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28 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Detalhes

Processo

Órgão Julgador

OITAVA TURMA

Julgamento

Relator

NIVALDO BRUNONI
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Inteiro Teor

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Habeas Corpus Nº XXXXX-51.2022.4.04.0000/PR

PACIENTE/IMPETRANTE: FRANCISCO JOSE PEREIRA

IMPETRADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

IMPETRADO: Juízo Federal da 3ª VF de Foz do Iguaçu

DESPACHO/DECISÃO

Trata-se de habeas corpus, com pedido de provimento liminar, impetrado em favor de FRANCISCO JOSE PEREIRA, em face de decisão do Juízo Federal da 3ª VF de Foz do Iguaçu, objetivando a dispensa do reforço de fiança.

O paciente foi preso em flagrante, no dia 20/11/2021, em um ônibus de "sacoleiros", no posto da Polícia Rodoviária Federal de Céu Azul/PR, portando duas pistolas calibre 9mm.

Narra o impetrante que o paciente encontra-se preso há 66 (sessenta e seis) dias, pois, em que pese tenha sido concedida liberdade provisória mediante fiança, não possui condições financeiras de recolher o valor estabelecido.

Requer, liminarmente e no mérito, a concessão da ordem, determinando-se a concessão de liberdade provisória ao paciente, dispensando-o do pagamento, ou a redução da fiança, ou, ainda, a aplicação de outra medida cautelar diversa da prisão.

É o relatório.

Decido.

A decisão combatida foi proferida nos seguintes termos (processo XXXXX-03.2021.4.04.7002/PR, evento 6, DESPADEC1):

(...)

Vistos em regime de plantão.

Trata-se da comunicação da prisão em flagrante de FRANCISCO JOSÉ PEREIRA LOPES, sexo masculino, nacionalidade brasileira, solteiro, filho de Maria Viviane Pereira, nascido aos 21/08/1993, natural de Fortaleza/CE, instrução médio completo, profissão cozinheiro, documento de identidade nº 20081953318-SSP/CE, residente na Rua jacinto Matos, nº 53, bairro Jacarecanga, Fortaleza/CE, pela suposta prática do crime previsto no art. 18 da Lei 10.826/03 (Tráfico internacional de arma de fogo).

Narra o auto de prisão em flagrante que, no dia 20/11/2021, policiais militares, em parceria com a Receita Federal, realizavam fiscalização de rotina no posto da PRF em Céu Azul/PR quando abordaram um ônibus de "sacoleiros" e, após vistoria, constataram que o passageiro FRANCISCO JOSÉ PEREIRA LOPES tinha, em seu poder, dois revolveres marca Canik, calibres 9 mm, desmuniciados, acondicionados. O flagrado informou que teria comprado as armas há dois dias, em Ciudad del Leste/Paraguai, tendo pago aproximadamente U$ 7.000,00 (sete mil dólares americanos0 pelas mercadorias, que seriam entreguem em São Paulo/SP e que receberia R$ 2.000,00 (dois mil reais) pelo transporte.

Decido.

1. Da Homologação da Prisão em Flagrante

Os indícios de materialidade são evidentes, tendo em vista o próprio auto de prisão em flagrante, depoimento do condutor e testemunhas, auto de apresentação e apreensão. Da mesma forma, os indícios de autoria estão presentes, uma vez que as armas de fogo estavam na posse do flagrado no momento da abordagem policial, e que o réu informou que as teria adquirido em Ciudad del Leste/Paraguai.

Considerando, ainda, a presença dos demais requisitos necessários à prisão em flagrante delito (oitiva de testemunhas, interrogatório do flagrado, entrega da nota de culpa ao preso, concessão de oportunidade para a comunicação imediata da prisão às famílias do preso e comunicação imediata da prisão ao Juízo competente e comunicação ao Ministério Público Federal), homologo a prisão em flagrante levada a efeito pela Autoridade Policial.

2. Da Prisão Preventiva e Liberdade Provisória

Ausente ilegalidades passíveis de relaxamento da prisão, cabe ao magistrado apreciar a necessidade de decretação de prisão preventiva ou a concessão de liberdade provisória, consoante o disposto no art. 310 do CPP:

Art. 310. Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público, e, nessa audiência, o juiz deverá, fundamentadamente:

I - relaxar a prisão ilegal; ou

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Após as reformas legislativas promovidas com a Lei nº 12.403/11, a prisão passou a ser a exceção no ordenamento, devendo ser, quando possível, aplicadas medidas cautelares diversas da prisão.

