primeira reclamada para prestar serviços à segunda ré, como Ajudante Instalador Rede, por força de contrato firmado entre as empresas.

O fato de o contrato firmado entre as rés ter se efetivado mediante procedimento licitatório, conforme se infere do documento de ID ad286e7, não elide a responsabilidade subsidiária da contratante relativamente aos créditos trabalhistas, nos termos da Súmula 331, IV, do TST. E assim se conclui porque o tomador fez uso da força de trabalho do reclamante, e, por tal motivo, não pode o trabalhador ser apenado no caso de a empresa interposta não cumprir com suas obrigações, incorrendo aquela em culpa in eligendo e in vigilando, se os valores devidos não forem corretamente pagos pela empregadora.

A culpa in eligendo se verifica pela contratação de empresa que não arca com as obrigações trabalhistas. E a culpa in vigilandopela falta de fiscalização, por parte da contratante, do cumprimento dessas mesmas obrigações. A estes fundamentos, acresça-se que o entendimento jurisprudencial uniforme de nossos Tribunais, ao concluir pela responsabilidade subsidiária do tomador de serviços, ainda que ente público, é coerente com os princípios constitucionais de proteção à pessoa humana, ao trabalho e ao trabalhador (artigo , III e IV, da CR/88), sendo a valorização do trabalho fundamento de ordem econômica (artigo 170) e o seu primado a base da ordem social (artigo 193).

Quanto aos entes públicos, a discussão primordial gira em torno da possibilidade de se aplicar o entendimento contido na Súmula 331, IV e V, do TST. É dever do ente público fiscalizar os prestadores de serviços quanto ao cumprimento de suas obrigações para com os empregados durante a execução do contrato, e não apenas por ocasião da avença. Caso o tomador dos serviços não tome tais cuidados, deverá arcar com o ônus de sua incúria, ou seja, responderá pelo pagamento das verbas devidas aos empregados da empresa contratada se esta não pagar.

No caso em análise, tem-se por caracterizada a culpa in vigilando, sob aspecto civil, tendo em vista que a primeira reclamada não quitou todos os direitos trabalhistas do reclamante, o que configura omissão e negligência da contratante, gerando a obrigação de reparar o dano, nos termos do disposto nos artigos 186 e 927 do Código Civil.

Acresço que os documentos colacionados sob ID ad286e7 e seguintes, consistentes no contrato celebrado entre as rés, autorização de início dos serviços, alguns comprovantes de pagamento de registro de ponto, dentre outros documentos relativos ao pacto laboral, não são suficientes para comprovar a fiscalização efetiva do contrato firmado com a primeira ré. O artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93 não ampara aquele que, incorrendo em culpa na fiscalização da empresa contratada, concorre para que o empregado venha a suportar os prejuízos decorrentes do inadimplemento das obrigações trabalhistas a cargo desta. Aliás, esse o entendimento consolidado após o julgamento da ADC 16 pelo STF, que, apesar de declarar a constitucionalidade do artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93, concluiu que o dispositivo em análise não exime de responsabilidade, de forma generalizada, o órgão público que contrata mediante licitação, pelo descumprimento das obrigações trabalhistas pela empresa contratada, mas apenas afasta a imputação de responsabilidade objetiva.

Mas restou claro que tal declaração não impede o reconhecimento da responsabilidade do ente público, de acordo com o caso concreto, em face de outros dispositivos legais e constitucionais, que impõe ao poder público o dever de fiscalizar de forma eficaz a execução do contrato. Ademais, ao apreciar o Recurso Extraordinário n. 760.931/DF , julgado em 26.04.2017, o STF fixou a seguinte tese em sede de repercussão geral:

"O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Ministro Luiz Fux, que redigirá o acórdão, vencido, em parte, o Ministro Marco Aurélio, fixou a seguinte tese de repercussão geral:"O inadimplemento dos encargos trabalhistas dos empregados do contratado não transfere automaticamente ao Poder Público contratante a responsabilidade pelo seu pagamento, seja em caráter solidário ou subsidiário, nos termos do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93". Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 26.4.2017".

Nesse sentido, a jurisprudência da corte superior desta Justiça Especializada, que se mantém atual e sintonizada com o entendimento traçado pelo STF, sedimentada na nova redação dada à Súmula 331, IV e V, admitiu a responsabilidade subsidiária do ente público pelos encargos trabalhistas dos empregados das empresas contratadas, in verbis:

"IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.

V - Os entes integrantes da administração pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666/93, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre do mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada. [...]".

Ao excluir a responsabilidade da Administração Pública e suas entidades pelas obrigações assumidas pelas empresas contratadas, o artigo 71, § 1º, da Lei 8.666/93, se oponível aos trabalhadores prejudicados, confrontar-se-ia com o princípio constitucional de valorização do trabalho humano, eleito como um dos fundamentos do Estado Democrático. Admitir-se a interpretação defendida pela recorrente para esta norma importaria acolher privilégio antissocial, beneficiando-se as entidades estatais com a prerrogativa de isenção da responsabilidade sobre seus atos, em detrimento do trabalho alheio.

Mas não se está negando vigência ao artigo 71 da Lei 8.666/93, e nem declarando a sua inconstitucionalidade. Na verdade, o dispositivo em comento apenas não possui o condão de afastar a responsabilidade da ré ante as circunstâncias aqui expostas.

Ressalto ainda que a responsabilidade subsidiária aqui atribuída encontra respaldo no artigo 54 da Lei 8.666/93, que preceitua que os contratos administrativos se regulam pelos preceitos de direito público, dentre os quais se destacam os princípios da equidade e da ordem social, que impõem a obrigação de reparar o prejuízo causado a outrem àquele que age com negligência ou se omite voluntariamente em cumprir obrigação legal ou contratual. Aliás, o artigo 67 da Lei de Licitações e Contratos determina que a execução do contrato deve ser fiscalizada por um representante da Administração, especialmente designado para tal mister. Nesse caso, cabe ao tomador de serviços, integrante da Administração Pública, através de seu representante, verificar a regularidade da situação dos empregados e do contrato. A averiguação do regular cumprimento do contrato não é prerrogativa, mas obrigação e só por meio de tal fiscalização o ente público se resguarda de eventual responsabilização.

A segunda reclamada contratou a empresa prestadora de serviços e descurou-se do dever de fiscalizar a execução deste contrato, o que lhe é imposto pelo mencionado artigo 67 da Lei 8.666/93 e decorrente do próprio pacto, negligenciando o dever de vigilância e prudência no cometimento de serviços à empresa interposta. Não demonstrando o ente público, por meio idôneo e previsto na Lei de Licitações, o cumprimento de seu dever de fiscalizar o contrato de prestação de serviço para com a contratada (prestadora desses serviços), não pode ser afastado o reconhecimento de seu dever de reparar o dano perpetrado aos empregados da empresa inadimplente, atraindo a sua responsabilização subsidiária. Nesse sentido, a Tese Jurídica Prevalecente nº 23 deste Regional, assim, dispõe:

"RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. TERCEIRIZAÇÃO. ENTE PÚBLICO. FISCALIZAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. É do ente público o ônus da prova quanto à existência de efetiva fiscalização dos contratos de trabalho de terceirização, para que não lhe seja imputada a responsabilidade subsidiária".

