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4 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Superior Tribunal de Justiça
há 12 anos

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

T6 - SEXTA TURMA

Publicação

Julgamento

Relator

Ministro HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE)

Documentos anexos

Inteiro TeorRESP_1043207_SP_1326942200913.pdf
Certidão de JulgamentoRESP_1043207_SP_1326942200915.pdf
Relatório e VotoRESP_1043207_SP_1326942200914.pdf
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Relatório e Voto

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE): Cuida-se de recurso especial interposto por Luiz Estevão de Oliveira Neto contra acórdão do Tribunal Federal da 3ª Região.

Extrai-se do processado que o recorrente foi denunciado, juntamente com outras pessoas, pela prática de falsificação de documento público e uso de documento falso, por terem, em tese, juntados documentos contábeis falsos nos autos da Ação Civil Pública nº 2001.61.012.554-5, com o fim de induzir o juízo em erro e, assim, promover a liberação de bens indisponíveis por força de decisão judicial.

A ação penal foi julgada parcialmente procedente para condená-lo, por fraude processual, a 1 ano e 2 meses de detenção, em regime aberto, e multa, substituída a pena privativa de liberdade por duas medidas restritivas de direitos.

Interposto recurso de apelação por ambas as partes e pela União, assistente da acusação, o da defesa foi improvido, o da União não conhecido, e o apelo do Ministério Público foi parcialmente provido para "restaurar parcialmente a capitulação original conferida aos fatos e condenar o réu somente nas penas do artigo 297, , do Código Penal, com a incidência da agravante prevista no artigo 62, inciso I, do Código Penal, aplicando-lhe a pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão em regime semi-aberto, sem possibilidade de substituição por pena alternativa, e multa equivalente a 17 (dezessete) dias-multa, no valor unitário de 15 (quinze) salários-mínimos, restando prejudicada a insurgência quanto à fundamentação da dosimetria da pena feita em primeiro grau."

O acórdão encontra-se assim ementado:

