Busca sem resultado
jusbrasil.com.br
17 de Junho de 2024
    Adicione tópicos

    A Imunidade Tributária Implícita do Mínimo Existencial na Constituição da República Federativa do Brasil

    há 3 anos

    RESUMO

    O presente trabalho tem como cerne identificar se há previsão na Constituição da Republica Federal do Brasil de 1988 da imunidade tributária do mínimo existencial, quais são os princípios e valores constitucionais que sustentam e se compreende todas as espécies tributárias. A tese é que a Constituição estabeleceu imunidades tributárias específicas a determinadas espécies tributárias sobre o mínimo existencial, mas que não há normativa expressa de desoneração tributária com fulcro no mínimo existencial aos tributos em geral, portanto, apenas de forma implícita que poderia chegar a esta conclusão. Assim,analisa-se o os princípios da capacidade contribuitiva, da isonomia e da vedação do tributo com efeito de confisco, em vista da proteção ao mínimo existencial, eis que sendo limitações constitucionais ao poder de tributar. Ademais, indaga-se se o legislador constituinte protegeu o mínimo existencial sob o sustentáculo de tais princípios e da proteção da dignidade da pessoa humana, como forma de promover e manter o direito ao mínimo existência, que se trata de núcleo irredutível da dignidade da pessoa humana.

    Palavra-chave: Imunidade. Mínimo Existencial. Dignidade da Pessoa Humana. Desoneração Tributária. Capacidade Contribuitiva. Vedação do Tributo com Efeito de Confisco.

    ABSTRACT

    The core of this course completion paper is to identify whether there is a provision in the Constitution of the Federal Republic of Brazil of 1988 for tax immunity of the existential minimum, what are the constitutional principles and values that support and if it includes all tax species. The thesis is that the Constitution established specific tax immunity for certain tax species regarding the existential minimum, but that there is no express normative of tax exoneration based on the existential minimum for taxes in general, therefore, only in an implicit form could this conclusion be reached. Thus, the principles of the contributive capacity, of isonomy, and of the prohibition of confiscatory taxes are analyzed, in view of the protection of the existential minimum, since they are constitutional limitations to the power to tax. Moreover, the question is whether the constituent legislator protected the existential minimum under the support of such principles and the protection of human dignity, as a way to promote and maintain the right to minimum existence, which is the irreducible core of human dignity.

    KEYWORDS: Immunity. Existential Minimum. Dignity of the Human Person. Tax Exemption. Contribution capacity. Prohibition of taxation with confiscation effect

    SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO 6

    2 DESENVOLVIMENTO 9

    2.1 DO CONSTITUCIONALISMO9

    2.1.1 Do Neoconstitucionalismo 11

    2.1.2 Da Constitucionalização do Direito12

    2.2 DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NA CONSTITUIÇÃO13

    2.2.1 Das Espécies Tributárias16

    2.2.2 Da Limitação Constitucional ao Poder de Tributar24

    2.3 DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA 27

    2.3.1 Da Hierarquia Constitucional da Imunidade Tributária 30

    2.3.2 Das Cláusulas Pétreas 32

    2.3.3. Interpretação e aplicação das Imunidades Tributárias34

    2.4 DOS PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS CONSTITUCIONAIS36

    2.4.1 Da Isonomia Tributária36

    2.4.2 Da Capacidade Contribuitiva e o Mínimo Existencial39

    2.4.3. Princípio da Vedação do Tributo com Efeito de Confisco46

    2.5 DA INTRIBUTABILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL50

    2.5.1. Da Dignidade da Pessoa Humana55

    2.5.2 Da Imunidade Tributária Implícita do Mínimo existencial na Constituição Federal de 198857

    3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 64

    1 INTRODUÇÃO

    As imunidades tributárias são hipótese de incompetência tributária, na qual o ente federado que possui o poder tributário de cobrar determinado tributo vê-se diante de uma limitação constitucionalmente estabelecida, é, pois, a imunidade tributária que define os contornos da competência tributária, exclui hipóteses que prima face estaria dentro da competência tributária de determinado ente público. Assim, em suma, a imunidade tributária define hipóteses de intributabilidade de determinadas situações e espécie tributária.

    Neste contexto, denota-se que o sistema tributário constitucional adotou a teoria pentapartida, de modo que tributo é o gênero na qual deriva cinco espécies tributárias, que são os impostos; taxas; contribuições de melhoria; empréstimo compulsório e contribuições especiais. Posto isto, as imunidades tributárias podem ser estabelecidas apenas a determinado tributo, taxa, nas situações constitucionalmente delimitadas, assim denomina-se imunidade tributária específica, do contrário, há as imunidades genéricas que afastam a incidência tributária de mais de uma espécie tributária.

    Ademais, as imunidades tributárias tem seu fundamento em princípios constitucionais, à guisa de exemplo a imunidade tributária recíproca que veda a cobrança de impostos de um ente federado sobre o outro, conforme disposto no art. 150, VI, a, da CF/88, tem sua fundamentação ontológica no pacto federativo, de modo que um ente federado não possa influir no patrimônio do outro, garantindo-se, por conseguinte, autonomia financeira, o que é imprescindível em uma federação.

    Assim, as imunidades se fundamentam nos próprios princípios constitucionais e podem ser expressas, isto é, aquelas que estão explicitamente estabelecidas nos dispositivos constitucionais, que o método de interpretação literal consegue extrair a norma de desoneração tributária do texto constitucional, do outro lado, há as imunidades tributárias implícitas, que simbolizam normas de imunidade tributária que são extraída de princípios constitucionais, que por meio da interpretação literal se quer poderia chegar nesse sentido, assim, exige-se do interprete a utilização de métodos de hermética clássico, respectiva a intepretação sistemática, que analisa o direito a partir de um todo e não por meio de dispositivos isolados, e a teleológica, que buscar a ratio essendi da norma, a razão de sua criação, para que se tenha o seu efetivo alcance que o legislador supôs, sob o fito de recrudescer a força normativa da constituição, in casu dos princípios constitucionais, e harmonizar a dispositivos constitucionais.

    Neste sentido, este trabalho versa sobre o do mínimo existencial, que decorre do princípio e fundamento da República do Brasil – a dignidade da pessoa humana, que em síntese, compreende a satisfação e manutenção dos direitos básicos para que se tenha uma existência com dignidade. Portanto, busca-se analisar a existência da imunidade tributária do mínimo existência, se há de forma explícita no texto constitucional ou se é possível extrair a indigitada imunidade dos princípios constitucionais que limitam o poder de tributar, deste modo, implícito.

    Assim, tem como objetivo identificar a imunidade tributária do mínimo existencial na Constituição Federal de 1988.

    Para tanto, analisa-se na primeira seção, o constitucionalismo, isto é, o movimento de limitação do poder absoluto do Estado – em razão do regime monárquico à época –, que colimou no processo de criação das constituições, como forma de conter o poder do monarca. Ademais, investiga-se o movimento neoconstitucionalista, que buscou aproximar a moral do direito, com a ínsita preocupação de um direito justo, moral, que respeite os direitos fundamentação, principalmente das minorias. E ainda, aponta-se o processo de constitucionalização do direito, de modo que, exige-se uma reinterpretação dos demais ramos do direito à luz da constituição – que simboliza o centro do ordenamento jurídico.

    Na segunda seção, aborda-se o sistema tributário constitucional que define e limita o poder tributário do Estado, deste modo trata-se de poder que deve respeitar os contornos constitucionais na atividade tributária e mais, analisa-se as espécies tributárias, qual a teoria adotada no sistema tributário brasileiro e, por fim, os princípios básicos das limitações constitucionais ao poder de tributar.

    Na terceira seção, investiga-se as imunidades tributárias, qual a ratio essendi da imunidade tributária necessitar de hierarquia constitucional, analisa-se se as imunidades são cláusulas pétreas e qual o método de interpretação e aplicação das normas de imunidade tributária.

    Na quarta seção, vislumbra-se os principais princípios tributários que sustentam a tese adota neste trabalho de conclusão de curso, assim o princípio da isonomia e da capacidade contribuitiva, investiga-se também a existência no ordenamento jurídico brasileiro do mínimo existencial, quais os princípios constitucionais o sustentam e sua ligação com o princípio da vedação do tributo como efeito de confisco.

    Por fim, na última seção, analisa-se a intributabilidade do mínimo existencial na constituição, tanto de forma expressa quanto implícita, para tanto, investiga-se de forma ontológica o princípio da dignidade da pessoa humana e os princípios constitucional que estruturam a presente tese.

    E assim, o presente trabalho almeja responde o problema cientifico, e por conseguinte, se há a imunidade tributária do mínimo existencial, através de método de revisão bibliográfica.

    2 DESENVOLVIMENTO

    2.1 DO CONSTITUCIONALISMO

    O constitucionalismo, no sentido mais amplo, se refere a existência de uma constituição nos Estados, e no sentido mais restrito está associada a separação de poderes, de modo que a constituição é utilizada como instrumento de limitação do poder estatal e proteção das liberdades, portanto, contrapõe-se ao absolutismo. (NOVELINO, 2020).

    Nas lições de André ramos Tavares há quatro acepções do constitucionalismo:

    Numa primeira acepção, emprega-se a referência ao movimento político-social com origens históricas bastante remotas que pretende, em especial, limitar o poder arbitrário 1. Numa segunda acepção, é identificado com a imposição de que haja cartas constitucionais escritas 2. Tem-se utilizado, numa terceira concepção possível, para indicar os propósitos mais latentes e atuais da função e posição das constituições nas diversas sociedades 3. Numa vertente mais restrita, o constitucionalismo é reduzido à evolução histórico constitucional de um determinado Estado. (TAVARES, 2020, pág. 72).

    Assim, a existência de uma constituição em determinado estado representa invariavelmente a limitação ao poder estatal ou autoritário e respeito aos direitos fundamentais. (LENZA, 2016). Posto isto, observa-se que a constituição desempenha diversas funções essenciais do estado, seja organizando e estruturando o poder político ou na perspectiva jurídica de legitimação da ordem normativa; ofertando a estabilidade; afirmando a identidade política do Estado; reconhecendo e protegendo os direitos fundamentais; e, ainda, estabelecendo normas programáticas de fins a se perseguir (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).

    Nesta senda, a função que mais se destaca é a limitação e controle do poder, que está diretamente relacionado a separação dos poderes e das garantias fundamentais, visto que historicamente o constitucionalismo nasceu como forma de combater o absolutismo, deste modo a constituição vem e se estabelece como democraticamente legitima, dado que seu texto resultado do consenso, que consolidou regras e princípios, a estrutura do Estado, valores substanciais, emanados da vontade popular. Ademais, ante a supremacia constitucional, garante-se a estabilidade das normas constitucionais, visto que nas constituições rígidas o processo legislativo de alteração das normas é mais dificultoso em comparação as outras espécies legislativas, e ainda há limites formais e matérias para o processo de alteração das normas constitucionais (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018), sua razão:

    [...] guarda relação com outra função relevante das constituições, designadamente, a de ser simultaneamente símbolo, garantia e instrumento de afirmação da identidade da ordem jurídica e política instaurada mediante o processo constituinte. Nesse contexto, é preciso ter em conta que na e por meio da constituição as sociedades politicamente organizadas alcançam determinada identidade, que as distingue entre si, identidade que, por sua vez, é assegurada enquanto a constituição estiver em vigor e na medida em que forem respeitados os limites materiais (explícitos e implícitos à reforma constitucional. (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018, pág. 93)

    E mais, também desempenha a constituição a função de estruturar e organizar os poderes, pois fixa as competências, estrutura e organiza o poder político, impõe responsabilidade e define o controle e o modo de criação órgãos e pessoas jurídicas. E, além disso, é o fundamento de validade das normas, impondo a forma de criação e a necessária conformação no plano horizontal, sob pena de ter-se por invalida a norma (SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2018).

    Desta forma, como o constitucionalismo marcou o nascimento do direito constitucional, pode-se definido este como “ramo do direito público (gênero próximo) que tem por objeto o estudo sistematizado das normas supremas originárias e estruturantes do Estado (diferença Específica)” (NOVELINO, 2020, pág. 40). Portanto, a Constituição é uma norma jurídica formal, que estrutura o Estado e serve de fundamento de validade as demais normas infraconstitucionais.

    Destarte, conclui-se que, o constitucionalismo surgiu como movimento político, jurídico e ideológico com a precípua tarefa de limitar o poder político, buscando uma superação do absolutismo reinante na época, que culminou, na sua maioria, em uma democracia popular, eis que resultou do consenso popular, e também objetificou também estruturar os poderes políticos, atribuir responsabilidade e proteger os direitos fundamentais.

        1. Do Neoconstitucionalismo

    A partir do século XXI, na pós segunda guerra mundial, o constitucionalismo recebeu novos contornos, denominado neoconstitucionalismo, constitucionalismo pós-moderno ou pós-positivismo. Assim, acresce-se a seu escopo de limitação do poder político para também preocupar-se com a eficácia da Constituição, para que ela não seja mera folha de papel recheada de retóricas atraente aos olhos de quem lê e padecida em sua eficácia (LENZA, 2016).

    Deste modo, o neoconstitucionalismo:

    [...] é propulsionado pelos seguintes aspectos: a) falência do padrão normativo, que fora desenvolvido no século XVIII, baseado na supremacia do parlamento; b) influência da globalização; c) pós-modernidade; d) superação do positivismo clássico; e) centralidade dos direitos fundamentais; f) diferenciação qualitativa entre princípios e regras; g) revalorização do direito. (AGRA; 2018, pág. 81);

    A filosofia que embasou o neoconstitucionalismo é o pós-positivismo, que é visto como a terceira via entre a filosofia positivista e jusnaturalista, a primeira buscou afastar o direito da moral restringindo o direito a aquele posto pelo Estado, na segunda, prega-se a existência de um direito natural, de valor transcendental que é eterno e imutável, já no pós-positivismo objetivou-se uma releitura do direito sob a perspectiva moral, assim, buscou a (BARROSO; 2018):

    [...] reentronização dos valores na interpretação jurídica, com o reconhecimento de normatividade aos princípios e de sua diferença qualitativa em relação às regras; a reabilitação da razão prática e da argumentação jurídica; a formação de uma nova hermenêutica; e o desenvolvimento de uma teoria dos direitos fundamentais edificada sobre a dignidade da pessoa humana. Nesse ambiente, promove-se uma reaproximação entre o Direito e a Ética. (BARROSO; 2018, pág. 534).

    Desta forma, o neoconstitucionalismo aproxima o direito da moral por meio da “[...] incorporação dos valores morais nas constituições por meio de princípios e direitos fundamentais, pontes necessárias entre as duas esferas” (NOVELINO; 2020, pág. 67). Assim, com a incorporação dos valores morais nos textos constitucionais o julgador que aplicar o preceito moral incorporado está apenas aplicando o direito, pois quando incorporado reconhece-se o caráter normativo do preceito moral, de modo que, ao contrário, tem-se por indevido aplicar conceitos morais externos, isto é, aqueles não incorporados no texto constitucional, visto que não ostentam normatividade (NOVELINO; 2020).

    Posto isto, o novo constitucionalismo é axiológico, isto é, no constitucionalismo clássico as normas infraconstitucionais e constitucionais se diferenciavam apenas em sua hierarquia, já no neoconstitucionalismo a constituição se torna valor em si mesmo (AGRA; 2018).

    Portanto, o neoconstitucionalismo objetivou atribuir normatividade aos preceitos morais por meio de regras e princípios constitucionais, assim, indubitavelmente, promoveu uma reinterpretação do direito, que não contrasta com o positivismo, que nesta nova acepção de aproximação do direito da moral é denominado pós-positivismo, pois ao julgado quando aplica preceitos morais que estão incorporados está aplicando o direito, eis que dotado de normatividade, reafirmando a força normativa da constituição .

        1. Da Constitucionalização do Direito

    A constitucionalização do direito é o fenômeno que se apresenta como superação da concepção de uma constituição meramente formal para então se tornar o centro do ordenamento jurídico impactando as demais áreas do direito, exigindo-se um filtro de interpretação a luz dos preceitos constitucionais, o que ocorreu, no Brasil, especialmente com a Constituição de 1988 (BARROSO, 2018).

    Assim,

    [...] a Constituição passou a desfrutar, além da supremacia formal que sempre teve, também de uma supremacia material, axiológica, potencializada pela abertura do sistema jurídico e pela normatividade dos princípios. Compreendida como uma ordem objetiva de valores, transformou-se no filtro através do qual se deve ler todo o ordenamento jurídico. (BARROSO; 2018, pág. 535).