Assim, descurando-se de sua obrigação legal, responde a recorrente, de forma subsidiária. O atual inciso V da Súmula 331 do TST dispõe que, para haver condenação de forma subsidiária dos entes integrantes da administração pública direta e indireta, necessário evidenciar sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei 8.666/93, o que por certo ocorreu.

Portanto, deve ser mantida a condenação subsidiária da segunda ré, com fulcro nos incisos IV e V da Súmula 331 do TST, pois, evidenciada a culpa in vigilando.

Por todo o exposto, nego provimento.

RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMANTE

VALORAÇÃO DA PROVA. ARQUIVOS DE ÁUDIO E VÍDEO. DEPOIMENTO DA TESTEMUNHA LUCAS MARTINS DE SOUZA

O reclamante não se conforma com a sentença, na parte em que o juízo inadmitiu algumas das provas produzidas por meio de mídias de áudio e vídeo, por considera-las ilícitas. Alega que o reclamante participou de todas as conversas, e que, quando constou na degravação como um dos interlocutores "funcionário Engelmig", tal se deu por ser mais de um empregado envolvido na conversa.

Arrola diversos vídeos em que o reclamante aparece, revelando as péssimas condições de trabalho a que era submetido. Entende que possui todo o direito de realizar filmagens no local de trabalho, pois o próprio contrato de trabalho traz a possibilidade de monitoramento por filmagens, por parte da empregadora, sendo que todo direito é recíproco.

Pugna ainda seja considerado o depoimento prestado pela testemunha Lucas Martins de Souza, que confirma o conjunto probatório existente nos autos, como as fotografias juntadas com a inicial. Argumenta que o juízo poderia ter, simplesmente, indeferido as perguntas, mas não há justificativa para se desconsiderar o depoimento.

Requer sejam tomados como base para a decisão as mídias referidas, bem como o depoimento prestado pelo Sr. Lucas Martins de Souza.

Ao exame.

O reclamante juntou uma série de áudios e vídeos pelos quais pretendia comprovar as condições de trabalho a que se submetia.

Parte desses documentos não foram aceitos pelo juízo, conforme fundamentos abaixo transcritos (ID 7fec230):

"Outrossim, os arquivos de áudio e vídeo anexados às fls. 169/188 não são aptos a produzir prova neste feito. A uma, porque os áudios não têm como interlocutor o autor, o que sinaliza que foram obtidos ilicitamente (o reclamante não se dignou, sequer, a identificar quem seria o tal" FUNCIONÁRIO ENGELMIG "). A duas, porque tanto os áudios quanto os vídeos, em gravações esparsas, estão descontextualizados, não guardando a confiabilidade necessária a fazer prova em Juízo. Desconsidero, como meio de prova, os documentos de fls. 169/188.

Quanto aos arquivos de áudio juntados às fls. 191/198, devem ser considerados, já que um dos interlocutores é o reclamante. Nesse sentido, a Suprema corte já há muito firmou entendimento de que a prova obtida, nessa condição, não se revela ilícita. De todo o modo, o Juízo, segundo o livre convencimento motivado, examinará, no momento oportuno, sobre a importância daquele conteúdo gravado para o deslinde das questões aqui debatidas".

De fato, a degravação das conversas acostadas ao ID fb796c7 e 93323fa, por exemplo, são reclamações feitas por algum empregado não especificado, denominados os interlocutores apenas como "Funcionários Engelmig" e "encarregado". Ora, tal prova não poderia mesmo ser admitida, pois não é possível saber ao certo quem são os interlocutores. Sequer é possível saber com exatidão a época em que tais conversas ocorreram.

E, ao contrário do que entende o reclamante, ele não tem o direito de gravar qualquer conversa ocorrida no local de trabalho, independentemente da ciência e concordância dos interlocutores.

Ora, o fato de a empresa monitorar o local, com câmeras, não significa registrar toda conversa lá realizada, sobretudo sem o conhecimento das partes envolvidas. O que o reclamante pretende não é a reciprocidade de direitos, tanto que não informou a reclamada sobre a sua intenção de registrar cada detalhe da prestação de serviços.

Acrescento ainda que tais provas realizadas pelo autor devem ser vistas com prudência, pois o que se percebe é que ele, meses antes de ajuizar esta ação, já vinha registrando, seja por áudio ou vídeo, conversas e o próprio labor, de forma unilateral, com total liberdade para conduzir os registros.

De toda forma, o conjunto probatório será integralmente analisado e sopesado.

Quanto ao depoimento prestado pela testemunha obreira, vejamos o que decidiu o juízo originário, que colheu a prova:

"O depoimento da primeira testemunha, Sr. Lucas Martins de Souza , mostrou-se inconvincente. A partir do (primeira gravação) momento em que foi dada oportunidade ao reclamante para realizar os questionamentos na audiência instrutória, o Juízo percebeu que as respostas da testemunha estavam sendo induzidas no afã de confirmar, ipsis litteris, a narrativa exordial, conforme se infere dos seguintes trechos do depoimento: 00:16:05 a 00:17:15 (pergunta direcionada sobre a situação em que o reclamante ficava embaixo do poste, com posterior advertência do Juiz); 00:19:30 a 00:19:50 (pergunta induzida sobre a presença de malas dentro da cabine do veículo); 00:23:55 a 00:24:15 (pergunta induzida sobre o acesso difícil ao local de trabalho); 00:27:00 a 00:27:25 (pergunta direcionada sobre supostas reclamações dos empregados junto à reclamada).

Repare que, não obstante a advertência deste Magistrado, as perguntas continuaram sendo formuladas com direcionamento explícito das respostas, o que tornam as declarações da testemunha inconfiáveis.

Portanto, o quadro fático narrado pelo depoente não se revela idôneo, preferindo este Julgador, por medida de razoabilidade e prudência, tomar como base, neste comando, as declarações da segunda testemunha".

Ora, esta instância revisora deve, sempre que possível, dar especial atenção às impressões causadas pelas partes e testemunhas ao juízo instrutor do feito, que teve a oportunidade de dirigir-se diretamente a elas, fazendo as perguntas e conduzindo a audiência.

E, ouvindo o depoimento da testemunha obreira, de fato, constata-se que, além da questão das perguntas direcionadas, o depoente, mesmo sem ser perguntado, prestou informações acerca de pedidos feitos na inicial, como, por exemplo, em relação ao alegado acúmulo de funções.

De toda forma, tal depoimento será também sopesado, com reservas, e considerando-se as impressões causadas ao juízo originário.

Por ora, nada a prover.

ACIDENTE DE TRABALHO. DOENÇA OCUPACIONAL

O reclamante reitera suas pretensões baseadas nos acidentes de trabalho sofridos na reclamada.

Alega o seguinte: que a reclamada não exibiu um plano de contingência para enfrentamento da pandemia; que não lhe foi fornecida capa de travesseiro e de colchão, e nem lençóis e cobertores suficientes, sendo que, quando necessitava lava-los, tinha que pedir emprestado, ficando sujeito à contaminação pelo coronavírus; que não recebia EPIs de forma satisfatória.

Relata que sofreu acidente de trabalho em 21/05/2020, quando uma chave inglesa de 12 mm caiu de uma altura de 12 metros, atingindo suas costas. Aduz que caiu no instante em que foi atingido, tendo sentido falta de ar, e até hoje sente dores.