"APELAÇAO CRIMINAL CRIME DE FALSIFICAÇAO DE DOCUMENTO PÚBLICO INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO DECORRENTE DA AUSÊNCIA DE INQUÉRITO POLICIAL INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO PROVENIENTE DA NAO INCLUSAO DE CONTADORA DO GRUPO EMPRESARIAL NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO ORIGINÁRIA DA AUSÊNCIA DE INTIMAÇAO DE DEFENSORA CONSTITUÍDA INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DO PROCESSO ORIUNDA DA OFENSA AO ARTIGO 207 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL INEXISTÊNCIA DE NULIDADE DA SENTENÇA DECORRENTE DA INCOMPETÊNCIA DO JUÍZO DA CONDENAÇAO MATERIALIDADE COMPROVADA - DESCABIMENTO DE ALEGAÇAO INOVADORA DA DEFESA FEITA EM SUSTENTAÇAO ORAL QUANTO À ATIPICIDADE DO FATO RESTAURAÇAO DA CAPITULAÇAO ORIGINÁRIA DOS FATOS POTENCIALIDADE DA FALSIFICAÇAO - AUTORIA INDUVIDOSA PROGRESSAO CRIMINOSA PRELIMINAR REFERENTE A DOSIMETRIA DA PENA FEITA EM PRIMEIRO GRAU PREJUDICADA - DOSIMETRIA DA PENA DENTRO DOS LIMITES TRAÇADOS PELO ARTIGO 297, , DO CÓDIGO PENAL INCIDÊNCIA DA AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 62, I, DO CÓDIGO PENAL IMPOSIÇAO DO REGIME SEMI-ABERTO IMPOSSIBILIDADE DE SUBSTITUIÇAO POR PENA RESTRITIVA DE DIREITOS EXPEDIÇAO DE MANDADO DE PRISÃO SÚMULA 267 DO STJ NAO CONHECIMENTO DA APELAÇAO DA UNIÃO FEDERAL APELAÇAO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDA DESPROVIMENTO DA APELAÇAO DO RÉU.
1. Réu denunciado pela prática dos crimes capitulados nos artigos 297, e 304 do Código Penal, em concurso material, c.c artigos 29 e 62, I, do mesmo diploma legal. O MM. Juiz a quo , sob a fundamentação de que os fatos narrados na denúncia não se enquadram no tipo penal nela capitulado, aplicou a emendatio libelli , nos termos do artigo 383 do Código de Processo Penal e condenou o réu ao cumprimento de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de detenção, a serem cumpridos em regime aberto, e ao pagamento de 200 (duzentos) dias-multa, no valor unitário de 15 (quinze) salários mínimos, pela prática do crime descrito no artigo3477, caput , doCódigo Penall. Não obstante os antecedentes criminais do condenado, o ilustre magistrado, com base no artigo 44 4, º, do Código Penal l, substituiu a pena privativa de liberdade, pelo mesmo prazo, por 2 (duas) penas restritivas de direitos, quais sejam, prestação pecuniária consistente no pagamento em dinheiro de 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos à "Cáritas Brasileira", e prestação de serviços à essa mesma entidade, à razão de uma hora por dia de condenação.
2. Em síntese: ao réu atribui-se os fatos de promover e coordenar operação de adulteração de balancetes comerciais do"Grupo OK"documentos equiparados ao documento público por força do 2º do artigo 297 do Código Penal fazendo constar como integrantes do"ativo circulante"da empresa e portanto salvos de indisponibilidade imóveis que na realidade integravam o"ativo permanente"e seriam indisponibilizados; tudo com o fim de safar de prévio decreto judicial de indisponibilidade esses imóveis; fez juntar no rol inclusive um bem de seu patrimônio pessoal consistente na moradia dele.
3. A acusação formulada é perfeitamente viável, pois foi lastreada em farta documentação coligida aos autos, com especial ênfase nos balancetes referentes aos meses de dezembro de 1998 e janeiro de 1999, através dos quais constata-se claramente a existência de contrafação nos documentos contábeis do" Grupo OK ". Ademais, a legitimidade do Ministério Público para desenvolver atividade persecutória é fundada na própria Carta Magna, artigo 129, incisos I e VI, tendo a questão sido regulamentada pela Lei Complementar nº 75/93, em seu artigo , incisos I a IV. Assim, nada obsta o Ministério Público de investigar os fatos criminosos passíveis de ação penal pública, tanto que o inquérito policial, para a propositura da ação pertinente é dispensável, desde que haja elementos suficientes a embasá-la, nos termos do artigo 39, , do Código de Processo Penal, exatamente o que ocorreu no caso vertente, onde o órgão ministerial cumpriu fielmente seu mister, ao oferecer denúncia para apuração, em juízo, dos fatos noticiados em representação criminal, devidamente instruída com todas as peças de informação necessárias, pertinentes e aptas a fornecer justa causa à presente ação penal. Além disso, ninguém ignora o caráter inquisitorial do inquérito, onde eventuais diligências requeridas pelo investigado são ou não praticadas a critério do Delegado de Polícia (artigo 12 do CPP).
4. Não há nos autos nenhum indício de autoria delitiva em relação à contadora Jesuína, hábil a autorizar o exercício da ação penal pelo órgão acusador. Há apenas a certeza de que a mesma tinha conhecimento o que nunca foi negado da fraude perpetrada a mando e mediante acompanhamento do réu, fato este que não a torna partícipe do delito de falso, face à ausência do dever jurídico de impedir o resultado (art. 13, 2º, do CP). O fato de o Ministério Público deixar de oferecer denúncia contra quem o órgão não reconheceu presente a existência de indícios de autoria na prática do delito, não ofende o princípio da obrigatoriedade da ação penal pública.
5. Cabe à serventia realizar a intimação sempre em nome de quem detém, de direito, a outorga, que no caso em tela competia ao defensor dativo nomeado pelo juízo processante 4 (quatro) meses antes da audiência de inquirição das testemunhas arroladas pela acusação, realizada no juízo deprecado e na qual o réu compareceu acompanhado de defensora constituída, sem, contudo, ter juntado aos autos o necessário mandato procuratório.
6. Não está obrigado ao dever de sigilo profissional o contabilista empregado de uma firma que toma conhecimento de fraudes perpetradas através da escrituração mercantil, realizada por outros contadores a mando do patrão (Código de Ética Profissional do Contabilista, Capítulo II, artigo 2º, inciso II). Ora, se o regulamento que disciplina a profissão de contabilista exige do profissional a guarda de sigilo sobre " exercício profissional lícito ", resta evidente que a salvaguarda não abrange a falsificação de balancetes da empresa.
7. A desclassificação do delito para ilícito de pequeno potencial ofensivo não exclui a competência do Tribunal para conhecer do apelo do Ministério Público em que se visa o restabelecimento da classificação original do crime. Além disso, consoante disposto no artigo 25 da Lei nº 10.259 de 12/07/2001, não serão remetidas aos Juizados Especiais as demandas ajuizadas até a data de sua instalação. Ora, a presente ação penal foi iniciada até antes da vigência da citada Lei e, portanto, antes mesmo da instalação do Juizado Especial Criminal nesta Capital.
8. A materialidade delitiva está comprovada pelos documentos de fls. 82/88 e 94/240, que demonstram a alteração perpetrada nos balancetes que foram juntados aos autos da Ação Civil Pública, com o inequívoco propósito de se obter o levantamento da indisponibilidade que recaía sobre alguns imóveis.
