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25 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal de Contas da União
há 3 anos

Detalhes

Processo

Partes

Julgamento

Relator

VITAL DO RÊGO

Documentos anexos

Inteiro TeorTCU_RP_16752021_304f9.pdf
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Inteiro Teor

Adoto como parte integrante do relatório a instrução de mérito elaborada pelo auditor lotado na Secretaria de Recursos -Serur, peça 170, que contou com a anuência do escalão gerencial da referida unidade técnica, peças 171 e 172, a seguir transcrita com os ajustes de forma pertinentes:

INTRODUÇÃO

1. Trata-se de pedidos de reexame interpostos pela União, por intermédio da Advocacia-Geral da União (peça 120) , pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) (peça 125) e pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) (peça 126) , contra o Acórdão 1.921/2019 (peça 102) , mantido pelo Acórdão por Relação 2.358/2019 (peça 131) , ambos do Plenário e sob a relatoria do Ministro Bruno Dantas, nos seguintes termos:

9.1. conhecer da presente representação, satisfeitos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 237, inciso VI, do Regimento Interno do TCU, para, no mérito, considerá-la procedente;

9.2. com fundamento nos arts. 32, inciso II, e 34, da Lei 8.443/1992, conhecer e rejeitar os embargos de declaração interpostos pela União Federal por meio da Advocacia-Geral da União (peça 98) ;

9.3. determinar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 113, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017;

9.4. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 6º do art. 150, e o § 11 do art. 201, ambos da CF/1988, e com o art. 14 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, adote providências para o estabelecimento de medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pela Lei 13.464/2017, a teor do art. 14 da LRF;

9.5. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 2º do art. 17 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, evidencie as medidas compensatórias, por meio do aumento permanente de receitas ou redução permanente de despesas, em montante equivalente ao pagamento da parcela fixa atualmente paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade, tendo em vista a criação e a majoração de despesas obrigatórias de caráter continuado promovidas pela edição da Lei 13.464/2017;

9.6. informar ao Ministério da Economia que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação, na forma dos subitens 9.4 e 9.5 acima, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15, da Lei Complementar 101/2000, ensejando a suspensão dos benefícios e pagamentos;

9.7. dar ciência ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com § 1º do art. 169 e o art. 107 do ADCT, todos da CF/1988, c/c arts. , 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, de que eventual projeto de lei que vise estabelecer medidas necessárias à implementação da remuneração variável paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho deve conter, no mínimo:

9.7.1. a evidenciação do atendimento aos requisitos insculpidos no § 1º do art. 169 da CF/88;

9.7.2. estimativas de impacto orçamentário-financeiro adequadas e coerentes acerca da majoração dessa despesa;

9.7.3. premissas e metodologia de cálculo utilizadas para se estimar o montante da despesa;

9.7.4. valores estimados que cada beneficiário individualmente irá perceber a título de BEP;

9.7.5. comprovação de que a despesa criada ou majorada não afetará as metas de resultados fiscais;

9.7.6. clara demonstração de que a majoração da despesa será compensada pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa;

9.8. recomendar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 107, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. , 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que eventual projeto de lei que vise estabelecer medidas necessárias à implementação da remuneração variável paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho estabeleça:

9.8.1. limite máximo do valor global dessa parcela remuneratória variável;

9.8.2. mecanismos que não vinculem a base de cálculo, a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16 da Lei 13.464/2017, à arrecadação de receitas, visando preservar a lógica pretendida pelo Novo Regime Fiscal;

9.9. encaminhar cópia da presente deliberação à Casa Civil, dado o risco de repercussão dessas questões, se não equacionadas, na apreciação das Contas do Presidente da República referentes ao exercício de 2019, conforme alertado em outras decisões do Tribunal;

9.10. encaminhar cópia da presente deliberação à Secretaria de Fiscalização de Pessoal do TCU, tendo em vista as irregularidades apontadas acerca do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho instituído pela Lei 13.464/2017, a fim de subsidiar a fiscalização daquela unidade instrutora no âmbito do TC Processo XXXXX/2018-0;

9.11. encaminhar cópia dos autos às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, bem como à Procuradoria-Geral da República, tendo em vista os aspectos de constitucionalidade da Lei 13.464/2017 tratados no presente relatório, notadamente aqueles relacionados à instituição de benefício fiscal em desacordo com a Constituição Federal de 1988, à vinculação de remuneração de servidores e ao potencial conflito de interesses na instituição de bônus de produtividade a agentes públicos;

9.12. dar ciência desta deliberação às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, à Procuradoria-Geral da República, ao Ministério da Economia, à Casa Civil da Presidência da República, à Advocacia-Geral da União, à Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, ao Sindicato Nacional dos Analistas Tributários da Receita Federal do Brasil, ao Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil e ao Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho;

9.13. autorizar o Relator, desde logo, a prorrogar monocraticamente os prazos definidos nos subitens 9.4 e 9.5 deste Acórdão, caso seja requerido, de forma justificada, pelo Ministério da Economia.

HISTÓRICO

2. Trata-se, originariamente, de representação da Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) , com vistas a avaliar a conformidade do pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade (BEP) na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, instituído pela Medida Provisória 765/2016, posteriormente convertida na Lei 13.464/2017, e dos Honorários Advocatícios de Sucumbência a servidores públicos, regulamentados pela Lei 13.327/2016, diante dos requisitos exigidos na Lei Complementar 101/2000 ( Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e, ainda, no artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).

2.1. Após análise preliminar dos fatos, o Relator a quo proferiu despacho (peça 5) , em que conheceu da representação e decidiu:

96.2. facultar a manifestação do Ministério da Economia e da Secretaria da Receita Federal no prazo de 24 horas, se desejarem, a respeito dos indícios de irregularidades apontados na presente representação, os quais ensejam a adoção imediata de medida cautelar no sentido da suspensão de todos os atos tendentes ao cálculo, à fixação e ao pagamento de parcelas remuneratórias a título de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, previsto na Lei 13.464/2017, e em especial sobre os seguintes aspectos, nos termos e fundamentos desta decisão:

96.2.1. Inexistência de previsão legal de valores, base de cálculo e metodologia de cálculo do Bônus de Eficiência, com consequente ofensa à reserva legal estrita para fixação de remuneração de servidores públicos;

96.2.2. Vinculação da espécie remuneratória a índices e indicadores;

96.2.3. Afetação da arrecadação de impostos a gastos específicos ( CF/88, art. 167, IV);

96.2.4. Efetivação de renúncia previdenciária sem atendimento aos requisitos da Lei de Responsabilidade Fiscal;

96.3. autorizar a Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) deste Tribunal a realizar inspeção no Ministério da Economia e na Secretaria da Receita Federal, conforme escopo que definir, para apurar os indícios de irregularidades identificados relativos aos pagamentos do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e na atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho;

96.4. destacar os indícios de irregularidade suscitados na manifestação da Secretaria de Macroavaliação Governamental (peça 1) relacionados ao pagamento de Honorários Advocatícios de Sucumbência, para que, preliminarmente, o Plenário delibere sobre a relatoria do feito, no que se refere a atos praticados no âmbito da Advocacia-Geral da União;

96.5. dar ciência à Procuradoria-Geral da República acerca das aparentes inconstitucionalidades, ilegalidades e/ou incompatibilidades identificadas na presente Representação (peças 1, 2, 3 e 5) , notadamente no que diz respeito ao confronto entre os dispositivos da Lei 13.464/2017 e os art. 37, inciso X, XIII, 150, § 6º, e 167, inciso IV, da Constituição Federal, bem como os art. 114, caput e §§ 3º e 4º da LDO/2016 (Lei 13.242/2015), e art. 118 da LDO/2017 (Lei 13.408/2016);

96.6. dar ciência desta decisão ao Ministério da Economia e à Secretaria da Receita Federal;'

2.2. Depois da oitiva dos órgãos responsáveis e análise das respostas encaminhadas, a Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) identificou diversas irregularidades na formatação do BEP, resumidas no voto condutor da deliberação recorrida, nos seguintes termos (peça 105, p. 3) :

a) Inexistência da Base de Cálculo e de Índices de Eficiência Institucionais previstos em lei formal;

b) Exclusão dos Bônus de Eficiência e Produtividade da base de cálculo de contribuição previdenciária;

c) Despesas criadas com a instituição dos Bônus de Eficiência e Produtividade;

d) Vinculação de espécie remuneratória a índices e indicadores;

e) Potencial conflito de interesses entre o público e o privado.

2.3. Diante das análises empreendidas pela unidade técnica, o Tribunal, preocupado com a gravidade dos fatos relatados e o possível reflexo nas contas do Presidente da República, relativas ao exercício de 2019, proferiu, por meio do Acórdão 1841/2019-TCU-Plenário (peça 87) , relatado pelo Ministro Bruno Dantas, o seguinte alerta:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação acerca do pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria Fiscal do Trabalho, consoante os dispositivos da Lei Complementar 101/2000 ( Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF) e demais normativos;

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. com fundamento no art. 59, § 1º, inciso V, da Lei Complementar 101/2000, alertar à Casa Civil e ao Ministério da Economia de que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação orçamentária, em especial os arts. 14, 16 e 17 da Lei Complementar 101/2000, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15 dessa norma, ensejando a necessidade de suspensão de benefícios e pagamentos.

2.4. Em face dessa deliberação, a Advocacia-Geral da União (AGU) opôs embargos de declaração (peça 98) , apontando omissões e contradições no julgado, os quais foram enfrentados juntamente com o mérito da representação.

2.5. Com isso, o Tribunal, ao se debruçar sobre as conclusões da unidade técnica e sobre a documentação juntada pelas partes, proferiu, por meio do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário (peça 102) , determinações e recomendações aos órgãos responsáveis, na forma transcrita na introdução acima, além de conhecer e rejeitar os embargos interpostos.

2.6. Com vistas a solucionar obscuridades e contradições nesse julgado, o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) opôs embargos de declaração (peça 117) , requerendo o saneamento da deliberação. O Tribunal, por meio do Acórdão por Relação 2.358/2019 - Plenário (peça 131) , da relatoria do Ministro Bruno Dantas, decidiu por não conhecer do pedido.

2.7. Também insatisfeita, a União, por intermédio da AGU, interpôs pedido de reexame (peça 120) , requerendo o conhecimento e provimento do pedido para (peça 120, p. 9) :

a. Afastar os itens 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.9 e 9.13 do Acórdão; e

b. Adequar os itens 9.7 e 9.8, para que os requisitos ali indicados sejam direcionados ao ato regulamentador do BEP.

2.8. Do mesmo modo, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) interpôs pedido de reexame em face do julgado (peça 125) , requerendo (peça 125, p. 49-50) :

a) Que seja atribuído efeito suspensivo ao presente pedido de reexame;

b) Preliminarmente, que seja anulado o acórdão pelo fato de que ele não foi instruído pela SEFIP;

c) Que seja anulado o acórdão pela impossibilidade do TCU determinar forma de regulamentação de Lei pelo Poder Executivo;

d) Que seja anulado o acórdão em razão de que ele determina o estabelecimento de medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pela Lei 13.464/2017, a teor do art. 14 da LRF, quando não é hipótese de renúncia de receita, mas, sim, não incidência. Ou seja, não se aplica o art. 14 da LRF;

e) Que seja anulado o acórdão em razão de que o Tribunal de Contas não poder, de maneira alguma, determinar o corte do Bônus de Eficiência, da forma que ele é pago atualmente, pelo fato de que ele está previsto em lei e no orçamento;

f) Que no mérito, seja julgado procedente o pedido para reformar o acórdão e julgar pela improcedência da Representação, em face de que o Bônus de Eficiência é pago aos auditores em razão de previsão legal e fazer diferente é afrontar a decisão judicial vigente nos Mandados de Segurança nº 35.498 e 35.500.

2.9. Também irresignado, o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) interpôs pedido de reexame (peça 126) , com pedidos idênticos ao recurso da Anfip.

ADMISSIBILIDADE

3. Reiteram-se os exames preliminares de admissibilidade (peças XXXXX-145) , ratificados pelo Exmo. Sr. Ministro-Relator, na peça 147, que concluíram pelo não conhecimento dos recursos da Anfip e do Sinai, ante a ausência de legitimidade; e pelo conhecimento do pedido da União, suspendendo-se os efeitos dos itens 9.1, 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.7, 9.8 e 9.9 do Acórdão 1.921/2019 (peça 102) , mantido pelo Acórdão por Relação 2.358/2019 (peça 131) , ambos do Plenário e sob a relatoria do Ministro Bruno Dantas, nos termos do artigo 48 da Lei 8.443/1992, c/c os artigos 285 e 286, parágrafo único, do Regimento Interno do TCU (RI/TCU) . Diante disso, a análise de mérito nesta instrução se restringirá ao recurso interposto pelo ente federal.

MÉRITO

4. Delimitação

4.1. Constituem objetos do recurso as seguintes questões: Se as determinações insculpidas nos itens 9.3, 9.4 e 9.5 do acórdão recorrido configuram controle abstrato de constitucionalidade pelo TCU, se é possível inviabilizar norma vigente, mesmo sob a pendência de termo previsto na própria lei, se o BPE constitui hipótese de isenção ou não incidência de contribuição previdenciária e se houve violação à Lei pelo Presidente da República (peça 120) .

5. BPE, determinações insculpidas nos itens 9.3, 9.4 e 9.5 do acórdão recorrido, controle abstrato de constitucionalidade pelo TCU, possibilidade de inviabilizar norma vigente, mesmo sob a pendência de termo previsto na própria lei; isenção ou não incidência e violação à Lei pelo Presidente da República (peça 120)

5.1. A União, por meio da AGU, afirma que as determinações insculpidas nos itens 9.3, 9.4 e 9.5 do acórdão recorrido configuram controle abstrato de constitucionalidade pelo TCU sobre o BPE, hipótese de isenção tributária, não sendo possível inviabilizar norma vigente, mesmo sob a pendência de termo previsto na própria Lei, sem que tenha havido violação à Lei pelo Presidente da República, impondo-se a modificação do julgado recorrido, haja vista os seguintes argumentos:

a) O item 9.3 do acórdão recorrido fixa a inviabilidade da regulamentação da Lei 13.464/2017, por considerar não ser possível o estabelecimento de base de cálculo para o BEP por ato infralegal (peça 120, p. 3) ;

b) A Lei 13.464/2017 prevê, nos parágrafos de seu artigo , atribuições do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil, para mensuração dos índices de eficiência que definirão os valores variáveis do BEP, bem como delega a regulamentação do Comitê Gestor a ato do Poder Executivo Federal, havendo a mesma lógica em relação à Auditoria-Fiscal do Trabalho, conforme o artigo 16 da norma (peça 120, p. 3) ;

c) O afastamento dos dispositivos previstos na Lei 13.464/2017 constituiu controle de constitucionalidade, por não haver hierarquia entre leis complementares e ordinárias, hipótese vedada pelo próprio Tribunal, conforme ressaltou o Ministro André Luís de Carvalho, em declaração de voto juntada ao acórdão recorrido. Esse viés se confirma nos próprios encaminhamentos do acórdão, como no item 9.11, que encaminha o caso às Mesas das Casas do Congresso e à Procuradoria-Geral da República, tendo em vista os aspectos de constitucionalidade da norma (peça 120, p. 3-4) ;

d) Questiona-se a opção do legislador por delegar ao regulamento a fixação dos contornos da verba criada, o que configura evidente hipótese de controle de constitucionalidade, como reconheceu o Ministro André Luís de Carvalho na citada declaração de voto. O julgador lembrou, ainda, que a Gratificação de Desempenho instituída pela Lei 10.356/2001 aos servidores desta Corte tem conformação semelhante ao BEP, tendo sido regulamentada pela Resolução 146, de 28/12/2001, inclusive com extensão a aposentados e pensionistas. Segundo o Ministro, apenas em 2012, após diversas mudanças legislativas, é que a Lei passou a trazer padrões e percentuais dessa parcela remuneratória. Com isso, por 11 anos, os servidores do TCU perceberam gratificação regulamentada por ato infralegal, em razão da opção do legislador de promover a delegação do tema (peça 120, p. 3-4) ;

e) O voto condutor da deliberação recorrida pretende inviabilizar a regulamentação do BEP por ato infralegal, mas, também, encampa tese de descumprimento dos artigos 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF). Há teses contraditórias nesse ponto (peça 120, p. 4) ;

f) Se a violação suscitada pelo TCU foi promovida pela Lei 13.464/2017, trata-se de evidente controle de constitucionalidade, pois o fato objetivo é que a lei foi aprovada e está em pleno vigor. Assim, se houver potencial violação por ato administrativo, decorrente da regulamentação do Bônus de Eficiência, ela somente poderá ocorrer com a regulamentação infralegal e se essa não observar os ditames da Lei de Responsabilidade, os quais serão aplicáveis no momento das definições a serem feitas pelo regulamento vindouro (peça 120, p. 4) ;

g) A pretensão de se obstar a própria edição do regulamento torna impossível qualquer violação decorrente da regulamentação do BEP, ou seja, qualquer afronta à LRF por ato administrativo. Por meio desse raciocínio circular, há inconsistências na argumentação;