Informa que, em 12/01/2021, foi acometido de conjuntivite, ficando com a visão turva por quatro dias, com sensibilidade à luz e sem conseguir dormir. Entende que a doença se deu em razão do contato com o pó gerado quando estava fazendo a montagem das cruzetas dos postes para a rede de distribuição de energia, sem a utilização do EPI devido, que seriam os óculos de proteção.

Por fim, quando estava alojado em Governador Valadares, em casa providenciada pela empregadora, com o total de 26 pessoas, contraiu COVID-19, pois dormia em quarto com mais sete empregados, e um deles estava com a doença. Além disso, viajavam no caminhão, cerca de 6 pessoas, sem qualquer medida de proteção.

Quando foi diagnosticado com a COVID, foi enviado para casa, correndo o risco de levar a doença para sua família. Entende que a reclamada deveria ter providenciado um hotel onde pudesse permanecer isolado.

Sustenta que esses três eventos podem ser considerados acidentes de trabalho, todos causados por culpa da empregadora, que deverá arcar com a indenização substitutiva da estabilidade acidentária.

Pugna ainda pela absolvição do ônus de arcar com os honorários periciais, que devem ser impostos às reclamadas.

Analiso.

O reclamante foi contratado pela primeira reclamada em 19/02/2020, para exercer as funções de Ajudante de Instalador Rede de Distribuição.

Do primeiro acidente relatado, a queda da chave inglesa de uma altura de 12 metros nas costas do reclamante, houve apenas escoriação superficial, conforme revela o documento de ID 12fb0f1, gerando afastamento de três dias. Foi emitida CAT (ID 4f7860e).

Foi feito relatório de acidente, no qual constou a seguinte dinâmica (ID 3f613a9):

"O ajudante estava organizando o local de trabalho (retirando a sobra da terra), quando o mesmo precisou pegar uma enxada que estava no pé do poste, neste momento, uma chave inglesa tamanho 12 se desprendeu da mão do eletricista que estava no alto da estrutura e caiu, atingindo as costas do ajudante que estava no solo.

(...)

Os participantes concluíram que o acidente ocorreu devido à falta de análise de riscos do ajudante Maykon de não ter avisado ao eletricista que estava no alto da estrutura que iria entrar e permanecer na área de projeção de queda de ferramentas".

Como se vê, não há qualquer indício de culpa patronal.

E, embora o reclamante tente, de forma insistente, desconstituir tal narrativa, nada comprovou nos autos no sentido de ter a empregadora incorrido em culpa pelo ocorrido.

No final do mês de junho de 2020, o reclamante foi acometido de síndrome gripal, CID J-11, tendo que cumprir o isolamento em razão das circunstâncias atuais, de pandemia de COVID-19. No entanto, a documentação acostada pelo reclamante não confirma que ele foi acometido de COVID-19, mas sim de síndrome gripal, Influenza, causada por vírus não especificado (ID b67da03).

Em janeiro de 2021 o reclamante teve conjuntivite não especificada, CID H10.9 (ID 95d10f3), ficando afastado por cinco dias.

É certo que o reclamante tenta atribuir a culpa pela patologia à reclamada, dizendo que a conjuntivite ocorreu em razão do contato com pó de madeira e de cimento, pois os óculos fornecidos não possuíam embalagem protetora, o que fazia com que estragassem rápido e não havia reposição.

No entanto, embora o perito tenha admitido que esses agentes, pó de madeira e de cimento, possam, em tese, causar alergias, irritação nos olhos e conjuntivite, não há prova no sentido de que essa tenha sido a causa da infecção, no caso do autor.

Ora, o perito não conseguiu firmar o nexo de causalidade entre a conjuntivite e o labor (ID bf5154b).

Foi feita perícia para apuração de eventual incapacidade laborativa, vindo aos autos o laudo de ID b7c02cd, em que o perito conclui o que segue:

"Periciado vitima de acidente de trabalho típico, comprovado por CAT emitida pelo empregador não apresenta sequelas incapacitantes de contusão no dorso, sendo considerado apto para o trabalho".

Veja-se que apenas o primeiro incidente ocorrido com o reclamante, a queda da chave inglesa, foi considerado acidente de trabalho e, mesmo assim, não gerou danos, limitando ao afastamento de 3 dias e sem qualquer sequela.

A conjuntivite, como já analisado, tampouco teve nexo reconhecido com o trabalho, além de também não ter gerado qualquer consequência ou sequela para o reclamante, tratando-se de infecção facilmente tratável, que gerou afastamento de cinco dias.

Por fim, quanto à alegação do reclamante de ter sido acometido de COVID, não há nos autos prova disso. Fato é que o reclamante não trouxe aos autos o exame que confirmaria o diagnóstico, e os atestados juntados não fazem referência ao CID da COVID, mas sim de resfriado comum.

O fato de o reclamante ter tido a necessidade de cumprir isolamento e ficar afastado por um período maior se deu em razão da circunstância de estarmos vivendo uma pandemia de um vírus potencialmente grave e de fácil transmissão, cujos sintomas podem ser semelhantes ao da gripe. Então, antes mesmo de haver diagnóstico, o protocolo médico indica que o paciente evite qualquer contato social, a fim de evitar a transmissão.

Ocorre que essa situação em nada se relaciona com o labor do reclamante, e nem se deu por exigência da reclamada, mas por circunstâncias às quais todos estamos sujeitos, mesmo quem não exerce atividade laborativa.

O reclamante tenta ainda, de forma insistente, atribuir à reclamada a responsabilidade pela sua contaminação (não comprovada) pela COVID, em razão das condições do alojamento, e até mesmo pela proximidade com os demais empregados durante o labor.

No entanto, a primeira reclamada comprovou, de forma exaustiva, que possuía sim um plano de contingenciamento para prevenir a disseminação do coronavírus, fazendo diversas reuniões com os empregados, no sentido de orientar quanto ao uso de máscaras e adoção de medidas de higiene.

Mas não é possível afastar, completamente, os riscos. A atividade exercida pela primeira reclamada, de instalação de redes de distribuição, não foi paralisada pela pandemia, então não há ilicitude na manutenção dos trabalhos, ao contrário, ela visava dar continuidade à prestação de serviço essencial. E, infelizmente, assim como em outras atividades, não foi possível manter os empregados totalmente isolados.

De toda forma, não obstante as combativas argumentações do autor, não há nos autos prova de que as condições de trabalho e alojamento fornecidos pela ré tenham gerado algum dano aos empregados. Como já analisado, o reclamante sequer comprovou que foi infectado pela COVID, e, menos ainda, que tal infecção ocorreu por culpa patronal.

A disseminação do vírus se generalizou em todo o planeta, podendo a contaminação ocorrer em qualquer lugar, e o reclamante não comprovou nem mesmo que havia outro empregado que testou positivo para a COVID, dividindo o mesmo alojamento.

Por todas essas razões, não é possível considerar as alegadas infecções, a conjuntivite e o resfriado, como acidentes de trabalho ou doença ocupacional.

O único acidente de trabalho sofrido pelo autor foi aquele ocorrido em 21/05/2021, que não gerou consequências relevantes para o reclamante, não havendo que se falar em indenização por danos morais, mesmo porque não evidenciada a culpa patronal.

Vejamos agora se o autor, em razão desse acidente, passou a ser detentor de estabilidade acidentária.

O artigo 118 da Lei 8.213/91 assim dispõe:

"Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente".

Veja-se que, para que o empregado tenha o direito à estabilidade provisória, tem que ter chegado a receber auxílio doença, o que pressupõe afastamento superior a 15 dias.

