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    Doença Ocupacional - Empresa é condenada a Indenizar Empregado Doente

    há 3 anos

    PODER JUDICIÁRIO

    JUSTIÇA DO TRABALHO

    TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 11ª REGIÃO

    7ª Vara do Trabalho de Manaus

    RTOrd 0000761-23.2016.5.11.0007

    AUTOR: JOSEMARA ALMEIDA DOMINICO

    RÉU: SODECIA DA AMAZONIA LTDA

    Manaus, 2 de setembro de 2016.

    Processo n. 0000761-23.2016.5.11.0007

    Reclamante: JOSEMARA ALMEIDA DOMINICO

    Reclamada: SODECIA DA AMAZONIA LTDA

    Autuação: 11.04.2016 Rito: Ordinário

    S E N T E N Ç A

    I - RELATÓRIO

    JOSEMARA ALMEIDA DOMINICO, devidamente qualificada, ajuizou reclamação trabalhista, em 11.04.2016, em face de SODECIA DA AMAZONIA LTDA também devidamente qualificada. Alega que foi admitida em 02/01/2008 e dispensada em 05/11/2015, tendo exercido a função de auxiliar de inspeção. Aduz, ainda, ter contraído doença ocupacional no ombro. Por esses e outros fatos que declina na inicial pleiteia a condenação da ré no pagamento de indenização por danos morais e danos materiais decorrentes de doença ocupacional, dentre outros pedidos discriminados. Instruiu a inicial com documentos.

    Atribuído à causa o valor de R$476.922,76.

    Conciliação rejeitada.

    A ré apresentou resposta escrita na forma de contestação, acompanhada de documentos. Impugna o mérito com as razões de fato e de direito contidas na contestação, negando a natureza ocupacional da enfermidade apontada na exordial.

    Dispensados os depoimentos das partes, com a determinação da realização de exame pericial, tendo a reclamada se manifestado sobre o laudo. Dispensada a produção de prova testemunhal, encerrando-se a instrução processual.

    Razões finais remissivas pelas partes.

    Rejeitada a proposta final de conciliação.

    É o relatório, decide-se.

    II - FUNDAMENTAÇÃO

    DAS COMUNICAÇÕES JUDICIAIS

    Observe a Secretaria que todas as comunicações judiciais (citações, intimações e notificações) devem ser efetivadas em nome do (s) advogado (s) eventualmente indicado (s) na inicial, contestação ou em petição específica e, se postais, no endereço porventura declinado, de modo a evitar futuras arguições de nulidade processual, conforme Súmula 427 do C. TST.

    DA IMPUGNAÇÃO AO VALOR DA CAUSA

    No caso em análise, o rito é o ordinário, que contempla maior espaço para produção de prova. As custas, na hipótese de condenação do réu, serão calculadas pelo valor arbitrado à condenação, e não da causa, pelo que se conclui em ausência de prejuízo ao reclamado, conforme artigo 794 da CLT. Ademais, o cálculo apresentado com a inicial é apenas referencial, não vinculando a liquidação do julgado, podendo sofrer modificação de acordo com o que for efetivamente acolhido pela sentença, não havendo, pois, que se cogitar de limitação ou mesmo limitação ao postulado. Por essas razões, rejeito eventuais impugnações nesse sentido.

    DA IMPUGNAÇÃO AOS DOCUMENTOS

    A impugnação meramente formal não deve prevalecer, tendo em vista os princípios da informalidade e instrumentalidade do processo do trabalho. O valor probante dos documentos será avaliado pelo Juízo no momento oportuno, em cotejo com as demais provas produzidas. Ademais, a atual redação do Artigo 830 CLT autoriza que o documento em cópia seja declarado autentico pelo advogado, sob pena de sua responsabilidade pessoal. Por essas razões, rejeito eventuais impugnações nesse sentido.