h) As medidas potencialmente nulas de pleno direito nos termos dos artigos 15 e 21 da LRF são aquelas decorrentes de atos administrativos. Lei em sentido estrito é lei posta e vigente, a ser cumprida, e não é passível de ser afastada ao argumento de ferir requisito genérico de outra lei. Exigir do Ministério da Economia a demonstração de requisitos ausentes na lei aprovada pelo Parlamento é exigir do Poder Executivo o descumprimento da Lei se o TCU a entender inadequada, o que representaria patente sobreposição do Tribunal ao Poder Legislativo, do qual é órgão auxiliar, nos exatos termos do caput do art. 71 da Constituição Federal (peça 120, p. 4) ;

i) O Ministério da Economia trabalha para afastar as preocupações externadas pelo TCU na definição da base de cálculo, a exemplo do afastamento de multas tributárias e aduaneiras e das receitas classificadas extraordinariamente por estimativa, não havendo razão para a imputação do suposto conflito de interesses. Não há suspeição por presunção, conforme a jurisprudência pátria (peça 120, p. 4-5) ;

j) A Lei 13.464/2017, em seu artigo 15, abriu a possibilidade de se utilizar recursos do Fundaf para o custeio do Bônus, não sendo, entretanto, imposição. A parcela pode ser custeada pelo Tesouro Nacional, caso o Poder Executivo entenda nesse sentido na regulamentação, tudo a depender do alcance de metas institucionais, podendo, inclusive, não ocorrer o pagamento, caso não se atinjam os objetivos. Os valores recebidos pelos inativos não são custeados pelo Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) , mas pelo mesmo montante que paga os ativos, sendo direito residual e não provento de aposentadoria. Impõe-se, portanto, o afastamento do item 9.3 do acórdão recorrido (peça 120, p. 5) ;

k) O item 9.4 do acórdão recorrido abarca tese de isenção de contribuição previdenciária sobre o BEP, em detrimento da tese de não-incidência, encampada pela Lei 13.464/2017. Nessa linha, a Semag buscou diferenciar o feito dos outros processos que já tratam do Bônus, os quais não abordariam o tratamento orçamentário e contábil e os impactos fiscais associados, viés abarcado pelo presente processo. Essa ressalva é contraditória, pois a definição pela incidência de contribuição previdenciária sobre essa parcela tem o efeito de significar que a contribuição incide sobre essa rubrica, o que repercute diretamente no regime desses pagamentos a inativos e pensionistas (peça 120, p. 5) ;

l) A deliberação recorrida está embasada na presunção de que se trata de uma verba incorporável aos proventos de inatividade, uma vez que é paga a inativos e pensionistas, o que ignoraria as condições peculiares da verba. O Bônus de Eficiência não é uma verba que se incorpora aos proventos de inatividade e à pensão, pois esse pagamento ocorre em percentuais decrescentes a cada ano e que estacionam no importe de 35% a partir de dez anos de inatividade ou de pensão;

m) Se fosse uma verba incorporada à inatividade, não haveria o decréscimo, mas, ao revés, incidiria a regra da paridade, ainda vigente para casos pretéritos, embora revogada desde a Emenda Constitucional 41/2003. Ou seja, a incidência de contribuição previdenciária sobre o BEP, ao gerar a consequente incidência da paridade, ensejaria incremento de gastos, ante relevante acréscimo de valores para inativos e pensionistas (peça 120, p. 6) ;

n) Esse potencial incremento de gastos não está abrangido por análise de impacto prévia, reiterando-se que a incidência de paridade - que é corolário da incidência de contribuição previdenciária - gera um custo a maior para pagamento do Bônus, pois o aparente ganho de receita, pelo pagamento de contribuição, é anulado pelo incremento de despesa decorrente da paridade. Daí surgiria a suposta contradição entre a conclusão do TCU, de incidência necessária de contribuição social, e o argumento de responsabilidade fiscal (peça 120, p. 6) ;

o) A tese encampada pela Lei é de não incidência de contribuição previdenciária sobre o BEP, o que afasta a necessidade de se prever medidas de compensação previstas no artigo 14 da LRF, pois o que se paga nessa rubrica não repercute para fins previdenciários, estando os valores pagos aos inativos pré-definidos, sem vinculação pela paridade a ser aplicada, em caso de entendimento contrário (peça 120, p. 6) ;

p) Em decisão em repercussão geral, em 11/11/2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento de que "não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público", sendo que as hipóteses de não incidência tributária podem ser delimitadas por expressa previsão legal, como no artigo 25 da Lei 13.464/2017 (peça 120, p. 6) ;

q) O caput e o § 3º artigo 41 da lei 8.112/1990 definem remuneração como o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, caracterizado pela irredutibilidade. O Bônus é parcela variável, podendo chegar a zero, não integrando o vencimento básico e sem que seja base de cálculo para qualquer vantagem pecuniária, conforme o artigo 14 da lei 13.464/2017 (peça 120, p. 6) ;

r) O afastamento dessa Lei, ao se transmudar o que é hipótese de não-incidência em isenção, constitui controle de constitucionalidade de lei em tese, tendo sido opção do legislador (peça 120, p. 6) ;

s) Caso não se aceite a tese da não-incidência, é imprescindível que o acórdão aborde os efeitos da paridade sobre o Bônus de Eficiência. Deve-se presumir que, em se entendendo pela incidência de contribuição previdenciária, à revelia da lei, há risco elevado de judicialização do tema para obtenção de paridade, refletindo-se diretamente no regime de pagamento a inativos e pensionistas, ao contrário do que se pretendeu defender (peça 120, p. 6-7) ;

t) O STF já decidiu pela existência de direito adquirido a reajuste previsto em Lei para servidores do Estado do Tocantins, mesmo antes do advento de termo previsto em lei, conforme precedente contido na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) n. 4013/TO, aplicado em outras decisões recentes, proferidas nas ADI XXXXX/DF e 6004/DF, que buscavam postergar reajustes aprovados em Lei exatamente sob argumentação de natureza orçamentária. Os julgados informam que o precedente contido na ADI XXXXX/TO produziu eficácia contra todos e efeito vinculante. O Ministro Relator, naquelas ações, destaca não ser possível o Poder Executivo desconstituir diploma normativo previamente combinado entre o governo e as entidades de representação de classe, com aprovação das respectivas Casas Legislativa e sanção pelo próprio Presidente da República (peça 120, p. 7) ;

u) O STF afasta qualquer possibilidade de imposição de condição de eficácia nos moldes suscitados no voto condutor da deliberação recorrida, sendo que o BPE é ainda mais direto, pois a Lei 13.464/2017 tem vigência imediata em relação ao valor fixo, dependendo de regulamentação apenas em relação à parcela variável;

v) O STF firmou entendimento no sentido de não haver hierarquia entre lei complementar e lei ordinária, não se mostrando razoável o viés de eficácia que buscou inaugurar o TCU (peça 120, p. 7) ;

w) A Lei Orgânica do TCU e o Regimento Interno desta Corte preveem que a consulta deve ter indicação precisa do objeto, de modo que constitua prejulgamento de tese específica e não genérica (peça 120, p. 7-8) ;

x) A consulta que deu origem ao TC Processo XXXXX/2018-7 foi formulada pelo então Ministro da Fazenda e se refere a leis instituidoras de subvenções, benefícios e isenções fiscais, ou seja, leis autorizativas, informando-se, ainda, que o Presidente da República havia oposto veto na lei em razão exatamente de inobservância do artigo 113 do ADCT, incluído em dezembro de 2016, tendo sido o veto superado pelo Congresso Nacional. Logo, o caso era distinto da questão tratada nos presentes autos (peça 120, p. 8) ;

y) O Relator a quo informa que a PGFN/AGU, pela CAF, manifestou-se sobre o tema antes da consulta e sustentou a inviabilidade de execução de medidas legislativas que impliquem aumento de despesa, independentemente da natureza do gasto. Mas, o Parecer/SEI n. 430/2018/CAF/PGACFFS/PGFN-MF foi no sentido de que as despesas de caráter discricionário não são alcançadas pelo artigo 113 do ADCT, apesar de terem necessariamente que observar as normas da LRF e as exigências das leis orçamentárias. Por isso, a PGFN/AGU considerou que somente seria possível a impugnação da Lei 13.606/2018, em relação aos artigos 29 a 32; bem como sobre o § 4º do artigo 4º da Lei 13.340/2016 por ADI. Na ocasião, os artigos 28 a 32 da Lei 13.606/2016 foram revogados pela Medida Provisória 842, convertida na Lei 13.729/2018. Para o parecerista, inclusive, a conversão poderia até ensejar a perda de objeto da consulta;

z) No mérito, o Parecer da PGFN/AGU deixou clara a aplicação a casos de subvenção, benefícios e subsídios, cuja execução pelas instituições financeiras oficiais deve depender de consentimento expresso prévio do Tesouro Nacional, em observância aos artigos 16 a 17 da LRF. Por conta disso, o Parecer PGFN/CAR n. 567/2017, anterior à manifestação então em análise, concluiu pela suspensão da eficácia dos dispositivos da Lei 13.340/2016, afetados pela rejeição dos vetos da Lei 13.606/2018, até que seja possível comprovar a devida adequação orçamentária e financeira;

aa) Não se justifica o apego do acórdão recorrido a uma só frase do Parecer da PGFN/AGU, desconsiderando todo o restante do conteúdo. Além disso, é contraditória a deliberação estender o objeto da consulta a toda e qualquer despesa criada por Lei, quando o objeto daquele processo era específico, ou seja, casos de Leis que autorizam subvenção, benefício e subsídios. Essas leis autorizativas exigem atos posteriores do Poder Executivo, que devem observar a legislação orçamentária, não se aplicando ao presente processo (peça 120, p. 8) ;

ab) O âmbito de aplicação do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, relatado pelo Ministro Raimundo Carreiro, está aberto, como demonstrado na sessão plenária de 11/9/2019, envolvendo o TC Processo XXXXX/2019-0. Nesses autos, entendeu-se que razões excepcionalíssimas de interesse público poderiam afastar a aplicação da consulta (peça 120, p. 9) ;

ac) Inexiste descumprimento de Lei por parte do Poder Executivo, não havendo razão para que o julgado repercuta na análise das contas do Presidente da República, conforme sugere o item 9.9 do acórdão recorrido (peça 120, p. 9) ;

ad) O Poder Executivo, em dever clássico, apenas deu estrito e escorreito cumprimento de lei válida e vigente, sem qualquer ato do que transborde dos preceitos legais. A Semag, seguida pelo Ministro Relator e pelo Plenário desta Corte, reconheceu a ausência de irregularidades nos pagamentos efetivados até o presente momento, exatamente porque ocorreu tão-somente o cumprimento direto e objetivo da lei posta. Compreensão diversa configuraria subversão direta do próprio conceito de legalidade estrita, além de violação ao princípio da separação dos Poderes (peça 120, p. 9) .

Análise

5.2. Os argumentos da recorrente estão parcialmente corretos. O Tribunal de Contas da União não detém competência para realizar controle de constitucionalidade das leis ou dos atos normativos in abstrato, atribuição exclusiva do Poder Judiciário, mesmo diante da possibilidade de esta Corte examinar a aderência das normas à Constituição nos casos concretos.

5.3. Destaque-se, inicialmente, nos termos da Lei 13.464/2017, que o Bônus de Eficiência e Produtividade constitui parcela, como regra, variável na remuneração das carreiras Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, dependente da regulamentação dos parâmetros essenciais relativos ao índice de eficiência institucional e à base de cálculo.

5.4. Até que se estabeleça esse detalhamento, a norma previu pagamento dos bônus em valores fixos da ordem de R$ 3 mil para Auditores Fiscais e Auditores do Trabalho e R$ 1,8 mil para Analistas Tributários, conforme determinado pela Lei, em seus artigos 11, § 2º; e 21, § 2º.

5.5. Assim, na forma como apontou o Relator a quo, deve-se distinguir entre o BEP variável, que depende de regulamentação e de outras medidas; e o BEP fixo, já em execução, por meio de pagamentos mensais aos servidores.

5.6. Sobre o mérito do recurso, primeiramente, está absolutamente correto o posicionamento da unidade técnica, encampado pelo Plenário desta Casa, tendo por base o inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, no sentido de que a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica.

5.7. Do mesmo modo, a definição da composição da base de cálculo do valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade (BPE) , em sua parcela variável, impacta diretamente a remuneração e os proventos dos servidores das carreiras tributária e aduaneira e auditoria-fiscal, exigindo-se estruturação por lei específica.

5.8. Note-se, na forma discutida pela Semag, que, nos termos dos artigos 5º, § 5º; e 15, § 5º, da Lei 13.464/2017,

Art. 5º (...)

§ 5º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira a ser distribuído aos beneficiários do Programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira pelo Índice de Eficiência Institucional.

(...)

Art. 15 (...)

§ 5º O valor global do Bônus a ser distribuído aos beneficiários do Programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Auditoria-Fiscal do Trabalho pelo Índice de Eficiência Institucional. (Grifos acrescidos)

5.9. Assim, o valor global do BEP é razão direta da definição da base de cálculo e do índice de eficiência institucional, sendo que, após o cálculo, esse é o montante a ser distribuído entre os beneficiários definidos na Lei 13.464/2017, anexando-se, portanto, à remuneração e aos proventos dos servidores.

5.10. Por óbvio, a delimitação da base de cálculo a compor o valor do BEP é elemento essencial na definição da remuneração dos beneficiários da rubrica e, portanto, deveria estar delineada expressamente em lei específica.

5.11. Nesse sentido, conforme assinalado no relatório e no voto condutor da deliberação recorrida e na manifestação do Ministro Raimundo Carreiro, a redação original da Medida Provisória 765/2016, que fundamentou inicialmente o Bônus, no § 4º do artigo 5º, delineava expressamente a base de cálculo dessa rubrica.

5.12. Todavia, quando da conversão da medida provisória na Lei 13.464/2017, esses dispositivos foram retirados, o que deixou sem definição a base de cálculo do BEP, conforme pode ser observado, na tabela comparativa constante da declaração de voto do Ministro Raimundo Carreiro, o cotejo entre o artigo 5º da Medida Provisória 765/2016 e os artigos e 6º da Lei 13.464/2017, os quais tratam dos mesmos assuntos, mas com conteúdos distintos (peça 104, p. 3-4) :

Art. 5º da MP 765/2016

Arts. 5º e 6º da Lei 13.464/2017

Art. 5º Ficam instituídos o Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil e o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira, com o objetivo de incrementar a produtividade nas áreas de atuação dos ocupantes dos cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista-Tributário da Receita Federal do Brasil.

§ 1º O Programa de que trata o caput será gerido pelo Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil, composto por representantes do Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e da Casa Civil da Presidência da República, nos termos a serem definidos em ato do Poder Executivo federal.

§ 2º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira será definido pelo Índice de Eficiência Institucional, mensurado por meio de indicadores de desempenho e metas estabelecidos nos objetivos ou no planejamento estratégico da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

§ 3º Ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil será editado até 1º de março de 2017, o qual estabelecerá a forma de gestão do programa e a metodologia para a mensuração da produtividade global da Secretaria da Receita Federal do Brasil e fixará o Índice de Eficiência Institucional.

§ 4º A base de cálculo do valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira será composta pelo valor total arrecadado pelas seguintes fontes integrantes do Fundo Especial de Desenvolvimento e Aperfeiçoamento das Atividades de Fiscalização - FUNDAF, instituído pelo Decreto-Lei nº 1.437, de 17 de dezembro de 1975:

I - arrecadação de multas tributárias e aduaneiras incidentes sobre a receita de impostos, de taxas e de contribuições administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil a que se refere o art. 4º da Lei nº 7.711, de 22 de dezembro de 1988 , inclusive por descumprimento de obrigações acessórias; e

II - recursos advindos da alienação de bens apreendidos a que se refere o inciso I do § 5º do art. 29 do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976 .

§ 5º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira a ser distribuído aos beneficiários do Programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira pelo Índice de Eficiência Institucional.

§ 6º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira não poderá ultrapassar o valor da base de cálculo de que trata o § 4º.

Art. 5º A carreira de Auditoria da Receita Federal do Brasil, de que trata o art. 5º da Lei nº 10.593, de 6 de dezembro de 2002 , passa a ser denominada carreira Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil, composta de cargos de nível superior de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista Tributário da Receita Federal do Brasil.

Parágrafo único. Os ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil, no exercício das atribuições previstas no inciso I do art. 6º da Lei nº 10.593, de 6 de dezembro de 2002 , são autoridades tributárias e aduaneiras da União.

Art. 6º São instituídos o Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil e o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira, com o objetivo de incrementar a produtividade nas áreas de atuação dos ocupantes dos cargos de Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil e de Analista Tributário da Receita Federal do Brasil.

§ 1º O Programa de que trata o caput deste artigo será gerido pelo Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil, composto de representantes do Ministério da Fazenda, do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e da Casa Civil da Presidência da República, nos termos a serem definidos em ato do Poder Executivo federal.

§ 2º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira será definido pelo índice de eficiência institucional, mensurado por meio de indicadores de desempenho e metas estabelecidos nos objetivos ou no planejamento estratégico da Secretaria da Receita Federal do Brasil.