E a Súmula 378 do TST assim esclarece:

"ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº 8.213/1991. (inserido item III) - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012

I - E constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)

II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a consequente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001)

(...)".

Além de o reclamante não ter ficado afastado por mais de quinze dias, não ficou constatada a existência de doença profissional que guarde nexo de causalidade com o labor.

Assim, por qualquer ângulo que se analise a questão, não faz jus o reclamante à pretendida estabilidade acidentária.

A questão relativa aos honorários periciais será analisada mais adiante, no tópico relativo aos honorários advocatícios.

Nego provimento.

RESCISÃO INDIRETA

O reclamante insiste no pedido de reconhecimento da rescisão indireta, alegando que a prova por ele produzida revela a realidade a que era submetido.

Afirma que realizava inúmeras horas extras, com labor por até 22 horas seguidas. Atribui as seguintes faltas à empregadora: exigência de serviços superiores às suas forças e alheios ao contrato, pois cumulava funções, comprometendo a sua integridade física; tratamento com rigor excessivo; exposição a perigo manifesto de mal considerável; descumprimento das obrigações do contrato (artigo 483, a, b, c e d, da CLT).

Relata que era obrigado a realizar trabalhos braçais excessivamente pesados, como carregar transformador de 215 kg, levantar poste nas costas, atravessar cachoeira carregando postes, etc. Era tratado de forma desrespeitosa, com humilhações e constrangimentos. Além disso, sofreu dois acidentes de trabalho e contraiu COVID por ter permanecido em alojamento fornecido pela ré com mais 26 pessoas, sendo que dividia o quarto com mais 7 trabalhadores.

Continua dizendo que recebeu valor a menor a título de adicional de periculosidade e vale refeição, sendo que já chegou a ficar até três dias sem realizar uma refeição. Não recebia corretamente suas horas extras, o banco de horas era manipulado, não usufruía corretamente os intervalos intrajornada e interjornadas, não recebia as horas de sobreaviso.

Por todas essas circunstâncias, afirma que ficou impossível prosseguir na prestação de serviços para as reclamadas, motivo pelo qual pugna pela decretação da rescisão indireta do contrato de trabalho, a partir de 23/03/2021, com o deferimento das parcelas típicas dessa modalidade de rescisão.

Pretende ainda receber indenização substitutiva da estabilidade acidentária, que, somada ao aviso prévio indenizado, projetou seu contrato de trabalho para 29/04/2022. Considerando todo esse período pretende receber: férias mais 1/3, 13º salário, aviso prévio indenizado, saldo de salário (1º a 23/03/2021), FGTS mais 40%, fornecimento das guias CD/SD e TRCT ou indenização substitutiva do seguro desemprego.

Insiste ainda na condenação das reclamadas ao pagamento das multas dos artigos 467 e 477 da CLT.

Analiso.

De plano, fica afastada a pretensão de receber indenização substitutiva da estabilidade acidentária, tendo em vista o que ficou decidido no tópico anterior.

Nos termos do artigo 483 da CLT, o empregado poderá considerar rescindido o seu contrato de trabalho e pleitear a respectiva indenização quando o empregador incorrer em uma das faltas capituladas no referido dispositivo legal, quais sejam:

"a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;

c) correr perigo manifesto de mal considerável;

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários."

Para se aferir a existência de atos faltosos do empregador, capazes de propiciar a extinção do contrato por esta via, utiliza-se dos mesmos critérios para se aferir a existência de falta grave praticada pelo empregado, dentre os quais está a gravidade, que deve ser suficiente para tornar inviável o prosseguimento da relação de emprego. Não é qualquer falta praticada pelo empregador que enseja a ruptura do vínculo empregatício pela rescisão indireta, é imprescindível que a manutenção do contrato por parte do empregado torne-se insuportável.

O reclamante alega fatos ocorridos no início do contrato, como o pagamento a menor do adicional de periculosidade e do auxílio refeição, o que não justifica a rescisão indireta, pois foram sanados posteriormente.

Os áudios colacionados não comprovam falta grave patronal. O fato de a empregadora exigir de seus empregados o cumprimento do sobreaviso está dentro de seu poder diretivo, não há ilicitude. Ora, é óbvio que se o empregado se nega a ficar de sobreaviso, de forma injustificada, estará sujeito a medidas disciplinares.

A questão do atestado referente aos dias 10 a 13 de julho de 2020, que o reclamante afirma que a ré não aceitou, descontando os dias de seu banco de horas, o segundo áudio juntado pelo reclamante, em que ele contesta o fato com seu supervisor, revela que houve, na realidade, erro de comunicação, pois o autor limitou-se a enviar foto do atestado para pessoa de nome Cassila, sem comunicar com seu supervisor. E, de fato, em sua defesa, a ré não juntou esse atestado, embora tenha juntado diversos outros apresentados pelo reclamante ao longo do pacto laboral.

O que se infere é que a reclamada não deixou de aceitar o atestado, mas ele não foi encaminhado pelas vias adequadas, e não chegou a quem de direito. Não vislumbro aí falta patronal.

Os demais áudios são reclamações feitas por empregados, sem definição clara de quem seriam os interlocutores. E, como visto em tópico anterior, não é possível aceitar provas colhidas de forma ilícita, ou seja, gravação de conversas de terceiros.

Ainda que assim não se entendesse, trata-se de conversas esparsas, descontextualizadas, insuficientes para corroborar a condenação pretendida.

Não vislumbrei nos áudios qualquer tratamento desrespeitoso em face do reclamante. O áudio em que ele afirma que está sendo mal tratado pelo supervisor, trata-se de discussão iniciada pelo próprio reclamante, que se reporta ao supervisor com cobranças eloquentes, dizendo que está sendo tratado "igual bicho", ao que o supervisor tenta explicar o ocorrido relativo ao dia em que não tinha vaga para o reclamante no alojamento, mas ele demonstra de forma veemente seu descontentamento, dizendo que sua CTPS está a disposição para ser dispensado. Na verdade, o excesso partiu foi do próprio reclamante.

O que se vê do conjunto probatório é que o reclamante, desde muitos meses antes de ajuizar a presente ação, vinha tentando juntar provas contra a ré, por estar insatisfeito com o trabalho. No entanto, não queria abrir mão das parcelas próprias da dispensa imotivada, e entendia possuir o direito de ser dispensado.

As fotos colacionadas pelo reclamante ID dcb6e4b e seguintes não comprovam o trágico cenário relatado pelo reclamante em sua inicial e repetido em razões recursais. São fotos dos empregados no caminhão, em atividade durante o labor, atuando na instalação de redes. De fato, há fotos de veículo contendo diversos objetos, como malas, caixas, no entanto, isso não significa que o veículo assim permanecia durante o trajeto e menos ainda que tal se dava por força de ordens da empregadora, sendo razoável supor que cada empregado seja responsável por acondicionar seus pertences ou o material de trabalho de forma segura.

As fotografias de ID 1f46c3a e 67ce7b0 mostram apenas um quarto arrumado de forma precária, com dois colchões no chão, mas não informa o local, a data e nem tampouco quem foi afetado, ou seja, para quem se destinavam aqueles colchões.