    DA PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO - DOENÇA OCUPACIONAL - ALTA PREVIDENCIÁRIA

    O termo inicial da prescrição em matéria de doença ocupacional conta-se a partir do momento em que o empregado teve ciência inequívoca da extensão do dano, o que, no caso sub judice, ocorreu com o exame pericial determinado pelo Juízo. Nesse sentido, o artigo 198 do CC c/c as Súmulas 230 do STJ, 278 do STJ e 378 do C. TST. Rejeito.

    DA RESPONSABILIDADE CIVIL - DOENÇA OCUPACIONAL - DANOS MORAIS E MATERIAIS

    A autora postula, em breve síntese, a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos materiais e morais sob o argumento de que teria adquirido moléstia profissional que acomete seus ombros (sinovite acrômio- clavicular, tendinopatia do supra e infra-espinhosos, bursite subacrômio-subdeltoideana e sub coracóide), sustentando que foi adquirida em razão do desempenho diário e repetitivo de movimentos inadequados em função da atividade exercida, sem a ré ter emitido a CAT.

    A reclamada, por sua vez, controverte o pleito alegando que o autor não comprovou as suas alegações quanto a existência de culpa por parte da reclamada na aquisição de doença profissional no desempenho do labor, e muito menos de qualquer incapacidade para o trabalho, podendo a mesma ter tido origem nos trabalhos de cabeleireira que a reclamante fazia, aduzindo ainda que ré sempre adotou todos os procedimento aptos a resguardar a saúde dos seus funcionários.

    O laudo pericial de ID c5433b7, após meticuloso exame realizado nesta, explicou que a reclamante relata quadro com dor nos ombros direito e esquerdo, alegada como consequência de seu trabalho. Nos autos estão acostados resultados de exames de imagem evidenciando diagnóstico de lesão musculoesquelética (tendinopatia do supra e infraespinhosos, sinovite acrômio-clavicular e bursite subacrômio/subdeltoidea/subcoracoide), que vem piorando, apesar da retirada das incriminadas sobrecargas biomecânicas laborais e de vários tratamentos medicamentosos e cirúrgico instituídos, fato que resta comprovada a concausalidade, posto que sua predisposição heredo-constitucional, isto é, por ser portadora de acrômio tipo II da classificação de Bibliani contribuiu, também, para o aparecimento e/ou agravamento das lesões retromencionadas.

    Relata que o que se depreende de toda história clínica, laboral e dos resultados de exames é que a reclamante já possuía predisposição heredo-constitucional, fato que contribuiu com o desenvolvimento e/ou agravamento de tais patologias, haja vista que a mesma possui o acrômio tipo II da classificação de Bigliani, razão pela qual há compressão da junção miotendinea do supraespinhoso, o que corrobora o nexo concausal com as atividades laborativas na Reclamada.

    Observou, ainda, que na data da realização da perícia médica judicial, a obreira ainda queixava de dor no membro superior direito, pois mesmo após a intervenção cirúrgica realizada e do total afastamento de suas atividades laborais, a paciente continua apresentando queixas álgicas (dores), contrariando todo o conhecimento científico acumulado.

    Conclui que há nexo concausalentre as doenças alegadas (sinovite acrômioclavicular, tendinopatia do supra e infraespinhosos e bursite subacromial/subdeltoidea/subcoracoide) e as atividades laborais desempenhadas pela obreira na reclamada.

    Atesta ainda que a incapacidade laboral é parcial, temporária e tem tratamento no Sistema Único de Saúde. Ademais, esta não é omniprofissional, posto que a obreira não apresenta qualquer déficit de cognição.

    Contribui também com a conclusão do laudo pericial o fato da autora ter sido admitida como apta para o trabalho. A meu sentir, a reclamada sequer pode alegar que não foram realizados exames específicos para detectar tais moléstias, já que, em atenção aos princípios da prevenção e da precaução próprios ao Direito Ambiental, nele incluído o do trabalho (artigo 200, VIII, c/c o 225, § 3º da CF), outros devem ser realizados pela parte patronal, de modo a evitar futura responsabilidade pelo infortúnio, notadamente quando a própria atividade a ser exercida pelo trabalhador já indica a existência de riscos ergonômicos consideráveis.