§ 3º Ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil será editado até 1º de março de 2017, o qual estabelecerá a forma de gestão do Programa e a metodologia para a mensuração da produtividade global da Secretaria da Receita Federal do Brasil e fixará o índice de eficiência institucional.

§ 4º O valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira a ser distribuído aos beneficiários do Programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus pelo índice de eficiência institucional.

§ 5º (VETADO) . [dispositivo do projeto de lei alusivo ao pagamento diferenciado da BEP para auditores da SRFB cedidos para atuar como conselheiros no CARF, vetado por afronta ao princípio da isonomia em relação aos demais auditores].

§ 6º (VETADO) . [idem].

§ 7º (VETADO) [idem].

5.13. Possivelmente por discordância quanto à inclusão de rubricas na composição da base de cálculo do valor global do BEP, especialmente multas, o Congresso Nacional, como se constata na tabela, ao apreciar a medida provisória, optou por rejeitar a formatação dessa parcela, apesar de ter mantido a metodologia de cálculo do Bônus.

5.14. O Ministério da Economia, em resposta a solicitação de informações da equipe de fiscalização da Semag, entendeu que a definição da base de cálculo do valor global do BEP poderia ocorrer por meio de decreto do Poder Executivo (peça 48, p. 3) .

5.15. Entretanto, conforme discorreu adequadamente a unidade técnica e os votos que conduziram a deliberação recorrida, a regulamentação dessa parcela, com impacto direto na remuneração das carreiras tributária e aduaneira e auditoria-fiscal, constituiria decreto autônomo não autorizado no ordenamento, em usurpação às competências do Parlamento.

5.16. Nesse sentido, transcreve-se trecho do relatório do acórdão recorrido (peça 106, pl. 24) :

125. Com as devidas vênias, discorda-se parcialmente da opinião do Ministério da Economia, notadamente no que diz respeito à definição das bases de cálculo por meio de ato infralegal. Assinale-se que a definição dessa variável não se trata de mero complemento da lei, visando à sua fiel execução, mas sim uma inovação no mundo jurídico, a qual repercutirá diretamente na remuneração de servidores e nas despesas públicas. Cite-se ainda que, em momento algum, a Lei 13.464/2017 atribuiu ao Poder Executivo prerrogativa para estabelecer base de cálculo do BEP, como estabelecido no que diz respeito à definição dos índices de eficiência institucional.

126. Ademais, a definição do quantum, ou seja, da composição da base de cálculo irá, de fato, balizar o montante total da despesa com o pagamento desse BEP, e, por consequência o valor da remuneração dos agentes públicos. Para custear o valor fixo do BEP, a União desembolsa cerca de R$ 1,0 bilhão anualmente. Dessa forma, o valor global do BEP também seria de R$ 1,0 bilhão, considerando-se os índices de eficiência institucional igual a 100%. Assim, se utilizasse o raciocínio inverso para o cálculo do valor do BEP (como propõe a Lei 13.464/2017, após a implementação da variabilidade no bônus), esse valor seria distribuído aos respectivos beneficiários, perfazendo o valor mensal de R$ 3.000,00 - para Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil e Auditores-Fiscais do Trabalho ativos - e de R$ 1.800,00 - para Analistas Tributários da RFB ativos. Os inativos e pensionistas receberiam uma fração desses valores. (Grifos no original)

5.17. Dessa forma, a instituição de decreto para regulamentação de assunto reservado à lei específica, de fato, ultrapassa a competência do Chefe do Poder Executivo e deve ser objeto de enfrentamento por esta Corte.

5.18. Todavia, ao se debruçar sobre a manifestação da unidade técnica transcrita no relatório do acórdão recorrido (peça 106 - itens 113 a 136) e os votos condutores do julgado (peças 104 e 105) , não obstante se observe referência a dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e normas constitucionais de finanças públicas, é forçoso reconhecer que esse ponto gira em torno primordialmente da inconstitucionalidade na edição de possível decreto autônomo, em afronta ao inciso X do artigo 37 da Constituição Federal. Não se desconhece nesta instrução o papel essencial que a base de cálculo do BEP tem sobre exigências da LRF, conforme será discutido abaixo.

5.19. Mas, igualmente, é posicionamento de todos que o tratamento da base de cálculo do BEP por decreto constitui inconstitucionalidade formal, por se referir a matéria reservada a lei específica, nos termos do artigo 37, inciso X, da Constituição Federal. Observe-se trecho do voto revisor proferido pelo Ministro Raimundo Carreiro (peça 104, p. 4) :

12. Dessa forma, anuo às conclusões do Relator quanto à inconstitucionalidade decorrente da delegação a um órgão administrativo (Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal do Brasil) da competência para fixar a base de cálculo de uma verba remuneratória, o que, nos termos do art. 37, inciso X, da Constituição Federal, é atribuição adstrita à reserva legal (a remuneração e o subsídio dos servidores "somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica") . (Grifos no original)

5.20. Esta Corte, em atendimento à proposição da unidade técnica, optou por tratar a questão de forma preventiva e proferir, por meio do item 9.3 do acórdão recorrido, transcrito uma vez mais, para melhor entendimento, determinação ao Ministério da Economia e à Casa Civil, para que se abstenham de dispor sobre o tema de outra forma senão por lei formal:

9.3. determinar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 113, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017;

5.21. Em que pese se refira ao Ministério da Economia e à Casa Civil, por certo, a determinação se direciona, em primeira medida, ao Presidente da República, em acintoso controle de constitucionalidade preventivo pelo TCU. Apesar de salutar a intenção de proteção prévia das contas públicas, nesse caso específico, a forma de controle encontrada pela Corte não encontra guarida na Constituição Federal.

5.22. Sobre o tema, cabe ressaltar que o enunciado 347 da Súmula de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, transcrito abaixo, permite apenas manifestação desta Corte sobre a constitucionalidade de leis ou atos normativos, de forma incidental, afastando-se a aplicação de normas viciadas nos casos concretos submetidos à Corte:

O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do poder público.

5.23. Não se enfrenta, neste ponto, contudo, qualquer caso concreto que atraia a atuação incidental desta Corte sobre a matéria, mas sim a discussão em abstrato da norma, com vistas a impedir a regulamentação do normativo por decreto executivo.

5.24. É importante observar que o enunciado 347 foi aprovado em sessão plenária do STF de 13/12/1963, época em que o único titular do controle de constitucionalidade era o Procurador-Geral da República (PGR) , a quem cabia encaminhar ao Poder Judiciário pedidos de declaração de inconstitucionalidade de leis e atos normativos, em controle difuso.

5.25. Com a Emenda Constitucional n. 16/1965, institui-se a representação contra inconstitucionalidade de lei ou ato de natureza normativa, encaminhada pelo PGR, dando início ao controle de constitucionalidade em abstrato no ordenamento jurídico pátrio.

5.26. A partir de então, apenas o Supremo Tribunal Federal possui essa prerrogativa, havendo, hoje, conforme o artigo 103 da Constituição Federal, com redação dada pela Emenda Constitucional n. 45/2004, inúmeros outros legitimados aptos representar acerca da constitucionalidade de lei ou ato normativo, não se encontrando nesse rol o Tribunal de Contas da União:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:

I - o Presidente da República;

II - a Mesa do Senado Federal;

III - a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;

V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;

VI - o Procurador-Geral da República;

VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;

IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

5.27. Assim, poder-se-ia, em momento futuro, pleitear, por meio do adequado processo legislativo, a inserção desta Corte no rol de legitimados para a representação de inconstitucionalidade de leis e atos normativos, dada a relevância e a posição que o Tribunal se encontra no ordenamento constitucional brasileiro. Mas, no momento, as competências estão claramente estabelecidas, não cabendo desvirtuamento.

5.28. Inclusive, no TC Processo XXXXX/2017-1, que também discutiu, sob outros parâmetros, o próprio BEP, o Tribunal, por meio do Acórdão 2000/2017-TCU-Plenário, atendendo ao voto do Ministro Relator Benjamin Zymler e a jurisprudência da Casa, afastou a possibilidade de o Tribunal realizar controle abstrato de constitucionalidade:

55. A despeito da relevância da questão e da materialidade do dano apurado (cerca de R$ 477 milhões anuais) , observo que a unidade técnica propõe verdadeiro controle prévio e in abstracto de constitucionalidade de norma legal, o que não se insere no rol de competências desta Corte e é atribuição exclusiva do Supremo Tribunal Federal ( Constituição Federal, art. 102, inciso I, alínea a).

56. É certo que o Tribunal pode, nos casos concretos, examinar a constitucionalidade de norma, mas não é essa a proposta da Sefip, que busca impedir todo e qualquer pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade instituído pela Lei 13.464/2017 aos aposentados e pensionistas da Carreira de Auditoria Fiscal do Ministério da Fazenda e do Ministério do Trabalho, afastando-se a aplicação dos §§ 2º e 3º do art. 7º e dos §§ 2º e 3º do art. 17, ambos da Lei 13.464/2017, por estarem em desconformidade com os princípios da solidariedade, da contributividade e do equilíbrio financeiro e atuarial, todos insculpidos no caput do art. 40 da Constituição Federal.

57. A despeito das inconstitucionalidades acima mencionadas, em relação às quais reitero a minha total concordância, entendo que esta Corte de Contas encontra-se limitada em sua atuação, por se tratar os presentes autos de processo de representação formulada pela unidade técnica versando sobre a constitucionalidade de leis e regulamentos de forma abstrata.

58. Com efeito, tudo leva a crer que a presente representação foi formulada como sucedâneo de ação direta de inconstitucionalidade na esfera administrativa, resultando daí a inviabilidade do exame da questão na forma proposta, haja vista que o exame de constitucionalidade por parte desta Corte de Contas, assegurado pela Súmula nº 347 do Supremo Tribunal Federal, somente poderia se dar de forma incidental.

5.29. Mesmo o conteúdo do enunciado 347 da Súmula do STF tem sido fortemente contestado naquela Corte, o que se pode constatar nos trâmites dos Mandados de Segurança 35.824, 35.494 e 35.498, que tratam exatamente de julgamentos do Tribunal, nos quais o Tribunal rechaçou incidentalmente a aplicação da Lei 13.464/2017 em atos concretos de registro de aposentadorias de beneficiários da norma. Em consulta a esses processos no decorrer desta instrução, verificou-se que a Procuradoria-Geral da República contesta a possibilidade de o Tribunal atuar nessa seara.

5.30. Por oportuno, há, inclusive, decisão liminar do Ministro Alexandre de Moraes, proferida no âmbito do Mandado de Segurança 35.498/DF, no qual o magistrado suspende deliberações do Tribunal nos casos concretos constantes daquele processo, manifestando-se, nos seguintes termos:

Haveria nessa hipótese inaceitável subversão constitucional, pois o texto constitucional não prevê essa competência jurisdicional ao Tribunal de Contas da União, que, igualmente, não se submete às regras de freios e contrapesos previstas pela Constituição Federal ao Supremo Tribunal Federal para interpretar seu texto (legitimidade taxativa, pertinência temática, cláusula de reserva de plenário, quórum qualificado para modulação dos efeitos, quórum qualificado para edição de súmulas vinculantes, entre outros), e que acabam por ponderar, balancear e limitar esse poder.

Dessa forma, a Constituição Federal não permite ao Conselho Nacional de Justiça, tampouco ao Tribunal de Contas da União, o exercício do controle difuso de constitucionalidade, pois representaria usurpação de função jurisdicional, invasão à competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal e desrespeito ao Poder Legislativo.

5.31. Se há forte discussão sobre a possibilidade de controle incidental de constitucionalidade por esta Corte, não há dúvida sobre a impossibilidade de o Tribunal atuar in abstrato nessa seara, como se viu no debate até o momento. Não se trata, no caso, de discussão quanto à eficácia de normas que ampliam despesas obrigatórias de caráter continuado ou criam benefícios tributários, como se discutirá à frente, mas sim intervenção em competência constitucional e no próprio processo de produção de normas jurídicas. No âmbito dos normativos relativos a finanças públicas, o TCU atua para materializar o ordenamento vigente, sem interferir em competências constitucionais ou legais.

5.32. Assim, não obstante correto o posicionamento desta Corte em relação à inconstitucionalidade de eventual decreto autônomo acerca da regulamentação da base de cálculo do valor global do BEP, a opção por realizar determinação ao Chefe do Poder Executivo se apresenta como controle de constitucionalidade abstrato preventivo pelo TCU.

5.33. Por certo, cabe forte recomendação sobre a matéria, nos exatos termos colocados pela deliberação recorrida no item 9.3, opção que possibilita a manutenção dos itens 9.7 e 9.8 e respectivos subitens do julgado em debate, além do encaminhamento dessa e de outras questões tratadas nos autos ao Procurador-Geral da República, legitimado à representação por inconstitucionalidade.

5.34. Em sentido contrário, não se vislumbra nas deliberações inseridas nos itens 9.4, 9.5, 9.6, 9.9 e 9.13 do acórdão recorrido qualquer irregularidade, mas sim a atuação escorreita desta Corte na materialização das normas constitucionais e legais de finanças públicas, que se aplicam às despesas criadas pela Lei 13.464/2017, sem que se constitua controle de constitucionalidade. Essas deliberações não pretendem excluir a lei que criou o Bônus do mundo jurídico ou atuar sobre a validade dos dispositivos legais, como ocorreu nos precedentes citados pelo recorrente, mas sim a aplicação sistemática de outras regras positivadas no ordenamento.

5.35. Nessa linha e ao contrário do que afirma a recorrente, aplica-se ao caso a resposta à consulta formulada pelo então Ministro de Estado da Fazenda, Eduardo Refinetti Guardia, constante do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, sob a relatoria do Ministro Raimundo Carreiro, in verbis:

9.1. responder ao consulente que medidas legislativas que forem aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira, e em inobservância ao que determina a legislação vigente, especialmente o art. 167 da Constituição Federal, o art. 113 do ADCT, os arts. 15, 16 e 17 da LRF, e os dispositivos pertinentes da LDO em vigor, somente podem ser aplicadas se forem satisfeitos os requisitos previstos na citada legislação;

5.36. Trata-se de discussão no plano da eficácia e exequibilidade das normas relativas a finanças públicas, sem que o Tribunal tenha a intenção de afastar a validade do normativo, conforme disserta o Ministro Relator Raimundo Carreiro no voto condutor do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, em relevante aplicação da teoria da "Escada Ponteana", de Pontes de Miranda:

E, sobre essa questão posta pelo consulente, entendo que medidas legislativas aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira e em inobservância ao que determina a legislação vigente são inexequíveis, porquanto embora se trate de normas que, após a sua promulgação, entram no plano da existência e no plano da validade, não entram, ainda, no plano da eficácia, justamente por não atenderem ao disposto no art. 167 da CF/88, art. 113 do ADCT, arts. 15, 16 e 17 da LRF, e na respectiva LDO.

Refiro-me, na espécie, à teoria de Pontes de Miranda relativamente aos fatos jurídicos, denominada "Escada Ponteana", no sentido de que os fatos jurídicos perpassam, respectivamente, pelo plano da existência, plano da validade e plano da eficácia.

A entrada no plano da existência ocorre com a promulgação da norma, ao passo que o plano da validade é alcançado com a compatibilidade da aludida norma com as demais normas do ordenamento jurídico. A norma, no entanto, somente entrará no plano da eficácia se houver a ocorrência concreta dos fatos que constituem o suporte fático da norma. Caso contrário, enquanto não ocorrer o suporte fático, a norma será existente, válida, mas ineficaz, na medida em que seus comandos normativos não serão capazes de produzir consequências jurídicas no mundo dos fatos (cf. MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da eficácia. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2013.p. 17) .

5.37. Como se observa no relatório do acórdão recorrido, as irregularidades que ensejaram a atuação desta Corte estão relacionadas ao descumprimento de normas de finanças públicas vigentes e também aplicáveis aos gestores no Ministério da Economia, quando da execução dos gastos.

5.38. Diferentemente do ponto anteriormente discutido nesta instrução, o Tribunal não pretende, com as outras determinações, inviabilizar a vigência da Lei 13.464/2017, mas sim a adequação das renúncias de receita e das despesas decorrentes desse normativo às demais normas de finanças públicas também vigentes no ordenamento, como medidas de eficácia do referido diploma. Trata-se de interpretação que busca o equilíbrio sistemático do ordenamento jurídico pátrio aplicável a gastos governamentais.

5.39. Nessa linha, para o melhor entendimento da matéria, cabe a transcrição das demais deliberações questionadas na peça recursal:

9.4. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 6º do art. 150, e o § 11 do art. 201, ambos da CF/1988, e com o art. 14 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, adote providências para o estabelecimento de medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pela Lei 13.464/2017, a teor do art. 14 da LRF;

9.5. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 2º do art. 17 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, evidencie as medidas compensatórias, por meio do aumento permanente de receitas ou redução permanente de despesas, em montante equivalente ao pagamento da parcela fixa atualmente paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade, tendo em vista a criação e a majoração de despesas obrigatórias de caráter continuado promovidas pela edição da Lei 13.464/2017;

(...)

9.6. informar ao Ministério da Economia que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação, na forma dos subitens 9.4 e 9.5 acima, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15, da Lei Complementar 101/2000, ensejando a suspensão dos benefícios e pagamentos;

(...)