9. Não é por causa da apresentação de" fotocópias não autenticadas "que o réu foi processado, e sim por promover a contrafação de documentos mercantis cujos originais fez apresentar, por advogado constituído, ao Juízo da 12ª Vara Cível; originais, aliás, assinados por contadora que assim " autenticou "o conteúdo dos papéis construídos inidoneamente, restando, dessa forma, manifestamente equivocada a alegação da defesa, em sustentação oral em sessão de julgamento, de atipicidade do fato porquanto o objeto material do delito seriam apenas" fotocópias não autenticadas ".
10. Impropriedade da subsunção da conduta delituosa do réu ao artigo 347 do Código Penal (cujo núcleo é"inovar", que significa introduzir efetivamente uma modificação física no estado natural da coisa) procedida pelo Juiz a quo ao proferir a sentença. No caso dos autos, o réu, de modo artificial, com uso de falso material e ideológico," criou "um suposto meio de prova que o favorecia em processo cível. Não alterou o " estado "do que já existia, e sim" criou "uma prova nova conspurcada, porque seu berço de criação foi a farsa, a fraude. O que se operou foi a modificação de localização dos referidos bens nos registros contábeis do" Grupo OK ", tendo obviamente o estado físico dos imóveis permanecido incólume.
11. O meio de que se valeu o apelante para o cometimento do crime era absolutamente eficaz a iludir os sentidos ou a inteligência do homo medius , apresentando vários aspectos de semelhança com o original, sendo que a empreitada criminosa só não alcançou êxito em virtude do zelo e cautela do digníssimo Juiz oficiante na Ação Civil Pública que, não satisfeito com a documentação carreada aos autos - que, frisa-se, já era falsa - e tendo em vista o relevante interesse público em questão, determinou a juntada de novos documentos, vindo só então a ser descoberta a manobra fraudulenta, através da comparação entre todos os registros mercantis e contábeis apresentados.
12. Autoria delitiva comprovada pela confissão do réu quanto à ciência da alteração perpetrada no balancete de janeiro de 1999, do seu inequívoco interesse direto no resultado das falsificações, da sua posição de superior hierárquico, da esclarecedora prova testemunhal produzida em juízo, tudo aliado a todas as demais provas e circunstâncias do fato, que denotam de maneira irrefutável que o réu, livre e conscientemente, podendo determinar-se segundo seus propósitos, ordenou a seus subordinados a falsificação material e ideológica de vários balancetes contábeis de sua empresa no manifesto propósito de evitar qualquer comprometimento pessoal para neles inserir imóveis integrantes do" ativo permanente” bens particulares e do "Grupo OK" no intuito de induzir o juízo em erro e, assim, eximi-los do gravame da indisponibilidade judicialmente decretada nos autos da Ação Civil Pública. Não há dúvidas de que o réu, como mandante, deve ser tido por falsário. É autor do falso, na medida em que ordenou e promoveu a contrafação que foi materialmente formalizada por terceiras pessoas. E usou o "falsum" perante a 12ª Vara Federal.
13. Quando é o próprio falsário quem usa o documento falso é de se reconhecer a progressão criminosa e apená-lo somente pelo crime de falso, restando o uso como exaurimento impunível. Entende-se, na melhor doutrina, haver uma só conduta embora composta por 2 (duas) ações (falsificar e usar) que ofendem o mesmo bem jurídico (fé pública), sendo que a potencialidade lesiva da contrafação é concretizada no uso o qual se torna um "post factum" impunível.
14. Face à restauração da capitulação originária dos fatos, esvaziou-se de conteúdo a insurgência do réu tratada em preliminar quanto a insuficiente fundamentação da dosimetria penal referente ao artigo 347 do Código Penal; restando prejudicada essa questão.
15. Atentando-se às múltiplas circunstâncias judiciais desfavoráveis ao réu (culpabilidade acentuada, má conduta social, personalidade maculada e motivos altamente repreensíveis), ao mínimo legal da pena privativa de liberdade prevista no preceito secundário do artigo 297 do Código Penal, foi acrescido (metade), alcançando-se a pena-base de 3 (três) anos de reclusão, consoante as diretrizes do artigo599 doCódigo Penall. Sendo de rigor a incidência da agravante capitulada no artigo 62 2, I, do Código Penal l, a pena-base foi aumentada em 1/6 (um sexto), alcançando-se a pena corporal definitiva de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão. Seguindo a mesma metodologia, a pena pecuniária foi fixada em 17 (dezessete) dias-multa, mantido o valor unitário determinado na r. sentença monocrática, de 15 (quinze) salários mínimos, devidamente fundamentado na capacidade econômica do acusado, que é um conhecido empresário de sucesso e foi Senador da República, detentor de expressivo patrimônio.
16. É fato incontestável que o réu não operou a falsificação dos balancetes de próprio punho, no manifesto propósito de evitar comprometimento pessoal, sendo correto afirmar, com sustentáculo na prova testemunhal colhida nos autos e através da demonstração do indiscutível interesse direto na concretização das referidas adulterações contábeis, que ele ordenou, promoveu, organizou e comandou a atividade dos demais agentes - seus funcionários - que lhe eram diretamente subordinados, restando ainda a materialidade da participação de terceiros indiscutivelmente corroborada por Laudo de Exame Documentoscópico. Ademais, é cediço que para a caracterização da agravante em comento a lei penal não exige a identificação de todos os concorrentes que tenham efetivamente participado da empreitada criminosa.
17. O regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade deve considerar, além da quantidade da pena aplicada (artigo 33, , do Código Penal), as condições pessoais do réu (artigo 33, 3º c.c artigo 59, ambos do estatuto repressivo), a fim de ser cumprida a regra constitucional da individualização da reprimenda. Dessa forma, ainda que o quantum da pena privativa de liberdade fixada seja inferior a 4 (quatro) anos, a minuciosa valoração negativa anteriormente explanada acerca da culpabilidade, conduta social, personalidade do agente e motivos do crime, autorizam e justificam a imposição do regime semi-aberto para o início do cumprimento da pena privativa de liberdade, no caso "sub judice", em perfeita consonância com os critérios de necessidade e suficiência da resposta penal.
18. O não preenchimento dos requisitos subjetivos estampados no inciso III, do artigo 44, do Código Penal, aliado ao total menoscabo do réu para com a Justiça, bem como à forma destemida e audaciosa com que visou enganar o juízo, revelam a impossibilidade, insuficiência e inadequação social da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
19. Com relação a pena aplicada e ao regime eleito, o caso enseja a determinação de prisão do réu, nos termos da Súmula nº 267 do Superior Tribunal de Justiça que tem o seguinte discurso: "a interposição de recurso, sem efeito suspensivo, contra decisão condenatória não obsta a expedição de mandado de prisão".
20. Nos termos do artigo 598 do Código de Processo Penal admite-se a apelação do assistente de acusação já habilitado somente em caráter supletivo, ou seja, quando se omite o Ministério Público. Como no caso houve oportuno recurso do Parquet , não se deve conhecer da apelação da União que, aliás, comodamente limitou-se a ratificar as razões do recurso interposto pelo Parquet .
21. Apelação ministerial parcialmente provida.
22. Apelação do réu não provida."