    Deste modo, a Constituição passa a ser um sistema unificado que irradia efeitos sobre os demais ramos do Direito, o que se denota um efeito expansivo das normas constitucionais condicionando a validade das normas infraconstitucionais, que devem estar em consonância aos preceitos constitucionais sob pena de ter-se a norma inaplicada por vício de inconstitucionalidade material. Posto isto, observa-se que qualquer interpretação do direito deve ser elaborada a luz do direito constitucional, portanto, interpretar o direito infraconstitucional é direta ou indiretamente interpretar a Constituição (BARROSO, 2018).

    Por esta razão revela-se inadequado a vetusta dicotomia do direito público e privado, isso porque qualquer ramo do direito deve ser interpretado a luz das normas constitucionais, daí então falar do direito civil constitucional, visto que se exige uma releitura dos institutos do direito privado sob um prisma constitucional, o que pode, inclusive, culminar na aplicação direita dos direitos fundamentais nas relações privadas, denominada eficácia horizontal dos direitos fundamentais. Portanto, tem-se por inconcebível a dicotomia público e privado, seja em razão do princípio da unidade do ordenamento jurídico ou, em razão, do caráter da Constituição como norma que irradia efeitos aos demais ramos do direito e que condiciona a sua validade. (LENZA, 2016).

    Posto isto, conclui-se que, a expansão do direito constitucional implicou numa Constituição extensão abarcando regras e princípios que no início eram do direito privado, o que impactou todo os ramos do direito, exigindo-se além da hermenêutica tradicional na aplicação do direito um filtro de constitucionalidade, que de fundo revela a onipresença constitucional, isso porque na aplicação do direito seja direta ou indiretamente incidirá regras ou princípios constitucionais, que validará a norma infraconstitucional ou invalidará por contrastar com suas disposições.

      1. DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NA CONSTITUIÇÃO

    O sistema tributário Nacional

    [...] é o conjunto de normas constitucionais de natureza tributária, inserido no sistema jurídico global, formado por um conjunto unitário e ordenado de normas subordinadas aos princípios fundamentais, reciprocamente harmônicos, que organiza os elementos constitutivos do Estado, que outra coisa não é senão a própria Constituição.

    O que existe, portanto, é um sistema parcial (sistema constitucional tributário) dentro de um sistema global (sistema constitucional). (HARADA, 2016, pág. 388).

    Assim, os princípios constitucionais delimitadores da tributação, o exercício da competência tributária, bem como espécies tributárias federais, estaduais e municipais consubstanciam o sistema tributário nacional, que estão insculpidos na Constituição Federal e regulamentado pela Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – denominado Código Tributário NacionalCTN, que em que pese originariamente concebido como lei ordinária tem status de lei complementar em razão da recepção constitucional (HARADA, 2016).

    Neste passo, os tributos são receitas derivadas, isto é, são derivadas do patrimônio do particular regidas pelo regime de direito público, de forma que o Estado utiliza do seu poder de império para compelir o particular a contribuir, prescindível, pois, a vontade do contribuinte (ALEXANDRE, 2020). E assim o Código Tributário Nacional define que “Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada” (BRASIL, 1966, art. 3º).

    Posto isto, extrai-se que, tributo é prestação pecuniária compulsória, não é multa, é instituído por meio de lei e é cobrado mediante lançamento.

    Em relação a primeira característica do tributo – prestação pecuniária compulsória, o dispositivo legal visou realçar que o tributo é pago por meio de dinheiro, isto é, na moeda corrente não de forma in natura ou in labore, contudo, acresça-se que, no art. 162 do CTN (BRASIL, 1966) o dispositivo legal permite o pagamento do tributo por meio de cheque e de vale postal e, nos casos previstos em lei, em estampilha, papel selado ou por meio de processo mecânico. Ademais, o tributo é compulsório, não há relação contratual ou o consenso do contribuinte, pois prevalece a supremacia do interesse público sobre o privado, de forma que é imposto o tributo ao contribuinte de forma unilateral pelo Estado, independente da sua vontade em contribuir, nesse sentido “não há o que se optar pelo pagamento do tributo, mas a ele se submeter, uma vez ínsita a sua natureza compulsória. Por isso, valendo-se de expressão neológica, tributo é prestação acontratual” (SABBAG, 2019, pág. 442).

    Na sua segunda característica – prestação diversa de multa, denota-se que tributo não se confunde com multa, em que pese ambos devam estar previstos em lei e sejam receitas derivadas, a diferença reside que, o tributo, não possui finalidade de sanção, isto é, não simboliza uma penalidade, apenas visa acarrear recursos aos cofres públicos para que o Estado preste os serviços públicos insculpidos no texto constitucional, de forma contrária a multa é a consequência da prática de um ato ilícito, que tem por finalidade justamente a coibição da conduta deletéria, assim o desejo do Estado ao instituir a multa é que ela não seja acarreado aos cofres (ALEXANDRE, 2020). Contudo, adverte-se que,

    A expressão não significa, necessariamente, que o tributo sempre pressupõe a licitude de ato que o gerou, como sustentado por alguns autores, mesmo porque os atos ilícitos são passíveis de tributação, sob pena de violação do princípio constitucional de isonomia. O que a expressão significa é que a cobrança de tributo não representa imposição de penalidade (HARADA, 2016, pág. 389).

    Quanto a terceira característica – instituído por meio de lei, assim significa que o tributo é obrigação ex lege, isto é, nasce a obrigação de pagar o tributo pela incidência da hipótese prevista em lei, irrelevante, pois, a vontade das partes, bastando que o comando legal assim descrimine a hipótese de incidência e ela ocorra no mundo dos fatos (SABBAG, 2019). Deste modo, a regra é que o tributo só pode ser criado por meio de lei, que decorre do princípio democrático, o povo cria seus próprios tributos que terá de pagar, o que é denominado no Direito Americano como no texation without representation – ,isto é, não há cobrança de tributo sem representação, regra esta que não comporta exceções, contudo, em relação as alíquotas, o princípio da legalidade é aplicado de forma mitigada, pois, a título de exemplo, a majoração ou redução das alíquotas dos impostos sobre importação ou exportação podem ser alteradas por decreto do Presidente da república (BRASIL, de 1988, art. 153, § 1º) (ALEXANDRE, 2020).

    No que toca a quarta característica – cobrada mediante lançamento, demonstra que

    o lançamento mostra-se como procedimento de exigibilidade do tributo. Consuma-se em ato documental de cobrança por meio do qual se pode quantificar (quantum debeatur) e qualificar (an debeatur) a obrigação tributária que lhe é preexistente (SABBAG, 2019, pág. 446).

    Ademais, atividade de lançamento é plenamente vinculada, assim não há facultatividade da autoridade fiscal em lançar ou não, não há discricionariedade, a autoridade deve lançar, visto que na sua omissão configura o crime próprio de previsto no art. da Lei de Crimes contra a ordem tributária (Brasil, Lei n. 8.137 de 1990), deste modo, ocorrido o fato gerador é imperativo o seu lançamento sob pena de ter de configuração de crime funcional (ALEXANDRE, 2020).

    Por último, ressalta-se que, o lançamento não é

    [...] ato autoexecutório, ou seja, não pode ser executado de plano. Assim, o contribuinte pode desviar-se do pagamento do tributo, caso dele discorde, e discuti-lo administrativamente e judicialmente, não devendo ser alvo implacável de atos autoexecutáveis de coerção, que visem compeli-lo, coativamente, a efetuar o recolhimento do gravame. (SABBAG, 2019, pág. 446).

    Do exposto, vislumbra-se que o tributo é prestação pecuniária, assim deve ser pago em moeda, ressalvada disposição legal em contrário, é compulsório, de modo que é irrelevante a vontade da parte, constituindo em uma obrigação ex lege, isto é, que nasce da lei, ademais, o tributo não simboliza sanção por ato ilícito, visto que visa apenas carrear dinheiro aos cofres públicos para o custeio das atividades desempenhadas pelo Estado, é instituído por meio de lei, de forma que o povo, por meio de seus representantes, cria tributos que terá ele mesmo que pagar, e, por fim, é cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada, assim ocorrido o fato gerador é imperativo o lançamento por meio da autoridade fiscal competente, que deverá lançar o tributo sob pena de não fazendo cometer crime funcional, o que conferirá exigibilidade, o que não se confunde com executoriedade do qual o tributo não é revestido.

        1. Das Espécies Tributárias

    Destaca-se que, tributo é o gênero que não se confunde com as espécies tributárias, na qual no Código Tributário Nacional aponta a existência de três, quais sejam impostos, taxas e contribuição de melhoria – a luz da teoria tripartite. Assim, diversos autores na seara tributária nega o caráter tributário do empréstimo compulsório, contudo não é a posição dominante (HARADA, 2016).

    Pois, “segundo o entendimento doutrinário dominante, defende-se que subsistem 5 (cinco) espécies tributárias, autônomas e inconfundíveis, no atual sistema tributário constitucional brasileiro, à luz da intitulada teoria pentapartida” (SABBAG, 2019, pág. 467). Assim, em que pese o Código Tributário Nacional faça menção a apenas três espécies tributárias, a doutrina majoritária e o próprio Supremo Tribunal Federal, interpretando o CTN à luz da constituição aponta a existência de cinco espécies tributárias.

    Isto posto, a teoria pentapartite aponta a existência de cinco espécies tributárias autônomas: impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições. Deste modo, considera os três impostos previsto no CTN, denominados não finalísticos, que em suas características intrínsecas é identificado pelo fato gerador e não considera “a denominação e demais características formais adotadas pela lei” BRASIL, 1966 - CTN, art. , I) e “a destinação legal do produto da sua arrecadação” (BRASIL, 1966 - CTN, art. , II), e mais, a teoria aludida prestigia também (SABBAG, 2019)

    os tributos finalísticos – os empréstimos compulsórios e as contribuições (art. 149 da CF)–, ou seja, exações em que a denominação e a destinação são destacadas pelo próprio legislador constituinte, não tendo relevância para a identificação do fato gerador do tributo, como ocorre com os impostos, taxas, e contribuições de melhoria (SABBAG, 2019, pág. 472).

    Ainda, fala-se em uma outra corrente doutrinária que aponta que, com a Emenda Constitucional 39/2002 – que instituiu a Contribuição para o Serviço de Custeio e Iluminação Pública (COSIP), cuja competência detêm os Municípios e o Distrito Federal –, tem-se seis espécies tributária, denominada teoria hexapartida, pois a referida exação se diferencia das demais espécies tributárias. Entretanto, ressalta-se, a teoria pentapartida é a majoritária (SABBAG, 2019).

    Doravante, analisando-se a espécie tributária – imposto –, é o tributo cujo o fato gerador independe da atuação estatal específica, tributa-se o fato do contribuinte, previsto no art. 16 do CTN (BRASIL, 1966), assim

    Impostos (art. 145, I, da CF) são exações desvinculadas de qualquer atuação estatal, decretadas exclusivamente em função do jus imperii do Estado. Seu fato gerador é sempre uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. O imposto sempre representa uma retirada da parcela de riqueza do particular, respeitada a capacidade contributiva deste. (HARADA, 2016, pág. 392).

    Deste modo, trata-se de um tributo não vinculado a uma atividade estatal, que recaí exclusivamente à atividade do particular, de modo que basta a incidência do fato gerador praticado pelo contribuinte para que surja a obrigação principal de pagar o tributo, independentemente de qualquer vantagem, por isso diz-se que se trata de tributo unilateral, pois não há causa ou contraprestação, apenas a obrigação desvinculada de qualquer bônus (SABBAG, 2019).

    Ademais,

    Insta mencionar que o imposto é, concomitantemente, exação não vinculada e gravame de arrecadação não afetada. É que a receita dos impostos visa custear as despesas públicas gerais ou universais, v.g., educação, segurança pública, limpeza pública etc. além disso, a receita do imposto não pode ser atrelada a qualquer órgão, fundo ou despesa, à luz da proibição derivada do princípio da não afetação, previsto no inciso IV do art. 167 da Carta Magna [...]. (SABBAG, 2019, pág. 475-476)

    Portanto, o art. 167, IV da CF/ 88 república (BRASIL, 1988) veda a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa, assim os impostos não têm destinação específica, de modo que o valor arrecadado é direcionado a um conjunto de receitas apta a adimplir o conjunto de despesas (SABBAG, 2019).

    E mais, a competência tributária privativa dos impostos são repartidos entre os entes federativos de direito público interno, isto é, União, Estado, Distrito Federal e Municípios, conforme disciplinado na Carta Magna (SABBAG, 2019).

    Adianta-se que, os impostos estão vinculados ao princípio da capacidade contribuitiva (que será trabalhado em tópico próprio), assim, sempre que possível será graduado segundo a sua capacidade contributiva (BRASIL, de 1988). Contudo, o parâmetro aludido só terá aplicabilidade se tratando de impostos pessoais, aqueles que considera aspectos pessoais na sua incidência tributária, isso porque se fosse imposto reais, isto é, aqueles que na sua incidência desconsidera a pessoa do contribuinte, com incidência objetiva, impossível seria sua aplicação (ALEXANDRE, 2020).

    Posto isto,

    O legislador ordinário, ao elaborar as leis que instituam impostos, deve obrigatoriamente verificar a possibilidade de conferir caráter pessoal ao tributo. Havendo viabilidade, a pessoalidade é obrigatória. A finalidade clara do dispositivo é dar concretude ao princípio da isonomia, tratando diferente quem é diferente, na proporção das diferenças (desigualdades) existentes. É uma maneira de buscar a justiça social (redistribuir renda) utilizando-se da justiça fiscal (paga mais quem pode pagar mais). (ALEXANDRE, 2020, pág. 59).

    Desta forma, apontou-se que os impostos independem da atividade estatal, portanto, trata-se de tributo não vinculado, o seu fato gerador está adstrito a atividade do particular e a Constituição Federal veda a vinculação da receita do imposto a órgão, fundo ou despesa, por fim, se tratar de impostos pessoas deve observar o princípio da capacidade contribuitiva.

    De outro lado, analisando-se a outra espécie tributária autônoma – a taxa –, se trata de espécie tributária vinculado a atividade estatal, o exercício do poder de polícia ou a utilização efetiva ou potencial de serviço público específico e divisível, que é prestado ao contribuinte ou posto a sua disposição, conforme assevera o art. 145, II da CF/88 (BRASIL, 1988) e o art. 77 do CTN (BRASIL, 1966).

    No que toca a competência para instituir e cobrar a taxa, o ente federado competente

    [...] é aquele que, utilizando legitimamente suas competências, presta o serviço ou exerce o poder de polícia. Como os Estados têm competência material residual, podendo prestar os serviços públicos não atribuídos expressamente à União nem aos Municípios (CF, art. 25, § 1º), a consequência é que, indiretamente a Constituição Federal Atribuiu a competência Tributária residual para instituição de taxas aos Estados. De acordo com esse entendimento, que não é pacífico na doutrina, a competência residual, em relação aos impostos, pertence à União, mas, quanto às taxas e às contribuições de melhoria, é atribuída aos Estados membros. (ALEXANDRE, 2020, pág. 60)

    Portanto, o ente federado competente para instituir a taxa é o ente federado que detêm a competência para execução do serviço ou o exercício do poder de polícia.

    Ademais, ante o caráter contraprestacional da taxa é também denominada de tributo retributivo, vez que só possível sua cobrança diante de uma atividade estatal, assim sempre se tem presente o fato do Estado.

    Na primeira hipótese, no exercício do poder de polícia, apto a ensejar a cobrança da referida exação, consiste numa atividade administrativa que limita ou disciplina direitos, liberdade ou interesse, que regula a abstenção de fato ou a prática de determinado ato, prevalecendo o interesse público sobre o privado, que pode ser de ordem sanitária, econômica, segurança pública e da propriedade, conforme fundamenta o art. 78 do CTN (BRASIL,1966). E mais, o poder de polícia deve ser exercido de forma regular e efetiva, visto que, apenas na prestação de serviços permite-se a cobrança pelo exercício potencial (ALEXANDRE, 2020).

    Na segunda hipótese, o serviço público, deve ser específico e divisível,

    Segundo o Código Tributário Nacional, os serviços são específicos quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidades públicas; são divisíveis quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários (art. 79, II e III). (ALEXANDRE, 2020, pág. 63)

    Ademais, conforme já alertado, tratando-se de serviços público é devida a cobrança seja na utilização efetiva do serviço público específico e divisível posto à disposição do contribuinte, ou mesmo sem a sua utilização, denominada utilização potencial. Assevera-se que, o serviço deve perpassar o interesse individual, de modo que interessa de forma translúcida a coletividade, isso porque caso o particular não se utiliza o serviço a cobrança ainda seria devida e o prejuízo reverteria a sociedade (ALEXANDRE, 2020).