9.9. encaminhar cópia da presente deliberação à Casa Civil, dado o risco de repercussão dessas questões, se não equacionadas, na apreciação das Contas do Presidente da República referentes ao exercício de 2019, conforme alertado em outras decisões do Tribunal;

9.13. autorizar o Relator, desde logo, a prorrogar monocraticamente os prazos definidos nos subitens 9.4 e 9.5 deste Acórdão, caso seja requerido, de forma justificada, pelo Ministério da Economia.

5.40. Nota-se que os dispositivos constitucionais e legais invocados nas determinações acima estão relacionados aos princípios basilares sobre finanças públicas aplicáveis a todos os gastos públicos criados após a promulgação da Constituição Federal e sob a égide da LRF.

5.41. Nesse sentido, a Medida Provisória 765/2016 e a posterior Lei de conversão 13.464/2017 estabeleceram, de acordo com os artigos 14 e 24, abaixo transcritos, que a parcela remuneratória relativa ao BEP não constituirá base de cálculo de contribuição previdenciária.

Art. 14. O valor do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira não integrará o vencimento básico, não servirá de base de cálculo para adicionais, gratificações ou qualquer outra vantagem pecuniária e não constituirá base de cálculo de contribuição previdenciária.

(...)

Art. 24. O valor do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho não integrará o vencimento básico, não servirá de base de cálculo para adicionais, gratificações ou qualquer outra vantagem pecuniária e não constituirá base de cálculo de contribuição previdenciária. (Grifos acrescidos)

5.42. A União, no recurso em debate, entende que a exclusão do BEP da base de cálculo da contribuição previdenciária constitui hipótese de não incidência e não de isenção tributária, como defende o acórdão recorrido. Sobre o tema, é importante ressaltar, conforme lição de Ricardo Alexandre, que a não incidência se refere a fatos não alcançados pela regra de tributação, podendo decorrer de três formas (Direito tributário esquematizado: 4. ed. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010, p. 168-169) :

a) o ente tributante, podendo fazê-lo, deixa de definir determinada situação como hipótese de incidência tributária;

(...)

b) o ente tributante não dispõe de competência para definir determinada situação como hipótese de incidência do tributo, uma vez que a atribuição constitucional de competência não abrange tal fato;

(...)

c) a própria Constituição delimita a competência do ente federativo, impedindo-o de definir determinadas situações como hipóteses de incidência de tributos. (...)

5.43. A não incidência, portanto, ocorre quando o ente tributante, já na formulação original da hipótese de incidência ou por conta das características do fato jurídico, deixa de definir situação específica como tributável ou sequer dispõe de competência para incluir determinado fato como imponível ou, ainda, a própria Constituição delimita essa atribuição, impedindo a incidência sobre a conjuntura. Como leciona Luciano Amaro, trata-se dos "fatos que não têm aptidão de gerar tributos" (Direito tributário brasileiro. 13. ed. rev. - São Paulo: Saraiva, 2007, p. 280) .

5.44. De outro lado, para a doutrina majoritária, a isenção é "a dispensa legal do pagamento do tributo devido" (SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 866) . Essa corrente entende que a norma isentiva apenas impede o lançamento do tributo, sendo que já existe a obrigação tributária com a realização do fato imponível. O que se exclui é o crédito dela decorrente.

5.45. De outro lado, pensamento capitaneado por José Souto Maior Borges considera que a incidência da norma isentante implica na não incidência da norma tributária. Para esse autor, o mesmo fato imponível que gerou a obrigação tributária não poderia transformar-se em fato isento (BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p. 163-164) .

5.46. O autor aprofunda a questão e argumenta que a norma isentante retira pessoas ou objetos do campo de incidência tributária e impede o nascimento da obrigação tributária. Assim, as regras de isenções são hipóteses de não incidência tributária legalmente qualificadas. Elas afastam as normas que criam o liame obrigacional (BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p. 200-201) .

5.47. A solução à controvérsia doutrinária e a observação do fenômeno das isenções tributárias se tornaram mais fáceis com a explicitação esquemática da regra matriz de incidência tributária (CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2009. p. 592) .

5.48. O esclarecimento do fenômeno tributário, por meio dos aspectos espacial, temporal, material, pessoal e quantitativo, via hipótese e consequência, permitiu visualizar que a isenção ataca um dos elementos da regra matriz, por oito maneiras distintas:

i.1) atingindo-lhe o critério material, pela desqualificação do verbo; i.2) mutilando o critério material, pela subtração do complemento; i.3) indo contra o critério espacial; i.4) voltando-se para o critério temporal; (ii) pelo consequente, atingindo: ii.1) o critério pessoal, pelo sujeito ativo; ii.2) o critério pessoal, pelo sujeito passivo; ii.3) o critério quantitativo, pela base de cálculo; e ii.4) o critério quantitativo, pela alíquota. (Grifos acrescidos)

(CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário, linguagem e método. 3. ed. São Paulo: Noeses, 2009. p. 593)

5.49. De fato, o pensamento do ilustre doutrinador descreve com maior clareza a influência da norma isentante sobre a regra criadora da obrigação tributária. Em cada normativo que trata de isenções tributárias é possível perceber que ora são excluídas pessoas, ora bens, ora parcelas da base de cálculo ou modificações da alíquota.

5.50. Nessa linha, a regra matriz de incidência tributária da contribuição previdenciária do servidor público, conforme ao artigo , incisos I e II, da Lei 10.887/2004, incluídos pela Lei 12.618/2012, entende como fatos imponíveis:

I - a totalidade da base de contribuição, em se tratando de servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo e não tiver optado por aderir a ele;

II - a parcela da base de contribuição que não exceder ao limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social, em se tratando de servidor:

a) que tiver ingressado no serviço público até a data a que se refere o inciso I e tenha optado por aderir ao regime de previdência complementar ali referido; ou

b) que tiver ingressado no serviço público a partir da data a que se refere o inciso I, independentemente de adesão ao regime de previdência complementar ali referido.

5.51. A base de contribuição, como regra, nos termos do § 1º do mesmo artigo 4º da Lei 10.887/2004, é entendida como o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei, os adicionais de caráter individual ou quaisquer outras vantagens, excluídas determinadas rubricas expressamente previstas na norma, incluindo-se hipóteses de não incidência e isenção. Dentre essas exclusões estão as parcelas relativas ao BEP, recebidas pelos servidores das carreiras Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e Auditoria-Fiscal do Trabalho, incluídas, posteriormente, nos incisos XXIII e XXIV do referido parágrafo, por meio da Lei 13.464/2017.

5.52. Assim, as quantias relativas ao BEP, por certo, encontram-se originalmente inseridas no espectro de incidência da contribuição social do servidor público, como parcelas remuneratórias, sem que se discuta na base original serem as vantagens permanentes ou não. Com a norma isentiva é que essas rubricas restaram mutiladas da base de cálculo. Trata-se, portanto, de isenção, dispensa legal do pagamento do tributo.

5.53. Além disso, a unidade técnica demonstrou com clareza as características de perpetuidade dessas rubricas, mesmo para os aposentados e pensionistas, diferentemente das rubricas com caráter indenizatório, temporárias ou não recebidas na inatividade, como férias e adicionais, sendo improvável que o Bônus seja zerado em algum momento (peça 106, p. 12-13) :

62. Deve-se observar que inativos e pensionistas fazem jus aos Bônus de Eficiência e Produtividade, inclusive, perceberão essa remuneração por todo o período em que conservarem seu vínculo de aposentação ou de pensionista. Embora o percentual dos bônus se reduza, a uma proporção média anual de 7%, após a data de aposentadoria, esse valor não chega a zero, pois a proporção mínima é de 35% do valor do BEP, ou seja, o aposentado e aquele que fizer jus à respectiva pensão receberão indefinidamente esse bônus. A seguir, as tabelas a e b do Anexo IV da Lei 13.464/2017 são reproduzidas em forma de gráfico a fim de ilustrar esta situação.

5.54. Diante disso, a exclusão dessa rubrica da base de cálculo da contribuição previdenciária constitui, de fato, benefício fiscal, sobre o qual incidem diversos normativos relacionados às finanças públicas, a exemplo dos artigos 150, § 6º; e 113 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias; bem como dispositivos anualmente colocados nas Leis de Diretrizes Orçamentárias e da LRF.

5.55. A unidade técnica demonstrou que a referida isenção não restou editada por lei específica, conforme preconiza o § 6º do artigo 150 da Constituição Federal, mas sim inserida em norma relativa à remuneração de servidores.

5.56. Do mesmo modo, o artigo 113 do ADCT prevê que "a proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro".

5.57. De outro lado, o artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF), possui disciplina normativa específica acerca de renúncias fiscais, incluindo-se a isenção em debate:

Art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições.

I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

II - estar acompanhada de medidas de compensação, no período mencionado no caput, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 1ºA renúncia compreende anistia, remissão, subsídio, crédito presumido, concessão de isenção em caráter não geral, alteração de alíquota ou modificação de base de cálculo que implique redução discriminada de tributos ou contribuições, e outros benefícios que correspondam a tratamento diferenciado.

§ 2º Se o ato de concessão ou ampliação do incentivo ou benefício de que trata o caput deste artigo decorrer da condição contida no inciso II, o benefício só entrará em vigor quando implementadas as medidas referidas no mencionado inciso.

5.58. Nesses termos, a concessão de benefício de natureza tributária deve estar acompanhada de demonstração de que a renúncia foi considerada na estimativa do impacto orçamentário e financeiro no exercício da vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na LDO, além de medidas de compensação, as quais constituem condição para a vigência da renúncia.

5.59. Destaque-se que a Lei 13.408, publicada no Diário Oficial da União de 27/12/2016, portanto, vigente quando da edição da Medida Provisória 765, em 29/12/2016, assim como LDOs anteriores e subsequentes, também traziam regime jurídico para as renúncias fiscais, conforme se nota nos dispositivos transcritos abaixo:

Art. 118. Somente será aprovado o projeto de lei ou editada a medida provisória que institua ou altere receita pública quando acompanhado da correspondente demonstração da estimativa do impacto na arrecadação, devidamente justificada.

§ 1º A criação ou alteração de tributos de natureza vinculada será acompanhada de demonstração, devidamente justificada, de sua necessidade para oferecimento dos serviços públicos ao contribuinte ou para exercício de poder de polícia sobre a atividade do sujeito passivo.

§ 2º A concessão ou ampliação de incentivos ou benefícios de natureza tributária, financeira, creditícia ou patrimonial, destinados à região do semiárido incluirão a região norte de Minas Gerais.

§ 3º As proposições que tratem de renúncia de receita, ainda que sujeitas a limites globais, devem ser acompanhadas de estimativa do impacto orçamentário-financeiro e correspondente compensação, consignar objetivo, bem como atender às condições do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

§ 4º Os projetos de lei aprovados ou medidas provisórias que resultem em renúncia de receita em razão de concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária, financeira, creditícia ou patrimonial, ou que vinculem receitas a despesas, órgãos ou fundos, deverão conter cláusula de vigência de, no máximo, cinco anos.

5.60. Na espécie, o Tribunal, corretamente, não identificou qualquer estimativa do impacto dessas isenções na arrecadação das receitas federais ou eventuais medidas de compensação, na forma exigida na LRF. No recurso em análise, a recorrente também não se desincumbiu da obrigação de demonstrar eventuais ações nesse sentido. Não há sequer menção ao benefício tributário na Exposição de Motivos 360/2016, que fundamentou a Medida Provisória 765/2016, convertida na Lei 1464/2017, consultada nesta instrução, por certo, em razão de o Ministério da Economia considerar, erroneamente, o benefício como hipótese de não incidência, conjuntura não abarcada pelas exigidas medidas de compensação.

5.61. Verifica-se que, não obstante a formatação da renúncia de receitas decorrente da exclusão dos BEP da base de cálculo da contribuição previdenciária tenha incorrido em variados vícios de ordem constitucional, o Tribunal, na espécie, restringiu-se a determinar ao Ministério da economia, o estabelecimento de medidas de compensação para o benefício, conforme exigência inscrita no artigo 14 da LRF, hipótese aceitável na linha de entendimento defendida nesta instrução.

5.62. A identificação intempestiva de renúncias fiscais descompromissadas com as exigências da LRF remete à complexa interpretação da norma, no que concerne às formas para regularizar essa conjuntura. Nessa linha, pode-se observar, no texto do artigo 14 da Lei Complementar, transcrito acima, que os requisitos prévios necessários para a eficácia do gasto tributário são:

a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes;

b) atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias; e

c) alternativamente:

c.1) demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias;

c.2) estar acompanhada de medidas de compensação, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

5.63. As duas primeiras exigências são de caráter obrigatório. Verifica-se, contudo, que, não obstante a expressão "medidas de compensação" conste apenas no inciso II do artigo 14, podem ser consideradas nesse sentido o cumprimento alternativo de qualquer uma das condições previstas nos incisos I e II do mesmo artigo 14. De fato, caso a renúncia seja considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, o ordenador estará atuando no controle das despesas, pois reduzirá o montante destinado a esse fim, atingindo-se a finalidade da norma.

5.64. Sobre o cumprimento alternativo de qualquer uma das condições previstas nos incisos I e II do artigo 14 da LRF, cabe transcrever lição de Tathiane Piscitelli (Direito financeiro esquematizado. 3. ed. rev. E atual. - Rio de Janeiro: Forense, São Paulo: Método, 2012, p. 91-92) :

(...) Contudo, ao lado dessas demandas obrigatórias, o legislador ainda estabelece duas outras condições, das quais pelo menos uma deve ser cumprida, a critério do ordenador da renúncia.

A primeira possibilidade está na demonstração de que a renúncia está contemplada na LOA, por ocasião da estimativa de receitas e, ainda, no fato de que não haverá prejuízo às metas estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais, integrante da LDO. Trata-se, aqui, de garantir que a estimativa de receita contida na LOA reflita uma estimativa real e não mascarada por posteriores reduções de receita, evitando, dessa forma, eventual déficit nas contas públicas e perda do equilíbrio orçamentário.

(...)

Ao lado dessas exigências, o ordenador da renúncia, ao contrário, pode optar pela criação de "medidas de compensação", pelo aumento de receita, proveniente de aumento ou instituição de tributos.

5.65. Do mesmo modo, a jurisprudência desta Casa ratifica esse posicionamento, conforme se nota em deliberação contida no Acórdão 809/2014, relatado pelo Ministro Benjamin Zymler:

9.4. determinar ao Ministério da Fazenda que, quando da proposição de ato normativo que conceda renúncias de receitas tributárias de sua iniciativa ou submetido à sua apreciação, observe o teor do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal, de modo a fazer constar da exposição de motivos:

9.4.1. estimativa de impacto orçamentário-financeiro dessas medidas no exercício em que devam iniciar sua vigência e nos dois seguintes;

9.4.2. demonstração de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias ou, alternativamente, indicação da adoção de uma das medidas de compensação constantes do inciso II do art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal;

5.66. Todavia, quando a renúncia deixa de ser considerada na estimativa da LOA e já produz efeitos no exercício, como, no presente caso, em que a desoneração vigora desde o ano de 2016 invisível aos demonstrativos da União, resta, no primeiro momento, como medidas de compensação, de modo a garantir o equilíbrio orçamentário e financeiro no ano em curso, apenas as hipóteses previstas no inciso II do artigo 14 da LRF.

5.67. Na espécie, o recorrente, ao se submeter à deliberação recorrida, em seu item 9.3, aplicando-se o artigo 14 no prazo de 30 dias, não terá, no primeiro momento, outra solução senão estabelecer, com a urgência devida, medidas para solucionar o desequilíbrio que a renúncia não computada traz ao orçamento do exercício de criação e dos anos posteriores.

5.68. Nessa linha, compartilha-se do posicionamento do Relator a quo colocado no item 42 do voto condutor da deliberação recorrida, in verbis:

42. Por isso, estou de acordo com a proposta da unidade instrutora de determinar ao Ministério da Economia que, no prazo de trinta dias, estabeleça as medidas de compensação (ou seja, algum aumento de receita proveniente de elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição) .

5.69. Em razão disso, de fato, como informa o Tribunal no item 9.6 do acórdão recorrido, eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas no artigo 14, inciso II, pode atrair a incidência do disposto no § 2º do artigo 14 da LRF, podendo acarretar discussões quanto à legalidade e eficácia do gasto tributário.

5.70. De outra sorte, não se vislumbra a alegada necessidade de que esta Corte se manifeste necessariamente sobre a repercussão do posicionamento acerca da natureza jurídica da renúncia fiscal vinculada ao BEP sobre o regime de pagamento do Bônus a inativos e pensionistas. Pretende o recorrente que esta Corte se manifeste, nos presentes atos, sobre incidência da paridade nesses pagamentos.

5.71. Como se pode notar, a deliberação de que a exclusão do Bônus da base de cálculo da contribuição previdenciária se trata de isenção está relacionada à própria regra matriz de incidência do tributo e às normas de Direito Tributário e, para o que interessa aos presentes autos, enseja repercussões nas regras delimitadas pela LRF, não havendo necessidade, nesta assentada, de se manifestar sobre eventual regime de pagamentos.