Em uma das degravações em que o reclamante é um dos interlocutores (ID cdc389c e 0c60ec8), em que pretende comprovar que foram descontados do banco de horas dias de atestado, ele afirma que, como seu teste deu positivo para COVID, a médica teria dado mais alguns dias de afastamento. No entanto, causa espécie o fato de não ter vindo aos autos o resultado do teste, bem como que todos os atestados contenham o CID referente a gripe comum (CID J-11.1). É possível sim que o reclamante tenha contraído COVID, no entanto, não há provas disso nos autos.

Quanto aos inúmeros vídeos juntados, cujo link de acesso se encontra ao ID7bcb42b, tampouco favorecem o reclamante. Trata-se de vídeos curtos, mostrando o alojamento, os empregados durante o trabalho ou mesmo o próprio reclamante tecendo reclamações e afirmações que sequer se pode saber se são verdadeiras.

Ora, seria muito cômodo para a parte fazer um vídeo seu relatando supostas irregularidades e querer que isso fosse tomado como prova.

Aliás, alguns vídeos, na realidade, desconstroem a realidade que o reclamante insiste em alegar. Por exemplo, ele diz que era obrigado a carregar postes. Ocorre que o que um dos vídeos mostra é um grupo grande de empregados, cerca de dez, carregando um poste, sem evidenciar qualquer abuso ou, como alega o autor, exigência de esforço superior às suas forças.

Tal vídeo somente confirma o que foi dito pela testemunha empresária, no sentido de que, quando era necessário carregar os postes de madeira, eram mobilizadas duas ou três equipes.

O que os vídeos evidenciam é o profundo descontentamento do reclamante com o trabalho em si, que possui natureza braçal, e com as condições, já que tinha que permanecer em alojamento junto a outros empregados, no entanto, não há nos autos provas das inúmeras infrações patronais que o autor tenta imputar à reclamada.

Ainda que o reclamante possa ter passado algum dissabor, isso não lhe dá o direito de ver rescindido de forma indireta o contrato de trabalho.

Quanto aos alegados acidentes de trabalho, a questão já foi analisada no tópico anterior, não havendo qualquer ilícito imputável à reclamada.

Sobre o fato de haver jornada extraordinária e sobreaviso, não configura falta patronal, mas exigência que se enquadra no poder diretivo da empregadora.

É certo que as funções para as quais o autor foi contratado são, de fato, pesadas, o trabalho é braçal, realizado a céu aberto, estando os empregos sujeitos às variações climáticas e o reclamante, ao que indicam as provas produzidas, não se adaptou a tais condições de trabalho. No entanto, isso não justifica a rescisão indireta do pacto, pois não configurada falta grave patronal.

Assim, fica mantido o indeferimento das parcelas próprias da rescisão oblíqua do contrato de trabalho, bem como as multas dos artigos 467 e 477 da CLT, incabíveis no caso em análise. Indevida também a expedição de guias para fins de requerer o seguro desemprego, ou a indenização substitutiva.

Nego provimento.

ADICIONAL POR ACÚMULO DE FUNÇÕES

O reclamante não se conforma com o indeferimento do pedido de pagamento de adicional por acúmulo de funções. Alega que a testemunha Lucas Martins de Souza confirmou a existência de acúmulo de funções. Aduz que, além de atuar como ajudante, que era a função para a qual foi contratado, também se ativava como eletricista, ante o grande volume de serviço e o baixo quantitativo de empregados. Afirma que montava as cruzetas dos postes para rede de distribuição de energia, montava transformador, prensava os cabos do transformador, abria a chave para energizar a rede do transformador, aterrava a rede.

Pretende receber adicional de 30% sobre o seu salário, em razão do acúmulo de funções, e reflexos.

Examina-se.

O acúmulo de funções que pode ensejar as pretendidas diferenças salariais é aquele em que o trabalhador passa a realizar, rotineiramente, tarefas de maior complexidade e/ou responsabilidade em relação às inerentes ao cargo para o qual foi contratado.

O trabalhador não é um ser estático, cumprindo várias tarefas ao longo do dia, o que não lhe confere o direito ao pagamento de salário para cada uma delas. Nesse sentido, o parágrafo único do art. 456 da CLT dispõe que, à míngua de estipulação expressa em contrário, o empregado é obrigado a desempenhar, na empresa, atividade compatível com a sua qualificação.

Nesse aspecto, o exercício de uma determinada função pode englobar tarefas distintas, sem, contudo, implicar acúmulo de função, salvo em situações extremas, o que não se visualiza nos autos.

Até a testemunha ouvida a rogo do autor, apesar de ter prestado depoimento tendencioso, confirmando as teses da inicial mesmo antes de ser perguntado, disse, sobre o acúmulo de funções que o reclamante, quanto às funções de solo, fazia tudo que o eletricista fazia.

Já a testemunha empresária prestou depoimento mais esclarecedor, dizendo que as atividades do ajudante se limitavam àquelas exercidas no chão, ao passo que o eletricista realizava a montagem da estrutura no poste, motivo pelo qual os treinamentos eram distintos, englobando o deste último o trabalho em altura. Afirmou com veemência que o reclamante nunca exerceu atividade de eletricista, pois ele era proibido de subir nos postes.

Ora, as funções do eletricista na atividade de instalação de redes de distribuição não se limitam às funções de solo, tendo ambas as testemunhas deixado claro que o reclamante não subia em postes.

Além disso, o reclamante era ajudante de eletricista, não implicando em acúmulo indevido de funções o fato de ele realizar algumas tarefas similares às do eletricista, mas não as principais, que envolviam a montagem das estruturas nos postes.

Assim, entendo que o conjunto probatório não evidenciou o acúmulo indevido de funções, de modo a gerar para o reclamante o direito ao pretendido plus salarial.

Nego provimento.

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

O reclamante pretende receber indenização por danos morais em razão das condições de trabalho a que era submetido, conforme relatado em tópicos anteriores, pelos acidentes de trabalho, pelas humilhações e assédio moral sofrido, pelo transporte e alojamento precários, ausência de água e banheiro e ainda pelos danos existenciais, ante a extensa jornada praticada.

Ao exame.

Não vislumbro qualquer dano moral sofrido pelo reclamante, nada que ultrapasse o mero dissabor ou aborrecimento.

Como já visto, o único acidente de trabalho não gerou qualquer repercussão na vida ou na saúde do reclamante, não possuindo gravidade e nem deixando sequelas.

Quanto ao extenso rol de irregularidades relatadas, não consta nos autos prova robusta.

Até mesmo a testemunha ouvida a rogo do autor disse nunca ter visto situações envolvendo o reclamante, que pudessem gerar dano moral.

A testemunha empresária disse que os alojamentos eram organizados, sendo realizada a limpeza às segundas e sextas-feiras, era fornecida roupa de cama e água potável.

Assim, não vislumbro ato ilícito por parte da empregadora, causador de dano moral indenizável.

Nada a prover.

RECONHECIMENTO DO SALÁRIO IN NATURA

Insiste o reclamante no reconhecimento da natureza salarial da refeição fornecida por força de ACT. Invoca o disposto no artigo 458, caput,da CLT, e a Súmula 241 do TST.

Pelos termos da norma coletiva, afirma que faria jus ao importe de R$36,00 por dia de trabalho. Considerando que permanecia alojado por 26 dias, afirma que teria direito a receber o total de R$936,00 a título de auxílio refeição, por mês. No entanto, recebia bem menos que isso. E mais, deveria receber R$9,00 por dia de trabalho, a fim de custear o lanche, totalizando R$1.134,00, que deverá ser integrado ao seu salário.