    Portanto, conclui-se que, a taxa é tributo contraprestacional ou retributivo, é cobrada pela prestação de serviço público específico e divisível, que incide mesmo que o usuário não usufrua do serviço – utilização potencial –; tem por fato gerador também o exercício regular e efetivo do poder de polícia. Por fim, tem a competência indiretamente estabelecida de acordo com a competência para o exercício do poder de polícia ou da prestação do serviço, conforme disciplina a Constituição Federal.

    A outra espécie tributária – a contribuição de melhoria –, historicamente tem sua origem

    Em 1605, na Inglaterra, a Coroa inglesa realizou uma obra de grande porte e com enorme dispêndio de dinheiro para retificar e sanear as margens do Rio Tâmisa, tornando-o mais navegável e estimulando o incremento da atividade econômica nas áreas ribeirinhas. Os proprietários dos imóveis localizados nessas áreas foram muito beneficiados, pois passaram a ter suas terras, antes sujeitas a frequentes alagamentos, bastante valorizadas. Visando a sanar o enriquecimento sem causa, foi criado, por lei, um tributo (betterment tax), a ser pago pelos beneficiários, limitando ao montante da valorização individual. Nascia a contribuição de melhoria, até hoje responsável pelo financiamento de obras de grande vulto. (ALEXANDRE, 2020, pág. 76)

    Assim, de início, vislumbra-se que a contribuição de melhoria é uma espécie tributária que tem seu fundamento ético-jurídico na vedação ao enriquecimento sem causa, de modo que se trata de tributo vinculado a uma atividade estatal, qual seja, a realização de uma obra pública que tenha como sua consequência a valorização do imóvel do qual o contribuinte é proprietário, sendo está a característica fundamental e indispensável – a valorização imobiliária. (ALEXANDRE, 2020).

    Ademais, a contribuição é decorrência da obra pública, isto é, não se pode cobrar antecipadamente o tributo para a realização de uma futura obra, e ainda, há duas limitações ao valor do tributo, a individual que tem como seu teto a valorização for acrescida ao imóvel do contribuinte, e a total, que perfaz o valor total dos gastos com a referida obra, e por isso caracteriza-se como um tributo contraprestacional, visto que o valor arrecadado com a indigitada contribuição destina-se ao custeio da obra pública, não podendo exceder este valor (limite total). (ALEXANDRE, 2020).

    Posto isto, denota-se que a contribuição de melhoria é uma espécie tributária contraprestacional, decorrente da realização de obra pública que ocasione valorização imobiliária ao imóvel do contribuinte, não podendo o valor do referido tributo ser superior a valorização imobiliária individual (individual), nem ao total dos gastos com aludida obra (total), por fim, assevera-se que a competência para instituir é do ente responsável pela obra que ocasionou a valorização imobiliária.

    No que toca a outra espécie tributária – o empréstimo compulsório –, que tem seu fundamento no art. 148 da CF/88 (BRASIL, 1988), trata-se de tributo finalístico cuja a competência privativa da União, portanto, não pode os demais entes federados instituir, e ainda, tem como sua principal característica ser tributo adstrito as hipóteses extraordinárias e de caráter temporário, assim, impossível sua instituição nos casos de normalidade pública (SABBAG, 2019).

    E mais, tem como hipótese autorizadora para sua instituição a despesa extraordinária decorrente de guerra externa, o

    [...] pressuposto fático de “guerra” – ou, com maior rigor técnico, “conflito armado internacional” – cuja deflagração tenha sido perpetrada por nação estrangeira, independente de uma formal “declaração de guerra”. (SABBAG, 2019, pág. 575).

    Ou na hipótese de investimento público de caráter relevante,

    [...] tratar-se de investimento que se traduz em uma antecipação de receita de importe pecuniário, do patrimônio particular para os cofres estatais. Vale dizer que quilo que seria arrecadado, v.g., em vários anos poderá sê-lo em um par deles, com ulterior devolução. (SABBAG, 2019, pág. 575)

    E ainda, a despesa extraordinária decorrente de calamidade pública, que

    [...] não obstante a indeterminação do conceito, a despesa extraordinária decorrente de calamidade pública refere-se a situações limítrofes, indicadoras de catástrofes da natureza ou hecatombes avassaladoras (terremotos, maremotos, incêndios, enchentes catastróficas, secas transanuais, tufões, ciclones, etc.) (SABBAG, 2019, pág. 574)

    Por fim, destaca-se que, as hipóteses autorizadoras acima elencadas não se confundem com o fato gerador, no qual não foi explicitado pelo legislador, portanto, todos os seus elementos de incidência cabem a lei complementar definir (SABBAG, 2019).

    Posto isto, o empréstimo compulsório só pode ser instituído para atender as finalidades de despesas extraordinárias decorrente de calamidade pública ou guerra externa, e ainda no caso de investimento público de caráter relevante no âmbito nacional.

    No que toca a última espécie tributária – as contribuições especiais, que tem seu fundamento no art. 149 da CF/88 (BRASIL, 1988), a hipótese de incidência apta a enseja a referida exação é uma atuação estatal indiretamente vinculada ao contribuinte, inclusive de sua receita, o que e vedado nos impostos – ante o princípio da não afetação da receita (SABBAG, 2019).

    Assim,

    [...] o que marca indelevelmente as contribuições especiais é o que seu bolo de arrecadação deve ser carreado para o financiamento de atividades de interesse público, beneficiando certos grupos, e diretamente ou indiretamente, o contribuinte (SABBAG, 2019, pág. 590).

    Portanto, as contribuições destinam-se ao financiamento determinados gastos, no campo social e econômico, o que, de forma peculiar, entra no campo da parafiscalidade, isto é, o ente federado competente institui o tributo – in casu a contribuição especial –, contudo a atividade de arrecadação e fiscalização é realizada por outra pessoa, deste modo o ente político fica com a competência tributária enquanto a entidade paraestatal tem a capacidade tributária ativa, assim (SABBAG, 2019)

    Fiscal, no sentido de “Estado”. Parafiscal quer dizer “ao lado do fiscal”. Se é algo que anda paralelamente com o Estado, significa que não é, rigorosamente, igual ao Estado. É um quase Estado, uma “extensão” do Estado. Faz “as vezes” do Estado, tendo natureza tributária, em face de disposição constitucional. Por exemplo, as contribuições corporativas não integram o orçamento da Seguridade Social. No entanto, a Constituição as coloca no capítulo do sistema tributário, dando-lhes características que as identificam como de natureza tributária. (CASSONE, 2018, pág. 102)

    Desta forma, as contribuições especiais são arrecadas, em geral, de forma parafiscal em razão da atividade especialmente desempenhada, com a receita vinculada a uma atividade específica, que beneficia diretamente ou indiretamente o contribuinte.

    Posto isto, vislumbrou-se nesta seção as cincos espécies tributárias, conforme a teoria pentapartida adotada majoritariamente pela doutrina e pelo próprio Supremo Tribunal Federal, na qual as espécies tributárias são os tributos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições especiais e empréstimos compulsórios, sendo estes dois últimos tributos finalísticos previsto na CF/88.

        1. Da Limitação Constitucional ao Poder de Tributar

    Ab initio, as limitações constitucionais ao poder de tributar são considerados, em suma, princípios constitucionais tributários, o que não necessariamente corresponda em sua inteireza, visto que o art. 150 da CF/88 traz princípios, mas também regras, entre outros não elencados no indigitado dispositivo (PAULSEN, 2020). No entanto, aborda-se nesta seção os principais princípios tributários, sem prejuízo de em seções autônomas abordar outros, em razão do necessário desdobramento.

    O primeiro princípio tributário que se analisa – a legalidade –, decorre do art. 5, II, da CF/88 (BRASIL, 1988), que insculpe o indigitado princípio de forma genérica, que vem a ser especificado na seara tributária no art. 150, I, da mesma Carta Magna aludida. O que, de início, torna evidente que tributo é prestação que é instituída por lei.

    A respeito da espécie legislativa necessária,

    A lei em questão pode ser ordinária, sendo igualmente admitida a utilização de medida provisória. Para alguns tributos, contudo, exige-se processo legislativo mais rigoroso, sendo necessário a edição de lei complementar. É o que ocorre exclusivamente nos casos do Imposto sobre Grandes Fortunas (CF, art. 153, VII), dos empréstimos compulsórios (CF, art. 148), dos impostos residuais (CF, art. 154, I) e das contribuições residuais (art. 195, § 4º) (ALEXANDRE ,2020, pág. 135).

    Desta forma, a criação ou aumento de tributo está reservada a lei, excepcionada as situações que a Constituição dispensa tal formalidade, principalmente nos tributos extrafiscais, dado que sua principal função é estimular ou desestimular condutas e o aspecto fiscal fica em segundo plano. Assim, vislumbra-se que, a espécie legislativa necessária para a criação e aumento do tributo é a lei ordinária, que se ressalva as exações constitucionalmente estabelecidas (ALEXANDRE ,2020).

    O segundo princípio tributário que se analisa – o princípio da segurança jurídica –, decorre do preâmbulo da Constituição Federal que prenuncia a instituição do Estado democrático de direito, e em seus valores destaca a segurança jurídica. Assim, a segurança simboliza a ausência de perigo, de incerteza, carrega de forma ínsita a certeza e a confiança, por essa razão é considera um subprincípio do Estado de Direito (PAULSEN, 2020), pois

    O princípio da segurança jurídica demanda que o Direito seja compreensível, confiável e calculável o que só ocorre quando o indivíduo conhece e compreende o conteúdo do Direito, quando tem assegurados no presente os direitos que conquistou no passado e quando pode razoavelmente calcular as consequências que serão aplicadas no futuro relativamente aos atos que praticar no presente (ÁVILA, 2019, pág. 76).

    Assim, a certeza do direito, a legalidade, irretroatividade e anterioridade garante a aplicação uniforme do direito. Por este raciocínio, como sendo o direito tributário ramo do direito, a segurança jurídica se aplica, desta forma, deve-se respeitar em matéria de direito e processo tributário: a certeza do direito; a intangibilidade das posições jurídicas consolidadas; a estabilidade das situações jurídicas, por isso o CTN (BRASIL,1966) prevê prazos decadências para a constituição do crédito tributário – por meio do processo do lançamento administrativo – e prazos prescricionais para a exigência em juízo do indigitado crédito, ambos quinquenais; a proteção da confiança do contribuinte; o devido processo legal (PAULSEN, 2020).

    E dentro desta perspectiva o princípio da segurança jurídica se relaciona com o princípio da anterioridade de exercício financeiro que veda a cobrança do tributo no mesmo exercício financeiro que tenha sido publicado a lei, que aumentou ou instituiu, nos moldes do art. 150 da CF/88 (BRASIL, 1988). Assim,

    É importante ressaltar que o princípio existe para proteger o contribuinte, não impedindo, portanto, a imediata aplicação das mudanças que diminuam a carga tributária a que o contribuinte está sujeito (casos de extinção ou redução de tributos) ou que tenham qualquer impacto sobre essa carga tributária. Apesar de ser um posicionamento discutível, o Supremo Tribunal Federal entende que a norma que se restringe a mudar o prazo para pagamento de tributo, mesmo antecipando-o, não agrava a situação do contribuinte, não se sujeitando à regra da anterioridade de exercício. (ALEXANDRE, 2020, pág. 169).

    Posto isto, vislumbra-se que a segurança jurídica é um subprincípio do Estado de Direito, visto que indispensável para sua configuração a certeza do direito e o respeito as situações jurídicas consolidadas, que se projeta na seara tributária. Ademais, no direito tributário o princípio da segurança jurídica se relaciona também com o princípio da anterioridade de exercício financeiro, que veda a instituição ou majoração do tributo no mesmo exercício financeiro que tenha sido publicado a lei, aponta-se, contudo, que tal princípio não se aplica nos casos de diminuição, extinção ou alteração da data do pagamento, visto que visa proteger é o planejamento tributário do contribuinte para que não tenha surpresas em pagar mais tributo do que havia inicialmente planejado no ano.

    O terceiro princípio que se analisa é o – princípio da praticabilidade da tributação, visto que

    A atribuição de competência tributária aos entes políticos ocorre para que possam, legitimamente, buscar recursos no patrimônio privado para fazer frente aos gastos públicos com custeio e investimentos. O exercício da tributação não é um fim em si mesmo, mas um instrumento. Só se admite a intervenção no patrimônio das pessoas porque é necessário para o financiamento das atividades que cabe ao Estado promover. É essencial, por isso, que a tributação ocorra por mecanismos que lhe permitam chegar aos seus objetivos do modo mais simples, econômico, confortável e eficiente possível. (PAULSEN, 2020, pág. 188).

    Assim, sob a perspectiva deste princípio a tributação funciona como um meio para a consecução dos objetivos do estado, à guisa de exemplo, segurança pública, prestação de serviços públicos, portanto, não se deve admitir que a exação ultrapasse o montante indispensável ao enfrentamento dos gastos necessários, deste modo a tributação só se figura legítima quando se retira parcela do patrimônio do contribuinte, que é imprescindível para o custeio das atividades do Estado.

    Por fim, a última limitação constitucional ao poder de tributar que será analisada nesta seção é – o princípio da uniformidade geográfica da tributação –, que consiste na vedação da instituição de tributo que seja desigual no território nacional, ou que expresse preferência a distinção de tratamento de um ente federado em detrimento de outro, o que se ressalva os casos de incentivo fiscal, sob o fito de promover desenvolvimento socioeconômico, conforme disciplina o art. 151 da CF/88 (BRASIL, 1988).

    Assim,

    Não pode a União, portanto, estipular diferentes alíquotas do imposto de renda, nos distintos Estados da Federação. Caso a alíquota fosse menor, a título de exemplo, no Estado de São Paulo, os demais Estados Estariam sendo ilegitimamente diferenciados, o que poria em risco a Federação. O mesmo dispositivo prevê a regra traz também a exceção, ao permitir a diferenciação com a finalidade extrafiscal de diminuir as diferenças de desenvolvimento socioeconômico entre as diferentes regiões do país. (ALEXANDRE, 2020, pág. 191).

    Deste modo, tem-se que o princípio da uniformidade geográfica da tributação visa proteger o pacto federativo, exigindo-se tratamento uniforme para que não beneficie um e prejudique outro ente federado, o que fica ressalvado quando a finalidade é promover o desenvolvimento socioeconômico, isto é, para fins extrafiscais.

    Posto isto, vislumbrou-se nesta seção as principais limitações constitucionais ao poder de tributar, sem prejuízo de no decorrer deste trabalho apresentar outras, assim, conclui-se que o princípio da legalidade; da segurança jurídica; da anterioridade de exercício financeiro; da praticabilidade da tributação; da uniformidade tributária; define os contornos necessários que o tributo deve respeitar, exigindo-se lei para o aumento e majoração do tributo, respeito as situações juridicamente consolidadas, ao planejamento tributário do contribuinte – vedando-se surpresas de aumento do tributo durante o exercício financeiro –; que a retirada da parcela do patrimônio a título de tributo seja apenas o indispensável ao custeio das atividades exercidas pelo Estado e que a tributação seja uniforme em todo território nacional, em respeito ao pacto federativo.

      1. DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA

    Inicialmente, pontua-se que, a regra é o pagamento do tributo, de forma compulsória, visto que imposto pela lei sendo indiferente à vontade das partes em pagar, em consonância, pois, com o disposto na Carta Magna que prenuncia “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (BRASIL, Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988, art. , II), e sendo está a característica marcante do tributo – a compulsoriedade, dado que tributo é prestação pecuniária compulsória (BRASIL, 1966). E assim, de forma excepcionar a aludida regra, a imunidade tributária prima facie é o instituto apto dispensar o pagamento do tributo (ALEXANDRE, 2020).

    Nesta linha, pode-se afirmar que as imunidades “são limitações constitucionais ao poder de tributar consistentes na delimitação da competência tributária constitucionalmente conferida aos entes políticos” (ALEXANDRE, 2020, pag. 211), deste conceito extrai-se que a fonte das imunidades tributárias é a Constituição da Republica Federativa do BrasilCRFB/88, o que diferencia das normas de isenção tributária, visto que o que há é a dispensa legal do pagamento do tributo com sede infraconstitucional. Desta forma, conclui-se que a imunidade é constitucionalmente qualificada não se confundido com a isenção, visto que apresentam fontes normativas diversas (SABBAG, 2019).