As medidas cautelares restritivas de direitos devem ser aplicadas quando houver a plausibilidade da acusação, por meio de comprovação da materialidade delitiva e indícios de autoria. Basta, é dizer, a existência de um mínimo de elementos indicativos do autor ou autores do delito, sendo desnecessária a mesma certeza exigida para a prolação do decreto condenatório.

No caso dos autos, verifico que estão presentes indícios de autoria e materialidade.

A materialidade, em princípio, é evidente, diante do auto de apreensão e depoimento do condutor e testemunhas, além das informações prestadas pelo próprio flagrado em seu interrogatório.

Do mesmo modo se pode dizer dos indícios de autoria da prática criminosa em relação ao autuado, conforme elementos constantes do auto de prisão em flagrante que dão conta de que teria sido preso em flagrante delito no momento em que transportava as armas de fogo adquiridas no país vizinho.

Enfatizo que tais conclusões são obtidas mediante cognição sumária, sendo certo que os fatos ora apurados serão objeto de controvérsia sob o crivo do contraditório, oportunidade em que o Estado-Juiz garantirá às partes a ampla produção probatória. No entanto, para esta fase embrionária, entendo que existem indícios de autoria, sendo que a instrução comprovará ou não as suspeitas fundadas em desfavor do flagrado.

A Lei nº 10.826/03 prevê, em seu artigo 21, que o delito de trafico internacional de arma de fogo é insuscetível de liberdade provisória.

No entanto, a inconstitucionalidade de referida proibição em abstrato foi decretada pelo Supremo Tribunal Federal, no bojo da ADI XXXXX-1, conforme restou noticiado no Informativo nº 465:

ADI e Estatuto do Desarmamento - 2

Em seguida, relativamente aos parágrafos unicos dos artigos 14 e 15 da Lei 10.868/2003, que proíbem o estabelecimento de fiança, respectivamente, para os crimes de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido e de disparo de arma de fogo, considerou-se desarrazoada a vedação, ao fundamento de que tais delitos não poderiam ser equiparados a terrorismo, prática de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes ou crimes hediondos ( CF, art. , XLIII). Asseverou-se, ademais, cuidar-se, na verdade, de crimes de mera conduta que, embora impliquem redução no nível de segurança coletiva, não podem ser igualados aos crimes que acarretam lesão ou ameaça de lesão à vida ou à propriedade. Quanto ao art. 21 da lei impugnada, que prevê serem insuscetíveis de liberdade provisória os delitos capitulados nos artigos 16 (posse ou porte ilegal de arma de fogo de uso restrito), 17 (comércio ilegal de arma de fogo) e 18 (tráfico internacional de arma de fogo), entendeu-se haver afronta aos princípios constitucionais da presunção de inocência e do devido processo legal ( CF, art. , LVII e LXI). Ressaltou-se, no ponto, que, não obstante a interdição à liberdade provisória tenha sido estabelecida para crimes de suma gravidade, liberando-se a franquia para os demais delitos, a Constituição não permite a prisão ex lege, sem motivação, a qual viola, ainda, os princípios da ampla defesa e do contraditório ( CF, art. , LV).Vencidos, parcialmente, os Ministros Carlos Britto, Gilmar Mendes e Sepúlveda Pertence, que julgavam improcedente o pedido formulado quanto aos parágrafos unicos dos artigos 14 e 15, e o Min. Marco Aurélio, que o julgava improcedente quanto ao parágrafo único do art. 15 e, em relação ao art. 21, apenas quanto à referência ao art. 16. O Tribunal, por unanimidade, julgou, ainda, improcedente o pedido quanto aos artigos , X; , §§ 1º, e ; 10; 11, II; 12; 23, §§ 1º, e ; 25, parágrafo único; 28; 29 e ao parágrafo único do art. 32, e declarou o prejuízo da ação em relação ao art. 35, todos da Lei 10.826/2003.