Analiso.

Restou provado nos autos que a reclamada fornecia auxílio refeição por meio de crédito em cartão Alelo, conforme extrato acostado ao ID a9ab20b. Além disso, a empregadora é empresa filiada ao PAT desde o ano de 2008 (ID f7e36fa).

O artigo 457, § 2º, da CLT, com a redação vigente por todo o pacto laboral do autor, dispõe:

"As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário".

O auxílio alimentação fornecido ao reclamante, como visto acima, não era pago em dinheiro. Logo, por qualquer ângulo que se analise a questão, não há que se cogitar de sua integração à remuneração.

Quanto aos valores creditados, foram variáveis ao longo do contrato, o que não causa estranheza, pois pelos controles de ponto do reclamante se vê que ele teve, com frequência, faltas justificadas por atestado médico e injustificadas, o que, evidentemente, reflete no benefício pago no intuito de possibilitar a alimentação do trabalhador durante a jornada.

Como o reclamante não logrou demonstrar a existência de diferenças a que fizesse jus, valendo ressaltar que a singela conta que ele faz em suas razões recursais não se presta ao fim pretendido, pois não considera os dias efetivamente trabalhados, não há que se falar em condenação das reclamadas ao pagamento de diferenças.

Nego provimento.

REMUNERAÇÃO

Requer o reclamante seja sua remuneração composta pelo salário base, somado o adicional de periculosidade de 30% e os auxílios refeição e lanche, totalizando R$2.539,01, valor a ser considerado para o cálculo de todas as parcelas objeto da condenação.

Sem razão.

Como já analisado, os valores creditados em cartão alimentação não possuem natureza salarial e não integram a remuneração do reclamante.

Nada a prover.

JORNADA DE TRABALHO (ANÁLISE CONJUNTA)

Insiste o reclamante na desconsideração dos registros de ponto colacionados pela empregadora, alegando tratar-se de documentos manipulados. Aduz que o ponto era batido em aplicativo existente no telefone celular do supervisor, portanto, conforme a conveniência da empregadora, o banco de horas era manipulado. Nega as faltas injustificadas constantes nos registros.

Afirma que, em pelo menos três dias na semana, não usufruía intervalo intrajornada, fazendo suas refeições em, no máximo, 15 minutos.

Também não lhe era fornecido o intervalo de 15 minutos antes da jornada extraordinária, previsto em ACT, nem tampouco o lanche.

Relata que laborava, em média, das 6h50min às 20h, de segunda a sexta-feira, sendo que, por diversas vezes, trabalhava até de madrugada, ou iniciava o labor antes das 6h. Quando apresentava atestado médico, o dia era descontado do banco de horas.

Quanto ao sobreaviso, embora o juízo tenha reconhecido que o reclamante permanecia nessa condição em dois finais de semana por mês, afirma que também ficava de sobreaviso de segunda a sexta-feira, das 20h às 7h, pugnando pela majoração da condenação.

Ainda afirma que, uma vez na semana, estendia sua jornada até as 2h da madrugada, retornando, no máximo, as 7h, em nítido prejuízo ao seu intervalo interjornadas, o que requer seja considerado.

Diante dessa jornada, requer o pagamento do adicional noturno sobre as horas laboradas a partir de 22h, considerada a redução ficta da hora noturna.

Requer sejam as reclamadas condenadas ao pagamento das diferenças de horas extras e reflexos que arrola em suas razões, bem como as horas extras intervalares.

A segunda reclamada, por sua vez, afirma que todas as horas extras foram corretamente anotadas nos registros de ponto e pagas ou compensadas, nada mais sendo devido ao reclamante.

Analiso.

A primeira reclamada colacionou aos autos os cartões de ponto do reclamante referentes a todo o período laborado (ID 6761f80), constando marcações variáveis e, em algumas ocasiões, o registro de número considerável de horas extras.

Tais documentos foram considerados fidedignos pelo juízo originário, não havendo, de fato, razões para invalidá-los.

A testemunha empresária confirmou que o reclamante trabalhava das 7h às 17h, de segunda a sexta-feira, com 1 hora de intervalo intrajornada, ficando de sobreaviso aos finais de semana, quinzenalmente. Disse que o ponto era corretamente registrado, todos os dias.

Houve dias em que o reclamante iniciou sua jornada por volta das 7h e findou somente na madrugada do dia seguinte. No entanto, foram ocasiões esporádicas, não sendo comum a ocorrência de jornadas tão extensas.

Via de regra, o trabalho ia das 7h às 17h/19h, podendo ocorrer de se encerrar mais cedo.

Diante do conjunto probatório, vejamos o que decidiu o i. juízo sentenciante (ID 7fec230):

"À luz do depoimento da segunda testemunha (segunda gravação), os controles de ponto eram corretamente registrados (00:07:14 a 00:08:35 e 00:13:05 a 00:15:19). Atribuo, então, plena validade aos documentos de fls. 669/681.

Não há que se falar em registros britânicos. Os horários de trabalho guardam variação regular de minutos nos horários de início e fim da jornada, o que sinaliza para a retidão dos registros. De mais a mais, o reclamante não se dignou a apontar, de forma específica, eventual hora extra prestada que não tivesse sido paga ou compensada.

Assim, não identificando o Juízo violação ao art. , inciso XIII, da CRFB, e dos arts. 58 e 59 da CLT, rejeito o pedido de recebimento de horas extras e reflexos (item b do rol postulatório, à fl. 71).

O intervalo intrajornada, consoante as alegações da segunda testemunha, era cumprido pelo período de uma hora (00:06:45 a 00:06:58). Assim, obedecida a inteligência do art. 71 da CLT, rejeito o pedido de recebimento de horas extras, a título de intrajornada, e reflexos (itens c do rol de pedidos, à fl. 72).

Com base nos controles de ponto, o reclamante não apontou específico dia em que tivesse prestado horas extras, mas não recebido o lanche previsto no instrumento coletivo da categoria, conforme cláusula terceira do ACT.

Rejeito o pedido de recebimento de indenização substitutiva do lanche (item i do rol de pedidos, às fls. 75/76).

A segunda testemunha disse que o autor permanecia em sobreaviso em dois finais de semana por mês (00:05:03 a 00:06:44). Entretanto, diversamente do relato testemunhal, os holerites não demonstram a ativação em sobreaviso em todos os meses laborados, conforme se infere, por exemplo, às fls. 706/708.

Assim, nos termos do art. 244, § 2º, da CLT, e da Súmula nº 428 do TST, condeno a primeira reclamada a pagar ao reclamante as horas de sobreaviso, à razão de 1/3 da hora normal de trabalho, compreendidas entre as 17h01, da sexta-feira, às 06h59 da próxima segunda-feira, incidentes em dois finais de semana por mês, por todo o pacto, com reflexos em DSR, 13º salário, férias com 1/3 e depósitos de FGTS".

Mais adiante, em sede de julgamento de embargos declaratórios, o juízo acresceu à condenação o intervalo interjornadas não usufruído, confira-se (ID 318fb23):

"Quanto ao adicional noturno, o reclamante, em impugnação, à fl. 935/939, não apontou inobservância efetiva e substancial atinente ao pagamento do adicional noturno. Ao contrário, pelo que se infere dos holerites, restou devidamente observado esse direito trabalhista. Rejeito.