5.72. Além disso, mesmo que se enfrente esse tema, verifica-se que o Bônus de Eficiência tem regime jurídico próprio de execução, prevendo-se, como se discutiu acima, o pagamento aos ativos e aos inativos, independentemente do regime de aposentadoria a que estejam vinculados.

5.73. Por oportuno, esta Corte identificou essa realidade na prática dos pagamentos, como relatou o Ministro Benjamin Zymler, no voto condutor do Acórdão 2000/2017-TCU-Plenário:

51. A propósito, a Sefip apurou que, em julho de 2017, o Bônus foi pago a 18.668 aposentados e 13.409 pensionistas, gerando uma despesa mensal da ordem de R$ 36,7 milhões ou cerca de R$ 477 milhões ao ano.

52. A parcela foi estendida, inclusive, àqueles sem direito à paridade. Nesse caso, são 486 inativos e 3.856 pensionistas, perfazendo um dispêndio mensal de R$ 4,3 milhões (cerca de R$ 55,5 milhões ao ano) .

5.74. Logo, a própria sistemática estabelecida pela Lei 13.464/2017 desconsidera o regime de aposentadoria dos beneficiários. De toda sorte, a pretensão da recorrente de que esta Corte se manifeste sobre os pagamentos dos Bônus no regime de paridade dos servidores não tem correlação com a solução das controvérsias levantadas nos presentes autos.

5.75. Cabe informar, por oportuno, que a natureza jurídica do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, bem como a inclusão dessa parcela em aposentadorias e pensões será enfrentada no TC Processo XXXXX/2018-0, instaurado em atendimento à determinação contida no item 9.3 do Acórdão 2721/2017-TCU-Plenário, relatado pelo Ministro Benjamin Zymler. O processo se encontra sobrestado, até que sobrevenham julgamentos definitivos em mandados de segurança em trâmite no STF, conforme despacho contido à peça 13 daqueles autos.

5.76. De outro lado, as despesas criadas por meio da Medida Provisória 765/2016, convertida na Lei 13.464/2017, caracterizam-se pela obrigatoriedade e continuidade, devendo, portanto, respeito à LRF, em seus artigos 15 a 17. Por certo, como ressaltou a unidade técnica, essas rubricas não se confundem com a revisão geral anual para todos os servidores públicos, prevista no inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, para as quais as medidas compensatórias não se aplicam, conforme o § 6º do artigo 17 da LRF. Trata-se, no caso, de reestruturação de carreiras específicas.

5.77. Sobre esse ponto, os artigos 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal trazem diversas exigências a serem seguidas já no momento da criação ou aumento de despesas de caráter continuado, nos seguintes termos:

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes;

(...)

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.

(...)

Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exercícios.

§ 1º Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.

§ 2º Para efeito do atendimento do § 1º, o ato será acompanhado de comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1º do art. 4º, devendo seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.

§ 3º Para efeito do § 2º, considera-se aumento permanente de receita o proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

§ 4º A comprovação referida no § 2º, apresentada pelo proponente, conterá as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diretrizes orçamentárias.

§ 5º A despesa de que trata este artigo não será executada antes da implementação das medidas referidas no § 2º, as quais integrarão o instrumento que a criar ou aumentar.

(...)

5.78. Dessa forma, a criação ou o aumento de despesas obrigatórias de caráter continuado exigem a comprovação de que esse gasto não afetará as metas de resultados fiscais, devendo os respectivos efeitos financeiros serem compensados ou pelo aumento permanente da receita ou pela redução permanente da despesa.

5.79. Conforme se constata na Exposição de Motivos 360/2016, que fundamentou a Medida Provisória 765/2016, convertida na Lei 1464/2017, consultada nesta instrução, confirma-se o posicionamento da unidade técnica, no sentido de não haver qualquer demonstração de que as despesas com BEP fixo ou variável comprometeriam as metas de resultado, além de não se ter o detalhamento de eventuais medidas de compensação, conforme exigem os artigos 16 e 17 da LRF.

5.80. No documento, consta apenas as seguintes informações genéricas sobre o tema, que não têm o condão de comprovar o real atendimento da Lei de Responsabilidade Fiscal:

33. Cabe ressaltar que as reestruturações remuneratórias propostas para o exercício de 2017 foram consideradas no rol de autorizações específicas do Anexo V do Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2017 - PLOA-2017, devendo os impactos orçamentários, a partir de 2018, serem incorporados nas respectivas leis orçamentárias.

34. Nesse sentido, consideram-se atendidos os requisitos dispostos nos artigos 16 e 17 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, haja vista que o Projeto de Lei Orçamentária Anual para 2017 contempla reserva cujo valor é suficiente para suportar as despesas decorrentes da implementação da medida ora proposta.

(Disponível em:Acesso em 30 abr 2020)

5.81. O cumprimento integral desses dispositivos não restou demonstrado pelos órgãos gestores dessas despesas no Poder Executivo, seja no processo de formação da Medida Provisória 765/2016 ou de conversão na lei 13.464/2017 ou, posteriormente, na execução dos gastos, conforme disserta a unidade técnica em posição transcrita no relatório do acórdão recorrido (peça 106, p. 33) :

179. No que se refere aos requisitos exigidos pela LRF para a geração da despesa pública, constatou-se que a Exposição de Motivos 360/2016, que acompanhou a MP 765/2016, não menciona qualquer premissa e metodologia de cálculo acerca dos dados contidos naquele documento. Informou-se apenas que o Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira alcança 18.090 servidores ativos e 27.003 aposentados e instituidores de pensão, perfazendo um quantitativo de 45.093 beneficiários. Quanto aos bônus da carreira de Auditoria-Fiscal do Trabalho, a exposição de motivos noticia que o bônus alcança 2.671 servidores ativos e 4.011 aposentados e instituidores de pensão, perfazendo um quantitativo de 6.682 beneficiários. As estimativas de impacto são as seguintes: (...) (Grifos no original)

5.82. Não houve, na formulação da Medida Provisória 765/2016 e na Lei 13.464/2017, sequer transparência quanto o valor que será recebido por cada servidor ou as respectivas premissas ou a metodologia de cálculo das parcelas, no caso do BEP variável a ser implementado (peça 106, p. 47) :

275. Outro fator que remete a um vício na criação dessa despesa é a falta de transparência quanto ao valor percebido individualmente por servidor a título de BEP, o que poderia ser parcialmente saneado a partir da evidenciação adequada das premissas e metodologia de cálculo para se estimar a despesa, como estabelecido no § 2º do art. 16 da LRF. Observe-se que nem o Parlamento e, tampouco, a sociedade conheciam ou conhecem o valor estimado que cada servidor das carreiras beneficiadas irá auferir a título de BEP, após a implementação da variabilidade dessa espécie remuneratória. Ainda que se diga que a remuneração e, consequentemente, a despesa para custeá-la sejam variáveis, o Poder Executivo estimou o dispêndio anual. Portanto, esperava-se que os cálculos dos valores individuais dos BEP e a remuneração média dos servidores fossem divulgados pelo autor daquela medida provisória, o que deveria ser evidenciado na EM 360/2016, que acompanhou a MP 765/2016. Contudo, isso não aconteceu. (Grifos no original)

5.83. Por certo, na forma discutida pela unidade técnica, a base de cálculo a ser definida posteriormente por meio de processo legislativo regular, o que se espera por esta Corte e de acordo com o texto constitucional, constitui o elemento central na quantificação da despesa, devendo a majoração desse gasto estar protegida por todas as medidas previstas na LRF e na Carta Magna.

5.84. Além disso, nos termos do artigo 15 da LRF, serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos artigos 16 e 17 da LRF.

5.85. Em razão disso, esta Corte atuou cuidadosamente em informar ao Ministério da Economia, por meio do item 9.6 do acórdão recorrido, que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação pode acarretar a incidência do disposto no artigo 15 da Lei Complementar 101/2000, ensejando a suspensão dos pagamentos.

5.86. Logo, o descumprimento desses dispositivos, pode ensejar a suspensão dos benefícios e dos pagamentos. Mostra-se sobremaneira pertinente informação nesse sentido inserida no item 9.6 do acórdão recorrido, sobretudo, no que concerne ao delineamento do BEP variável, sendo que o Tribunal agiu corretamente ao possibilitar a continuidade dos pagamentos da parcela fixa do BEP, claramente definida no artigo 11, § 2º, da Lei 13.464/2017.

5.87. De outra sorte, esses dispositivos demonstram o papel essencial que as normas constitucionais ou legais de Direito Financeiro têm na eficácia de leis que criem ou majorem despesas e gastos tributários, não se tratando de discussão quanto à constitucionalidade dos diplomas normativos, como busca fazer crer o recorrente.

5.88. Cite-se, nesse sentido, diversos precedentes do Supremo Tribunal Federal, nos quais a Corte considera leis que concederam reajustes de remunerações de servidores públicos sem o atendimento ao disposto nos incisos I e II do o § 1º do art. 169 da Constituição (que exigem prévia dotação orçamentária e autorização específica da LDO) constitucionais, mas ineficazes:

I. Despesas de pessoal: limite de fixação delegada pela Constituição à lei complementar ( CF, art. 169), o que reduz sua eventual superação à questão de ilegalidade e só mediata ou reflexamente de inconstitucionalidade, a cuja verificação não se presta a ação direta; existência, ademais, no ponto, de controvérsia de fato para cujo deslinde igualmente é inadequada a via do controle abstrato de constitucionalidade.

II. Despesas de pessoal: aumento subordinado à existência de dotação orçamentária suficiente e de autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias ( CF, art. 169, parág. único, I e II): além de a sua verificação em concreto depender da solução de controvérsia de fato sobre a suficiência da dotação orçamentária e da interpretação da LDO, inclina-se a jurisprudência no STF no sentido de que a inobservância por determinada lei das mencionadas restrições constitucionais não induz à sua inconstitucionalidade, impedindo apenas a sua execução no exercício financeiro respectivo: precedentes.

(ADI 1585, Relator (a) : Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, julgado em 19/12/1997, DJ XXXXX-04-1998 PP-00001 EMENT VOL-01905-01 PP-00029) .

MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI CATARINENSE Nº 9.901, DE 31.07.95: CRIAÇÃO DE CARGOS DE PROVIMENTO EFETIVO DE FISCAIS DE TRIBUTOS ESTADUAIS E DE AUDITORES INTERNOS - ALEGAÇÃO DE QUE A EDIÇÃO DA LEI NÃO FOI PRECEDIDA DE PRÉVIA DOTAÇÃO ORÇAMENTÁRIA NEM DE AUTORIZAÇÃO ESPECÍFICA NA LEI DE DIRETRIZES ORÇAMENTÁRIAS (ART. 169, PAR. ÚNICO, I E II, DA CONSTITUIÇÃO)-

1. Eventual irregularidade formal da lei impugnada só pode ser examinada diante dos textos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e da Lei do Orçamento Anual catarinenses: não se está, pois, diante de matéria constitucional que possa ser questionada em ação direta.

2. Interpretação dos incisos I e II do par. único do art. 169 da Constituição, atenuando o seu rigor literal: é a execução da lei que cria cargos que está condicionada às restrições previstas, e não o seu processo legislativo. A falta de autorização nas leis orçamentárias torna inexeqüível o cumprimento da lei no mesmo exercício em que editada, mas não no subseqüente. Precedentes (Medidas liminares nas ADINs nº s 484/PR (RTJ 137/1.067) e 1.243/MT (DJU de 27.10.95) .

3. Ação direta de inconstitucionalidade não conhecida, ficando prejudicado o pedido de medida cautelar".

(ADI XXXXX-5/SC, TP, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJU de 10.05.96) .

Direito constitucional. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei n. 6.614, de 22.12.1994, que dispõe sobre o Quadro de Pessoal do Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso. Alegações do Governador, autor da ação, de que a Lei impugnada: 1.) - Ofende o princípio da legalidade (art. 39,"caput", e inciso X do art. 48 da C.F.), porque cria número incerto de cargos; 2.) - Viola os incisos XII e XIII do art. 37, quanto a paridade e vinculação de vencimentos; 3.) - Desrespeita o art. 169, a falta de previsão orçamentaria.

1. As alegações perderam consistência, em face das informações do Tribunal de Justiça e da Assembleia Legislativa do Estado.

2. A falta de previsão orçamentaria, conforme precedente do S.T.F. (RTJ 137/1.067) é obstáculo ao cumprimento da Lei no mesmo exercício mas, não, no subsequente.

3. Hipótese, ademais, em que os repasses devem observar a Lei de Diretrizes Orçamentarias, a própria Lei Orçamentaria, que não foi suspensa por esta Corte, na ADI n. 1.287, ajuizada, igualmente, pelo Governador, e seu Decreto n. 4, de 10.01.1995, que se encontra novamente em vigor.

4. Inconveniência do deferimento da medida cautelar de suspensão da Lei, cuja execução está praticamente concluída com a implantação nela prevista, e que vem sendo cumprida com os meios a disposição do Poder Judiciário.

5. Medida cautelar indeferida. Votação unânime.

(ADI 1243 MC, Relator (a) : Min. SYDNEY SANCHES, Tribunal Pleno, julgado em 17/08/1995, DJ XXXXX-10-1995 PP-36331 EMENT VOL-01806-01 PP-00088)

5.89. Dessa forma, mesmo que se tenham precedentes com entendimentos distintos, sem que se tenha notícia de tese com repercussão geral sobre a matéria, a condução desta Corte no âmbito do presente processo e diante dos argumentos colocados nesta instrução demonstram correção no enfrentamento do tema, excluída a possibilidade do exercício de controle de constitucionalidade abstrato, conforme discutido anteriormente.

5.90. Diante disso, a alegação da recorrente de que a remuneração dos auditores desta Corte tenha tido conformação semelhante à conjuntura que se discute nos presentes autos não suprime as irregularidades descritas nos autos e não afasta as exigências legais e constitucionais relacionadas à renúncia de receitas e às despesas obrigatórias em questão. Ademais, os limites constitucionais a serem seguidos pelos titulares das competências para instituir o BEP variável também se mantém.

5.91. De outra sorte, não se desconhece nesta instrução as mudanças fáticas decorrentes da crise do coronavírus (Covid-19) vivida pelo país, a qual ensejou diversas medidas legislativas e judiciais, com reflexos na interpretação e até mesmo na eficácia de normas de finanças públicas também discutidas no presente processo. Entretanto, como se demonstrará a partir desse ponto, a deliberação recorrida, na parte que propõe manter no presente trabalho, está condizente com a conjuntura atual, seja sob os aspectos legais ou judiciais.

5.92. Nessa linha, por conta da emergência de saúde pública de importância internacional relacionada ao coronavírus (Covid-19) , em 18/3/2020, o Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo n. 6/2020, reconheceu, para os fins do artigo 65 da LRF, a ocorrência do estado de calamidade pública, nos termos da solicitação do Presidente da República encaminhada por meio da Mensagem n. 93, datada do mesmo dia, com efeitos até 31/12/2020. O citado dispositivo da Lei Nacional de Finanças Públicas prevê a suspensão na contagem de determinados prazos da norma e, sobretudo, a dispensa do atingimento dos resultados fiscais e da limitação de empenhos.

5.93. Em outra vertente, o Presidente da República ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) Ação Direta de Inconstitucionalidade, com pedido de medida cautelar (ADI 6357 MC/DF) , com o objetivo de conferir interpretação conforme à Constituição aos artigos 14, 16, 17 e 24 da Lei de Responsabilidade Fiscal ( LRF); e ao artigo 114, caput, in fine, e § 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias do ano de 2020 (LDO/2020) . O autor buscou adequar a leitura desses dispositivos ao estado excepcional de calamidade decorrente da pandemia de Covid-19.

5.94. Em decisão liminar, proferida naqueles autos em 29/3/2020, o Ministro Alexandre de Moraes concedeu cautelarmente o pedido do Presidente da República, manifestando-se, nos seguintes termos:

19. Diante do exposto, CONCEDO A MEDIDA CAUTELAR na presente ação direta de inconstitucionalidade, ad referendum do Plenário desta SUPREMA CORTE, com base no art. 21, V, do RISTF, para CONCEDER INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO FEDERAL, aos artigos 14, 16, 17 e 24 da Lei de Responsabilidade Fiscal e 114, caput, in fine e § 14, da Lei de Diretrizes Orçamentárias/2020, para, durante a emergência em Saúde Pública de importância nacional e o estado de calamidade pública decorrente de COVID-19, afastar a exigência de demonstração de adequação e compensação orçamentárias em relação à criação/expansão de programas públicos destinados ao enfrentamento do contexto de calamidade gerado pela disseminação de COVID-19. Ressalto que, a presente MEDIDA CAUTELAR se aplica a todos os entes federativos que, nos termos constitucionais e legais, tenham decretado estado de calamidade pública decorrente da pandemia de COVID-19. Intime-se com urgência. Publique-se. (Grifos acrescidos)

5.95. Note-se que a deliberação é clara quanto à flexibilização na interpretação dos dispositivos da LRF apenas em despesas temporárias e excepcionais relacionadas diretamente ao combate à pandemia do coronavírus Covid-19) . O magistrado explica essa posição em trecho da deliberação:

O excepcional afastamento da incidência dos artigos 14, 16, 17 e 24 da LRF e 114, caput, in fine, e § 14, da LDO/2020, durante o estado de calamidade pública e para fins exclusivos de combate integral da pandemia de COVID-19, não conflita com a prudência fiscal e o equilíbrio orçamentário intertemporal consagrados pela LRF, pois não serão realizados gastos orçamentários baseados em propostas legislativas indefinidas, caracterizadas pelo oportunismo político, inconsequência, desaviso ou improviso nas Finanças Públicas; mas sim, gastos orçamentários destinados à proteção da vida, saúde e da própria subsistência dos brasileiros afetados por essa gravíssima situação; direitos fundamentais consagrados constitucionalmente e merecedores de efetiva e concreta proteção.