Desse modo, conclui-se no sentido de que, inobstante a gravidade de tal crime, revela-se como necessária à manutenção da custódia processual a existência de algum dos pressupostos autorizadores da prisão preventiva, previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal, quais sejam: garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal, ou garantia da aplicação da lei penal. Por força do artigo , inciso XLI, e artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, o magistrado deve apontar os elementos concretos ensejadores da medida. Os delitos apenados com reclusão admitem a prisão cautelar, nos termos do artigo 313, I, do Código de Processo Penal.

Nesse ponto, cumpre asseverar que, apesar de as circunstâncias do fato serem gravíssimas, em razão da natureza da mercadoria transportada pelo flagrado, o que possibilitaria o cabimento, em tese, da decretação de prisão preventiva para garantia da ordem pública, observo que o delito não foi praticado mediante violência ou grave ameaça, o preso informou endereço fixo, não ostenta antecedentes criminais na Justiça Federal da 4ª Região ou mandados de prisão em aberto em seu desfavor.

Em relação à instrução criminal, não há indícios de que, retomando a liberdade, o autuado possa gerar prejuízos à investigação ou ao eventual processo, seja aliciando ou ameaçando testemunhas, seja destruindo ou forjando provas, até mesmo porque foi preso em flagrante, tendo já sido colhidos diversos elementos informativos, dentre eles os depoimentos do condutor e da testemunha que efetuaram a prisão e o próprio objeto do crime, listado no auto de apresentação e apreensão.

Desse modo, verifico aplicar-se ao caso o artigo 321 do Código de Processo Penal, segundo o qual, estando ausentes os requisitos que autorizam a decretação da prisão preventiva, o juiz deverá conceder liberdade provisória, impondo, se for o caso, as medidas cautelares previstas no artigo 319, observados os critérios constantes do artigo 282, ambos do mesmo Código.

Compulsando o referido artigo 319 do Codex Processual, verifico que a fiança é medida cautelar que melhor se amolda ao caso em tela, tendo em vista que, por um lado, garante a liberdade do flagrado, e por outro, compensa o perigo a que a sociedade é exposta com sua soltura, inibindo possível reiteração criminosa e vinculando o autuado ao Juízo.

Em relação ao quantum da caução financeira a ser recolhida pelo flagrado, levo em conta, nos termos dos artigos 325 e 326 do Código de Processo Penal, as informações contidas nestes autos acerca da situação financeira do autuado e a natureza da infração o que deve ser levado em consideração para a fixação do valor da caução.

Considerando que a pena máxima cominada ao delito é superior a quatro anos, a fiança deve ser fixada entre 10 e 200 salários mínimos, nos termos do art. 325, II, do Código de Processo Penal. Diante da proporcionalidade com a conduta praticada, o valor das mercadorias e a condição social do acusado, majoro a fiança arbitrada em sede policial, fixando o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Por essa razão, concedo liberdade provisória ao indiciado, condicionada ao cumprimento do disposto nos art. 327 e 328 do CPP, bem como à prestação da fiança arbitrada.

A fiança deverá ser recolhida por meio de depósito em conta judicial vinculada aos autos em epígrafe, a ser aberta pela própria defesa no sistema eproc, por meio da opção depósitos judiciais>>guias geradas para um processo, no qual se pode gerar a respectiva guia de recolhimento, com abertura de conta judicial e expedição de número de identificação de transferência. Demais instruções poderão ser obtidas pelo seguinte link: http://tutoriaiseproc.trf4.jus.br/?page_id=503.

Recolhido o respectivo valor, expeça-se o competente Alvará de Soltura em favor do indiciado, devendo constar também a ressalva de que a ordem de soltura refere-se exclusivamente aos presentes autos, devendo a autoridade policial, previamente, diligenciar nos sistemas competentes a existência de outras ordens de prisão, pois, neste caso, o indiciado/preso deverá permanecer custodiado. Tal expediente será encaminhado eletronicamente à autoridade prisional, e valerá como intimação do inteiro teor desta decisão.

(...)

Apenas em momento posterior, seguiu-se a manifestação ministerial, nos seguintes termos (processo XXXXX-03.2021.4.04.7002/PR, evento 42, PARECER1):

(...)