Lado outro, quanto ao intervalo interjornada, com efeito, não era devidamente observado. Por exemplo, no dia 25/06/2020, o acionante laborou até às 21h48, reiniciando no dia seguinte às 8h23 (f. 672), sem a observância do intervalo de 11 horas a que alude o art. 66 da CLT.

Fixadas tais premissas e atentando-se ao limite dos pedidos (arts. 141 e 492 do CPC/2015), condeno as reclamadas, a segunda de forma subsidiária, a pagarem as horas extras, acrescidas do adicional convencional, e na falta dele, o legal de 50%, a título de intervalo interjornada, considerando-se, como tais, a integralidade das horas que foram subtraídas do referido descanso (OJ n. 355, da SDI-1, do TST), observando-se os registros apostos nos cartões de ponto, por todo o pacto".

Entendo que a sentença não comporta reparos. De fato, não logrou o reclamante apontar, sequer por amostragem, a existência de horas extras não pagas nem compensadas.

Quanto aos dias 10 e 13 de julho de 2020, em que o reclamante estaria afastado por atestado médico, e foi lançado como compensação, o que um dos áudios por ele colacionados aos autos revelou foi que o atestado não foi corretamente encaminhado na empresa, deixando o reclamante de comunicar o fato ao seu supervisor. E, da documentação acostada pela ré se infere que ela não tinha ciência de referido atestado, não se justificando que não fosse aceita referida licença, se diversas outras faltas justificadas ocorridas durante o pacto laboral foram corretamente aceitas, abonando-se o dia. Aqui se infere não ser verdadeira a alegação no sentido de que os dias de atestado eram lançados como compensação.

De toda forma, tal fato não invalida os registros de ponto.

Tampouco demonstrou o reclamante a existência de labor noturno sem o respectivo pagamento do adicional devido.

Quanto ao intervalo intrajornada, a testemunha empresária foi enfática ao atestar que havia sim, a pausa de 1 hora para almoço. Situação diversa deveria ser robustamente comprovada, por não ser presumível que em extensa jornada, com a realização de trabalhos pesados, os empregados não parassem por uma hora para almoçar. Não há prova nesse sentido, robusta o suficiente para amparar a condenação pretendida.

O intervalo interjornadas, quando os cartões de ponto indicaram que não foi respeitado, já foi alvo da condenação, nada mais havendo a pronunciar a respeito.

Por fim, quanto ao sobreaviso, a testemunha empresária foi também firme ao declarar que os empregados ficavam nessa condição em finais de semana alternados, não havendo sobreaviso de segunda a sexta-feira. E, considerando que os demonstrativos de pagamento revelam meses em que a rubrica não foi paga, o que era devido também já foi alvo de condenação, nada havendo a reformar.

Nego provimento.

BENEFÍCIOS NORMATIVOS. MULTAS NORMATIVAS

Afirma o reclamante que a primeira reclamada deixou de quitar benefícios previstos em ACT por ela firmado, em especial, o vale refeição, previsto na cláusula vigésima sexta; o lanche, previsto na cláusula terceira; fornecimento de água potável, previsto na cláusula décima terceira.

Requer sejam as reclamadas condenadas ao pagamento de três multas normativas por mês.

Sem razão.

Não restou provado que a reclamada deixou de fornecer água potável. Como já fartamente analisado, o depoimento da testemunha obreira deve ser visto com reservas, ante o seu nítido intuito de favorecer o autor.

A testemunha empresária, por sua vez, tendo exercido a função de auxiliar de supervisor, informou que eram fornecidas cinco garrafas de cinco litros de água por turma (que era composta por 8 empregados), podendo ainda os empregados completar as garrafas, caso necessário, na base ou no posto de gasolina onde eram abastecidos os veículos.

Nesse contexto, restou provado o regular fornecimento de água potável.

Quanto ao vale refeição, assim dispõe o ACT (ID 6f7728f - Pág. 8):

"A empresa se obriga a fornecer alimentação a seus empregados, que poderá ser feita em dinheiro, vale refeição, vale alimentação, convênio com supermercados e restaurantes ou a própria refeição, da seguinte forma:

Parágrafo único. Quando o fornecimento for feito através de vale refeição/alimentação, este será devido no valor de R$18,00 (dezoito reais) por refeição. Quando os trabalhadores ESTIVEREM ALOJADOS (OU SEJA, FORA DE SUA CIDADE DE ORIGEM) receberam o valor de duas refeições por dia".

Embora o reclamante afirme que não recebeu corretamente os créditos no cartão alimentação, o conjunto probatório revelou que a reclamada fornecia também, em algumas ocasiões, a própria refeição, mediante a aquisição de marmitas (ID b954a37 e seguintes), tendo o reclamante recebido em diversas ocasiões. Também a testemunha empresária informou que ocorria de buscar as marmitas na cidade e levar para o local da obra.

Além disso, e não menos importante, é que o reclamante teve, ao longo do contrato, diversas ausências, justificadas ou não, o que também reduz o valor devido a título de refeição.

Por fim, não logrou comprovar o reclamante a ausência do lanche nos dias em que havia labor extraordinário.

Assim, não há que se falar em multa normativa.

Nada a prover.

DESPESAS COM TRANSPORTE PARA VISITAR A FAMÍLIA

Relata o reclamante que permanecia em alojamento fornecido pela reclamada e que, duas vezes ao mês, viajava para casa, a fim de visitar sua família. No entanto, a empregadora não arcava com os custos das passagens, que era de cerca de R$174,92 por mês.

Requer a condenação das reclamadas ao pagamento da indenização das despesas com transporte.

Sem razão.

Não apontou o reclamante qual o amparo, seja legal ou normativo, para a pretensão em exame. Não consta tal obrigação no contrato de trabalho e nem tampouco em norma coletiva, sendo certo ainda que o reclamante dispensou o fornecimento de vale-transporte (ID 2ecf08e - Pág. 10).

Nego provimento.

LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ DA PRIMEIRA RECLAMADA

Por fim, requer o reclamante a condenação da primeira reclamada por litigância de má-fé, por ter alegado que o reclamante faltou ao serviço nos dias 10 a 13 de julho de 2020, inclusive descontando tais dias do banco de horas, sendo que ele se encontrava afastado por atestado médico, por ainda estar se recuperando da COVID. Além disso, a ré exigiu o seu labor no dia 14/07/2020, enquanto ele ainda se encontrava doente.

Analiso.

Não se cogita de litigância de má-fé em razão de atos praticados no curso do contrato de trabalho, mas sim durante o processo, ou seja, a litigância de má-fé se caracteriza pela conduta das partes no decorrer do processo e em seu bojo.

Ademais, a questão relativa ao referido atestado médico já foi fartamente analisada, nada mais havendo a complementar.

Nada a prover.

RECURSO ADESIVO DA PRIMEIRA RECLAMADA - ENGELMIG

DIFERENÇAS DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE

A primeira reclamada, por sua vez, se insurge contra a condenação ao pagamento de diferenças de adicional de periculosidade. Alega que firmou, em 19/02/2020, com o reclamante o contrato de trabalho verde a amarelo, conforme previsto pela MP 905/19, vigente à época. Referida MP teve vigência até o dia 20/04/2020, sem que fosse convertida em lei e sem que fosse editado decreto para disciplinar as relações jurídicas dela decorrentes. Isso significa que as relações constituídas sob a sua vigência continuarão por ela regidas, nos termos do artigo 62, § 3º, da CR/88.