5.96. Inclusive, a constitucionalização desse entendimento no artigo 3º da Emenda Constitucional n. 106, publicada em 8/5/2020 e apresentada à frente nesta instrução, levou o Supremo Tribunal Federal, em recentíssimo acórdão proferido em 13/5/2020, a referendar a liminar proferida no âmbito da ADPF 6357 MC/DF e extinguir o feito por perda do objeto. Portanto, a deliberação, transcrita abaixo, ratifica a percepção do Relator sobre a necessidade de se diferenciar os gastos relacionados com a Covid-19 das despesas obrigatórias de caráter continuado para as quais se mantém a influência das normas de finanças públicas:

O Tribunal, por maioria, referendou a medida cautelar deferida e extinguiu a ação por perda superveniente de objeto, nos termos do voto do Relator, vencidos o Ministro Marco Aurélio, que não referendava a medida cautelar deferida, e o Ministro Edson Fachin, que não extinguia a ação. Falaram: pelo requerente, o Ministro José Levi Mello do Amaral Junior, Advogado-Geral da União; e, pelo amicus curiae Associação Brasileira das Secretarias de Finanças das Capitais - ABRASF, o Dr. Ricardo Almeida Ribeiro da Silva. Presidência do Ministro Dias Toffoli. Plenário, 13.05.2020 (Sessão realizada inteiramente por videoconferência - Resolução 672/2020/STF).

5.97. Além disso, em 23/3/2020, o Presidente da República ajuizou no STF Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 662 MC/DF) , contra o Projeto de Lei do Senado 55 de 1996, na parte em que altera o art. 20, § 3º, da Lei 8.742, de 1993 (LOAS) , dispositivos relacionados a despesas de caráter continuado vinculadas aos Benefícios de Prestação Continuada (BPC) .

5.98. Na petição inicial, o requerente alegou o descumprimento pelo Congresso Nacional dos seguintes preceitos fundamentais: artigos , caput, 2º, 5º, LIV e § 2º, 37, 195, § 5º, todos da Constituição Federal; e artigos 107 a 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).

5.99. Sem que se aprofunde na discussão específica do BPC, que também se encontra em análise nesta Secretaria no bojo do TC Processo XXXXX/2020-2, cabe informar que, em 3/4/2020, o Ministro Gilmar Mendes proferiu decisão no âmbito da ADPF 662 MC/DF e reconheceu a necessidade de se fazer distinção entre os gastos vinculados ao combate à pandemia da Covid-19 e às despesas obrigatórias de caráter continuado, para as quais as exigências da LRF se mantém:

A suspensão desses dispositivos não parece afetar a discussão colocada na presente ADI. Isso porque a majoração do Benefício de Prestação Continuada não consubstancia medida emergencial e temporária voltada ao enfrentamento do contexto de calamidade da COVID-19. Ao contrário de outros benefícios emergenciais, a majoração do BPC nos termos propostos tem caráter permanente, ou seja, trata-se de uma expansão definitiva do benefício, que sequer está condicionada ao período de crise.

A necessidade de se fazer um distinguishing entre as medidas temporárias de combate à crise do Coronavírus e as medidas de expansão permanente do gasto público foi destacada pelo Professor Marcos Mendes em artigo recentemente publicado. (...)

(...)

Como destacado pelo economista, a expansão do BPC nos termos propostos implicará custo de R$ 20 bilhões por ano aos cofres públicos. Em um juízo comparativo com outras medidas temporárias e limitadas de contenção da crise, a ampliação permanente do BPC teria o condão de exponencializar a projeção da dívida pública nacional nos próximos anos.

Assim, por todo exposto acima, compreendo que o período emergencial não constitui motivo suficiente para se afastar a exigência constitucional da correspondente fonte de custeio para ampliação de benefício assistencial, sobretudo por se tratar de proposta de majoração permanente da prestação continuada.

5.100. Diante disso, o magistrado proferiu decisão cautelar, suspendendo-se a eficácia artigo 20, § 3º, da Lei 8.742, na redação dada pela Lei 13.981, de 24 de março de 2020, até que sobrevenham as condições previstas na Constituição e na LRF para a execução de despesas dessa natureza:

Concedo, em parte, a medida cautelar postulada, ad referendum do Plenário, apenas para suspender a eficácia do art. 20, § 3º, da Lei 8.742, na redação dada pela Lei 13.981, de 24 de março de 2020, enquanto não sobrevier a implementação de todas as condições previstas no art. 195, § 5º, da CF, art. 113 do ADCT, bem como nos arts. 17 e 24 da LRF e ainda do art. 114 da LDO.

5.101. Ressalte-se que esses posicionamentos estão condizentes com os dispositivos inseridos na recentíssima Emenda Constitucional n. 106, publicada no Diário Oficial da União de 8/5/2020, que instituiu regime extraordinário fiscal, financeiro e de contratações para enfrentamento de calamidade pública nacional decorrente de pandemia, informalmente conhecida como"orçamento de guerra".

5.102. O artigo 3º do referido documento, transcrito abaixo, é expresso em diferenciar as despesas permanentes dos gastos direcionados ao enfrentamento da crise da Covid-19, afastando-se as normas de finanças públicas apenas nesse último caso:

Art. 3º Desde que não impliquem despesa permanente, as proposições legislativas e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, ficam dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa e à concessão ou à ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

5.103. Não há dúvida de que, mesmo com esse cuidado, a indicação de fontes de recursos e medidas de compensação em relação a outras despesas para as quais ainda incidem os dispositivos constitucionais e legais de controle das finanças públicas será fortemente influenciada pelos estratosféricos gastos com a Covid-19 e, portanto, dificultosa, dada a natural escassez de recursos.

5.104. Igualmente verdadeira é a necessidade de se manterem hígidas o quanto possível as normas de controle orçamentário e financeiro constantes da Constituição Federal e da LRF, sob pena de agravar a situação fiscal do país a patamares ainda mais insustentáveis. Em razão disso, cabe a esta Corte distinguir adequadamente os gastos destinados à calamidade pública declarada em março e exigir o cumprimento das normas naquelas despesas não inseridas nessa conjuntura, como exige a recentíssima Emenda Constitucional n. 106/2020.

5.105. No presente caso, é de fácil constatação que incrementos remuneratórios destinados a servidores de determinadas carreiras anteriores ao Decreto Legislativo 6/2020 nenhuma relação possuem com a crise da Covid-19, mantendo-se incólume nessa conjuntura a aplicação das regras ordinárias de finanças públicas.

5.106. Por certo, resta aos Poderes impedir o surgimento de novos gastos não previstos, dada a quase certa impossibilidade de se indicarem fontes de recursos para custearem novas despesas; bem como postergar rubricas cujas medidas de compensação estejam pendentes, como no caso em epígrafe.

5.107. Por fim, o descumprimento sistemático das determinações desta Corte, insculpidas no acórdão recorrido, de fato, podem repercutir na apreciação das Contas do Presidente da República, conforme restou consignado no alerta contido no item 9.9 da deliberação em debate, tendo em vista os reflexos na gestão orçamentária e financeira da União.

CONCLUSÃO

6. Das análises anteriores, conclui-se que:

a) O Tribunal de Contas da União não detém competência para realizar controle de constitucionalidade das leis ou dos atos normativos in abstrato, atribuição exclusiva do Poder Judiciário, mesmo diante da possibilidade de esta Corte examinar a aderência das normas à Constituição nos casos concretos;

b) Medidas legislativas que forem aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira e em inobservância ao que determina a legislação vigente, especialmente o artigo 167 da Constituição Federal, o artigo 113 do ADCT, os artigos 14, 15, 16 e 17 da LRF; e os dispositivos pertinentes da LDO em vigor somente podem ser aplicadas se forem satisfeitos os requisitos previstos na citada legislação; e

c) Desde que não impliquem despesa permanente, as proposições legislativas e os atos do Poder Executivo com propósito exclusivo de enfrentar a calamidade relacionada à Covid-19 e suas consequências sociais e econômicas, com vigência e efeitos restritos à sua duração, ficam dispensados da observância das limitações legais quanto à criação, à expansão ou ao aperfeiçoamento de ação governamental que acarrete aumento de despesa e à concessão ou à ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita.

6.1. Assim, tendo em vista que Tribunal, ao proferir determinação ao Ministro da Economia e especialmente à Casa Civil para que se abstenham de emitir decreto regulamentador do BEP variável, tendo como base primordialmente interpretação de dispositivo constitucional relativo às atribuições das autoridades ou ao próprio processo de formação das normas jurídicas, realiza controle de constitucionalidade preventivo não inserido nas competências desta Corte.

6.2. Por certo, deve o Tribunal proferir recomendação aos órgãos sobre o tema, a qual se espera seja atendida, encaminhando-se, também, a questão ao Procurador-Geral da República, um dos legitimados para interpor representação por inconstitucionalidade.

6.3. Por fim, em relação aos demais pontos discutidos na peça recursal, os argumentos apresentados pela recorrente não têm o condão de modificar a deliberação recorrida, mantendo-se inalterada a deliberação recorrida.

PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO

7. Diante do exposto, com fundamento no artigo 48, da Lei 8.443/1992, submetem-se os autos à consideração superior, com posterior encaminhamento ao Gabinete do Relator, propondo:

a) não conhecer do recurso interposto pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) , em razão da ausência de legitimidade, nos termos do artigo 48 da Lei 8443/1992 e artigos 144, 286, parágrafo único, e 285 do Regimento Interno/TCU;

b) não conhecer do recurso interposto pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) , em razão da ausência de legitimidade, nos termos do artigo 48 da Lei 8443/1992 e artigos 144, 286, parágrafo único, e 285 do Regimento Interno/TCU;

c) conhecer do recurso interposto pela União, por meio da Advocacia-Geral da União; e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para, em substituição à determinação contida no item 9.3 do acórdão recorrido, recomendar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento nas alíneas c e d do inciso I do art. 3º; e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, bem como no inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017;

d) comunicar a deliberação que vier a ser proferida por esta Corte aos recorrentes, às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, à Procuradoria-Geral da República, ao Ministério da Economia, à Casa Civil da Presidência da República, à Advocacia-Geral da União, ao Sindicato Nacional dos Analistas Tributários da Receita Federal do Brasil, ao Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil e aos demais interessados.

2. Em razão da relevância do tema, com profundo impacto tanto nas finanças públicas quanto na vida de milhares de servidores públicos federais, mediante Despacho de peça 173, solicitei o pronunciamento do MPTCU acerca dos pedidos de reexame interpostos.

3. O representante do MPTCU que atuou no feito, Procurador Marinus Eduardo de Vries Marsico, divergiu da proposta da unidade técnica, conforme parecer lançado à peça 178, a seguir transcrito:

Trata-se de representação autuada pela Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) , com vistas a avaliar a conformidade do pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade (BEP) na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, instituído pela Medida Provisória 765/2016, posteriormente convertida na Lei 13.464/2017, e dos Honorários Advocatícios de Sucumbência a servidores públicos, regulamentados pela Lei 13.327/2016, diante dos requisitos exigidos na Lei Complementar 101/2000 ( Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e, ainda, no artigo 113 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT).

Cabe fazer breve histórico acerca do processo. Inicialmente, o Relator a quo proferiu despacho (peça 5) em que conheceu da representação, facultando ao Ministério da Economia e à Secretaria da Receita Federal que no prazo de 24 horas se manifestassem a respeito dos indícios de irregularidades apontados na peça inicial. O despacho também autorizou a Semag a realizar inspeção no Ministério da Economia e na Secretaria da Receita Federal, conforme escopo que viesse a definir, para apurar os indícios de irregularidades identificados relativos aos pagamentos do BEP.

Realizadas as oitivas dos órgãos responsáveis e a análise das respostas encaminhadas, a Semag identificou diversas irregularidades na formatação do BEP, resumidas no voto condutor da deliberação recorrida, nos seguintes termos (peça 105, p. 3) :

a) Inexistência da Base de Cálculo e de Índices de Eficiência Institucionais previstos em lei formal;

b) Exclusão dos Bônus de Eficiência e Produtividade da base de cálculo de contribuição previdenciária;

c) Despesas criadas com a instituição dos Bônus de Eficiência e Produtividade;

d) Vinculação de espécie remuneratória a índices e indicadores;

e) Potencial conflito de interesses entre o público e o privado.

O TCU, preocupado com a gravidade dos fatos relatados e com o possível reflexo nas contas do Presidente da República relativas ao exercício de 2019, proferiu, por meio do Acórdão 1841/2019-TCU-Plenário (peça 87) , relatado pelo Ministro Bruno Dantas, a seguinte deliberação:

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de representação acerca do pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria Fiscal do Trabalho, consoante os dispositivos da Lei Complementar 101/2000 ( Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF) e demais normativos; ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, ante as razões expostas pelo Relator, em:

9.1. com fundamento no art. 59, § 1º, inciso V, da Lei Complementar 101/2000, alertar à Casa Civil e ao Ministério da Economia de que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação orçamentária, em especial os arts. 14, 16 e 17 da Lei Complementar 101/2000, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15 dessa norma, ensejando a necessidade de suspensão de benefícios e pagamentos.

Em face desse acórdão, a Advocacia-Geral da União (AGU) opôs embargos de declaração (peça 98) , apontando omissões e contradições no julgado, os quais foram enfrentados juntamente com o mérito da representação, dando origem ao Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário (peça 102) . Por meio da referida deliberação a Corte expediu as seguintes determinações e recomendações aos órgãos responsáveis, além de conhecer e rejeitar os embargos interpostos:

9.1. conhecer da presente representação, satisfeitos os requisitos de admissibilidade previstos no art. 237, inciso VI, do Regimento Interno do TCU, para, no mérito, considerá-la procedente;

9.2. com fundamento nos arts. 32, inciso II, e 34, da Lei 8.443/1992, conhecer e rejeitar os embargos de declaração interpostos pela União Federal por meio da Advocacia-Geral da União (peça 98) ;

9.3. determinar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 113, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017;

9.4. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 6º do art. 150, e o § 11 do art. 201, ambos da CF/1988, e com o art. 14 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, adote providências para o estabelecimento de medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pela Lei 13.464/2017, a teor do art. 14 da LRF;

9.5. determinar ao Ministério da Economia, com fundamento no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 2º do art. 17 da Lei Complementar 101/2000, que, no prazo de 30 (trinta) dias, evidencie as medidas compensatórias, por meio do aumento permanente de receitas ou redução permanente de despesas, em montante equivalente ao pagamento da parcela fixa atualmente paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade, tendo em vista a criação e a majoração de despesas obrigatórias de caráter continuado promovidas pela edição da Lei 13.464/2017;

9.6. informar ao Ministério da Economia que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação, na forma dos subitens 9.4 e 9.5 acima, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15, da Lei Complementar 101/2000, ensejando a suspensão dos benefícios e pagamentos;

9.7. dar ciência ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com § 1º do art. 169 e o art. 107 do ADCT, todos da CF/1988, c/c arts. , 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, de que eventual projeto de lei que vise estabelecer medidas necessárias à implementação da remuneração variável paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho deve conter, no mínimo:

9.7.1. a evidenciação do atendimento aos requisitos insculpidos no § 1º do art. 169 da CF/88;

9.7.2. estimativas de impacto orçamentário-financeiro adequadas e coerentes acerca da majoração dessa despesa;

9.7.3. premissas e metodologia de cálculo utilizadas para se estimar o montante da despesa;

9.7.4. valores estimados que cada beneficiário individualmente irá perceber a título de BEP;

9.7.5. comprovação de que a despesa criada ou majorada não afetará as metas de resultados fiscais;

9.7.6. clara demonstração de que a majoração da despesa será compensada pelo aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa;

9.8. recomendar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 250, inciso III, do Regimento Interno do TCU, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 107, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. , 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que eventual projeto de lei que vise estabelecer medidas necessárias à implementação da remuneração variável paga a título de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho estabeleça:

9.8.1. limite máximo do valor global dessa parcela remuneratória variável;

9.8.2. mecanismos que não vinculem a base de cálculo, a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16 da Lei 13.464/2017, à arrecadação de receitas, visando preservar a lógica pretendida pelo Novo Regime Fiscal;

9.9. encaminhar cópia da presente deliberação à Casa Civil, dado o risco de repercussão dessas questões, se não equacionadas, na apreciação das Contas do Presidente da República referentes ao exercício de 2019, conforme alertado em outras decisões do Tribunal;

9.10. encaminhar cópia da presente deliberação à Secretaria de Fiscalização de Pessoal do TCU, tendo em vista as irregularidades apontadas acerca do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho instituído pela Lei 13.464/2017, a fim de subsidiar a fiscalização daquela unidade instrutora no âmbito do TC Processo XXXXX/2018-0;

9.11. encaminhar cópia dos autos às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, bem como à Procuradoria-Geral da República, tendo em vista os aspectos de constitucionalidade da Lei 13.464/2017 tratados no presente relatório, notadamente aqueles relacionados à instituição de benefício fiscal em desacordo com a Constituição Federal de 1988, à vinculação de remuneração de servidores e ao potencial conflito de interesses na instituição de bônus de produtividade a agentes públicos;

9.12. dar ciência desta deliberação às Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, à Procuradoria-Geral da República, ao Ministério da Economia, à Casa Civil da Presidência da República, à Advocacia-Geral da União, à Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil, ao Sindicato Nacional dos Analistas Tributários da Receita Federal do Brasil, ao Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil e ao Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais do Trabalho;

9.13. autorizar o Relator, desde logo, a prorrogar monocraticamente os prazos definidos nos subitens 9.4 e 9.5 deste Acórdão, caso seja requerido, de forma justificada, pelo Ministério da Economia. (grifos nossos)

Posteriormente, o Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil (Sindifisco Nacional) também opôs embargos de declaração (peça 117) , requerendo o saneamento da deliberação, e o Tribunal, por meio do Acórdão por Relação 2.358/2019 - Plenário (peça 131) , da relatoria do Ministro Bruno Dantas, decidiu por não conhecer do pedido.