Opostos embargos declaratórios pelo recorrente, foram rejeitados, fls. 1541/1542.

Daí o especial, calcado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, em que se alega, além de divergência jurisprudencial:

a) ofensa aos artigos 619 e 620 do Código de Processo Penal, pois o Tribunal de origem, mesmo instado em sede de embargos declaratórios, não teria apreciado a apontada nulidade da ação penal pela"ausência de elementos mínimos capazes de sustentar o oferecimento da denúncia sem o devido aprofundamento das investigações, a necessidade para o caso em tela da instauração de inquérito ante a evidente insuficiência de indícios, a opção do Ministério Público em ter respaldado a denúncia principalmente com base em depoimento da Sra. Jesuína, que é inimiga declarada do ora recorrente."Neste ponto, sustenta ser nulo o processo, pois a denúncia foi oferecida com base, exclusivamente, em investigação realizada pelo parquet (art. 39, 5º, do CPP);

b) que o aresto teria sido omisso também quanto à alegação de que o juiz ao realizar a emendatio libelli , imputando ao recorrente crime de menor potencial ofensivo, deveria ter dado oportunidade ao parquet para se manifestar com relação aos benefícios da Lei nº 9.099/95 ou se insurgir contra tal desclassificação. Ressalta"que tal procedimento seria o único a não arredar do réu o direito ao duplo grau de jurisdição vez que, caso reformada a decisão pela instância ad quem , retornariam os autos à origem para que o juiz viesse a apreciar a ocorrência ou não de materialidade delitiva segundo a classificação conferida ao caso pela Corte de Apelação.";

c) violação aos artigos 60 da Lei nº 9.099/95 e 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001 e 593 e 599 do Código de Processo Penal, afirmando não ser possível a modificação da capitulação legal direto em segundo grau, devendo ser reconhecida a nulidade do acórdão"naquilo que apreciou o mérito da imputação original da denúncia", devendo ser determinado"o retorno dos autos à 1ª instância para que julgue tais questões, prosseguindo-se o feito a partir de então, garantindo-se ao réu a apreciação no duplo grau de jurisdição quanto à matéria fática da causa";

d) que o Tribunal de origem teria deixado de enfrentar, ademais, a tese de ofensa aos princípios da indisponibilidade, obrigatoriedade e indivisibilidade da ação penal, uma vez que o órgão acusatório não indiciou no pólo passivo a contadora Jesuína Varandas Ferreira;

e) alternativamente, que se reconheça a"vulneração aos artigos 24 e 42 do CPP e 515 e seus parágrafos do CPC, bem como ofensa ao art. , letra d da Lei Complementar n. 75/93, determinar a nulidade da denúncia apresentada, determinando-se o retorno dos autos à origem para que o MPF inclua no polo passivo da ação penal a Srª. Jesuína Varandas, prosseguindo-se o feito como de direito a partir de então";

f) ter ocorrido cerceamento de defesa, contrariando o disposto nos arts. 261, 263, 370 e 570 do Código de Processo Penal, pois o defensor constituído em audiência não foi intimado da prática de vários atos, uma vez que as intimações continuaram a correr em nome da defensora dativa. Assevera que"se admitido que a advogada deveria ter juntado aos autos o instrumento procuratório, a violação ao art. 13 do CPC surge flagrante, tendo em vista que constatada irregularidade de representação na instância ordinária, cumpre ao Juiz mandar a parte sanar o vício com prazo razoável, o que não ocorreu";

g) contrariedade ao disposto no art. 207 do Código de Processo Penal, pois nulo o testemunho de Jesuína Varandas Ferreira, que era a contadora responsável pelas empresas do recorrente,"sendo que as informações que prestou somente foram obtidas em razão do exercício da atividade de confiança que desempenhava. Houve in casu , quebra do dever de sigilo decorrente da profissão".

Acentua que"demonstrada a violação ao art. 207 do CPP e tendo o v. Acórdão recorrido se baseado exclusivamente no depoimento desta testemunha para declarar a autoria do recorrente quanto ao suposto crime, merece o presente recurso conhecimento e provimento para, afastando-se aquela prova, julgar improcedente a ação penal ou, quando menos , determinar o retorno dos autos ao eg. Tribunal Regional Federal da 3ª Região para julgar a apelação como entender de direito, desconsiderando-se tal depoimento;

h) mais uma vez omissão no acórdão, que não teria analisado a tese da defesa de existir dúvida quanto a autenticidade dos documentos que são objeto da presente ação penal, uma vez que não passavam de meras fotocópias. Afirma que "mesmo que não seja acolhida a preliminar, ainda assim merece o presente recurso especial conhecimento e provimento, pois, ao condenar o réu sem indicar as provas em que se baseou, cometeu o Eg. Tribunal violência aos artigos 381, III, 386 e 387 do CPP, vez que proferiu, neste aspecto, decisão desfundamentada, com o que deve ser declarado nulo o respectivo acórdão - para que outro seja proferido sem os vícios apontados";

i) a atipicidade da conduta, pela ineficácia do meio, sendo que a defesa "destacou que a denúncia foi clara em afirmar que a suposta falsificação ocorreu em um único balancete mensal (janeiro de 1999) - o qual foi apresentado à MMª 12ª Vara Federal Cível de São Paulo -, sendo que os demais 59 balancetes mensais, sejam os anteriores (de janeiro de 1995 a dezembro de 1998 ou os posteriores (de fevereiro de 1999 a dezembro de 1999), não seriam falsos." Assim, sendo, o documento apresentado não teria potencialidade de induzir o juízo em erro. Enfatiza que "os balancetes considerados fraudados não tinham a capacidade de determinar a liberação dos bens, ainda que suas informações fossem verdadeiras";

j) por fim, violação dos arts. 33, , 44 e 59, todos do Código Penal, afirmando que o recorrente faz jus ao regime aberto e à substituição da pena por medidas restritivas de direitos.

Inadmitido o recurso pelo Tribunal de origem, fls. 1819/1833, foi interposto agravo de instrumento ao qual o Ministro Paulo Gallotti, antigo relator, deu provimento determinando a sua conversão em recurso especial (fls. 1869).

A Subprocuradoria-Geral da República, no parecer de fls. 1875/1902, opina pelo não conhecimento do apelo pela alínea c, e que se negue provimento quanto ao fundamento da alínea a.