    Noutra quadra, observo que foram preenchidos os requisitos indicados pela Súmula 378 do C. TST, abaixo transcrita:

    "SUM-378 ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº 8.213/1991. (inserido o item III) - Res. 185/2012 - DEJT di-vulgado em 25, 26 e 27.09.2012

    I - E constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado. (ex-OJ nº 105 da SBDI-1 - inserida em 01.10.1997)

    II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego. (primeira parte - ex-OJ nº 230 da SBDI-1 - inserida em 20.06.2001).

    III - O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego decorrente de acidente de trabalho previs-ta no art. 118 da Lei nº 8.213/91. " (grifos aditados)

    Observo, outrossim, que apesar de impugnado o laudo pela ré, não há nada na referida peça que tenha força para desconstituir o resultado alcançado pelo laudo, já que o trabalho do Sr. Perito foi realizado de forma meticulosa e completa, razão pela qual não acolho qualquer das impugnações contidas na indigitada promoção.

    Com esse desencadeamento fático e diante das provas produzidas nos autos, imperioso acolher a conclusão do laudo pericial (afastando-se, por consequência, a impugnação da ré no particular, já que traz argumentos insubsistentes em relação a ele), e reconhecer o nexo concausal das patologias nos ombros da autora com o trabalho executado na reclamada, ficando declarada sua natureza acidentária, a teor do artigo 20, II, da Lei 8.213/91.

    DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA OU CULPA EMPRESARIAL

    As atividades desenvolvidas pela reclamada, no entender desse magistrado, não podem ser classificadas como de risco acentuado, de modo a desafiar a aplicação da teoria objetiva fundada na teoria do risco-criado, conforme previsão do artigo 927, §único, do Código Civil, já que não acarreta a terceiros, ainda que empregados, um ônus maior do que o suportado ordinariamente pelos demais trabalhadores de outras empresas, porquanto seja uma realidade geral a presença de riscos ergonômicos nos ambientes de trabalho.

    Entretanto, comungo da diretriz doutrinária e jurisprudencial no sentido de que, em se tratando de doença ocupacional, a responsabilidade da empresa deve ser objetiva, mas sob outro fundamento que não na teoria do risco-criado, mas sim por conta do princípio constitucional e legal do poluidor-pagador.

    Inicialmente, cumpre argumentar que o artigo , XXVIII da Carta Magna, que determina o dever do empregador indenizar apenas em caso de culpa, aplica-se de forma restrita apenas às hipóteses de acidente de trabalho típico, como sendo aquele que ocorre eventualmente e de forma súbita, caracterizando-se por ser um evento único e isolado no tempo, a exemplo de uma queda de escada ou a amputação de um membro em determinada máquina.

    As doenças ocupacionais, que se identificam como enfermidades que são adquiridas de forma gradual e esparsa no tempo, em função de condições de trabalho inadequadas, seriam regidas, ao contrário do acidente típico, pelos artigos 200, VIII c/c o 225, § 3º da CF e, ainda, o artigo 14, § 1º da Lei 6938/81, in verbis:

    Art. 200 - Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei:

    ........................

    VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho;"

    "Art. 225 - Todos têm o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à saudável qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

    ...................

    § 3º - As condições e atividades lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoa físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente de obrigação de reparar os danos causados."

    "Art 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:

    I - à multa simples ou diária, nos valores correspondentes, no mínimo, a 10 (dez) e, no máximo, a 1.000 (mil) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs, agravada em casos de reincidência específica, conforme dispuser o regulamento, vedada a sua cobrança pela União se já tiver sido aplicada pelo Estado, Distrito Federal, Territórios ou pelos Municípios.

    II - à perda ou restrição de incentivos e benefícios fiscais concedidos pelo Poder Público;

    III - à perda ou suspensão de participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito;

    IV - à suspensão de sua atividade.