    E ainda, a isenção representa a manifestação da competência tributária, obstando o lançamento em situações passíveis de tributação, em que há a dispensa do pagamento por mera escolha do ente federado que detêm a competência tributária, visto que a regra é a vedação das isenções heterônomas. A imunidade, do contrário, delimita a competência tributária, retirando a competência do ente tributante, consolida contribuintes, bens e rendas que não estão sujeitos ao poder de tributar do ente tributante. Assim, se deduz outra distinção, a imunidade tributária opera na com âmbito da delimitação negativa da competência tributária, enquanto a isenção no seu exercício (ALEXANDRE, 2020).

    Ademais, se de um lado a imunidade tributária demarca a competência tributária limitando hipóteses que prima face estaria dentro da competência tributária, de outro lado confere o direito público subjetivo do beneficiário a não ser cobrado pelo ente tributante, neste aspecto insta destacar que, a imunidade apenas atinge a obrigação tributária principal, de forma que se mantem incólume a obrigação tributária acessória (SABBAG, 2019), que consiste em uma

    prestação positiva ou negativa, que denota atos “de fazer” ou “não fazer” despido do timbre de patrimonialidade e dotado de viés de instrumentalidade. Assim, o agir, ou não agir, dissociado do ato de pagar, podem representar obrigações tributárias acessórias ou “deveres instrumentais do contribuinte”. (SABBAG, 2019, pág. 847)

    Posto isto, conclui-se que a imunidade abarca apenas a obrigação tributária principal, que representa o dever de pagar tributo ou penalidade pecuniária, conforme definido no art. 113, § 2º do Código Tributário Nacional - CTN (BRASIL, 1966), de modo que a imunidade tributária não dispensa o dever de sujeição a fiscalização ou exigência de exibição de documentos por parte do ente tributante.

    Noutro ponto, no que toca as espécies tributárias, quais sejam os impostos, taxas, contribuições e empréstimo compulsórios – sob a perspectiva da teoria quadripartite, as imunidades podem limitar a competência tributária para quaisquer espécie tributária, desde que assim prevista, conforme est disciplinado no art. , XXXIV da CRFB/88 a imunidade relativo a taxa, art. 150, VI relativo aos impostos, e no art. 195, § 7º referente a contribuição para a seguridade social – todos do mesmo diploma legal (BRASIL, 1988). Portanto, conclui-se que, a imunidade tributária pode alcança todas as espécies tributárias, desde que assim previsto na Carta Magna, o que não ocorreu com as imunidades previstas no art. 150, VI, da CRFB/88, pois, em sua literalidade, o texto constitucional restringe sua aplicação apenas aos impostos, denominada imunidade específica, visto que circunscrita a uma única espécie tributária (ALEXANDRE, 2020).

    Adiante, acresça-se que, as imunidades tributárias podem ser explícitas, isto é, aquelas previstas expressamente no texto constitucional, ou implícitas, pois não prevista expressamente, mas que podem ser extraídas de princípios previstos no texto constitucional, daí também ser denominada de imunidade ontológica, visto que se sustenta pela força de princípios estruturantes da carta magna (SABBAG, 2019), a título de exemplo há o celebre caso McCulloch vs. Maryland da imunidade tributária recíproca implícita no Direito norte-americano reconhecida pela Suprema Corte, dado que não há norma que imunize os entes federados de forma expressa na Constituição dos Estados Unidos da América, o que, contudo, não simbolizou óbice ao seu reconhecido, visto que a imunidade recíproca decorre diretamente do pacto federativo, pois tem-se por imaginável que numa federação uma esfera do governo, dotado de autonomia política, fique à mercê de outra (ALEXANDRE, 2020).

    Por fim, pode-se classificar a imunidade tributária em objetiva ou subjetiva, a primeira visa restringir da tributação bens, riquezas etc., isto é, seu escopo é excluir da tributação bens desconsiderando o seu titular. A outra, a subjetiva, é a imunidade concedida em razão da pessoa do contribuinte, que é o caso dos templos religiosos e dos entes federados (PAULSEN, 2020).

    Portanto, conclui-se que, as imunidades tributárias estão previstas na Constituição, o que se diferencia das regras de isenção tributária, ademais as regras imunizantes abarcam apenas a dispensa no pagamento do tributo, isto é, a obrigação tributária principal, assim não dispensa as obrigações tributárias acessórias, que consiste num fazer ou não fazer, e ainda observou-se que as imunidades alcançam todas as espécies tributárias desde que assim previstas, e por fim podem estar expressamente previstas na carta magna ou implicitamente por decorrer de princípios estruturantes.

        1. Da Hierarquia Constitucional da Imunidade Tributária

    Ab initio, a Constituição de 1988 é rígida, que “são aquelas Constituições que exigem, para a sua alteração [...], um processo legislativo mais árduo, mais solene, mais dificultoso do que o processo de alteração das normas não constitucionais” (LENZA, 2016, pág. 105), dado esta característica é lógico deduzir a supremacia ou hierarquia Constitucional, isto é, a necessária relação de conformidade entre as normas infraconstitucionais com a constituição, sob pena de padecer de vício de inconstitucionalidade, pois a Constituição é o fundamento de validade das demais normas, por esta razão é imprescindível uma Constituição rígida, pois sem ela a supremacia constitucional perderia sem sentido, visto que com uma constituição flexível o processo de alteração das normas constitucionais seria igual das normas infraconstitucionais (LENZA, 2016).

    Aliás, esta relação de conformidade já era observada pelo jurista Hans Kelsen, vejamos:

    A ordem jurídica, especialmente a ordem jurídica cuja personificação é o Estado, é, portanto, não um sistema de normas coordenadas entre si, que se acham, por assim dizer, lado a lado, no mesmo nível, mas uma hierarquia de diferentes níveis de normas. A unidade dessas normas é constituída pelo fato de que a criação de uma norma – a inferior – é determinada por outra – a superior – cuja criação é determinada por outra norma ainda mais superior, e de que esse regressus é finalizado por uma norma fundamental, a mais superior, que, sendo o fundamento supremo de validade da ordem jurídica inteira, constitui a sua unidade. (KELSEN, 1998, pág. 181)

    Portanto, em razão do caráter constitucional das normas imunizantes, qualquer outra lei ordinária ou de outra espécie legislativa infraconstitucional que venha de encontro com a imunidade tributária padecerá de inexorável inconstitucionalidade, em vista da supremacia constitucional. Ademais, por igual razão, a imunidade tributária tem status constitucionais, visto que opera no campo da delimitação da competência tributária, que representa a

    aptidão jurídica para criar, in abstrato, tributo, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus jeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas. Perguntar-se-á: quem a tem? As pessoas políticas – União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal -, que receberam do legislador constituinte a faculdade de instituir, em caráter privativo, todas as modalidades de tributos (impostos, taxas, contribuições de melhoria, empréstimos compulsórios e contribuições. (SABBAG, 2019, pág. 305)

    Assim, visto que a Constituição estabelece quais tributos cada ente federativo possui o poder de tributar, à guisa de exemplo o art. 155, II, da CF/1988 confere ao Estado a competência para instituir o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS, deste modo cada Estado possui a competência para instituir o ICMS sobre a circulação de mercadorias e serviços aludidos dentro do seu território, contudo, de forma a limitar, o art. 150, VI, a, da CF/1988, obsta a tributação sobre o patrimônio, renda e serviços dos entes federativos, um dos outros, denominada a imunidade tributária recíproca, em razão disso Estado não pode instituir o ICMS sobre a circulação de mercadorias e serviços indicados quando os Municípios, demais Estados ou outros entes federativos na qualidade de contribuinte de direito for o suposto sujeito passivo da relação jurídico tributária, deste modo a regra imunizante opera na restrição de hipóteses que prima facie estaria dentro da competência tributária do ente tributante, daí porque a imunidade tributária tem hierarquia constitucional, pois a competência tributária está estruturada na Carta Magna, portanto, qualquer norma apta a limitar ou restringir não poderia ser de ordem infraconstitucional, sob pena de padecer de vício de inconstitucionalidade material. (ALEXANDRE, 2020).

    Desta forma, assenta-se que, a supremacia constitucional, isto é, a necessária relação de conformidade da legislação infraconstitucional com a Constituição, esta intrinsicamente relacionada com uma constituição rígida, com um processo legislativo dificultoso, visto que este o fundamento que sustenta a obediência os preceitos constitucionais e garante a estabilidade, e ainda, considerando que a Constituição institui a competência tributária de cada ente federado qualquer norma apta a restringir a competência do ente tributante necessariamente tem que estar prevista na constituição, daí porque a imunidade ter status constitucional, pois delimita a competência do ente tributante, exclui, pois, hipóteses de incidência tributária que prima face estaria dentro da competência do ente tributante.

        1. Das Cláusulas Pétreas

    De início, salienta-se que, com a ruptura da Monarquia no brasil e o advento da República as sucessivas constituições estabeleceram vedações a deliberação de determinadas matérias com o objetivo de limitar o poder constituinte derivado reformador, que modifica a constituição por meio das emendas limitada pelas regras do poder constituinte originário (NOVELINO, 2020).

    Na CRFB/88 o art. 60, § 4º dispôs que

    Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

    § 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

    I - a forma federativa de Estado;

    II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

    III - a separação dos Poderes;

    IV - os direitos e garantias individuais. (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 60, § 4º)

    Assim, o aludido artigo consubstancia as cláusulas pétreas, que embora em sua interpretação literal vede a deliberação de tais regras e princípios, estes limites ao poder de reforma devem ser interpretados no sentido de preservar o seu núcleo essencial, ou seja, a intangibilidade dos princípios e institutos protegidos pelas cláusulas pétreas e não do seu texto literal (NOVELINO, 2020).

    Ademais, podem ser as cláusulas pétreas expressas, conforme acima descritas ou implícitas, estas últimas decorrem do núcleo “de legitimidade ao qual fazem referência as cláusulas pétreas expressas, mas que não se pode ter como indiscutivelmente comtemplados por elas” (NOVELINO, 2020, pág. 87), isto é, nas cláusulas pétreas implícitas há uma veiculação direta com os princípios protegidos pelas cláusulas explícitas, que faz transcender a identidade da constituição, operando-se a imutabilidade de tais valores. Nesta senda, o inciso Ido § 4º do art. 60 da CFRB/88 estabelece como cláusula pétrea expressa a forma federativa de estado, noutro giro, o art. da Constituição elenca os fundamentos da República Federativa do Brasil, quais sejam a soberania, cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político, estes por parte da doutrina seriam cláusulas pétreas implícitas por consubstanciar a identidade da constituição (NOVELINO, 2020).

    Adiante, no que toca as imunidades, estas representam limitações constitucionais ao poder de tributar, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal – STF, assim adquire o status de cláusula pétrea, isto porque protege a forma federativa de estado, in caso a imunidade tributária recíproca ou simboliza direitos garantias fundamentais, à guisa de exemplo, as imunidades dos templos religiosos ou da manifestação do pensamento veiculado em livro, conforme o rol disciplinado no art. 60, § 4º da CRFB/88 (BRASIL, 1988).

    Assim, a imunidade tributária visa a proteção de valores que representa a identidade da constituição, de modo que goza da manta da imutabilidade, portanto se quer por emendas constitucionais se poderia suprir as hipóteses consagradas como imunidades tributárias, deste modo, qualquer lei ordinária ou outra espécie legislativa, emenda constitucional, que suprimir seu núcleo intangível implicará em nulidade absoluta (SABBAG, 2019).

    Deste modo, depreende-se que a cláusula pétrea é o instituto estabelecido pelo poder constituinte originária, que tem como escopo vedar a modificação de preceitos constitucionais pelo poder constituinte derivado, que podem ser expressas ou implícitas, realça-se que, o que está protegido é o seu núcleo essencial e não seu texto literal, que pode ser modificado desde que preserve os princípios que a cláusula pétrea visa proteger, ademais, conclui-se que as regras de imunidade são limitações constitucionais ao poder de tributar, portanto, representam cláusulas pétreas, visto que no fundo visa proteger direitos e garantias fundamentais, assim assenta-se que as imunidades estão protegidas pelo manto da imutabilidade.

    2.3.3. Interpretação e aplicação das Imunidades Tributárias

    Na interpretação das imunidades impele destacar que o Código Tributário Nacional disciplina - CTN que

    A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias (BRASIL, 1966, art. 110)

    Assim, conclui-se que o CTN adotou a intepretação restritiva das imunidades, compelindo a adotar o sentido técnico expresso das normas imunizantes, contudo, em que pese diversos precedentes do STF em igual sentido, há outros que ampliam o alcance das regras das imunidades, a título de exemplo (PAULSEN, 2020):

    Recurso extraordinário com repercussão geral. 2. Imunidade recíproca. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. 3. Distinção, para fins de tratamento normativo, entre empresas públicas prestadoras de serviço público e empresas públicas exploradoras de atividade. Precedentes. 4. Exercício simultâneo de atividades em regime de exclusividade e em concorrência com a iniciativa privada. Irrelevância. Existência de peculiaridades no serviço postal. Incidência da imunidade prevista no art. 150, VI, a, da Constituição Federal. 5. Recurso extraordinário conhecido e provido (BRASIL, Supremo Tribunal Federal – Pleno, RE 601.392/PR - 2013).

    Assim, o STF estendeu a imunidade tributária recíproca, que na Constituição apenas abrange os entes políticos, autarquias e fundações públicos, que nestes dois últimos a Constituição restringe ao patrimônio, renda e serviços vinculados às suas finalidades essenciais (art. 150, § 2º CRFB/88), para englobar também as empresas públicas e sociedade de economia mista que exerça serviço público em regime de monopólio ou a título gratuito. Portanto, vislumbra-se que a jurisprudência do STF é oscilante, ora adota a intepretação restritiva das imunidades ora ampliativa, que segundo o doutrinador Leandro Paulsen entende que

    não é dado ao aplicador assumir qualquer premissa que o condicione a estender ou a restringir a norma que imuniza; deve, sim, perscrutar seu efetivo alcance considerando a regra de imunidade, seu objeto, sua finalidade, enfim, todas as técnicas interpretativas ao seu alcance (literal, sistemática, teleológica). (PAULSEN, 2020, pág. 155).

    Assim, conclui-se que, na interpretação das normas de imunidade tributária deve-se levar em consideração o fim da norma, os valores que de fundo são protegidos pela norma imunizante, como guia para que a norma alcance sua real finalidade.

    Por fim, no que toca a aplicação das normas imunizantes, em regra, destaca-se que são normas autoaplicáveis ou bastante em si, isto é, prescinde de regulamentação legislativa infraconstitucional para sua aplicação, dotada de aplicação imediata, ressalvada disposição constitucional que expresse a necessidade de regulamentação. Não obstante, tratando-se de norma de aplicação medita, isto é, com a necessidade de regulamentação infraconstitucional, queda-se no questionamento de qual a espécie legislativa apta para regulamentar as regras de imunidade, neste passo o STF decidiu no Ag. RE 428.815-0 (Brasil, Supremo Tribunal Federal, 2005) que, se tratando de condições materiais para o gozo da imunidade a espécie normativa será reservada a lei complementar, de outro lado, se se tratar apenas de requisitos formais para a concessão da imunidade basta lei ordinária (PAULSEN, 2020).

    Desta forma, na interpretação das normas de imunidade tributária o próprio CTN adotou a intepretação restritiva em seu sentido técnico, o que o Supremo nem sempre acolhe, visto que ora amplia o conceito da imunidade abarcada no texto constitucional, em vista do fim visado pela norma, e por fim, assenta-se que as regras de imunidade são, em sua maioria, normas autoaplicáveis, sem necessidade de regulamentação infraconstitucional para produção dos seus efeitos, e não sendo a espécie legislativa para regulamentação dos requisitos matérias para sua concessão é a lei complementar, diferente, pois, se tratar de requisitos formais que basta lei ordinária, segundo a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal.

      1. DOS PRINCÍPIOS TRIBUTÁRIOS CONSTITUCIONAIS

    Ab, initio, o poder de tributar “é, portanto, uma decorrência inevitável da soberania que o Estado exerce sobre as pessoas do seu território, ao qual corresponde, por parte dos indivíduos um dever de prestação” (NOGUEIRA, 1973, p. 140).

    Contudo, os cidadãos consentem por meio do pacto social a transferir a soberania ao Estado para que este arrecade limitadamente a necessária para o custeio dos gastos públicos, portanto, em que pese o poder tributário represente a soberania do Estado, esta soberania é decorrência direto da soberania popular que lhe outorgou. Assim, esta outorga está limitada as disposições constitucionais, que representa o contrato. (TORRES, 2011)

    Desta forma, por esta razão os princípios constitucionais representam limitações constitucionais ao poder de tributar, pois, porquanto o Estado detenha o poder tributário, este deve ser exercido nos moldes constitucionais previstos, isto é, de forma limitada, com respeito aos princípios constitucionais tributários.