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE) (RELATOR): Adoto, como razão de decidir, o substancioso parecer da lavra do Subprocurador-Geral da República Francisco Dias Teixeira , in verbis :

"10. O recorrente, em suas razões de recurso, limitou-se a transcrever ementas e excertos de acórdãos que, segundo afirma, divergem do acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, ora recorrido.
Nos termos do art. 255 do Regimento Interno deste Superior Tribunal de Justiça e conforme tem decidido esta Corte, não basta a simples transcrição de ementas para a apreciação da alegada divergência jurisprudencial, mas devem ser juntadas cópias integrais das decisões apontadas por paradigma, ou citado o repositório oficial de jurisprudência em que tenham sido publicadas, e demonstradas as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os casos confrontados.
Assim, o Ministério Público Federal é de parecer que o recurso não apresenta condição para ser conhecido com base na alínea c do inciso III do art. 105 da Constituição Federal (dissídio jurisprudencial).
SOBRE AS ALEGAÇÕES DO RECORRENTE
As argüições de nulidade
11. Negativa de vigência ao art. 39, , 619 e 620, todos do CPP: denúncia com base, exclusivamente, em investigações feitas pelo Ministério Público omissão do acórdão sobre a questão.
11.1. Ao contrário do que o recorrente afirma, o v. acórdão manifestou-se, e longamente, sobre a argüição de inidoneidade das provas, porque não colhidas em sede de inquérito policial. Esta questão é objeto do item 1 do v. acórdão (fls. 1334/1338). Decidiu bem, pois, o E. Tribunal Regional, ao negar provimento aos embargos de declaração relativamente a esta matéria, pois o que o recorrente pretendia era ver sua tese vencedora, com base na jurisprudência por ele invocada.
11.2. Mas também não se verifica negativa de vigência ao art. 39, , do CPP.
Diz a norma processual-penal:
" O órgão do Ministério Público dispensará o inquérito, se com a representação forem oferecidos elementos que o habilitem a promover a ação penal, e, neste caso, oferecerá a denúncia no prazo de 15 (quinze) dias. "
Ao dispensar o inquérito policial, o Ministério Público agiu exatamente conforme lhe autoriza a norma processual-penal.
Por outro lado, a avaliação sobre a suficiência da prova para instruir a denúncia cabe, num primeiro momento, ao Ministério Público; num segundo momento, ao Juízo, quando procede ao juízo de admissibilidade da denúncia. E num terceiro momento caberia ao próprio acusado, insurgindo-se contra a decisão de recebimento da denúncia. Mas tudo se passa ao largo da exigibilidade do inquérito policial, que, diferentemente do que o recorrente sustenta, a Lei Processual Penal prevê, exatamente, a sua dispensa.
Ademais, a questão atinente aos elementos que habilitem o Ministério Público a promover a ação penal remete-se à fase pré-processual, diz respeito à justa causa para a denúncia, que ficou superada pela sentença, e, de qualquer forma, refere-se a matéria de prova, insuscetível de ser analisada em sede de recurso especial.
11.3. Por fim, é de se anotar que, após a promulgação da Constituição de 1988, a questão atinente ao poder investigatório do Ministério Público passou a ter alçada constitucional, e, assim, a questão haveria de ser suscitada pelo recorrente em recurso extraordinário, que ele também interpôs.
Com efeito, as funções institucionais do Ministério Público estão previstas na Constituição Federal, verbis :
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: I promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
[...]; VII exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII requisitar diligências investigatórias e a instrução de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais;
[...].
A própria Lei Maior, ao outorgar ao Ministério Público a titularidade da ação, conferiu-lhe os meios indispensáveis ao desempenho dessa função. Realmente, não seria adequado que o Ministério Público, para desincumbir-se dessa função primordial e exclusivamente sua a promoção da ação penal pública ficasse sujeito a outro agente ou órgão público, no que se refere à colheita dos elementos probatórios indispensáveis à instrução da denúncia penal. Bem por isso, já na Lei Maior, ficou assegurada ao Ministério Público a possibilidade de requisitar diligências investigatórias e a instrução de inquérito policial .
E mais: conferiu-se ao Ministério Público a função de controle externo da atividade policial. A finalidade desse controle , de um lado, é zelar pelo respeito aos direitos do investigado, e, de outro, balizar as diligências investigatórias da Polícia Judiciária, de forma que elas se conduzam no sentido de obtenção de elementos probatórios úteis à elucidação do fato criminoso, para a formação da opinio delicti pelo titular da ação.
Se ao Ministério Público é conferido poder para requisitar a investigação criminal, e, diante de procedimento levado a efeito por outro órgão da Administração Pública, pode, de pronto, oferecer denúncia, tem ele também legitimidade, na condição de titular da ação penal pública, para instaurar procedimento investigatório de infração penal, quando, dada a peculiaridade do caso, tornar-se conveniente à elucidação do crime que a investigação seja realizada diretamente pelo titular da ação penal.
Nesse sentido tem sido a jurisprudência desta Superior Corte de Justiça, conforme verifica-se nos excertos a seguir transcritos:
EMENTA
"[...].
O respeito aos bens jurídicos protegidos pela norma penal é, primariamente, interesse de toda a coletividade, sendo manifesta a legitimidade do Poder do Estado para a imposição da resposta penal, cuja efetividade atende a uma necessidade social.
Daí por que a ação penal é pública e atribuída ao Ministério Público, como uma de suas causas de existência. Deve a autoridade policial agir de ofício. Qualquer do povo pode prender em flagrante. É dever de toda e qualquer autoridade comunicar o crime de que tenha ciência no exercício de suas funções. Dispõe significativamente o artigo 144 da Constituição da Republica que "A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio."