Por fim, a União, por intermédio da AGU, interpôs novo recurso, dessa vez na modalidade de pedido de reexame (peça 120) , requerendo o conhecimento e provimento do pedido para afastar os itens 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.9 e 9.13 do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário (peça 102) , e adequar os itens 9.7 e 9.8, para que os requisitos ali indicados fossem direcionados ao ato regulamentador do BEP. Da mesma forma, a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil (Anfip) e o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) interpuseram pedido de reexame em face do julgado (peça 125 e 126, respectivamente) , os quais tiveram os exames preliminares de admissibilidade (peças XXXXX-145) ratificados pelo Ministro-Relator, na peça 147, concluindo pelo não conhecimento dos recursos, ante a ausência de legitimidade das referidas entidades. Já quanto ao pedido de reexame interposto pela União, houve o conhecimento do pedido, suspendendo-se os efeitos dos itens 9.1, 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.7, 9.8 e 9.9 do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário.

Na fase atual, portanto, discute-se o mérito do pedido de reexame interposto pela União (peça 120) contra o Acórdão 1.921/2019 (peça 102) . Em sua análise (peça 170) , a Serur reconhece que os argumentos da recorrente estão parcialmente corretos, no sentido de que o Tribunal de Contas da União não detém competência para realizar controle de constitucionalidade das leis ou dos atos normativos in abstrato, atribuição exclusiva do Poder Judiciário. A Serur conclui que o Tribunal, ao proferir determinação ao Ministro da Economia e especialmente à Casa Civil para que se abstenham de emitir decreto regulamentador do BEP variável, tendo como base primordialmente interpretação de dispositivo constitucional relativo às atribuições das autoridades ou ao próprio processo de formação das normas jurídicas, realiza controle de constitucionalidade preventivo não inserido nas competências da Corte.

Por outro lado, a Unidade Técnica entende que não configuraria espécie de controle de constitucionalidade proferir apenas recomendação mantendo a mesma redação contida originariamente no item 9.3 do acórdão recorrido. Por fim, em relação aos demais pontos discutidos na peça recursal, a Unidade Técnica defende que os argumentos apresentados pela recorrente não teriam o condão de modificar a deliberação recorrida.

Nesse sentido, a Serur propôs conhecer do recurso interposto pela União e, no mérito, dar-lhe provimento parcial para, em substituição à determinação contida no item 9.3 do acórdão recorrido, recomendar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento nas alíneas c e d do inciso I do art. 3º; e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, bem como no inciso X do artigo 37 da Constituição Federal, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017.

***

O debate nos autos pode ser delimitado a duas discussões centrais: i) competência do TCU para determinar que o Poder Executivo se abstenha de regulamentar a parte variável do bônus de eficiência pela via infralegal; ii) determinações sobre a adequação do pagamento do BEP às normas orçamentárias, em especial o estabelecimento das medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pela Lei 13.464/2017, a teor do art. 14, 16 e 17 da Lei Complementar 101/2000.

Determinação para que o Poder Executivo se abstenha de regulamentar o BEP

Quanto à primeira questão, vale lembrar que, nos termos da Lei 13.464/2017, o Bônus de Eficiência e Produtividade constituiria parcela, como regra, variável na remuneração das carreiras Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, dependente da regulamentação dos parâmetros essenciais relativos ao índice de eficiência institucional e à base de cálculo. Até que fosse estabelecido esse detalhamento, a norma previu pagamento dos bônus em valores fixos da ordem de R$ 3 mil para Auditores Fiscais e Auditores do Trabalho e de R$ 1,8 mil para Analistas Tributários, conforme determinado pela Lei, em seus artigos 11, § 2º; e 21, § 2º.

A divergência entre o TCU e a União nesse ponto se dá justamente em reconhecer qual espécie normativa é aplicável a essa regulamentação. A União entende que estão presentes na Lei os requisitos necessários para prover a regulamentação do BEP via decreto autônomo. O TCU, entretanto, entende que, dada a ausência de lei formal definindo parâmetros relevantes na composição do BEP, como por exemplo a sua base de cálculo, essa regulamentação pela via infralegal acabaria por violar o art. 37, inciso X, da CF/88, segundo o qual, "a remuneração dos servidores públicos e o subsídio de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em cada caso".

Quanto a essa questão, vale a pena destacar as informações trazidas pela Semag em seu relatório de inspeção, no sentido de que, nos termos dos artigos , § 5º, e 15, § 5º, da Lei 13.464/2017, o valor global do Bônus de Eficiência e Produtividade a ser distribuído aos beneficiários do Programa corresponde à multiplicação da base de cálculo do Bônus pelo Índice de Eficiência Institucional, e que esse valor global consiste no montante a ser distribuído entre os beneficiários definidos na Lei 13.464/2017. Nesse sentido, a delimitação da base de cálculo a compor o valor do BEP seria elemento essencial na definição da remuneração dos beneficiários da rubrica e, portanto, deveria estar delineada expressamente em lei específica.

A Semag lembra que, inclusive, a redação original da Medida Provisória 765/2016, que fundamentou inicialmente o Bônus, no § 4º do artigo 5º, delineava expressamente a base de cálculo dessa rubrica. Todavia, quando da conversão da medida provisória na Lei 13.464/2017, esses dispositivos foram retirados, o que deixou sem definição a base de cálculo do BEP.

Por outro lado, a União afirma que o TCU busca questionar a opção do legislador por delegar ao regulamento a fixação dos contornos da verba criada pela Lei 13.464/2017, de modo que a determinação contida no subitem 9.3 do acórdão ora recorrido configuraria novamente tentativa de controle difuso de constitucionalidade por parte dessa Corte.

De todo modo, o debate sobre a natureza da espécie normativa aplicável à regulamentação do BEP foge ao escopo dos autos pelo simples fato de que tal regulamentação nem sequer sobreveio ao ordenamento jurídico. A discussão central cinge-se à constitucionalidade da determinação proferida pelo TCU no subitem 9.3 do Acórdão 1.921/2019, no sentido de impedir que o Poder Executivo venha a regulamentar a matéria. Sobre essa questão, vale a pena destacar alguns argumentos pontuados pela Serur (peça 170) , com cuja análise anuímos, embora divirjamos parcialmente da proposta final de encaminhamento:

(...) 5.17. Dessa forma, a instituição de decreto para regulamentação de assunto reservado à lei específica, de fato, ultrapassa a competência do Chefe do Poder Executivo e deve ser objeto de enfrentamento por esta Corte.

5.18. Todavia, ao se debruçar sobre a manifestação da unidade técnica transcrita no relatório do acórdão recorrido (peça 106 - itens 113 a 136) e os votos condutores do julgado (peças 104 e 105) , não obstante se observe referência a dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal e normas constitucionais de finanças públicas, é forçoso reconhecer que esse ponto gira em torno primordialmente da inconstitucionalidade na edição de possível decreto autônomo, em afronta ao inciso X do artigo 37 da Constituição Federal. Não se desconhece nesta instrução o papel essencial que a base de cálculo do BEP tem sobre exigências da LRF, conforme será discutido abaixo.

5.19. Mas, igualmente, é posicionamento de todos que o tratamento da base de cálculo do BEP por decreto constitui inconstitucionalidade formal, por se referir a matéria reservada a lei específica, nos termos do artigo 37, inciso X, da Constituição Federal.

5.20 Esta Corte, em atendimento à proposição da unidade técnica, optou por tratar a questão de forma preventiva e proferir, por meio do item 9.3 do acórdão recorrido, transcrito uma vez mais, para melhor entendimento, determinação ao Ministério da Economia e à Casa Civil, para que se abstenham de dispor sobre o tema de outra forma senão por lei formal: 9.3. determinar ao Ministério da Economia e à Casa Civil, com fundamento no art. 71, inciso IX, da Constituição Federal, bem como nas alíneas c e d, do inciso I, do art. , e no inciso II do art. 31, todos da Lei 13.844/2019, no inciso X do art. 37, § 1º, do art. 169, e art. 113, do ADCT, todos da CF/1988, e arts. 15, 16, 17 e 21 da Lei Complementar 101/2000, que se abstenham de implementar a remuneração variável a título de pagamento de Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade Tributária e Aduaneira e do Bônus de Eficiência e Produtividade na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho até que sobrevenha lei formal, estabelecendo a composição das bases de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017;

5.21. Em que pese se refira ao Ministério da Economia e à Casa Civil, por certo, a determinação se direciona, em primeira medida, ao Presidente da República, em acintoso controle de constitucionalidade preventivo pelo TCU. Apesar de salutar a intenção de proteção prévia das contas públicas, nesse caso específico, a forma de controle encontrada pela Corte não encontra guarida na Constituição Federal.

(...) 5.32. Assim, não obstante correto o posicionamento desta Corte em relação à inconstitucionalidade de eventual decreto autônomo acerca da regulamentação da base de cálculo do valor global do BEP, a opção por realizar determinação ao Chefe do Poder Executivo se apresenta como controle de constitucionalidade abstrato preventivo pelo TCU.

5.33. Por certo, cabe forte recomendação sobre a matéria, nos exatos termos colocados pela deliberação recorrida no item 9.3, opção que possibilita a manutenção dos itens 9.7 e 9.8 e respectivos subitens do julgado em debate, além do encaminhamento dessa e de outras questões tratadas nos autos ao Procurador-Geral da República, legitimado à representação por inconstitucionalidade

De fato, assiste razão a Serur no sentido de que a determinação contida no subitem 9.3 do acórdão proferido configura controle de constitucionalidade preventivo, competência essa privativa do Poder Judiciário. Convém salientar, inclusive, sobre decisão liminar do Ministro Alexandre de Moraes, proferida no âmbito do Mandado de Segurança 35.498/DF, impetrado pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do trabalho (Sinait) em face das decisões proferidas no âmbito do TC Processo XXXXX/2017-1, no qual o ministro suspende deliberações do Tribunal nos casos concretos constantes daquele processo, manifestando-se, nos seguintes termos em relação a esse possível controle exercido pelo TCU:

Haveria nessa hipótese inaceitável subversão constitucional, pois o texto constitucional não prevê essa competência jurisdicional ao Tribunal de Contas da União, que, igualmente, não se submete às regras de freios e contrapesos previstas pela Constituição Federal ao Supremo Tribunal Federal para interpretar seu texto (legitimidade taxativa, pertinência temática, cláusula de reserva de plenário, quórum qualificado para modulação dos efeitos, quórum qualificado para edição de súmulas vinculantes, entre outros), e que acabam por ponderar, balancear e limitar esse poder. Dessa forma, a Constituição Federal não permite ao Conselho Nacional de Justiça, tampouco ao Tribunal de Contas da União, o exercício do controle difuso de constitucionalidade, pois representaria usurpação de função jurisdicional, invasão à competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal e desrespeito ao Poder Legislativo. (grifos nossos)

Nesse mesmo sentido, se ao TCU não é dado proferir determinação no caso em análise sob pena de realizar controle prévio de constitucionalidade e extrapolar o escopo das competências que lhe são constitucionalmente atribuídas, entendemos, com base nos mesmos fundamentos, não lhe caber expedir recomendação com o mesmo teor. A despeito de a medida sugerida pela Serur, a recomendação, não ser compulsória, aspecto em que se diferencia da medida anteriormente adotada, o fato é que o objeto recomendado permanece sendo a possível afronta de eventual decreto editado pelo Poder Executivo à reserva legal insculpida no art. 37, inciso X, da Carta Política.

Ou seja, em última análise o TCU estaria a recomendar, de maneira prévia, que o Poder Executivo não exerça nesse ponto específico sua função Constitucional de regulamentar a lei, ante o entendimento de que isso afrontaria a Constituição. Parece-nos que recomendação com tal teor importaria em idêntica análise prévia da constitucionalidade da matéria, veiculando novo, porém suave, controle concentrado de constitucionalidade.

No mais, convém destacar que a matéria já está judicializada em processo adequado para que a Suprema Corte se manifeste especificamente sobre a possível afronta à reserva legal e ofensa ao art. 37, inciso X da CF/88, que o Poder Executivo incorreria ao publicar eventual decreto a fim de regulamentar o BEP (ADI 6562) .

Desse modo, sem desconsiderar a independência das instâncias, mas estando a matéria sub judice em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF, foro competente para assentar, de maneira definitiva, a inconstitucionalidade (ou constitucionalidade) da lei, pensamos ser desaconselhável a emissão de qualquer recomendação pelo TCU neste momento, devendo-se aguardar o posicionamento da Suprema Corte acerca do tema.

Adequação do pagamento do BEP às normas orçamentárias

Quanto à segunda questão, convém inicialmente esclarecer que a Medida Provisória 765/2016 e a posterior Lei 13.464/2017 estabeleceram, de acordo com os artigos 14 e 24, que a parcela remuneratória relativa ao BEP não constituiria base de cálculo da respectiva contribuição previdenciária. Em processo anterior, nos autos do TC Processo XXXXX/2017-1, o TCU atacou a constitucionalidade desse dispositivo, considerando o fato de que a rubrica geraria reflexos também nos benefícios de inativos e pensionistas.

Já nos presentes autos, o TCU não teria discutido a constitucionalidade dos arts. 14 e 24 da Lei 13.464/2017, mas sim sua adequação às normas de finanças públicas, entendendo que, se houve a criação de uma nova despesa obrigatória de caráter continuado, dever-se-ia exigir a comprovação de que esse gasto não afetou as metas de resultados fiscais, devendo os respectivos efeitos financeiros ter sido compensados ou pelo aumento permanente da receita ou pela redução permanente da despesa.

Além disso, e principalmente, o Tribunal entendeu que a dispensa da contribuição previdenciária sobre o BEP configuraria hipótese de isenção tributária, importando em renúncia de receita, e que assim deveria obedecer aos requisitos exigidos no art. 14 da LRF, para a continuidade do seu pagamento, quais sejam: a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes; b) atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias; ou c) alternativamente: c.1) demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias; c.2) estar acompanhada de medidas de compensação, por meio do aumento de receita, proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.

Em resumo, a Corte de Contas afirmou que as medidas legislativas aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira e em inobservância ao que determina a legislação vigente, especialmente o artigo 167 da Constituição Federal, o artigo 113 do ADCT, os artigos 14, 15, 16 e 17 da LRF, bem como os dispositivos pertinentes da LDO em vigor, somente podem ser aplicadas se fossem satisfeitos os requisitos previstos na citada legislação. Essa lógica justificou as determinações contidas nos itens 9.4 e 9.5 do Acórdão ora recorrido.

Já a AGU diverge desse posicionamento, salientando que a tese encampada pela Lei 13.464/2017 seria a de não-incidência de contribuição previdenciária sobre o BEP, de modo que inexistiria renúncia de receita sujeita ao inciso II do art. 14 da LRF e que, portanto, não haveria que se falar em medidas de compensação e muito menos em condições de eficácia da Lei. Defende ainda que o Bônus de Eficiência não é uma verba que se incorpora aos proventos de inatividade e à pensão, pois esse pagamento ocorre em percentuais decrescentes a cada ano e que estacionam no importe de 35% a partir de dez anos de inatividade ou de pensão. Por outro lado, se fosse uma verba incorporada à inatividade, não haveria o decréscimo, mas, ao revés, incidiria a regra da paridade, ainda vigente para casos pretéritos, embora revogada desde a Emenda Constitucional 41/2003.

Por fim, a AGU salienta que a Semag buscou diferenciar o feito dos outros processos tramitados no TCU que já tratam do Bônus, restringindo sua análise à abordagem orçamentária e contábil, bem como aos impactos fiscais associados, o que deixaria de fora questões como, por exemplo, a natureza jurídica da parcela e sua inserção ou não no campo de incidência tributária. Contudo, alega que tal ressalva seria contraditória, pois a definição pela incidência de contribuição previdenciária sobre o BEP teria o inexorável efeito de significar que o Bônus é hipótese de incidência da contribuição previdenciária, e essa premissa repercutiria diretamente no regime de pagamento do Bônus a inativos e pensionistas.