    Doravante, em que pese já analisado as limitações constitucionais ao poder de tributar, que em suma, são princípio tributários constitucionais, analisa-se nesta seção os princípios que fornecem sustentáculo a resolução proposta neste trabalho ao problema científico apresentado.

    Portanto, tanto as limitações constitucionais ao poder de tributar quanto aos princípios tributários constitucionais são sinônimos, que se analisou separadamente por razões metodológicas.

        1. Da Isonomia Tributária

    O princípio da igualdade ou da isonomia na celebre lição de Rui Barbosa:

    A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade. O mais são desvarios da inveja, do orgulho, ou da loucura. Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real. Os apetites humanos conceberam inverter a norma universal da criação, pretendendo, não dar a cada um, na razão do que vale, mas atribuir o mesmo a todos, como se todos se equivalessem (BARBOSA, 2019, pág. 36)

    Portanto há duas acepções do princípio da igualdade uma na horizontal outra na vertical, a primeira refere-se as pessoas que estão em situação similar, portanto, deve-se tratar de forma igualdade, exemplificando duas pessoas que auferem a mesma renda deve ser tributadas na mesma proporção de alíquota, assim contribui com igual valor. A segunda, a vertical, trata-se de situação distinta da primeira, pois as pessoas aqui estão em situação desigual, exemplo, uma pessoa recebe R$ 1.000,00 (mil reais) mensais e a outra R$ 10.000,00 (dez mil) mensais, uma irá sofrer a incidência do imposto de renda enquanto a outra que tem o rendimento menor será isenta. (ALEXANDRE, 2020).

    Deste modo, encontra-se insculpido o princípio da igualdade tributária no art. 150, II, vejamos:

    Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

    II - Instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos; (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, art. 150, II)

    Assim, é clarividente que ao tratar da igualdade o texto constitucional referenciou a igualdade na acepção horizontal, “mas deixou implícita a necessidade de tratamento desigual aos que se encontravam em situação relevantemente distinta (sentido vertical)” (ALEXANDRE, 2020, pág. 145). Portanto, qualquer tratamento desigual conferido aos contribuintes que se encontram em situação desigual, promovida sob o fito de atenuar a desigualdade e promover a equivalência entre as situações, simboliza a efetividade da constituição que expressa o princípio da igualdade na sua acepção material. E do outro lado, o tratamento igual aos que se encontram em situação desigual é inconstitucional, pois há a inconstitucionalidade por omissão com ofensa direta ao princípio da igualdade.

    Ademais, há duas dimensões do princípio da igualdade, a igualdade perante a lei e igualdade na lei. A primeira está intrinsicamente associada ao princípio da legalidade, que tem seu fundamento no governo da lei, desta forma o princípio da isonomia na dimensão de igualdade perante a lei dirige-se ao aplicador do direito que deverá aplicar a lei sempre que a norma subsumir ao fato, de forma que se ignora o sujeito que sofre as sanções prescritas pela lei, assim, neste aspecto formal, cuida-se da aplicação uniforme da lei. A segunda, a igualdade na lei ou através da lei, volta-se preponderantemente ao legislador para que este institua normas que trate os iguais de igual forma e os desiguais na medida de suas desigualdades, ressalta-se que, os critérios de discriminação adotado para a equivalência das igualdades deverá ser razoável sob pena de se ter uma discriminação arbitrária (SABBAG, 2019).

    Doravante, o princípio da isonomia é também conhecido como proibição de privilégios odiosos, “na medida em que visa coibir a odiosidade tributária, manifestável em comandos normativos discriminatórios, veiculadores de favoritismo por meio da tributação (SABBAG, 2019, pág. 143). Assim, o postulado da igualdade tributária serve como proteção contra as discriminações irrazoáveis impregnadas de favoritismos e injustiças, quer se baseiam na classe ou cargo, portanto, ao discriminar o poder tributário deve adotar critérios legítimos fundamentados na realidade social subjacente, em busca da justiça tributária, para que classes menos favorecidas não contribuam além do que podem e classes mais abastadas suportem uma carga tributária aquém das suas possibilidades (SABBAG, 2019).

    Registra-se que, o critério de discriminação tributária será, em regra, a capacidade contribuitiva, contudo, excepcionalmente, medidas desiguais podem ser utilizadas para efetivar finalidades extrafiscais, que na lição de Hugo de Brito:

    Por sua vez, fala-se de função extrafiscal quando o tributo é utilizado para um fim, ou um propósito, diferente da obtenção de receitas. A entidade não institui e cobra o tributo para financiar seu orçamento, ou o orçamento de “prolongamentos” seus, mas sim para atingir outras finalidades, dirigindo comportamentos, estimulando ou desestimulando condutas etc. Todo tributo tem esse efeito na economia, de estimular ou desestimular condutas, ainda que isso não seja conhecido ou desejado por quem o idealiza. A extrafiscalidade consiste em utilizar deliberadamente esse efeito para a consecução de propósitos específicos (MACHADO SEGUNDO, 2018, pág. 64).

    Assim, exemplificando a utilização da discriminação sob o viés extrafiscal, a alta carga tributos sobre o cigarro, ela não visa a capacidade contribuitiva, mas apenas desestimular o uso desta substância nociva à saúde. Portanto, é possível ocorrer tratamento desigual entre contribuintes em situação equivalente, em vista da extrafiscalidade, em outro exemplo, quando um sujeito passivo de determinado tributo adotar práticas apta a preservar o meio ambiente enquanto o outro não e, por conseguinte, polui mais (MACHADO SEGUNDO, 2018).

    Por fim, outra faceta do princípio da isonomia é a cláusula pecúnia non olet, que “impõe que a hipótese de incidência tributária seja compreendida, independente da licitude ou ilicitude peculiares à atividade exercida” (SABBAG, 2019, pág. 145). Isto é, o fato gerador do tributo que desemboca na obrigação principal de pagar deve ser analisado sob o viés econômico, indiferente as conotações de licito ou ilícito ou da validade jurídica dos atos. Assim, vislumbra-se a onipresença tributária, alcançando atos ilícitos, ofertando igualdade formal, sem que os autores de atos ilícitos sejam beneficiados em detrimento do contribuinte que aufere renda de forma legitima (SABBAG, 2019).

    Assim, depreende-se que, o princípio da igualdade tem duas facetas a igualdade horizontal ou formal, de modo que deve-se tratar os iguais que se encontram em situação equivalente, e a vertical ou material, que ao contrário, aos contribuintes em situação discrepante dever ser tratado de forma distinta para que então a igualdade fática seja atenuada, e mais, há a igualdade perante a lei, que se exige que o aplicador do direito aplique de forma uniforme a lei, e a outra - a igualdade perante a lei, que impele que o legislador trate os iguais de igual forma e os desiguais na medida de suas desigualdades.

        1. Da Capacidade Contribuitiva e o Mínimo Existencial

    O princípio da capacidade contribuitiva comumente é associado ao princípio da isonomia, contudo, com este não se confunde. Pois, a capacidade contribuitiva revela apenas uma dimensão do princípio da isonomia, que está intrinsicamente relacionado com a justiça tributária, assim a capacidade de pagar tributo, nesta perspectiva, a isonomia se revela em duas dimensões, a primeira, (SABBAG, 2019)

    A equidade horizontal: os contribuintes que possuam igual capacidade de pagar deverão contribuir com a mesma quantidade pecuniária, destinada aos cofres do Estado. É a ideia do “tratamento igual os iguais”. (SABBAG, 2019, pág. 161)

    E a segunda,

    A equidade vertical: os contribuintes que possuam desigual capacidade de pagar deverão contribuir com diferentes quantidades pecuniárias, destinadas aos cofres do Estado. É a ideia do “tratamento desigual para os desiguais”. Aqui despontam os critérios da concretização do postulado da capacidade contribuitiva, v.g., a progressividade, a seletividade, entre outros. Assim, indivíduos com rendas maiores deverão contribuir, proporcional e equitativamente, com mais recursos do que aqueles que possuem menores rendimentos. O objetivo dessa forma de tributação não é o de inverter a posição da classe de renda, mas reduzir a diferença entre elas, por sinal, exageradamente grande no Brasil. (SABBAG, 2019, pág. 161)

    Portanto, enquanto o princípio da isonomia se manifesta de forma horizontal, – tratar os iguais de forma igual –, e vertical, – tratar os desiguais na medida de sua desigualdade –, o princípio da capacidade contribuitiva se preocupa com a dimensão vertical do princípio da igualdade com a preocupação ínsita em fazer justiça tributária. Assim, essa foi a preocupação do legislador constitucional ao mencionar que os impostos pessoais, isto é, aquele que considera a capacidade do contribuinte na tributação, serão graduados segundo a capacidade contribuitiva, conforme dispostos no art. 145, § 1º da CF/88 (BRASIL, 1988) e também foi previsto na lei complementar do Paraná, de forma a concretizar os valor constitucionais mencionados, LC 107/2005, art. , § 2º, que menciona que, “ o tributo deve ser e parecer justo, atendendo os critérios da isonomia, da capacidade contribuitiva, da equitativa distribuição do seu ônus, da generalidade, da proporcionalidade e não confiscatoriedade”. (PARANÁ, 2005).

    Deste modo, vislumbra-se que a capacidade contribuitiva tem como escopo alcançar uma tributação justa, ética, portanto, este princípio serve como “parâmetro de desigualdade a ser levado em consideração para a atribuição de tratamento diferenciado às pessoas” (ALEXANDRE, 2020, pág. 154).

    Ademais, ante a pluralidade de conceitos de justiça fiscal, destaca-se que

    [...] o primeiro é o da justiça fiscal no sentido de justiça tributária, que se limita a proceder a uma avaliação quantitativa do modo como são distribuídos os encargos tributários entre os cidadãos e as empresas, ou melhor, entre várias categorias de contribuintes. Perante uma dada carga fiscal, trata-se de saber como é que ela é partida entre os contribuintes com maiores e menores rendimentos. (MELLO, 2013, p. 41)

    Portanto, a justiça tributária tem a preocupação distribuir de forma quantitativa e qualitativa o encargo tributário entre os cidadãos de forma justa para que cada um contribua de acordo com sua possibilidade. Assim,

    A justiça fiscal só se realiza com a edição de leis tributárias que distribuam igualmente a carga impositiva através de observância do princípio da capacidade contributiva, onerando mais pesadamente aqueles que tem mais aptidão para contribuir e desobrigando do pagamento de tributos aqueles que, muito embora tenham capacidade econômica, não possuam capacidade para pagar tributos, pois toda a disponibilidade financeira é absorvida com a sua manutenção e a de sua família. Só há Estado Democrático construído sobre sólidas bases que envolvam compromissos de liberdade e igualdade materiais. Nesse contexto, a observância dos citados princípios impõe que o tributo não seja apenas uma fonte de renda, mas sim um instrumento de realização de justiça. A igualdade no tratamento tributário deixa de ser apenas formal, passando a ser materialmente um instrumento de redistribuição de riquezas. (GRUPENMACHER, 2006, p. 103)

    Posto isto, observa-se que, a concretização da justiça fiscal não se deve ater-se apenas a isonomia formal, mas a material, visto que aqueles que percebem rendas maiores devem contribuir de forma mais intensa com fisco, de modo que aqueles que possuem uma renda mínima, que se obrigado ao pagamento de tributo comprometeria o atendimento das suas necessidades básicas, devem ser dispensados.

    Doravante, a título de exemplo, o imposto de renda, aqueles que percebem um salário diminuto – de acordo com o entendimento do Estado –, são isentos, em razão do entendimento que, quem ganha pouco necessita suprir suas necessidades básicas, alimentação, saúde, moradia etc., portanto, não teria condições, capacidade de contribuir com parcela da sua renda para o custeio do Estado, pois não há aqui capacidade contribuitiva, capacidade de contribuir. Desta forma, “a imposição constitucional de progressividade do imposto de renda é exemplo de regra teleologicamente (finalisticamente) ligada aos princípios da capacidade contribuitiva e da isonomia” (ALEXANDRE, 2020, pág. 154)

    Deste modo, a

    [...] capacidade contributiva não constitui apenas um critério de justiça fiscal capaz de fundamentar tratamento tributário diferenciado de modo que seja considerado como promotor e não como violador da isonomia. Configura verdadeiro princípio a orientar toda a tributação, inspirando o legislador e orientando os aplicadores das normas tributárias. A maior parte da doutrina diz tratar-se de um princípio de sobredireito ou metajurídico, que deve orientar o exercício da tributação independentemente de constar expressamente da Constituição. (PAULSEN, 2020, pág. 99).

    Assim, visto que a capacidade contribuitiva deve orientar toda atividade tributária com a finalidade de concretizar a isonomia em seu aspecto vertical e trazer a desejável justiça fiscal, deve ela ser aplicado em todas as espécies tributárias, diferente, pois, do que consta na Constituição, isso porque o art. 145, parágrafo único, (BRASIL, 2020) restringe a capacidade contribuitiva apenas para os impostos, o que, no entanto, não pode ser encarado de forma literal, sob pena de a própria Constituição contradizer com os princípios nela sustentados, o que não se admite, assim, a capacidade econômica do contribuinte, “cuida-se de princípio fundamental de tributação aplicável a todas as espécies tributárias, ainda que de modo distinto conforme as características de cada qual.” (PAULSEN, 2020, pág. 99)

    Desta forma, o princípio da capacidade contribuitiva deve aplicado a todas as espécies tributárias, inclusive as taxas, que são tributos contraprestacionais.

    Ademais,

    O princípio da capacidade contributiva inspira-se na ordem natural das coisas: onde não houver riqueza é inútil instituir imposto, do mesmo modo que em terra seca não adianta abrir poço à busca de água. Porém, na formulação jurídica do princípio, não se quer apenas preservar a eficácia da lei de incidência (no sentido de que esta não caia no vazio, por falta de riqueza que suporte o imposto); além disso, quer-se preservar o contribuinte, buscando evitar que uma tributação excessiva (inadequada à sua capacidade contributiva) comprometa os seus meios de subsistência, ou o livre exercício de sua profissão, ou a livre exploração de sua empresa, ou o exercício de outros direitos fundamentais, já que tudo isso relativiza sua capacidade econômica. (AMARO, 2014, pág. 146).

    Portanto, o princípio da capacidade econômica do contribuinte relaciona-se com o Estado Social, pois o Estado passa a considerar qual o montante da carga tributária que determinado contribuinte pode vir a arcar sem comprometimento com as suas necessidades básicas, de modo que o mais rico contribuirá mais do que aquele é hipossuficiente, que pode ser, inclusive, isento de determinados tributos a depender da sua renda, assim o Estado passa a exigir de cada contribuinte de acordo com a possibilidade financeira do contribuinte (PAULSEN, 2020).

    E ainda,

    O princípio da capacidade contributiva também se projeta nas situações extremas, de pobreza ou de muita riqueza. Impõe, de um lado, que nada seja exigido de quem só tem recursos para sua própria subsistência e, de outro lado, que a elevada capacidade econômica do contribuinte não sirva de pretexto para tributação em patamares confiscatórios que, abandonando a ideia de contribuição para as despesas públicas, imponha desestímulo à geração de riquezas e tenha efeito oblíquo de expropriação. (PAULSEN, 2020, pág. 100).

    Visto isto, se os hipossuficientes não podem sofrer incidência tributária sob pena de comprometer o suprimento das suas necessidades básicas, salutar é que aqueles abastados financeiramente não sofram tributação em patamares estratosféricos, que beira a confiscatoriedade, dado que além de desestimular as riquezas também debilitaria o direito à propriedade privada, contrariando outros princípios constitucionais.

    Assim, o mínimo existencial é um dos núcleos da dignidade da pessoa humana, que é fundamento da República Federativa do Brasil, compreendido como (BRASIL, 1988)

    [...] um valor fundamental. Valores, sejam políticos, ou morais, ingressam no mundo do direito, assumindo, usualmente, a forma de princípios. A dignidade, portanto, é um princípio jurídico de status constitucional. Como valor e como princípio, a dignidade humana funciona tanto como justificação moral quanto como fundamento normativo para os direitos fundamentais. (BARROSO, 2018, pág. 289).