Não é, portanto, da índole do direito penal a feudalização da investigação criminal na Polícia e a sua exclusão do Ministério Público.
Tal poder investigatório, independentemente de regra expressa específica, é manifestação da própria natureza do direito penal, da qual não se pode dissociar a da instituição do Ministério Público, titular da ação penal pública, a quem foi instrumentalmente ordenada a Polícia na apuração das infrações penais, ambos sob o controle externo do Poder Judiciário, em obséquio do interesse social e da proteção dos direitos da pessoa humana.
Em nossa compreensão, é esse o sistema de direito vigente.
Diversamente do que se tem procurado sustentar, como resulta da letra de seu artigo 144, a Constituição da Republica não fez da investigação criminal uma função exclusiva da Polícia, restringindo-se, como se restringiu, tão-somente a fazer exclusivo da Polícia Federal o exercício da função de polícia judiciária da União (parágrafo 1º, inciso IV).
Essa função de polícia judiciária qual seja, a de auxiliar do Poder Judiciário , não se identifica com a função investigatória, qual seja, a de apurar infrações penais, bem distinguidas no verbo constitucional, como exsurge, entre outras disposições, do preceituado no parágrafo 4º do artigo 144 da Constituição Federal, verbis :
"4º às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
Tal norma constitucional, por fim, define, é certo, as funções das polícias civis, mas sem estabelecer qualquer cláusula de exclusividade .
O poder investigatório que, pelo exposto, se deve reconhecer, por igual, próprio do Ministério Público é, à luz da disciplina constitucional, da espécie excecional, fundada na exigência absoluta de demonstrado interesse público ou social.
O exercício desse poder investigatório não é, por óbvio, estranho ao Direito, subordinando-se, à falta de norma legal particular, no que couber, analogicamente, ao Código de Processo Penal, sobretudo na perspectiva da proteção dos direitos fundamentais e da satisfação do interesse social, que impedem a reprodução simultânea de investigações, reclamam o ajuizamento tempestivo dos feitos inquisitoriais e determinam a obrigatória oitiva do indiciado autor do crime e a observância das normas legais relativas ao impedimento, à suspeição e à prova e sua produção.
5. Em figurando autoridade policial ou seu agente como sujeito ativo do delito, levado a cabo a pretexto de cumprimento de dever legal, é óbvia a legitimidade do Ministério Público, na dupla perspectiva da proteção dos direitos fundamentais e da satisfação do interesse social, que mais se potencializam à luz do seu dever-poder de exercer o controle externo da atividade policial (Constituição da República, artigo 129, inciso VII).
6. Recurso especial provido."
(6ª Turma; REsp nº 402.419/RO, julgado de 21/10/03, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO)
EMENTA
"[...].
- A questão acerca da possibilidade do Ministério Público desenvolver atividade investigatória objetivando colher elementos de prova que subsidiem a instauração de futura ação penal, é tema incontroverso perante esta eg. Turma. Como se sabe, a Constituição Federal, em seu art. 129, I, atribui, privativamente, ao Ministério Público promover a ação penal pública. Essa atividade depende, para o seu efetivo exercício, da colheita de elementos que demonstrem a certeza da existência do crime e indícios de que o denunciado é o seu autor. Entender-se que a investigação desses fatos é atribuição exclusiva da polícia judiciária, seria incorrer-se em impropriedade, já que o titular da Ação é o Órgão Ministerial. Cabe, portanto, a este, o exame da necessidade ou não de novas colheitas de provas, uma vez que, tratando-se o inquérito de peça meramente informativa, pode o MP entendê-la dispensável na medida em que detenha informações suficientes para a propositura da ação penal.
- Ora, se o inquérito é dispensável, e assim o diz expressamente o art. 39, , do CPP, e se o Ministério Público pode denunciar com base apenas nos elementos que tem, nada há que imponha a exclusividade às polícias para investigar os fatos criminosos sujeitos à ação penal pública.
- A Lei Complementar nº 75/90, em seu art. 8º, inciso IV, diz competir ao Ministério Público, para o exercício das suas atribuições institucionais,"realizar inspeções e diligências investigatórias". Compete-lhe, ainda, notificar testemunhas (inciso I), requisitar informações, exames, perícias e documentos às autoridades da Administração Pública direta e indireta (inciso II) e requisitar informações e documentos a entidades privadas (inciso IV)."
(5ª Turma; HC nº 27.113/MG, julgado de 17/6/03, Rel. Ministro JORGE SCARTEZZINI)
EMENTA
"[...].
2. A legitimidade do Ministério Público para conduzir diligências investigatórias decorre de expressa previsão constitucional, oportunamente regulamentada pela Lei Complementar, mesmo porque proceder à colheita de elementos de convicção, a fim de elucidar a materialidade do crime e os indícios de autoria, é um consectário lógico da própria função do órgão ministerial de promover, com exclusividade, a ação penal pública.
3. A competência da polícia judiciária não exclui a de outras autoridades administrativas. Inteligência do art. , único, do Código de Processo Penal. Precedentes do STJ.
4. Writ parcialmente conhecido e, nessa parte, denegado."
(5ª Turma; HC nº 29.159/SP, julgado de 4/12/03, Rel. Ministra LAURITA VAZ)
12. Contrariedade às normas contidas nos arts. 60 e 89 da Lei nº 9.099/95, no art. , parágrafo único, da Lei nº 10.259/01, nos arts. 593 e 599 do CPP, no art. 515, , do CPC porque o Juiz, ao realizar emendatio libelli, não remeteu o processo ao Juizado Especial de Pequenas Causas
Não merece procedência a argumentação do recorrente sobre esta questão. Não houve contrariedade a qualquer dos dispositivos legais por ele invocados.