Observo que transcorreram poucos dias desde a fixação da fiança, o que não permite asseverar, com segurança, que o não recolhimento da cautela se deu pela absoluta impossibilidade de fazê-lo. Ademais, consigno que, em princípio, o montante arbitrado está em absoluta consonância com a natureza concreta da infração (que envolve elevado dispêndio financeiro – cerca de R$ 39.000,00), e também por suas declarações em sede policial acerca do exercício da atividade de contrabando como seu meio de vida há cerca de 8 meses. Assim, mostra-se adequado e razoável o valor estabelecido a título de fiança, principalmente tendo em vista o intuito de desestimular nova prática delitiva

(...)

Pois bem.

O Código de Processo, no art. 340, possibilita efetivamente seja exigido o reforço da fiança nas hipóteses que ali enumera.

Reproduzo:

Art. 340. Será exigido o reforço da fiança:

I - quando a autoridade tomar, por engano, fiança insuficiente;

II - quando houver depreciação material ou perecimento dos bens hipotecados ou caucionados, ou depreciação dos metais ou pedras preciosas;

III - quando for inovada a classificação do delito.

Parágrafo único. A fiança ficará sem efeito e o réu será recolhido à prisão, quando, na conformidade deste artigo, não for reforçada”

Como se percebe, o legislador não explicitou qual autoridade pode determinar o reforço da fiança. Contudo, é de se interpretar que isso fica a cargo da própria autoridade policial, nos casos em que for de sua atribuição, ou do juiz, quando tomar conhecimento do flagrante.

A questão que se coloca, inicialmente, é se o juiz pode fazer isso de ofício, como na hipótese dos autos, ou seja, sem requerimento expresso do agente ministerial.

A meu ver não pode. Isso porque, como dito, o art. 340 do CPP deve ser interpretado tendo em mira o art. 333 do mesmo diploma legal, que reza:

Art. 333. Depois de prestada a fiança, que será concedida independentemente de audiência do Ministério Público, este terá vista do processo a fim de requerer o que julgar conveniente”

Ou seja, o Ministério Público deve requerer o reforço.

Deve prevalecer o princípio acusatório, da mesma forma que ocorre com a impossibilidade de converter a prisão em flagrante em preventiva de ofício, conforme jurisprudências do STF e STJ recentes.

Note-se, ademais, que não se trata de caso de engano da autoridade, o que autorizaria a utilização do inciso I do art. 340 do CPP.

A autoridade policial não se enganou. Simplesmente utilizou do critério da discricionariedade regrada para arbitrar a fiança no valor de R$ 14.000,00, conforme lhe autorizava o art. 325, I, do CPP:

Art. 325. O valor da fiança será fixado pela autoridade que a conceder nos seguintes limites:

I - de 1 (um) a 100 (cem) salários mínimos, quando se tratar de infração cuja pena privativa de liberdade, no grau máximo, não for superior a 4 (quatro) anos;

II - de 10 (dez) a 200 (duzentos) salários mínimos, quando o máximo da pena privativa de liberdade cominada for superior a 4 (quatro) anos”.

Assim, se o Ministério Público tivesse entendido que era insuficiente, deveria então ter requerido o reforço ao juiz, conforme decorre de suas atribuições.

Neste sentido, aliás, já decidiu o Tribunal de Justiça do RS (sem grifos no original):

“Prisão em flagrante por receptação, com arbitramento de fiança em R$ 1.500,00 pela autoridade policial. Após o recolhimento da quantia pelo flagrado e a sua soltura, o juiz singular determinou reforço, exigindo mais R$ 3.000,00, sob pena de quebramento da fiança. Inadimplido o novo montante, foi decretada a prisão preventiva do recorrente e ordenada a expedição de mandado prisional. Realidade processual que refoge às hipóteses previstas para reforço de fiança no art. 340 do CPP, medida em que não verificado engano da autoridade policial na tomada de valor insuficiente (inciso I) (…) Restabelecimento do valor inicial a título de fiança e revogação da prisão preventiva decretada, com restituição do direito do recorrente de responder ao feito em liberdade. Recurso provido". (TJ/RS, 6a Câmara Criminal, Relator Ícaro Osório, DJ de 19.07.2016).