    § 1º - Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. (grifos e realces aditados)

    Referidos dispositivos, quando interpretados em seu conjunto, não deixam qualquer margem de dúvidas quanto à natureza objetiva da responsabilidade do empregador em indenizar eventuais danos causados, seja a terceiros ou a seus empregados, quando se tratar de doença ocupacional.

    Com efeito, interpretação diversa cairia na inconcebível contradição de se admitir a responsabilidade objetiva quando determinada empresa, em razão de suas atividades, causasse prejuízo a um terceiro que com ela não mantenha qualquer tipo de relação jurídica, ao passo que, em relação ao seu empregado, que lhe é subordinado juridicamente, tal responsabilidade dependeria de comprovação de culpa empresarial, em que pese se tratar da mesma atividade produtiva, situação que constituiria em atentado à lógica e sentimento de justiça, trazendo para dentro do ordenamento jurídico, que se diz único e harmônico, tão aguda e inconcebível incongruência.

    Com maestria, o doutrinador João José Sady, em sua obra "Direito do meio ambiente do Trabalho", editora LTr, 2000, p.37, nos brinda com um exemplo bem elucidativo da questão por nós suscitada no parágrafo precedente, questinonando a situação, da segunte forma:

    Imaginemos, por exemplo, que o poluidor-pagador deve reparar, independentemente de culpa, o prejuízo gerado pelo dano ambiental ao terceiro. Como hipótese, examina-se o caso de uma empresa que polui um rio destilando um poluente orgânico persistente, que gera doenças terríveis para o empregado, assim como a degradaçaõ do curso de água. O terceiro que tem uma propriedade ribeirinha prejudicada irá gozar do conforto de tal responsabilidade objetiva do poluidor, enquanto o empregado doente terá que provar a cula as empresa?

    Corroborando com o entendimento que ora defendemos, um dos maiores doutrinadores sobre o tema, o ilustre Professor e Desembargador do Trabalho da 3ª Região, Sebastião Geraldo de Oliveira, na obra intitulada "Indenizações por Acidente do Trabalho ou Doença Ocupacional", Editora Ltr, 6ª Edição, pág. 110, citando obra de Júlio César de Sá Rocha, assim assevera:

    Também o art. 225, § 3º, estabelece a obrigação de reparar os danos causados pelas atividades lesivas ao meio ambiente, sem cogitar da existência de dolo ou culpa. Esse último dispositivo constitucional merece leitura atenta porque permite a interpretação de que os danos causados pelo empregador ao meio ambiente do trabalho, logicamente abrangendo os empregados que ali atuam, devem ser ressarcidos independentemente da existência de culpa, ainda mais que o art. 200, VIII, da mesma Constituição, expressamente inclui o local de trabalho no conceito de meio ambiente.

    Pode-se invocar, também, em respaldo a essa tese, a Lei 6938/1981, que estabelece a política nacional do meio ambiente, cujo art. 14, § 1º, prevê: É o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. E o conceito de poluição, que conforme nosso entendimento, alcança boa parte dos fatores causais das doenças ocupacionais, foi inserido no artigo 3º, III, da mesma lei, com o seguinte teor: ´Entende-se por poluição a degradação da qualidade ambiental resultante de atividades que direta ou indiretamente prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da população... (grifos e realces aditados)

    No mesmo sentido foi a conclusão esposada no Enunciado nº 38 formulado quando da edição da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, ocorrida durante o mês de novembro do ano de 2007, nos seguintes termos:

    Responsabilidade civil. Doenças ocupacionais decorrentes dos danos ao meio ambiente do trabalho. Nas doenças ocupacionais decorrentes dos danos ao meio ambiente do trabalho, a responsabiliade do empregador é objetiva. Interpretação sistemática dos arts. , XXVIII, 200, VIII, 225, § 3º, da Constituição Federal e do art. 14, § 1º, da Lei n. 6.938/1981.