    Assim, como princípio a dignidade da pessoa humana, em seu valor intrínseco, decorre diversos direitos fundamentais, quais sejam, à vida, que sua consequência é a criminalização do homicídio; à igualdade, visto que a todos é garantido o direito ao respeito independentemente de raça, gênero etc.; à integridade física, de modo que sua violação configura crime; e, por último, à integridade moral e psíquica, que abarca a honra, imagem e pravidade. Ademais, além destes direitos decorrer da dignidade da pessoa humana, antes disso, faz necessário ou tem como pressupostos a satisfação do mínimo existencial, pois (BARROSO, 2018)

    trata-se de pressuposto necessário ao exercício da autonomia, tanto pública, quanto privada. Para poder ser livre, igual e capaz de exercer plenamente sua cidadania, todo indivíduo precisa ter satisfeitas as necessidades indispensáveis à sua existência física e psíquica. O mínimo existencial corresponde ao núcleo essencial dos direitos fundamentais sociais e seu conteúdo equivale às pré-condições para o exercício dos direitos individuais e políticos, da autonomia privada e pública (BARROSO, 2018, pág. 292).

    Posto isto, em pese o direito ao mínimo existencial não tenha expressa previsão constitucional, é decorrência direta da dignidade da pessoa humana que é fundamento da república do Brasil. E mais, o conteúdo do direito ao mínimo existencial, apesar de abstrato, representa um conjuntos de direitos necessários essenciais a sobrevivência humana de forma digna, isto é, a educação fundamental, saúde básica, ao acesso à justiça, que não admite ponderação, visto que trata-se de núcleo irredutível da dignidade da pessoa humana, que não pode ceder ante a ponderação de outros valores constitucionais (BARCELLOS, 2002).

    Em igual sentido,

    Neste contexto, há que enfatizar que o mínimo existencial – compreendido como todo o conjunto de prestações materiais indispensáveis para assegurar a cada pessoa uma vida condigna, no sentido de uma vida saudável (e a vinculação com o direito à saúde, tomado aqui em seu sentido mais amplo é proposital e será retomada no último segmento!) tem sido identificado – por alguns – como constituindo o núcleo essencial dos direitos fundamentais sociais, núcleo este blindado contra toda e qualquer intervenção por parte do Estado e da sociedade (SALET; FIGUEIREDO, 2007, pág. 14).

    Portanto, o mínimo existencial comporta o núcleo da dignidade da pessoa humana que não pode ceder sob qualquer pretexto, visto que concretiza o fundamento da República e garante um mínimo necessário para sobrevivência humana com dignidade, pois,

    De qualquer modo, tem-se como certo que a garantia efetiva de uma existência digna abrange mais do que a garantia da mera sobrevivência física, situando-se, portanto, além do limite da pobreza absoluta. Sustenta-se, nesta perspectiva, que se uma vida sem alternativas não corresponde às exigências da dignidade humana, a vida humana não pode ser reduzida à mera existência (SALET; FIGUEIREDO, 2007, pág. 9).

    Isto posto, o mínimo existencial não pode se confundir com o mínimo de sobrevivência, pois o último abrange apenas ao direito a vida, isto é, a sobrevivência, sem garantir a qualidade mínima necessária para se ter dignidade. Já o mínimo existencial engloba também o mínimo de sobrevivência, mas vai além, garante um conjunto de direitos e garantias necessárias para se ter uma vida diga, com o mínimo de qualidade, de modo que gera ao Estado não apenas deveres negativos, de abstenção Estatal, mas também diversos deveres prestacionais para se garantir o mínimo existencial (SALET; FIGUEIREDO, 2007)

    Diante disso, com o destaque da dignidade da pessoa humana na Carta Magna como centro do nosso ordenamento jurídico, não se pode mais conceber o direito a existência humana destituído de qualidades mínimas necessárias, sem dignidade, o que afrontaria o principal valor e fundamento constitucional e tornaria a Carta Magna em mera folha de papel, por isso é inexorável a aplicação do princípio da capacidade contribuitiva na seara tributária, sob o fito de evitar que a atividade tributária viole o direito o mínimo existencial, tributando aqueles destituídos de capacidade de contribuir.

    Assim, a aplicação do princípio da capacidade contribuitiva ao mínimo existencial – que representa a patrimônio mínimo necessário para os atendimentos das necessidades básicas do indivíduo que são imprescindíveis para sua manutenção –, são “[...] intangíveis pela tributação por via de impostos, é de todo natural que a capacidade contribuitiva só possa se reputar existente quando se referir alguma riqueza acima do mínimo vital” (SABBAG, 2019, pág. 164).

    Portanto, o mínimo existencial representa limite a tributação, devendo-se aferir parcela patrimonial acima dela para tornar possível a tributação. Entende de igual modo,

    Assim, nos quadrantes do sistema constitucional tributário, o conceito de renda somente pode ser estipulado a partir de uma série de influxos provenientes do sistema jurídico, como a proteção ao mínimo existencial, o direito ao amplo acesso à saúde, à capacidade contributiva, à proteção à livre iniciativa e à atividade econômica, e de outros sistemas com os quais o Direito mantém acoplamentos, como o sistema econômico e contábil (CASSONE, 2018, pág. 318)

    Diante disso, Estado não pode suprimir daquele que nada tem por meio de impostos, ao contrário, deve prestar serviços públicos que assegurem o mínimo existencial e concretize a dignidade da pessoa humana.

    Portanto, vislumbrou-se nesta seção que o princípio da capacidade contribuitiva não se confunde com a isonomia, apesar de próximos, pois o primeiro se preocupa com a isonomia no aspecto vertical para que a atividade tributária do estado alcance a – justiça tributária –, desta forma, deve-se exigir o montante a título de carga tributária de acordo com a possibilidade do contribuinte, sem comprometer o mínimo existencial, que decorre da dignidade da pessoa humana, que garante a todos além do direito a existência o suprimento das necessidades básicas para que se tenha uma vida digna, sendo que este núcleo é intangível, portanto, não pode ceder ante a outros valores constitucionais dissidentes. Diante disto, o princípio da capacidade contribuitiva derrui qualquer pretensão estatal de exigir tributo daquele que possui apenas o mínimo necessário para o atendimento das suas necessidades, deste modo, a atividade tributária deve visar o patamar acima do mínimo existência, sob pena de violar e princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da capacidade contribuitiva.

    2.4.3. Princípio da Vedação do Tributo com Efeito de Confisco

    De início o art., 150, IV, da Constituição/88 (BRASIL, 1988) veda a utilização do tributo como efeito de confisco, isto é, o efeito da tributação não pode configurar confisco, pois o tributo em si foi visto que não pode ser confiscatório, visto que não constitui sanção por ato ilícito (ALEXANDRE, 2020).

    Assim,

    Enquanto tributo confiscatório seria um tributo que servisse como punição; tributo com efeito confiscatório seria aquele de incidência exagerada, que, absorvendo parcela considerável do patrimônio ou da renda produzida pelo particular, gerasse neste e na sociedade em geral uma sensação de verdadeira punição. As duas situações estão proibidas – a primeira (confisco), pelo conceito legal de tributo (CTN, art. ); e a segunda (efeito de confisco), por determinação constitucional expressa (CF, art. 150, IV). (ALEXANDRE, 2020), pág. 180).

    Deste modo, tributo confiscatório e tributo com efeito confisco não se confundem, o primeiro é visto o tributo como punição, o segundo é a incidência demasiada do tributo que leva a perda da propriedade de forma total quanto parcial, contudo, ambos são vedados.

    Ademais, a denominação da vedação ao tributo com efeito de confisco pode ser utilizada como princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade da carga tributária, que traz de forma ínsita que o poder de tributar deve ser utilizado pelo legislador de forma razoável, sem comprometer o mínimo existencial ou que dificulte o exercício de atividades lícitas, isto é, a carga tributária deve ser aceitável, razoável (ALEXANDRE, 2020).

    Historicamente, o princípio abordado é conhecido desde o período de Roma Antiga, e é entendido “[...] a partir da ideia de apreensão da propriedade pelo Estado sem que se ofereça ao destinatário da invasão patrimonial a compensação ou indenizações correspectivas.” (SABBAG, 2019, pág. 252).

    E mais, na análise do efeito confiscatório do tributo deve-se analisar de forma conjunta toda a carga tributária e não só de forma isolada, assim

    Para se avaliar se um tributo está sendo usado de forma confiscatória, seu “ônus” deve ser considerado em conjunto com os demais tributos que oneram o mesmo fato, e não isoladamente. Assim, mesmo que a Constituição autorize a União a instituir mais de um tributo sobre um mesmo fato (por exemplo, IRPJ e CSLL, ou IRPF e contribuição previdenciária), haverá inconstitucionalidade se esses dois tributos, somados, tornarem-se confiscatórios, mesmo que cada um, isoladamente, aparentemente não o seja. (MACHADO SEGUNDO, 2018, pág. 84).

    Portanto, tem-se o efeito confiscatório quando se retira a propriedade do particular sem a respectiva indenização, que deverá ser considerado todos os tributos incidentes sobre o bem, não só de forma isolada.

    Assim,

    É óbvio que os tributos (de modo mais ostensivo, os impostos) traduzem transferências compulsórias (não voluntárias) de recursos do indivíduo para o Estado. Desde que a tributação se faça nos limites autorizados pela Constituição, a transferência de riqueza do contribuinte para o Estado é legítima e não confiscatória. Portanto, não se quer, com a vedação do confisco, outorgar à propriedade uma proteção absoluta contra a incidência do tributo, o que anularia totalmente o poder de tributar. O que se objetiva é evitar que, por meio do tributo, o Estado anule a riqueza privada. Vê-se, pois, que o princípio atua em conjunto com o da capacidade contributiva, que também visa a preservar a capacidade econômica do indivíduo. (AMARO, 2014, pág. 151)

    Posto isto, vislumbra-se que a vedação ao efeito confiscatório tem como escopo preservar a propriedade privada, mas que não goza de proteção absoluta, pois a Constituição outorga limites para o exercício de tributação, que se exercido dentro destes limites tem-se por legítima a atividade tributária.

    Ademais, o princípio aludido tem forte ligação com o direito à propriedade privada, visto que protege o contribuinte da injusta apropriação do bem particular pelo Estado sema a respectiva indenização, ou que torne impraticável o exercício do direito à propriedade, em razão da insuportabilidade do montante da carga tributária incidente sobre o bem, assim, é translúcido que o princípio da vedação do tributo com efeito confiscatório enaltece e fortalece o direito de propriedade (SABBAG, 2019).

    Neste sentido,

    [...] o postulado que coíbe o tributo confiscatório, com fiel da balança, conciliará o interesse público de percepção do tributo e o interesse privado de proteção à propriedade contra o arbítrio do estatal, em nítida sistemática de confrontação. Caso a tributação se furte da preservação do direito de propriedade, deixando de lubrifica-lo e construí-lo, patente estará o cenário do confisco. (SABBAG, 2019, pág. 255)

    Portanto, o poder de tributar nesta perspectiva deve preservar o direito de propriedade, pois caso contrário estaríamos num cenário paradoxal, do qual a constituição protege o direito de propriedade, art. , XXII CF/88 (BRASIL, 1988), e do outro lado o Estado utiliza-se o do poder de tributar para aniquilar direito de igual status (SABBAG, 2019), em sintonia, pois, com o princípio da unidade da constituição, que informa que o texto constitucional é um sistema unitário de regras e princípios, de modo que é inconcebível a ideia de hierarquia entre normas de igual status constitucional, portanto, em eventuais tensões ou contradições deve-se harmonizar os dispositivos constitucionais conflitantes (NOVELINO, 2020).

    Doravante, o princípio da vedação ao efeito confiscatório deriva do princípio da capacidade contribuitiva, isso porque quando o Estado confisca a propriedade do contribuinte estará agindo ultrapassando e desrespeitando a capacidade econômica do contribuinte. Assim, a capacidade contribuitiva compreende a aptidão de arcar com a carga tributária sem perder o bem objeto da tributação, portanto, existe uma zona intermediário na qual o fisco deve se orientar na sua atividade tributária que fica entre o efeito confiscatório do tributo e o mínimo existência (SABBAG, 2019).

    Ademais,

    [...] o mínimo existencial (vital ou necessário) está delineado no art. , IV, CF, cujo teor indica os parâmetros de quantidade de riqueza mínima, suficiente para manutenção do indivíduo e de sua família, isto é, um limite intangível pela tributação, no bojo da capacidade contribuitiva (SABBAG, 2019, pág. 253).

    Desta forma, deve-se respeitar o mínimo existencial sob pena de a tributação se tornar um instrumento de injustiças fiscais, o que representa o contrário da sua finalidade, porquanto, retirar daquele que nada tem se não o mínimo necessário para viver em condições dignas, viola fatalmente o princípio da dignidade da pessoa humana que decorre o mínimo existencial, conforme visto da capacidade contribuitiva e também da vedação do tributo com efeito confiscatório. Portanto, a Constituição protege o mínimo existencial com sustentáculo em diversos princípios Constitucionais, inclusive, em fundamentos da República do Brasil.

    Em igual sentido,

    Confiscatório, portanto, é o imposto que não revela a capacidade contributiva da pessoa que o suporta - o que se dá, por exemplo, sempre que a base de cálculo da exação extrapola sua regra-matriz. Sempre que este fenômeno ocorre resta ferido o mínimo vital, isto é, a porção de riqueza que garante ao contribuinte e a seus dependentes uma existência digna de cidadão. Também não se pode, em homenagem aos princípios da capacidade contributiva e da não confiscatoriedade, assujeitar um mesmo fato econômico à incidência de tantos impostos, que acabem por retirar do contribuinte o mínimo vital a que estamos a aludir. (CARRAZZA, 2013 pág. 118)

    Assim, os recursos financeiros indispensáveis a sobrevivência e ao atendimento das necessidades básicas, “garantidas pela Constituição, especialmente em seus art. e 7º (alimentação, vestuário, lazer, cultura, saúde, educação, previdência social, transporte etc.), não podem ser alcançados pelos impostos” (CARRAZZA, 2013 pág. 117). Portanto, devem ser alvo de isenções, de não incidências tributárias ou de imunidades implícitas, extraídas dos princípios constitucionais elencados.

    Desta forma, diferenciou-se tributo confiscatório, que é aquele tido como tributo multa, de tributo com efeito confiscatório, que veda que a tributação destitua a propriedade do contribuinte sem a respectiva indenização, em razão da carga tributária excessiva, assim ambos são vedados. Vislumbrou-se que, o princípio da vedação do tributo com efeito confiscatório para além de proteger o direito de propriedade protege também o mínimo existencial, de forma que se tem uma zona intermediária entre o mínimo existencial e o direito de propriedade que o Estado no exercício da função tributária deve transitar.

      1. DA INTRIBUTABILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL

    No que toca a intangibilidade do mínimo existencial pela tributação, observou-se que se sustenta em diversos princípios constitucionais tributários, a isonomia, a capacidade contribuitiva, a vedação do tributo com efeito de confisco e a dignidade da pessoa humana. Assim, interpretação em sentido contrário, destituiria o fundamento da república em prol de uma visão patrimonialista, o que não se sustenta a luz da Constituição de 1988, ante os valores constitucionais indigitados, pois possibilitaria o desfalque patrimonial daquele que nada tem se não o mínimo necessário para uma existência com dignidade, e conforme visto, o direito ao mínimo existencial é mais do que apenas o direito de meramente existir e continuar vivo.

    Assim, “há um direito às condições mínimas de existência humana digna que não pode ser objeto de incidência fiscal e que ainda exige prestações estatais positivas” (TORRES, 2011, pág. 69).

    Nesse sentido, mais do que a mera omissão do Estado na atividade tributária exige-se prestações positivas, notadamente deveres prestacionais na seara da saúde, educação, alimentação, que são essenciais e constituem um núcleo inviolável, que não se permite ponderação a outros valores constitucionais, trata-se, portanto, de um núcleo intangível.

    Pois,

    Sem o mínimo necessário à existência cessa a possibilidade de sobrevivência do homem e desaparecem as condições iniciais da liberdade. A dignidade humana e as condições materiais da existência não podem retroceder aquém de um mínimo, do qual nem os prisioneiros, os doentes mentais e os indigentes podem ser privados. O fundamento do direito ao mínimo existencial, por conseguinte, reside nas condições para o exercício da liberdade, que alguns autores incluem na liberdade real, na liberdade positiva ou até na liberdade para o fito de diferença-las da liberdade que é mera ausência de constrição. (TORRES, 2011, pág. 69)

    Deste modo, conforme já apontado, não basta o direito de existir e de continuar vivo, é necessário que se garanta o direito a uma existência em condições dignas, que o Estado deve promover aqueles que encontram-se nestas situações de miserabilidade, como o faz nos benefícios da assistência social, que tem como escopo o atendimento das necessidades vitais mais básicas, com direta relação ao princípio da dignidade da pessoa humana , que “impõe o dever de proteção e promoção dos bens e utilidades indispensáveis a uma existência digna (mínimo existencial) (NOVELINO, 2020, pág. 908).