Mesmo abstraindo-se o fato de que, quando da entrada em vigência da Lei nº 10.259/01, o Ministério Público Federal já houvera ajuizado a ação penal, portanto, esta lei que criou o Juizado Especial na Justiça Federal não se aplica ao presente caso, nos termos do art. 25 da mesma lei mesmo abstraindo-se este fato, não procede a alegação do recorrente. É que a Acusação recorreu da sentença condenatória na parte em que ela procedeu à desclassificado do fato para crime de menor potencial ofensivo. Portanto, ainda que o MM. Juiz houvesse apenas procedido à desclassificação, essa decisão seria mesmo remetido ao Tribunal, por força do recurso no Ministério Público, e assim toda a matéria seria devolvida à apreciação do Tribunal, que viria, conforme realmente veio, a reformar aquela emendatio libelli (que dera ao fato a definição do art. 347 do Código Penal), resultando, conforme resultou, a condenação do réu como incurso no art. 297, , do Código Penal.
Por semelhante razão também não procede a alegação do recorrente no sentido de que o MM. Juiz, ao proceder à emendatio libelli, deveria abrir vista dos autos ao Ministério Público para que o órgão de Acusação se manifestasse sobre a transação penal. É que, ao recorrer da decisão que propiciaria a transação penal, de modo implícito mais inequívoco, o Ministério Público recusou-se a propor transação penal ao acusado. E nem se diga que, em face dessa recusa implícita, o MM. Juiz deveria remeter a questão ao órgão superior do Ministério Público (art. 28 do CPP e súmula 696 do STF), porque o Ministério Público não apenas se recusou a apresentar a proposta, mas também recorreu da decisão que o autorizaria a formulá-la. Assim, a questão foi devolvida ao Tribunal. Conseqüentemente, apenas se o Tribunal mantivesse a decisão de 1ª instância o que não ocorreu e o órgão do Ministério Público persistisse na recusa, é que a questão deveria ser levada ao órgão superior do Ministério Público.
13. Negativa de vigência aos arts. 24 e 42 do CPP; contrariedade ao art. , letra “d”, da Lei Complementar nº 75/93 e ao art. 515 e parágrafos do CPC; negativa de vigência aos arts. 619 e 620 do CPP: ofensa aos princípios da indisponibilidade, obrigatoriedade, indivisibilidade e devolutividade da ação penal ausência de denúncia contra Jesuína Varandas Ferreira manifestação do Tribunal sobre as questões
13.1. O Tribunal decidiu, de modo fundamentado, sobre estas questões, conforme pode-se ler no item 2 do v. acórdão (fls. 1338/1342). Portanto, os embargos de declaração não mereciam procedência também nesta parte.
E o E. Tribunal Regional Federal não acolheu as alegações do recorrente ao fundamento de que “Não há nos autos nenhum indício de autoria delitiva em relação à Jesuína, hábil a autorizar o exercício da ação penal pelo órgão acusador. Há apenas a certeza de que a mesma tinha conhecimento o que nunca foi negado da fraude perpetrada a mando e mediante acompanhamento de LUIZ ESTEVAO, fato este que não a torna partícipe do delito de falso, face à ausência do dever jurídico de impedir o resultado (art. 13, 2º, do CP)” à fl. 1338 destaques constantes do original.
Portanto, antes mesmo de se chegar à questão dos princípios da indisponibilidade, obrigatoriedade e indivisibilidade da ação penal, o recurso, nesta parte, esbarra em questão atinente à prova.
Não é viável, C. Tribunal, em sede de recurso especial, revolver todo o acervo probatório que sustentou a denúncia, de modo a verificar se há indício de autoria contra a senhora Jesuína, para, só então, e se se concluir pela existência de algum indício, posteriormente, essa Corte vir a manifestar-se sobre a aplicabilidade dos mencionados princípios processuais, e, conseqüentemente, se a senhora Jesuína haveria de figurar como co-ré da ação penal.
A argüição restou, pois, estancada na questão da prova, pelo Tribunal a quo , competente para apreciar a prova e decidir sobre esta matéria.
14. Violação às normas contidas no art. 13 do CPC e nos arts. 261, 263, 266, 370 e 570, e posterior violação aos arts. 619 e 620, todos do CPP, por falta de intimação do defensor constituído: cerceamento de defesa ausência de manifestação do Tribunal sobre a matéria
Igualmente às argüições anteriores, aqui também não assiste razão ao recorrente ao dizer que o v. acórdão é nulo por não se manifestar sobre a controvérsia. A questão encontra-se discutida no item 3 do v. acórdão (fls. 1342/1342), e a decisão está bem fundamentada.
Conforme explicado no v. acórdão, a nomeação de advogado ao réu/recorrente, pelo juízo do processo, deveu-se ao fato de o réu não ter constituído advogado; e, posteriormente, quando ele compareceu acompanhado de advogada, perante o juízo deprecado (Brasília), a causídica não fez juntar aos autos instrumento de mandato, motivo pelo qual ele continuou a ser defendido pelo advogado dativo, perante o juízo do processo (em São Paulo); e só depois de proferida a sentença é que o réu se fez representado no processo por advogado constituído, que apresentou instrumento de mandato.
Realmente, se o acusado não se fez representar no processo por advogado constituído, o MM. Juiz do processo não haveria de ter por sua advogada constituída a causídica que simplesmente o acompanhara, sem instrumento de mandato, na audiência de oitiva de testemunha em juízo deprecado. O razoável era, mesmo, considerar que a função dessa advogada exaurira-se naquele ato, e o réu (bem instruído e cercado de recursos materiais grande empresário e ex-Senador da República) preferia, por alguma razão calculada, não constituir advogado para se defender. Assim, não restou ao juízo senão continuar tendo por seu defensor o advogado dativo, de modo a lhe assegurar o direito constitucional de defesa.
15. Ofensa ao art. 207 do CPP; ofensa aos arts. 619 e 620 do CPP: nulidade da decisão condenatória porque baseada no depoimento de testemunha que era responsável pela contabilidade das empresas do acusado, e, assim, estava proibida de depor omissão do acórdão sobre a questão
Conforme decidiu o E. Tribunal a quo, em conformidade com a norma contida no art. 207 do Código de Processo Penal, explicitada pelo art. 2º do Código de Ética Profissional do Contabilista, “o contabilista não tem o dever de guardar sigilo sobre fatos ilícitos descobertos no exercício da atividade profissional” (fl. 1344).