Por fim, cumpre destacar que constitui ônus do impetrante demonstrar que o paciente não possui condições de arcar com o custo da fiança, não se prestando para tanto a mera afirmação ou simples declarações, como reiteradamente vem decidindo esta Corte ( HC nº 5011598-57.2013.404.0000, 7ª Turma, Juiz Federal Luiz Carlos Canalli, por unanimidade, juntado aos autos em 11/06/2013). Registros de certidão negativa de propriedade imobiliária, por exemplo, não se mostram suficientes, por si sós, para comprovar a alegada incapacidade econômica.

De fato, as circunstâncias da prática delitiva demonstram a inadequação do valor estabelecido a título de fiança. Com efeito, o valor fixado se revela elevado para ser adimplido com renda auferida com a profissão de" cozinheiro ".

Cumpre esclarecer que esta Corte, seguindo precedentes de Tribunais Superiores, sempre decidiu pelo descabimento da manutenção da prisão preventiva de acusados que, em razão da impossibilidade financeira de recolherem o valor arbitrado a título de fiança, fossem permanecer presos indefinidamente em razão da falta de pagamento.

O recente julgamento realizado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça determinando a concessão de liberdade provisória aos acusados que estivessem presos em razão do não pagamento de fiança, no meu ponto de vista, segue essa mesma linha de raciocínio - o acusado não deve permanecer preso apenas por não possuir condições de pagar a fiança estabelecida.

Confira-se trechos do inteiro teor do julgamento referido:

Nos termos em que preconiza o Conselho Nacional de Justiça em sua Resolução, não se mostra proporcional a manutenção dos investigados na prisão, tão somente em razão do não pagamento da fiança, visto que os casos – notoriamente de menor gravidade – não revelam a excepcionalidade imprescindível para o decreto preventivo.

Ademais, o Judiciário não pode se portar como um Poder alheio aos anseios da sociedade, sabe-se do grande impacto financeiro que a pandemia já tem gerado no cenário econômico brasileiro, aumentando a taxa de desemprego e diminuindo ou, até mesmo, extirpando a renda do cidadão brasileiro, o que torna a decisão de condicionar a liberdade provisória ao pagamento de fiança ainda mais irrazoável.

(...)

... concedo a ordem para determinar a soltura, independentemente do pagamento da fiança, em favor de todos aqueles a quem foi concedida liberdade provisória condicionada ao pagamento de fiança no estado do Espírito Santo e ainda e encontram submetidos à privação cautelar de liberdade em razão do não pagamento do valor.

Da análise dos trechos acima verifica-se que o objetivo é conceder a liberdade aos acusados que não conseguiram arcar com o valor da fiança, e apenas por tal motivo ainda estão presos.

Esse parece ser o caso dos autos.

Ademais, o impetrante acostou aos autos extratos de pagamento ao paciente, do auxílio emergencial do Governo Federal, demonstrando transparência quanto à prova de hipossuficiência (evento 1, OUT4).

Por derradeiro, cumpre lembrar que, em face da situação excepcional do estado de calamidade pública diante da pandemia de COVID-19, estão sendo adotadas uma série de medidas para evitar o contato, a aglomeração e a circulação de pessoas.

Em virtude dessa peculiar situação, o CNJ recomenda que se adotem medidas para proteger a vida e a saúde das pessoas privadas de liberdade e que se reduzam as aglomerações nas unidades prisionais (Recomendação nº 62, de 17/03/2020).

Feitas essas considerações, conclui-se que, na espécie, há constrangimento ilegal a ser sanado na via do habeas corpus, devendo ser revogada a custódia cautelar.

Nessas condições, deve ser dispensado o pagamento da fiança arbitrada, sem prejuízo da aplicação de medidas cautelares diversas da prisão que o magistrado de origem entender convenientes.

Ante o exposto, defiro o pedido liminar.

Comunique-se imediatamente ao juízo a quo.

Intime-se.

Dê-se vista ao Ministério Público Federal.

Após, voltem conclusos para julgamento.


Documento eletrônico assinado por NIVALDO BRUNONI, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo , inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003035990v7 e do código CRC b4b1bff6.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): NIVALDO BRUNONI
Data e Hora: 27/1/2022, às 9:48:47

40003035990 .V7

Conferência de autenticidade emitida em 28/01/2022 21:04:03.

Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trf-4/1363181757/inteiro-teor-1363181869

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