    Assim, à guisa de exemplo, a assistência social pertence a um sistema não contribuitivo, isto é, não se exige contribuição para auferir os benefícios por ela ofertados, basta que se preencha nos requisitos constantes no texto constitucional, desta forma, os recursos utilizados nestes programas são provenientes de tributos (NOVELINO, 2020). Assim, seria no mínimo paradoxal o Estado oferecer com uma mão os benefícios sociais aqueles necessitados sob o fito de concretizar o princípio da dignidade da pessoa humana e com a outra mão violar a o mínimo existência na sua atividade tributária, retirando daquele que nada tem se não o mínimo.

    Ademais,

    O direito às condições mínimas de existência digna inclui-se entre os direitos da liberdade, ou direitos humanos, ou direitos individuais, ou direitos naturais, formas diferentes de expressar a mesma realidade. O mínimo existencial exibe as características básicas dos direitos da liberdade: é pré-constitucional, posto que inerente à pessoa humana; constitui direito público subjetivo do cidadão, não sendo outorgado pela ordem. jurídica, mas condicionando-a; tem validade erga omnes; aproximando-se do conceito e das consequências do estado de necessidade; não se esgota no elenco do art. 52 da Constituição nem em catálogo preexistente; é dotado de historicidade, variando de acordo com. o contexto social. Mas é indefinível, aparecendo sob a forma de cláusulas gerais e de tipos indeterminados. (TORRES, 2011, pág. 70).

    Desta forma, em que pese o mínimo existencial seja indeterminado em seu conteúdo, pode ser auferido in concreto e abstratamente, especialmente no que a Constituição Federal de 1988 no art. , IV diz que o salário mínimo deve atender as “necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social” (BRASIL, 1988). Assim, os direitos indigitados servem como parâmetro do que engloba o mínimo existencial, o que, no entanto, não significa que esgote o seu conteúdo.

    Noutro ponto, a Constituição Federal omitiu a imunidade tributária do mínimo existência de forma geral, isto é, a todos os tributos, assim não há normativa expressa que dispense do pagamento do tributo aqueles que estão no mínimo existencial ou aquém, o que, contudo, signifique que inexiste a respectiva imunidade de forma implícita.

    É de se ressaltar que a imunidade tributária do mínimo existencial já esteve expressa na Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1946 em seu art. 15, § 1º, vejamos:

    Art. 15 - Compete à União decretar impostos sobre:

    § 1º - São isentos do imposto de consumo os artigos que a lei classificar como o mínimo indispensável à habitação, vestuário, alimentação e tratamento médico das pessoas de restrita capacidade econômica. (Brasil, 1946, Constituição dos Estados Unidos do Brasil)

    Portanto, a imunidade tributária do mínimo existência foi previsto expressamente na Constituição de 1946, contudo, restrito apenas ao imposto sobre o consumo.

    Aliás, Ricardo Lobo Torres entende que a imunidade tributária do mínimo existência deriva, de forma implícita, do princípio da vedação do tributo com efeito de confisco, vejamos:

    A proibição de confisco é imunidade tributária de uma parcela mínima necessária à sobrevivência da propriedade privada. Entende, pois, com os direitos da liberdade. Não emana da ideia de justiça, pois se afirmar para além da capacidade contributiva. (TORRES, 2011, pág. 65)

    Assim, salienta-se que as imunidades tributárias estão previstas no texto Constitucional em que o legislador constituinte estabeleceu hipóteses de competências negativas tributárias, isto é, situações em que o poder tributário do Estado não alcança, assim, como o princípio da vedação do tributo com efeito de confisco obsta a tributação aquém do mínimo existência e aquela que ultrapasse a carga tributária razoável sobre o bem, impedindo, por conseguinte, o exercício do direito de propriedade, é lógico concluir que trata-se de hipótese de imunidade tributária, que está implícita, pois limita o poder tributário do Estado a situações inalcançáveis pela tributação.

    Deste modo, o “mínimo existencial está livre de tributos, embora a Constituição nem sempre o afirme explicitamente” (TORRES, 2011, pág. 66)

    Ademais, há dispositivos constitucionais que explicitam a imunidade tributária a tributos e situações específicas, assim o art. , XXXIV da CF/88 dispensa o pagamento de taxa, isto é, tributo, vejamos:

    Art. 5º [...]

    XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

    a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

    b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal; (BRASIL, 1988, Constituição Federativa da República do Brasil).

    E mais, o art. , LXXII, LXXIII, da CF/88, que prevê a gratuidade da ação popular, habeas corpus e habeas data; e no mesmo dispositivo legal, inciso LXXIV, expressa a gratuidade da justiça aos hipossuficientes, novamente, mais uma hipótese de imunidade tributária de taxa; e ainda no art. 5º, LXXIV, dispensa o pagamento da taxa aos reconhecidamente pobres, da certidão de nascimento e de óbito, vejamos (BRASIL, 1988):

    Art. 5º [...]

    LXXII - conceder-se-á "habeas-data":

    a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público;

    b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por processo sigiloso, judicial ou administrativo;

    LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência;

    LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

    LXXVI - são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma da lei:

    a) o registro civil de nascimento;

    b) a certidão de óbito;

    LXXVII - são gratuitas as ações de "habeas-corpus" e "habeas-data", e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania (BRASIL, 1988, Constituição Federativa da República do Brasil).

    No art. 150, IV, c, da CF/88 veda a cobrança de impostos sobre instituição de educação, assistência social (BRASIL, 1988). Assim, “trata-se de imunidade do mínimo existencial, a proteger as entidades filantrópicas que prestem assistência social ou eduquem pessoas pobres, em ação substitutiva do Estado” (TORRES, 2011, pág. 71)

    E ainda, o art. 153, VI § da CF/88 prevê que,

    Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

    VI - propriedade territorial rural;

    § 4º O imposto previsto no inciso VI do caput:

    II - não incidirá sobre pequenas glebas rurais, definidas em lei, quando as explore o proprietário que não possua outro imóvel; (BRASIL, 1988, Constituição Federativa da República do Brasil).

    Assim, trata-se de hipótese de imunidade tributária do imposto do ITR – Imposto Territorial Rural, que tem por fundamento a preservação do mínimo existencial, pois a Constituição presumiu que o único proprietário de pequenas glebas rurais, que as explore com sua família ou só, não tem capacidade de contribuir para indigitado tributo sem comprometer o atendimento das suas necessidades básicas e de sua família.

    Portanto, denota-se que a imunidade tributária do mínimo existencial se encontra parcialmente previsto no texto constitucional a situações e a tributos específicos de forma que inexiste previsão de imunidade a todos os tributos em geral, o que, contudo, não indica sua inexistência. Observou-se que há posição doutrinária que entende que a imunidade tributária do mínimo existência, de forma implícita, é decorrência dos princípios da isonomia, da capacidade contribuitiva, da vedação do tributo com efeito de confisco e do fundamento e princípio – a dignidade da pessoa humana.

    2.5.1. Da Dignidade da Pessoa Humana

    Inicialmente, cabe repisar que em que pese o conceito de dignidade da pessoa humana seja plural, abstrato,

    O que se percebe, em última análise, é que onde não houver respeito pela vida e pela integridade física e moral do ser humano, onde as condições mínimas para uma existência digna não forem asseguradas, onde não houver limitação do poder, enfim, onde a liberdade e a autonomia, a igualdade (em direitos e dignidade) e os direitos fundamentais não forem reconhecidos e minimamente assegurados, não haverá espaço para a dignidade da pessoa humana e esta (a pessoa), por sua vez, poderá não passar de mero objeto de arbítrio e injustiças. Tudo, portanto, converge no sentido de que também para a ordem jurídico-constitucional a concepção do homem-objeto (ou homem-instrumento), com todas as consequências que daí podem e devem ser extraídas, constitui justamente a antítese da noção de dignidade da pessoa, embora esta, à evidência, não possa ser, por sua vez, exclusivamente formulada no sentido negativo (de exclusão de atos degradantes e desumanos), já que assim se estaria a restringir demasiadamente o âmbito de proteção da dignidade. (SALERT, 2011, Pág. 28)

    Posto isto, vislumbra-se que a noção de homem objetivo é a oposição ao conceito de dignidade da pessoa humana, que compreende que o homem é um fim em si mesmo e não um meio, assim a dignidade da pessoa humana exige, sob o fito de concretizar, que o ser humano detenha condições mínimas de existência. Portanto, a noção de dignidade da pessoa humana desvinculada do mínimo existência é insustentável, visto que a dignidade da pessoa humana “de certo modo, harmoniza com a noção de um mínimo existencial para uma vida com dignidade e um conjunto de direitos prestacionais indispensáveis para a garantia deste mínimo sustentada” (SALERT, 2011, pág. 50).

    Deste modo, ante a situações que aquém do mínimo existencial, pode-se exigir em juízo a satisfação do mínimo necessário para uma existência digna, vejamos:

    Por outro lado, em que pese eventual divergência a respeito da fundamentalidade dos direitos sociais de um modo geral e dos limites de sua exigibilidade em Juízo, constata-se – pelo menos entre nós e em expressiva parcela da doutrina (mas também, embora talvez ainda com menor ênfase) e da jurisprudência – um crescente consenso no que diz com a plena justiciabilidade da dimensão negativa (defensiva) dos direitos sociais em geral e da possibilidade de se exigir em Juízo pelo menos a satisfação daquelas prestações vinculadas ao mínimo existencial, de tal sorte que também nesta esfera a dignidade da pessoa humana (notadamente quando conectada com o direito à vida) assume a condição de metacritério para as soluções tomadas no caso concreto, o que, de resto, acabou sendo objeto de reconhecimento em decisão recente do nosso Supremo Tribunal Federal. (SALERT, 2011, pág. 50)

    Assim, a dignidade da pessoa humana neste aspecto é fundamento para exigir do Estado a prestação de serviços públicos indispensáveis a satisfação do mínimo existencial. Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana, como fundamento da república, deve orientar a função judicante na interpretação e aplicação dos dispositivos constitucionais, principalmente ligados aos direitos prestacionais.

    Aliás, em igual sentido,

    Como afirmado acima, o mínimo existencial corresponde às condições materiais básicas para uma vida digna. Trata-se de um direito fundamental derivado diretamente do princípio da dignidade da pessoa humana, que também se manifesta em boa parte dos direitos fundamentais sociais positivados pela Constituição de 88, como saúde, educação, moradia, alimentação, previdência e assistência social etc., estando igualmente presente em alguns direitos individuais, como no acesso à justiça. (SARMENTO, 2016, pág. 212)

    Assim, “sempre que uma intervenção do Estado ou de um particular comprometer as condições materiais básicas para a vida digna de uma pessoa, entra em jogo a dimensão negativa do direito ao mínimo existencial” (SARMENTO, 2016, pág. 226).

    Deste modo, vislumbrou-se nessa seção que a dignidade da pessoa humana é indissociável do mínimo existencial, que tem o condão de condicionar a interpretação e aplicação do direito para que Estado satisfação das necessidades básicas daqueles que estão aquém do mínimo para se viver com dignidade, e também, sob outra perspectiva, exige omissões estatais para que o Estado não se torne o violador do mínimo existencial, portanto, da dignidade da pessoa humana, precipuamente na exercício do poder tributário, pois não faz o mínimo sentido o Estado ser obrigado a prestar serviços públicos que satisfaçam as necessidades básicas daqueles desprovidos e depois retire parcela do patrimônio a título de tributo.

    2.5.2 Da Imunidade Tributária Implícita do Mínimo existencial na Constituição Federal de 1988

    De todo o exposto, observou-se que os princípios da capacidade econômica do contribuinte; da vedação do tributo com efeito de confisco; da dignidade da pessoa humana; veda a tributação do mínimo existencial, e mais, em contrapartida, obriga ao Estado prestar serviços públicos àqueles que estão aquém do mínimo para uma existência com dignidade. Portanto, é patente que a Constituição Federal, por meio dos princípios indigitados, buscou inviabilizar a tributação do mínimo existencial, para que o Estado não seja o sujeito ofensor dos princípios constitucionais que o rege e constitui.

    No que toca as imunidades tributárias, refrisa-se que

    [...] intributabilidade absoluta ditada pelas liberdades preexistentes. A imunidade fiscal erige-se o status negativus libertatis, tornando intocáveis pelo tributo ou pelo imposto certas pessoas e coisas; é um dos aspectos dos direitos da liberdade, ou sua qualidade, ou sua exteriorização, ou o seu âmbito de validade. (TORRES, 2011, pág. 65)

    Assim, as imunidades podem ser expressas ou implícitas, as imunidades implícitas são as que [...] aparecem expressamente na CF, mas que nem por isso ficam prejudicas, pois, como já examinamos, a intributabilidade não é criada pelo pacto constitucional, mas apenas declarada. (TORRES, 2011, pág. 72).

    Neste ponto, quanto a imunidades tributária implícita

    [...] (ou ontológicas), que, conquanto, não textualmente contempladas por norma expressa, podem ser ontologicamente extraídas dos princípios contemplados no ordenamento jurídica. Como exemplos, podemos citar a imunidade recíproca, que se liga à ausência de capacidade contribuitiva e ao princípio federativo, e a imunidade ara entidade beneficente ou educacional fundadas na ausência de capacidade contribuitiva e no princípio da isonomia, entre outras. A proposito a imunidade ontológica é assim considerada por decorrer da força de princípios que constroem o texto constitucional, mostrando-se como uma consequência necessária dessa norma sobrepairante. (SABBAG, 2019, pág. 313)

    Posto isto, conclui-se que as imunidades tributárias implícitas decorrem da força de princípios constitucionais, de modo que a ausência da imunidade tributária prevista de forma expressa não implica prejuízo, pois os princípios tem aptidão, de por si só, produzir efeitos e aplicar a casos concretos, ante a força normativa da constituição.

    Doravante, conforme foi visto, deve-se apontar que não existe imunidade tributária expressa do mínimo existencial em geral, isto é, a todos as cinco espécies tributárias, do contrário, conforme visto, a Constituição Federal apenas estabelece hipóteses de imunidade tributária a situações específicas e a tributos específicos, conforme os dispostos nos artigo , XXXIV, LXXII, LXXIII, LXXIV, LXXVI, art. 150, IV, c e Art. 153, VI, § 4º II, todos da Constituição Federal (BRASIL, 1988). Portanto, as hipóteses expressas na constituição de imunidade ao mínimo existência está atrelada as taxas nas hipóteses elencadas, do Imposto sobre a Propriedade Rural – ITR no caso de proprietário hipossuficiente que preencha os requisitos constitucionais e, por fim, a hipótese de imunidade de tributos em geral das entidades filantrópicas.

    Assim, conclui-se, carece a Constituição Federal, de forma expressa, de hipótese de imunidade tributária do mínimo existência sobre os tributos em geral, apenas nas situações específicas indigitadas.

    Contudo, o mínimo existencial tem proteção sob a estrutura de diversos princípios e por decorrência do fundamento da dignidade da pessoa humana, assim, ressalta-se que,

    O mínimo existencial pode ser protegido tanto positivamente como negativamente. Pode ser protegido tanto por parte da ideia dos mínimos sociais, através de prestações sociais estatais positivas, como por parte da ideia do mínimo não imponível, seja através da imunidade tributária do mínimo existencial ou através da desoneração tributária pelo critério da capacidade contributiva. (MOTA, 2018, pág. 388)

    No que toca ao aspecto da imunidade tributária do mínimo existencial na esfera do patrimônio jurídico, isto é, o mínimo necessário para que se tenha uma vida digna, deve o Estado se omitir na atividade tributária, pois, realça-se que, a dignidade da pessoa humana obsta qualquer ação estatal de retirada da parcela de patrimônio daquele que não tem se não o mínimo para uma existência digna, portanto, em que pese expressamente a constituição omitiu a imunidade geral do mínimo existência, ela está implícita, ante aos valores constitucionais que fazem parte das limitações constitucionais ao poder de limitar.

    Deste modo, com o neoconstitucionalismo e a consequente reaproximação do direito e da moral e a positivação de valores morais na constituição sob a forma de princípios, tem-se que o principal valor a fundamentar a imunidade implícita do mínimo existencial é a dignidade da pessoa humana, visto que decorre dela o direito ao mínimo existencial, que constitui núcleo inviolável, que não pode ceder ante a outros valores de igual estrutura constitucional.