Afirma que o artigo 15, § 3º, da MP 905 previa o pagamento do adicional de periculosidade no percentual de 5%, caso a empregadora contratasse plano de seguro privado de acidentes pessoais para seus empregados. Tendo a empregadora contratado referido seguro, pagou o adicional de periculosidade no percentual de 5% até 20/04/2020, o que deve ser validado.

Requer a exclusão da condenação ao pagamento das diferenças de adicional de periculosidade.

Analiso.

Como bem observado na origem, a primeira reclamada firmou com o reclamante dois contratos de trabalho. O contrato "verde e amarelo", com base na mencionada MP 905 (ID b338210), e o contrato de trabalho em caráter de experiência (ID 2ecf08e), com previsão de pagamento de salário acrescido do adicional de periculosidade de 30%, conforme cláusula quarta. Ambos os contratos foram firmados no mesmo dia, em 19/02/2020.

Não se discute aqui a validade das disposições da MP 905, mas sim o fato de coexistirem dois contratos de trabalho, devendo prevalecer o mais benéfico ao empregado.

Assim, há que ser mantida a condenação das reclamadas ao pagamento das diferenças de adicional de periculosidade, incontroversamente pago sob o percentual de 5% nos primeiros meses de contrato.

Nada a prover.

INTERVALO INTERJORNADAS

Insurge-se ainda a ré contra a condenação ao pagamento do intervalo interjornadas. Alega que, ainda que descumprido referido intervalo, não há lei que a obrigue ao pagamento das horas dele subtraídas, não sendo correta a utilização analógica do disposto no artigo 71 da CLT, pois o artigo 66 é silente no aspecto.

Sem razão.

O entendimento prevalecente no TST acerca das consequências advindas do descumprimento do intervalo previsto no artigo 66 da CLT está pacificado por meio da OJ 355 da SDI-1 do TST, in verbis:

"O desrespeito ao intervalo mínimo interjornadas previsto no art. 66 da CLT, acarreta, por analogia, os mesmos efeitos previstos no § 4º do art. 71 da CLT e na Súmula nº 110 do TST, devendo-se pagar a integralidade das horas que foram subtraídas do intervalo, acrescidas do respectivo adicional".

Nego provimento.

LIMITAÇÃO DA CONDENAÇÃO AOS VALORES INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL

Requer a reclamada seja a liquidação limitada aos valores indicados na petição inicial.

Sem razão.

Com o advento da Lei 13.467/2017, foi acrescentada na CLT, como requisito da reclamação trabalhista, a formulação de pedido certo, determinado e com indicação de seu valor, sob pena de extinção do feito sem resolução do mérito (art. 840, §§ 1º e , da CLT).

No entanto, os valores dos pedidos indicados na petição inicial representam apenas uma estimativa do conteúdo pecuniário da pretensão e têm o objetivo de definir o rito processual a ser seguido, não havendo falar em limitação aos respectivos valores em eventual liquidação.

Aplica-se, por analogia, o entendimento consubstanciado na Tese Jurídica Prevalecente nº 16 deste Tribunal Regional, segundo a qual:

"No procedimento sumaríssimo, os valores indicados na petição inicial, conforme exigência do art. 852-B, I, da CLT, configuram estimativa para fins de definição do rito processual a ser seguido e não um limite para apuração das importâncias das parcelas objeto de condenação, em liquidação de sentença".

Desprovejo.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A primeira reclamada entende indevida a suspensão da exigibilidade dos honorários advocatícios a cargo do reclamante, considerando que ele possui créditos a receber, nos exatos termos do artigo 791-A, § 4º, da CLT.

Examina-se.

No que tange ao pagamento de honorários advocatícios e periciais pelo beneficiário da justiça gratuita, no âmbito do processo trabalhista, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 5766, em 20.10.2021, proferiu a seguinte decisão, in verbis:

"O Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ação direta, para declarar inconstitucionais os arts. 790-B, caput e § 4o, e 791-A, § 4o, da Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT), vencidos, em parte, os Ministros Roberto Barroso (Relator), Luiz Fux (Presidente), Nunes Marques e Gilmar Mendes. Por maioria, julgou improcedente a ação no tocante ao art. 844, § 2o, da CLT, declarando-o constitucional, vencidos os Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Redigirá o acórdão o Ministro Alexandre de Moraes. Plenário, 20.10.2021 (Sessão realizada por videoconferência - Resolução 672/2020/STF)".

Portanto, o STF, em decisão de natureza vinculante, com eficácia erga omnes, declarou inconstitucionais os artigos 790-B, caput,e 791-A, § 4º, da CLT, dispositivos que determinam o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência e periciais pelo beneficiário da justiça gratuita.

E tal decisão se aplica ao presente caso, ainda que não tenha ocorrido o trânsito em julgado na referida ADI. A regra é que as decisões proferidas nas ações decorrentes do controle abstrato de constitucionalidade, como as ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) e as declaratórias de constitucionalidade (ADC) possuem eficácia imediata, não precisando aguardar a publicação ou o trânsito em julgado para sua aplicação. A exceção é a restrição dos efeitos, que deve, inclusive, ser aprovada por maioria de dois terços dos membros do STF, o que, todavia, não ocorreu no caso da presente ADI.

Considerando a referida decisão, bem como que, no presente caso, foi deferida a justiça gratuita ao reclamante, em atuação de ofício, isento-o do pagamento de honorários de sucumbência aos procuradores das rés, bem como dos honorários periciais, que deverão, estes últimos, serem suportados pela União Federal.

Nego provimento ao apelo.

CONCLUSÃO

Conheço dos recursos ordinários interpostos, e, no mérito, nego-lhes provimento

Em atuação de ofício, isento o reclamante do pagamento de honorários de sucumbência aos procuradores das rés, bem como dos honorários periciais, que deverão, estes últimos, serem suportados pela União Federal.

Mantenho o valor da condenação, por ainda compatível.

O Tribunal Regional do Trabalho da Terceira Região, em Sessão Ordinária da Sexta Turma, hoje realizada, analisou o presente processo e, à unanimidade, conheceu dos recursos ordinários interpostos; no mérito, sem divergência, negou-lhes provimento. Em atuação de ofício, unanimemente, isentou o reclamante do pagamento de honorários de sucumbência aos procuradores das rés, bem como dos honorários periciais, que deverão, estes últimos, serem suportados pela União Federal. Mantido o valor da condenação, por ainda compatível.

Presidente: Exmº Desembargador Anemar Pereira Amaral.

Tomaram parte nesta decisão os Exmos.: Desembargadora Lucilde D'Ajuda Lyra de Almeida (Relatora), Desembargador Anemar Pereira Amaral e Desembargador César Machado.

Procuradora do Trabalho: Drª Maria Amélia Bracks Duarte.

Secretária: Márcia Moretzsohn de Oliveira.

Belo Horizonte, 30 de novembro de 2021.

LUCILDE D'AJUDA LYRA DE ALMEIDA

Relatora

VOTOS

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-3/1332402336/inteiro-teor-1332402517

Informações relacionadas

Tribunal Superior do Trabalho
Jurisprudênciahá 2 anos

Tribunal Superior do Trabalho TST: Ag XXXXX-44.2019.5.12.0039

Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região
Jurisprudênciahá 3 anos

Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região TRT-3 - RECURSO ORDINARIO: RO XXXXX-08.2020.5.03.0072 MG XXXXX-08.2020.5.03.0072