    Nesse diapasão, temos que a jurisprudência do C. Tribunal Superior do Trabalho já começou a proferir julgados adotando a tese ora defendida, como se extrai do acórdão abaixo reproduzido, com publicação ocorrida no mês de agosto de 2013:

    Ora, auferindo lucros em tal situação, a ré assume alto risco em face do princípio de que quem lucra com riscos e os causa a sociedade, deve arcar objetivamente com eventuais acidentes e prejuízos causados, tanto em matéria ambiental, como em matéria trabalhista, pois entendimento diverso aqui traria o paradoxo de a empresa preocupar-se mais com riscos ambientais do que com riscos trabalhistas, destacando que o meio ambiente de trabalho está inserido no meio ambiente equilibrado (artigo 200, VIII, artigo 225 parágrafo 3.º, da CF/88, c/c artigos 7, inciso XXII e XXVIII, Lei 6938/81, artigo 14, parágrafo 1º, artigo 927 parágrafo único, artigos 932, III, 933 e 942 do Código Civil). Processo: RR - 201900-26.2009.5.09.0654 Data de Julgamento: 28/08/2013, Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 06/09/2013.(Realces aditados)

    Assim, em que pese a natureza objetiva da responsabilidade civil do empregador em relação às doenças ocupacionais, entretanto, no caso vertente, encontra-se também evidenciada a culpa empresarial quanto a causa do infortúnio aqui reconhecido. O artigo , XXII, da Carta Política proclama que é direito do empregado a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de norma de higiene, saúde e segurança. Por sua vez, o artigo 157, I e II da CLT, assevera que é dever do empregador cumprir e fazer cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, bem como instruir os empregados, através de ordens de serviços, quanto às precauções a tomar no sentido de evitar acidentes do trabalho ou doenças ocupacionais. Assim, apesar do risco existente, a reclamada não comprovou por qualquer meio que buscou orientar e fiscalizar a forma correta de evitar problemas de saúde, obrigação que lhe competia à luz dos dispositivos acima indicados.

    Nestes termos, seja pela via objetiva ou mesmo pela subjetiva, patente é a responsabilidade da reclamada quanto à causa que implicou no surgimento e agravamento das patologias confirmadas pela perícia, o que fica aqui declarado, haja vista a presença, in casu, de todos os elementos configuradores da responsabilidade civil, quais sejam: dano, nexo causal e culpa, embora este último fosse, no caso, dispensável.

    DO DANO MATERIAL

    O laudo noticia a existência de restrição parcial (já que há restrições para atividade laboral, conforme indicado no quesito 5 do Juízo) e temporária para as atividades que requeiram esforço repetitivo, estático. Informa, ainda, que a incapacidade temporária mas podendo evoluir de maneira satisfatória com tratamento especializado.

    Neste diapasão, cristalino o abalo patrimonial, situação que deve ser compensada com o ressarcimento fulcrado na responsabilidade civil acima reconhecida e consequente dever de reparar o dano.

    O artigo 950, §único, do Código Civil é perfeitamente aplicável ao Direito do Trabalho, conforme artigo , §único c/c o 769, ambos da CLT, pois reflete a busca pela efetividade da tutela jurisdicional, assegurando o resultado prático das decisões judiciais.

    No caso dos autos a incapacidade é parcial e temporária, sendo possível a cura sem deixar seqüelas. Necessário esclarecer que o dano material, ao contrário do moral, possui uma base de cálculo objetiva, sendo a modalidade "lucros cessantes" aferida tendo por parâmetro o aspecto cronológico da incapacidade (temporária ou permanente), e sua extensão (total ou parcial). Quando a incapacidade é parcial, o valor deve corresponder a 50% da remuneração da vítima quando houver nexo de causalidade, e de 25% quando for concausalidade, critério que reputo mais justo quando a atividade laboral funcionou apenas como coadjuvante.

    Quando temporária, entendo que o período de cincos anos (60 meses) é adequado para fins de servir de base para fins de arbitramento em parcela única, já que, além do tratamento em si, há um período necessário à consolidação das lesões.