    Assim,

    [...] resta claro que a tributação não pode afrontar o princípio da dignidade da pessoa humana. Diante da necessidade de se promover a ponderação da legitimidade da tributação com a dignidade da pessoa humana, conclui-se que a Constituição Federal impõe ao Estado brasileiro o dever de promover a desoneração tributária do mínimo existencial para não inviabilizar uma vida digna ao contribuinte e sua família.

    Reportando-se a tudo o que foi analisado no estudo até este ponto, afirma-se que, embora não exista previsão constitucional expressa nesse sentido, o mínimo existencial deveria ser imune aos tributos porque ele integra os direitos humanos (imanentes à pessoa humana) e os direitos fundamentais (positivados nas Constituições contemporâneas). (MOTA, 2018, pág. 387).

    Posto isto, é translúcido que o princípio e o fundamento da dignidade da pessoa humana impõem a preservação e a promoção do mínimo existencial, seja por meio de prestações de serviços públicos essenciais, seja pela omissão por parte do Estado da tributação dos contribuintes em situações limítrofes no mínimo existencial. Portanto, observa-se que se trata de fonte de imunidade tributária implícita do mínimo existencial, pois, interpretação em sentido contrário levaria ao entendimento de que o próprio Estado poderia figurar como violador do mínimo existência, com retiradas patrimoniais daqueles que nada tem.

    Ademais, a imunidade tributária do mínimo existência implícita se sustenta também perante a outros princípios constitucionais, o que recrudesce sua força normativa, vejamos.

    O princípio da capacidade contribuitiva, que

    deste dispositivo constitucional emerge, de modo inequívoco, a necessária correlação entre os impostos e a capacidade contributiva. De um modo bem amplo, já podemos adiantar que ela se manifesta diante de fatos ou situações que revelam, prima facie, da parte de quem os realiza ou neles se encontra, condições objetivas para, pelo menos em tese, suportar a carga econômica desta particular espécie tributária. (CARRAZZA, 2013, pág. 96)

    Deste modo, é inconcebível a tese de que, aquele que nada tem se não o mínimo necessário para uma existência digna tenha capacidade de contribuir aos cofres públicos, assim revelaria paradoxal o Estado exigir tributo daquele que não tem condições de suportar. Portanto, a capacidade contribuitiva funciona como limite e parâmetro, nesse sentido o Estado só pode tributar aquele que possui patrimônio acima do mínimo existencial – sendo este o limite proposto pelo princípio capacidade econômica do contribuinte.

    Nesta senda,

    [...] levando em consideração a necessidade de se promover a ponderação da legitimidade da tributação com a dignidade da pessoa humana, cumpre anotar que a ideia do mínimo não imponível diz respeito tanto à imunidade tributária do mínimo existencial como à desoneração tributária pelo critério da capacidade contributiva. (MOTA, 2018, pág. 380).

    Posto isto, a imunidade implícita do mínimo existência se estrutura no princípio constitucional da capacidade econômica do contribuinte, visto que torna intributáveis as situações aquém e no limite do mínimo existencial, desta forma só é passível de tributação a riqueza acima do mínimo existencial (SABBAG, 2019). Assim, visto que a sua fonte é constitucional, o limite que se extrai do princípio da capacidade contribuitiva indubitavelmente representa hipótese de imunidade tributária, que está implícita.

    Ademais, do princípio da capacidade contribuitiva deriva o princípio da vedação do tributo com efeito de confisco, que também protege o contribuinte da tributabilidade do mínimo existencial, isso porque quando o Estado extrapola a capacidade econômica do contribuinte estará ele confiscando a propriedade daquele que pouco tem se não o mínimo para uma existência digna, o que é vedado por força do princípio indigitado.

    E mais, segundo o Professor Ricardo Lobo Torres a proibição do tributo com efeito de confisco ocasiona a imunidade tributária implícita do mínimo existencial, pois o Estado estaria retirando daquele a parcela mínima necessária de patrimônio do contribuinte – o mínimo vital – ,extrapolando, pois, os limites da capacidade contribuitiva sem a respectiva indenização, o que configura afronta ao princípio da proibição do tributo com efeito de confisco e a implícita imunidade tributária do mínimo existencial. (TORRES, 2011).

    Assim, interpretando a constituição de acordo com o método hermenêutico sistemático que preconiza a “[...] interpretação conjunta dos dispositivos, como se formassem um todo harmônico”, (NOVELINO, 2020, pág. 163), e o método teleológico, que se baseia

    [...] na finalidade contida no texto normativo (teleológico-objetivo). O caráter fortemente propositivo das constituições contemporâneas, repletas de normas definidoras de fins, diretrizes e tarefas dirigiras aos poderes públicos, reforça a relevância do mencionado cânone para a interpretação dos dispositivos constitucionais. (NOVELINO, 2020, pág. 163)

    E mais, segundo o postulado da força normativa da constituição, na qual deve-se extrair das normas constitucionais o máximo de efetividade, que

    O princípio da constitucionalidade não equivale, como resulta do que se acaba de afirmar em c) a uma total normação jurídica feita diretamente pela constituição. No entanto, quando existe uma normação jurídico constitucional ela não pode ser postergada quaisquer que sejam os pretextos invocados. Assim, o princípio da constitucionalidade postulará a força normativa da constituição contra a dissolução político-jurídica eventualmente resultante: (1) da pretensão da prevalência de fundamentos políticos de superiores interesses da nação, da soberania da nação, do realismo financeiro sobre a normatividade jurídico-constitucional; (2) da pretensão de através do apelo ao direito ou à ideia de direito querer neutralizar a forma normativa da constituição, material e democraticamente legitima, e substituir-lhe uma superlegalidade ou legalidade de duplo grau ancorada em valores ou princípios transcendentes (Preuss) relevados por instâncias desprovidas de legitimação política e jurídica. (CANOTILHO, 1941, pág. 248)

    Por esta razão, sob os métodos interpretativos clássicos, sistemático e teleológico, conforme se observou, entende-se que as limitações constitucionais elencadas ao poder de tributar obsta a tributação do mínimo existência, desta forma trata-se de imunidade tributária implícita, pois conferir interpretação em sentido contrário feriria a interpretação sistemática e o princípio da unidade da constituição, pois se o Estado é constitucionalmente obrigado a promover o mínimo existencial daqueles desprovidos, não poderia, igualmente, ser ele o agente ofensor da dignidade da pessoa humana, portanto, do mínimo existência, por meio da atividade tributária exercida.

    Ante o exposto, diversos princípios constitucionais sustentam a imunidade tributária do mínimo existência, a dignidade da pessoa humana, a capacidade contribuitiva e a vedação do tributo com efeito de confisco, este último inclusive com forte posição doutrinária. Ademais, vislumbrou-se que os dispositivos constitucionais ante a força normativa da constituição têm aplicação direta, portanto, não se pode negar a existência da imunidade do mínimo existencial como decorrência dos princípios elencados, sob pena de estar negando a aplicação destes princípios constitucionais, inclusive sob a perspectiva da dignidade da pessoa humana, que tem seu núcleo vital irredutível – o mínimo vital, desta forma é clarividente a existência da imunidade implícita do mínimo existencial na Constituição Federativa da República do Brasil de 1988.

    5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

    Ante o exposto, quando se estudou o projeto de pesquisa constatou-se a omissão em geral da imunidade tributária do mínimo existencial, considerando o princípio e o fundamento da dignidade da pessoa humana é tratado como núcleo irredutível. Assim, denota-se a importância do estudo da imunidade implícita do mínimo existencial na Constituição da Republica Federativa de 1988, ainda mais considerando a força normativa dos princípios constitucionais e da unidade da constituição.

    Deste modo, o presente trabalho identificou se é possível concluir pela existência da imunidade tributária implícita do mínimo existencial na Constituição federal, visto que não há norma expressa sobre a imunidade tributária do mínimo vital a todas as espécies tributárias, pois a norma constitucional de desoneração do mínimo vital se restringe a situações e espécies tributárias específicas.

    Assim, foi analisado o constitucionalismo, que compreende o movimento constitucional de limitação do poder soberano da monarca, que no fim culminou na existência da uma carta constitucional. Doravante, atrelado a nova fase do constitucionalismo, abordou-se o neoconstitucionalismo, que buscou incorporar valores morais na Carta Magna através de princípios e valores constitucionais, com a ínsita preocupação que as normas constitucionais e infraconstitucionais sejam justas, que surgiu principalmente após a segunda guerra mundial, especificamente, o movimento nazista instalado na Alemanha. Ademais, foi burilado o movimento de constitucionalização do direito, que implicou numa mudança de paradigma aos demais ramos do ordenamento jurídico, de modo que todos os ramos sofreram uma releitura a partir de valores constitucionais.

    Em seguida, definiu-se os contornos do sistema tributário na constituição, com a definição legal e doutrinária do tributo, destacou-se também que tributo é gênero que deriva cinco espécies tributárias, quais sejam, os impostos; taxas; contribuição de melhoria; empréstimo compulsório e contribuições especiais, a luz da teoria pentapartida. E mais, foi definido e distinguido as características das espécies tributárias, que tem particularidades próprias, diferentes, pois, uma das outras. Também foi apontado as principais limitações constitucionais ao poder de tributar, que em suma, são princípios, qual seja, a legalidade; a segurança jurídica; este último que se relaciona com o princípio da anterioridade de exercício financeiro; a praticabilidade da tributação e, por fim, a uniformidade geográfica da tributação.

    Adiante, foi analisado a imunidade tributária, que configura hipótese de desoneração tributária constitucionalmente estabelecida, que pode ser tanto prevista na Carta Magna, quanto implícita, por decorrer de princípios constitucionais. Assevera-se que, a razão da hierarquia constitucional da imunidade tributária se trata de norma de limitação da competência tributária, que define os contornos da competência tributária, sendo esta última estabelecida pelo texto constitucional, portanto, não poderia as normas de imunidade tributária ser de fonte distinta, em respeito a supremacia da constituição. Também, observou-se que, as imunidades tributárias representam cláusulas pétreas, pois são limitações constitucionais ao poder de tributar, assim, assegura a manutenção do núcleo inviolável dos direitos que o constituinte originário denominou de cláusulas pétreas, pois tem seu núcleo essência irredutível pelo legislador constituinte derivado. Por fim, foi detalhado a forma como as imunidades devem ser interpretadas, que em que pese o CTN tenha adotada a intepretação restritiva das normas imunizantes, o STF na busca de alcançar o sentido técnico da norma imunizante, ampliando para outras situações não previstas, mas que decorrem implicitamente de princípios constitucionais tributários.

    Ademais, analisou os princípios constitucionais da isonomia tributária, que decorre o princípio da capacidade econômica do contribuinte e também a vedação do tributo com efeito de confisco, que embasam a tese do presente trabalho.

    Assim, ante aos princípios constitucionais da isonomia, da capacidade contribuitiva, da vedação do tributo com efeito de confisco e do princípio e fundamento da dignidade da pessoa humana, numa intepretação sistemática e teleológica, em conformidade com a uniformidade da constituição, é possível apontar que a imunidade do mínimo existencial está protegida sob o fulcro dos princípios constitucionais indigitados.

    Portanto, intepretação em sentido contrário, levaria a ofensa ao princípio da uniformidade da constituição e da diretriz hermenêutica da interpretação sistemática, pois, não faz sentido a constituição obrigar ao estado promover e manter o mínimo existencial daqueles desprovidos, e na outra mão retirar a parcela patrimonial mínima para uma existência com dignidade a título de tributo, o que, logicamente ofende a capacidade contribuitiva, eis que aquele que nada tem se não o mínimo necessário para uma existência digna, não tem capacidade econômica de contribuir. E mais, ao princípio da vedação do tributo com efeito de confisco, pois este protege a tributação aquém do mínimo existência, visto que aquele que nada tem não possui capacidade de contribuir, logo, a tributação do mínimo existência deflagra o efeito da confiscatoriedade da atividade tributária.

    Deste modo, a imunidade tributária do mínimo existência está prevista no texto constitucional de forma implícita, conforme os valores constitucionais mencionados.

    REFERÊNCIAS

    AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 9. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.

    ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 14. ed. Salvador: JusPodivm, 2020.

    AMARO, Luciano. Direito Tributário Brasileiro. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.

    ÁVILA, Humberto. Constituição, liberdade e interpretação. São Paulo: Malheiros, 2019.

    BARBOSA, Ruy. Oração aos moços. Brasília: Senado Federal, Conselho Editorial, 2019.

    BARCELLOS, Ana Paula de. O Mínimo Existencial e Algumas fundamentações Jonh Rawls, Michael Walzer e Robert Alexy. In: TORRES, Ricardo Lobo (Org.). Legitimação pelos direitos humanos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002.

    BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e construção do novo modelo. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

    BRASIL, STF, 1ª TURMA. RECURSO EXTRAORDINÁRO: AgRRE 428.815/AM Relator do Acordão: Ministro Sepúlveda Pertence. DJ: junho de 2005.

    BRASIL, STF, PLENO. AGRAVO DE INSTRUMENTO NO RECURSO EXTRAORDINÁRO: RE 601.392/PR Relator do Acordão: Ministro Gilmar Mendes. DJ: 28/02/2013.

    BRASIL. Constituição da Republica Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988.

    BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, RJ: 1946.

    BRASIL. Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Código Tributário. Diário Oficial da União, Brasília, 1966.

    BRASIL. Lei 8.137, de 27 de dezembro de 1990. Define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 1990.

    CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7. ed. Portugal: Edições Almedina, 1941.

    CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2013.

    CASSONE, Vitorio. Direito Tributário. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2018. Editorial, 2019. Disponível em: < http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/564558> Acesso em: 27 de julho de 2021.

    GRUPENMACHER, Betina Treiger. Justiça fiscal e mínimo existencial In Princípios de direito financeiro e tributário. Organizado por Adilson Rodrigues Pires e Heleno Taveira Torres. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.

    HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 25. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Atlas, 2016.

    KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Tradução de Luís Carlos Borges. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes. 1998.

    LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2016.

    MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Manual de Direito Tributário. 10. ed. São Paulo: Atlas, 2018.

    MELLO, Elizabete Rosa de. Direito fundamental a uma tributação justa. São Paulo: Atlas, 2013.

    MOTA, Sergio Ricardo Ferreira. A Imunidade Tributária do Mínimo Existencial Omitida no Sistema Constitucional Tributário Brasileiro: legitimidade da tributação e limites imanentes ao sistema. Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas. Programa de Pós-Graduação em Direito.

    NOGUEIRA, Ruy Barbosa. Direito tributário: estudo de casos e problemas. São Paulo: Bushatsky, 1973.

    NOVELINO, Marcelo. Curso e Direito Constitucional. 15. ed. Salvador: JusPodivm, 2020.

    PARANÁ. Lei Complementar 107 de 2005. Estabelece normas gerais sobre direitos e garantias aplicáveis na relação tributária do contribuinte com a administração fazendária do Estado do Paraná. Diário Oficial da Estado, Curitiba, 2005.

    PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 11. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

    SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.

    SARLET, I.; FIGUEIREDO, M. Reserva do possível, mínimo existencial e direito à saúde. Revista Brasileira de Direitos Fundamentais & Justiça, v. 1, n. 1, p. 171-213, 25 mar. 2007.

    SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de 1988. 9. ed. rev. atual. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2011.

    SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito Constitucional. 7. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.

    SARMENTO, Daniel. Dignidade da Pessoa Humana: conteúdo, trajetórias e metodologia. Belo Horizonte: Fórum, 2016

    TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2020.

    TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. 18. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2011.

    • Publicações2
    • Seguidores0
    Detalhes da publicação
    • Tipo do documentoArtigo
    • Visualizações283
    De onde vêm as informações do Jusbrasil?
    Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
    Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-imunidade-tributaria-implicita-do-minimo-existencial-na-constituicao-da-republica-federativa-do-brasil/1314182883

    Informações relacionadas

    Limitações do Poder de Tributar

    Natalia Sales, Advogado
    Artigosano passado

    Conheça os principais direitos previdenciários para pessoas com deficiência no INSS!

    Artigoshá 10 anos

    O princípio da Legalidade Tributária e suas exceções

    Politize! Educação Política, Educador Social
    Artigoshá 7 anos

    Imunidade tributária: por que entidades religiosas não pagam impostos no Brasil?

    Tribunal de Justiça de São Paulo
    Jurisprudênciahá 8 meses

    Tribunal de Justiça de São Paulo TJ-SP - Apelação Cível: AC XXXXX-74.2019.8.26.0477 Praia Grande

    0 Comentários

    Faça um comentário construtivo para esse documento.

    Não use muitas letras maiúsculas, isso denota "GRITAR" ;)