Ademais, no caso em análise, constata-se na análise da prova testemunhal que a senhora Jesuína tomou conhecimento do fato sobre o qual depôs em juízo não propriamente em sua condição de contadora, mas de funcionária da empresa. Quem teria tomado conhecimento do fato na condição de contadoras seriam Eliana Suely Freitas da Cunha e Bernadete Pinto de Azevedo, que teriam procedido à alteração dos balancetes da empresa, a mando do acusado LUIZ ESTEVAO.
16. Violação aos arts. 381, III, e 386 e 387, todos do CPP, porque a decisão condenatória não indica as provas em que se baseou, e afirma que o balancete tido por falso era original, enquanto que a denúncia afirma que se tratou de cópia, juntada aos autos da ação civil pública; ofensa aos arts. 619 e 620 do CPP, por falta de pronunciamento do Tribunal sobre a questão
Contrariamente ao que o recorrente afirma, o acórdão recorrido procedeu a nova análise do acervo probatório, de modo a verificar a sustentação do decreto condenatório, e concluiu que ele estava bem alicerçado, conforme pode-se observar às fls. 1348 e seguintes. Portanto, não havia mesmo de ser dado provimento aos embargos de declaração também neste ponto.
Aqui também, sob alegação de que houve violação às normas contidas nos arts. 381, III, e 386 e 387, do CPP, a insurgência do recorrente é quanto à conclusão a que o Tribunal a quo chegou sobre o complexo probatório, e o que ele objetiva é nova análise das provas em sede de recurso especial.
A questão suscitada pelo recorrente quanto a ser original ou fotocópia o balancete apresentado no juízo cível, e tido por falso é irrelevante a questão. É irrelevante porque a falsidade (que se teve por existente) não se refere ao suporte material do documento (e mesmo se assim fosse, a questão seria irrelevante à acusação, salvo se o acusado, por sua vez, suscitasse incidente de falsidade, de modo a provar que a cópia não fora por ele levada aos autos e nem correspondia ao documento por ele produzido mas isso ele não diz). A falsidade de que aqui se cuida diz respeito ao conteúdo do documento (falsidade ideológica), portanto, seja o instrumento material original seja fotocópia, o conteúdo (falso) é o mesmo.
17. Violação aos arts. 299 e 304 do CP, como também aos arts. 381, III, 386, II e III, 43, I, e 41, todos do CPP: atipicidade do fato por inidoneidade do falsum
Também nesta parte o recorrente suscita questão relativa a prova. É que, salvo hipótese excepcional, em que não se controverte sobre questões fáticas, e delas exsurge, de plano e indubitavelmente, a ineficácia do meio para a consumação do crime (v.g., com a devida vênia, não se atenta contra a vida de alguém utilizando como arma contundente uma folha de papel), salvo semelhante hipótese, a verificação da potencialidade do meio para alcançar o fim criminoso demanda análise de todas as circunstâncias do caso, da prova, portanto.
No caso em análise, e mesmo sem se adentrar na análise da prova, observa-se que não se questionou a imitatio veri do documento. Ao que se discutiu neste processo, os documentos falsos nada continham que denunciasse, de plano, a falsidade: havia, somente, uma discrepância entre o valor dos imóveis neles descritos e o valor efetivo desses imóveis, constante de outros balancetes. Não seria possível ao juízo e a ninguém que não conhecesse intimamente a contabilidade da empresa, detectar o falsum; isto só foi possível depois da juntada de outros balancetes aos autos (o que não seria de rigor, mas se deu por uma extraordinária cautela do juízo), o que permitiu a confrontação de balancetes.
Assim, e sem maiores incursões no contexto probatório, conclui-se que a r. decisão não contrariou os mencionados dispositivos legais, quer no tocante à tipicidade quer no tocante à apreciação das provas.
18. Negativa de vigência aos arts. 59, 44, 33, incisos I, II e III e , “c”, todos do CP: regime de cumprimento da pena em desproporção ao quantum da pena ausência de fundamentação quanto à negativa de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e quanto ao regime prisional
18.1. O 3º do art. 33 do Código Penal preceitua que “ A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código ”. As mesmas circunstâncias previstas no art. 59 do Código Penal servem, pois, de base para a fixação da pena e para o estabelecimento do regime inicial de seu cumprimento. Assim, em princípio, o réu condenado à pena mínima legalmente cominada ao crime tem direito a iniciar o cumprimento da pena no regime mais brando possível, em consonância com as prescrições contidas no 2º do art. 33, que, no caso em análise, seria o aberto.
18.2. Porém, no caso em análise, não obstante a pena ter ficado em patamar que permite o início de seu cumprimento em regime aberto, esse limite não se refere à pena mínima cominada ao crime, mas esta foi elevada em decorrência da má conduta social do réu e dos motivos que o levaram a praticar o crime, “altamente repreensíveis, pois revelam que o apelante agiu de maneira premeditada e audaciosa” (conforme consignado no v, acórdão fl. 1360).
Assim, e considerando-se que a pena ficou estabelecida em patamar próximo ao limite que, se fossem favoráveis todas as circunstâncias previstas no art. 59 do CP, seria possível o início de seu cumprimento em regime aberto, no alvitre deste membro do Ministério Público Federal, não é desarrazoada a fixação do regime semi-aberto. Poder-se-ia dizer, frente a tais circunstâncias, que desarrazoada seria uma operação em salto, fixando o regime fechado, o que não houve.
E os mesmos fundamentos também justificam a não substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos.
Daí porque, ao ver deste membro do Ministério Público Federal, não houve infringência a nenhuma das normas legais acima indicadas.
19. Pelos fundamentos expostos, o parecer é no sentido de que o recurso não seja conhecido ao fundamento da alínea c do inciso III do art. 105 da CF, e que lhe seja negado provimento quanto ao fundamento da alínea a.

Ante o exposto, conheço em parte do recurso especial e, nessa parte, nego-lhe provimento.

É como voto.


Documento: XXXXX RELATÓRIO E VOTO
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