    Por tais razões, JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos materiais, o qual, conforme critérios acima estabelecidos, arbitro em R$17.626,35 (correspondente a 25% do último salário bruto multiplicado por 60 meses). Não houve pedido de ressarcimento de custo do tratamento, nem de medicamentos.

    Os valores ora arbitrados e fixados atendem aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, pelo que se mostram excessivos os postulados na peça vestibular.

    Registro que não é possível a compensação da condenação ora estabelecida com a percepção de eventual benefício previdenciário, vez que possuem natureza jurídica distintas, que visam resguardar bens da vida distintos.

    DO DANO MORAL

    Os direitos da personalidade encontram proteção nos incisos V e X do artigo 5º, da Lei Fundamental e, quando violados, devem ser objeto de reparação, nos termos dos artigos 186, 187 c/c o 927, todos do Código Civil, razão pela qual, além dos danos materiais, devem também ser ressarcidos os de natureza extrapatrimonial.

    Quanto ao dano moral pleiteado com fundamento na patologia adquirida, saliento que não obstante o obreiro ser acometido de uma patologia que gera incapacidade temporária e parcial, ela é passível sim de implicar em abalo moral face ao sofrimento experimentado pela vítima.

    O dano, in casu, é in re ipsa, ou seja, não depende de prova por parte da vítima, vez que suas repercussões ocorrem no íntimo, e decorre das agruras sofridas pelo trabalhador que passa a ter que conviver com a restrição, ainda que parcial e temporária, em sua capacidade laborativa, conforme se comprova pelo teor do laudo pericial e, consequentemente, com a dor física e a incerteza quanto ao seu futuro profissional.

    É evidente que qualquer pessoa sofre frustração e abalo moral ao ver restringida sua capacidade de trabalho, pois esta limitação causa transtorno na vida particular da vítima, limitando inclusive seu direito ao lazer, não permitindo a mesma interação social plena na comunidade e no núcleo familiar, dificultando, ainda, sua recolocação no mercado de trabalho.

    Presentes, portanto, os requisitos da responsabilidade civil, se impõe a indenização por dano moral em decorrência da doença ocupacional reconhecida com suas conseqüências já expostas, salientando que o valor pleiteado na inicial se afigura desarrazoado, limitando-se ao caráter pedagógico da medida (pois leva em consideração apenas a condição econômica do ofensor), relevando a extensão do dano e outros pressuposto de grande valia no arbitramento do quantum indenizatório, como a condição pessoal do ofendido, as finalidades dissuasória e compensatória do instituto, o não enriquecimento ilícito, a relação de causa do ambiente de trabalho com a moléstia, e a restrição parcial e temporária de sua capacidade laborativa .

    Por tais motivos, JULGO PROCEDENTE o pedido de indenização por danos morais, o qual arbitro em R$10.000,00 (dez mil reais), nos termos do artigo 944 do novo Código Civil (aplicável subsidiariamente nos termos do artigo e seu parágrafo único da CLT), observados os critérios acima apontados.

    Por fim, em relação ao pedido de indenização pelo fundamento da dispensa discriminatório, observo que não foi realizada qualquer prova nesse sentido, cujo ônus dependia da reclamante, nos termos do art. 818 da CLT, razão pela qual julgo improcedente o pedido quanto a este fundamento, até porque a constatação da extensão do dano só foi evidenciada pela perícia realizada, não se podendo presumir que a ré já tivesse pleno conhecimento das restrições da autora.

    DOS HONORÁRIOS PERICIAIS

    Nos termos do artigo 790-B da CLT, a reclamada é a responsável pelos honorários periciais, já que sucumbente no pedido, os quais, entretanto, já foram quitados antecipadamente, nada mais sendo devido a tal título.

    COMPENSAÇÃO E DEDUÇÃO

    Em relação a compensação não há o que deferir, pois não há prova de que haja parcela trabalhista de que a ré seja credora. Indefiro. Já a dedução é matéria de ordem pública, pois objetiva evitar o enriquecimento ilícito - artigo 884 do CC, ficando deferida quanto às parcelas pagas sob o mesmo título.

    DOS REQUERIMENTOS DAS PARTES

    Os eventuais requerimentos das partes de juntada de documentos e diligências de qualquer natureza que não tenham sido apreciados no curso da instrução processual ficam indeferidos, pois desnecessários ao julgamento da lide, tendo esse Juízo firmado seu convencimento de forma plena com os elementos trazidos aos autos.

    DA JUSTIÇA GRATUITA

    Preenchidos os requisitos do Artigo 790, § 3º CLT, mostra-se imperativa a concessão dos benefícios da justiça gratuita. De acordo com referido dispositivo, basta que a parte afirme não ter condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do sustento de sua família ou se encontre desempregado ou perceba até dois salários-mínimos, sendo que esta duas últimas já configuram a presunção do estado de necessidade. Defiro.

    DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

    Com ressalva de entendimento pessoal quanto ao tema, mas por questão de disciplina judiciária, curvo-me ao posicionamento do C. TST, no sentido de que o reclamante não preenche o requisito da assistência sindical previsto na Lei 5584/70 e suas Súmulas 219 e 329. Conforme entendimento dessa Colenda Corte Trabalhista, em se tratando de relação de emprego, indevidos honorários sucumbenciais ou mesmo por perdas e danos (artigos 389 c/c 404 do CC), conforme IN27/2005 do C. TST, já que o pleno acesso do reclamante ao Poder Judiciário não está condicionado à contratação de advogado, pois nessa Especializada vigora o princípio do jus postulandi.

    Dessa forma, o deferimento de honorários advocatícios violaria de forma indireta as Súmulas 219 e 329 do C. TST, o que implicaria em abrir portas à recorribilidade da decisão às instâncias extraordinárias, retardando, sobremaneira, a resolução final do dissídio cujo resultado da reforma seria certo face à jurisprudência sumulada.

    Por tais razões, e em observância ao princípio fundamental da duração razoável do processo - art. , LXXVIII, da CF, julgo improcedente o pedido.

    JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA

    Juros de Mora de 1% ao mês, desde o ajuizamento da ação, nos termos do artigo 883 da CLT e súmula 200 do TST. Correção Monetária desde o vencimento da obrigação, nos termos do artigo 459 da CLT c/c o artigo 39, § 1º, da Lei 8.177/91 e Súmula 381 do C. TST, exceto para os incidentes na compensação por danos morais, que deve observar a Súmula 439 do C. TST.

    DOS RECOLHIMENTOS FISCAIS

    As parcelas objeto da condenação possuem natureza indenizatória, motivo pelo qual não incidem as contribuições previdenciárias e imposto de renda.

    DISPOSITIVO

    Por estes fundamentos, defiro ao reclamante os benefícios da justiça gratuita, declaro a responsabilidade civil da ré pela causa na doença ocupacional e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos contidos na reclamação trabalhista ajuizada por JOSEMARA ALMEIDA DOMINICO em face da SODECIA DA AMAZONIA LTDApara o fim de condenar a reclamada a pagar a reclamante, no prazo legal, sob pena de execução, R$17.626,35 (dezessete mil seiscentos e vinte e seis reais e trinta e cinco centavos) a título de indenização por danos materiais e indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais); juros e correção monetária, tudo nos termos da fundamentação supra que esse dispositivo integra. Julgo improcedentes os demais pedidos.

    Custas pela reclamada no importe de R$552,52, calculadas sobre o valor da condenação de R$27.626,35, na forma do artigo 789 da CLT.

    Cientes as partes.

    Nada mais.

    ALEXANDRO SILVA ALVES

    Juiz do Trabalho

    MANAUS, 2 de Setembro de 2016

    ALEXANDRO SILVA ALVES

    Juiz (a) do Trabalho Substituto

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