Sobre essas questões, a Serur não vislumbrou qualquer irregularidade, mas sim a atuação escorreita dessa Corte na materialização das normas constitucionais e legais de finanças públicas, que se aplicam às despesas criadas pela Lei 13.464/2017, sem que se constitua controle de constitucionalidade. Além disso, entendeu desnecessário que essa Corte se manifeste sobre a repercussão do posicionamento acerca da natureza jurídica de possível renúncia fiscal vinculada ao BEP sobre o regime de pagamento do Bônus a inativos e pensionistas. Aduziu que a exclusão do Bônus da base de cálculo da contribuição previdenciária trata-se de isenção relacionada à própria regra matriz de incidência do tributo e, para o que interessa aos presentes autos, enseja repercussões nas regras delimitadas pela LRF, não havendo necessidade, nesta assentada, de se manifestar sobre eventual regime de pagamentos. Além disso, a própria sistemática estabelecida pela Lei 13.464/2017 desconsideraria o regime de aposentadoria dos beneficiários, de maneira que a discussão sobre os pagamentos do Bônus no regime de paridade dos servidores não teria correlação com a solução das controvérsias levantadas nos presentes autos.

Apesar de serem fortes os argumentos desenvolvidos pela Serur quanto à necessidade de adequação do pagamento da BEP às normas orçamentárias, pedimos vênias para defender que a definição da natureza jurídica da parcela é matéria prejudicial à definição de quais dispositivos legais sobre finanças públicas são aplicáveis ao caso. De fato, o entendimento sobre como essa rubrica repercute no regime de pagamentos traz uma visão crítica para definir se os artigos 14 e 24 da Lei 13.464/2017 tratam de uma isenção tributária ou de uma hipótese de não-incidência, como defende a AGU. Também é relevante a questão levantada sobre que efeitos essa contribuição previdenciária geraria sobre o regime de pagamento de aposentados e pensionistas, caso se entenda que a hipótese da lei é a de isenção fiscal.

Ocorre, entretanto, que nenhum desses temas está em discussão nos presentes autos. A propósito, vale dizer que a própria Serur mencionou a existência de processo (TC Processo XXXXX/2018-0) constituído anteriormente à autuação do presente em que se discute justamente a natureza jurídica dessa parcela, tema deveras controverso dada as peculiaridades dos diferentes regimes de pagamentos aplicáveis. Cabe informar, por oportuno, que o citado processo, de relatoria do E. Ministro Benjamin Zymler, se encontra sobrestado, até que sobrevenham julgamentos definitivos em mandados de segurança em trâmite no STF, conforme despacho contido à peça 13 daqueles autos.

Assim, temos que a definição da natureza jurídica do BEP é questão prejudicial à discussão sobre a adequação dos respectivos pagamentos às normas orçamentárias, e que tal matéria está pendente de decisão nos autos do TC Processo XXXXX/2018-0, sobrestado por força de Mandados de Segurança impetrados na Suprema Corte.

Desse modo, tendo em vista a prevenção do TC Processo XXXXX/2018-0 para examinar a definição da natureza jurídica do BEP, pensamos que tal matéria não deva ser enfrentada nestes autos. A fim de que não ocorra o necessário sobrestamento também os presentes autos, aguardando a definição da Suprema Corte, sugerimos que esse assunto seja remetido ao TC Processo XXXXX/2018-0, para que, quando do seu julgamento, o tribunal defina também os aspectos relacionados à adequação do pagamento do BEP às normas de finanças públicas.

***

Do exposto, anuímos parcialmente à proposta da Unidade Técnica, opinando, entretanto, que o item 9.3 do Acórdão recorrido seja excluído; e que se remeta a análise dos aspectos relacionados à adequação dos pagamentos do BEP às normas orçamentárias, especialmente o artigo 167 da Constituição Federal, o artigo 113 do ADCT, os artigos 14, 15, 16 e 17 da LRF, bem como os dispositivos pertinentes da LDO em vigor, aos autos do TC Processo XXXXX/2018-0.

É o relatório.

Em apreciação pedidos de reexame interpostos pela Advocacia-Geral da União - AGU (peça 120) , pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil - Anfip (peça 125) e pelo Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho - Sinait (peça 126) , contra o Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário (peça 102) , mantido pelo Acórdão 2358/2019-TCU-Plenário (peça 131) , que rejeitou embargos de declaração.

A decisão recorrida, no que interessa ao debate travado em sede recursal, apreciou representação da Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag) , com vistas a avaliar a conformidade do pagamento do Bônus de Eficiência e Produtividade (BEP) na Atividade Tributária e Aduaneira e na Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, instituído pela Medida Provisória 765/2016, posteriormente convertida na Lei 13.464/2017.

Em essência, o voto condutor da decisão combatida (peça 105) registrou a ocorrência das seguintes desconformidades a ensejar a prolação do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário: i) inexistência de previsão em lei formal da base de cálculo e de índices de eficiência institucionais relativos ao BEP; ii) exclusão do BEP da base de cálculo de contribuição previdenciária; iii) criação de despesa obrigatória com a instituição do BEP sem a indicação das medidas compensatórias; iv) vinculação de espécie remuneratória a índices e indicadores; v) potencial conflito de interesses entre o público e o privado.

No mérito, o Acórdão em questão, entre outros:

determinou ao Ministério da Economia e à Casa Civil que se abstivessem de implementar a remuneração variável a título de BEP, até que sobreviesse lei formal fixando a base de cálculo, sobre a qual deverá incidir o índice de eficiência institucional, a que se se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017 (subitem 9.3) ;

determinou ao Ministério da Economia que adotasse as providências para o estabelecimento de medidas de compensação para a instituição da renúncia de receita previdenciária veiculada pelos arts. 14 e 24 da Lei 13.464/2017 (subitem 9.4) ;

determinou ao Ministério da Economia que indicasse as medidas compensatórias, por meio do aumento permanente de receitas ou redução permanente de despesas, em montante equivalente ao pagamento da parcela fixa do BEP, tendo em vista a criação e a majoração de despesas obrigatórias de caráter continuado promovidas pela edição da Lei 13.464/2017 (subitem 9.5) ;

deu ciência ao Ministério da Economia e à Casa Civil acerca de premissas que o projeto de lei que permitir o pagamento da remuneração variável a título de BEP deveria observar (subitem 9.7) e, em seguida, recomendou a esses mesmos órgãos que o projeto de lei em referência estabelecesse critérios limitadores na fixação do citado pagamento (subitem 9.8) .

Após analisar as razões recursais trazidas pela AGU, a Secretaria de Recursos (Serur) , em pronunciamentos uniformes (peças 170 a 172) , pugna pelo acolhimento parcial das razões de apelo para, no mérito, sugerir o seu provimento parcial de sorte que a determinação contida no subitem 9.3 fosse convertida em recomendação.

Considerando a relevância do tema, com profundo impacto tanto nas finanças públicas quanto na vida de milhares de servidores públicos federais, mediante Despacho de peça 173, solicitei o pronunciamento do MPTCU acerca dos pedidos de reexame interpostos.

O representante do MPTCU que atuou no feito, Procurador Marinus Eduardo de Vries Marsico, em parecer lançado à peça 178, anuiu parcialmente à proposta da unidade técnica. Propõe, em relação ao mérito, a exclusão do subitem 9.3 e que se remeta a análise dos aspectos relacionados à adequação dos pagamentos do BEP às normas orçamentárias, especialmente o art. 167 da CF/1988, o art. 113 do ADCT, os arts. 14, 15, 16 e 17 da LRF, bem como os dispositivos pertinentes da LDO em vigor, aos autos do TC Processo XXXXX/2018-0.

Diga-se que o TC Processo XXXXX/2018-0 cuida de processo administrativo de relatoria do Ministro Benjamin Zymler, autuado em cumprimento ao subitem 9.3 do Acórdão 2721/2017-TCU-Plenário, em que foi determinada a realização de fiscalização pelo TCU para se analisar a natureza jurídica do BEP, bem como a repercussão do seu pagamento a servidores ativos, inativos e pensionistas.

Referido processo encontra-se sobrestado, aguardando decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal - STF acerca de questões similares tratadas nos MS 35.410, 35.490, 35.494, 35.498 e 35.500.

Feito esse necessário preâmbulo, passo a decidir.

Registro, nesta oportunidade, que incorporei ao presente voto as pertinentes sugestões que recebi do gabinete do eminente Ministro Benjamin Zymler.

De início, ratifico os termos do Despacho de peça 147, em que deixei de conhecer dos recursos interpostos pela Anfip e pelo Sinait por ausência de legitimidade e admiti a peça recursal manejada pela União, por intermédio da AGU, oportunidade em que foram suspensos os efeitos dos subitens 9.1, 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.7, 9.8 e 9.9 do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário.

Com relação ao mérito, acompanho em parte os pareceres prévios, transcritos no relatório precedente, oportunidade em que acolho os argumentos neles expendidos naquilo que não contrariam as teses por mim defendidas neste voto.

As razões de apelo trazidas pela AGU, reproduzidas de forma minudente no relatório prévio, buscam demonstrar a necessidade de revisão da decisão combatida, na medida em que as determinações que integram os subitens 9.3, 9.4 e 9.5 configuram, a seu ver, controle abstrato de constitucionalidade pelo TCU sobre a instituição e pagamento do BEP, não sendo possível inviabilizar os efeitos de norma vigente, mesmo sob a pendência de termo previsto na própria lei, sem que tenha havido violação à Lei pelo Presidente da República.

Aduz a recorrente que a pretensão de o TCU em exigir a edição de nova lei formal para dispor sobre a base de cálculo do BEP variável, dada a inviabilidade de regulamentação da questão tratada na Lei 13.464/2017 por ato infralegal, acaba por negar vigência a dispositivos da Lei 13.464/2017, norma válida e vigente no mundo jurídico, em verdadeiro controle de constitucionalidade.

Com relação à matéria veiculada na determinação inserta no subitem 9.3 da decisão combatida, entende a AGU que se trata de situação semelhante àquela tratada pela Lei 10.356/2001, que instituiu o plano de carreira dos servidores do TCU.

Prossegue afirmando que a Lei em menção foi regulamentada pela Resolução TCU 146/2001 e apenas em 2012, após diversas mudanças legislativas, é que essa Lei passou a prever os percentuais de pagamento de determinada gratificação. Conclui que os servidores do TCU perceberam, por 11 anos, gratificação regulamentada por ato infralegal, em razão da opção do legislador de promover a delegação do tema.

Informa que o STF já decidiu pela existência de direito adquirido a reajuste previsto em Lei, quando da apreciação das ADIs XXXXX/TO, esta com efeito vinculante, 5.809/DF e 6.004/DF, não sendo possível o Poder Executivo desconstituir diploma normativo aprovado pelas Casas Legislativas.

Afirma que a Suprema Corte afasta qualquer possibilidade de imposição de condição de eficácia nos moldes suscitados no voto condutor da deliberação recorrida, além daquela Corte ter firmado entendimento no sentido de não haver hierarquia entre lei complementar e lei ordinária, não se mostrando razoável o viés de eficácia que buscou inaugurar o TCU, de subordinar a produção de efeitos da Lei 13.464/2017 a disposições gerais da LRF.

Entende que o Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, proferido em sede de consulta, não se aplica ao caso sob exame. Na ocasião, o TCU respondeu ao consulente que"medidas legislativas que forem aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira, e em inobservância ao que determina a legislação vigente, especialmente o art. 167 da Constituição Federal, o art. 113 do ADCT, os arts. 15, 16 e 17 da LRF, e os dispositivos pertinentes da LDO em vigor, somente podem ser aplicadas se forem satisfeitos os requisitos previstos na citada legislação".

De acordo com a recorrente, o objeto da consulta se referiu a aprovação de leis instituidoras de subvenções, benefícios e isenções fiscais, ou seja, leis autorizativas, sem as devidas medidas de compensação orçamentária fixadas na CF/1988 e na LRF.

A AGU busca ainda evidenciar que a exclusão do BEP da base de cálculo da contribuição previdenciária pela Lei 13.464/2017 não se trata de isenção tributária como defende o TCU, mas cuida-se de hipótese de não-incidência a afastar a necessidade de se prever medidas de compensação previstas no art. 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF.

Em defesa dessa tese, a recorrente alega que o que se paga a título de BEP para os servidores ativos não repercute para fins previdenciários, pois a própria Lei 13.464/2017 previu o pagamento do BEP para os inativos em valores percentuais decrescentes com o passar do tempo. Caso essa verba fosse incorporada na inatividade, não haveria decréscimo, pois incidiria a regra de paridade.

Reforça a tese de não-incidência da contribuição previdenciária, além do fato de a hipótese de não-incidência tributária poder ser delimitada por expressa previsão legal, a exemplo do art. 25 da Lei 13.464/2017, a decisão do STF, em sede de repercussão geral, que firmou o entendimento de que"não incide contribuição previdenciária sobre verba não incorporável aos proventos de aposentadoria do servidor público".

Requer, ainda, que este TCU se manifeste sobre a repercussão do posicionamento acerca da natureza jurídica da renúncia fiscal vinculada ao BEP sobre o regime de pagamento do Bônus a inativos e pensionistas, inclusive, sobre incidência da paridade nesses pagamentos.

Por fim, esclarece a AGU que inexiste descumprimento de Lei por parte do Poder Executivo, não havendo razão para que o julgado repercuta na análise das contas do Presidente da República, conforme sugere a leitura do subitem 9.9 do acórdão recorrido.

Com relação aos pedidos, requer a AGU o afastamento dos subitens 9.3, 9.4, 9.5, 9.6, 9.9 e 9.13 do acórdão adversado, bem como a adequação dos subitens 9.7 e 9.8, para que os requisitos ali indicados sejam direcionados ao ato que for regulamentar o BEP.

As razões de apelo merecem acolhimento parcial pelos motivos que passo a expor.

O BEP foi trazido ao mundo jurídico pela Medida Provisória - MP 765/2016, posteriormente convertida na Lei 13.464/2017. Desde o seu nascedouro, já era previsto o seu pagamento inicial sob a forma de parcela fixa, cabendo o pagamento nos moldes de parcela variável apenas após a regulamentação da metodologia para mensuração da produtividade global da Secretaria da Receita Federal do Brasil e do Índice de Eficiência Institucional - IEI, a incidir sobre determinada base de cálculo (art. , § 4º, da MP 765/2016), para fins de apuração do valor global do BEP. Este seria partilhado aos servidores ativos, inativos e pensionistas.

Como era de se esperar, a própria MP 765/2016, em seu art. , § 4º, identificava as receitas que deveriam compor a base de cálculo sobre a qual incidiria o IEI, a saber, a arrecadação de multas tributárias e aduaneiras e os recursos advindos da alienação de bens apreendidos. Ademais, o § 6º do mesmo art. 5º, limitava o valor global do BEP à referida base de cálculo. Essa limitação tinha por objetivo claro não permitir a atribuição de valores maiores do que um ao IEI, de sorte a evitar um incremento sem controle do valor global do BEP a ser pago.

Ocorre que, na conversão da mencionada MP para a Lei 13.464/2017, ambos os dispositivos normativos (§§ 4º e 6º do art. 5º) foram suprimidos, a evidenciar nítida lacuna na referida Lei 13.464/2017, pois deixou em aberto tanto a composição da base de cálculo do BEP variável (§ 4º do art. 5º da MP 765/2016) , quanto à especificação de que a referida base de cálculo constituiria o limite do BEP global (§ 6º do art. 5º da MP 765/2016)

No entender do recorrente, o exercício do poder regulamentar a dotar a Lei 13.464/2017 de plena executoriedade autorizaria a expedição de ato regulamentar pertinente a preencher as lacunas apontadas.

Neste ponto, a decisão combatida foi precisa ao considerar a impossibilidade de ato infralegal, a extrapolar os limites da regulamentação a ser aplicada à Lei 13.464/2017, assumir as vestes típicas de um diploma legal para, ao exclusivo talante da autoridade executiva que o expedir, fixar a remuneração de servidor público, em afronta à regra constitucional disposta no inciso X do art. 37 da CF/1988, e em clara usurpação de competência típica do Congresso Nacional.

De se dizer, contudo, que o legislador ordinário, in casu - ao contrário do que estipulou nos § 3º do art. 6º e § 3º do art. 16 da Lei 13.464/2017, ao prever que ato do Comitê Gestor do Programa de Produtividade da Receita Federal fixará o IEI -, não delegou expressamente à autoridade do Poder executivo a possibilidade de regulamentar a base de cálculo do BEP variável.

Assim, a Lei 13.464/2017, ao deixar de prever a base de cálculo para a incidência do IEI, sem estabelecer qualquer limite para o valor global do BEP, permitiu que ato infralegal fixasse, à exclusiva mercê da autoridade que o expedirá, parcela remuneratória para os servidores das carreiras da Atividade Tributária e Aduaneira e da Atividade de Auditoria-Fiscal do Trabalho, em clara afronta ao princípio constitucional de reserva de lei.

Por oportuno, transcrevo a ementa da ADI 3.369 MC/DF, de relatoria do Min. Carlos Velloso, apreciada pelo Pleno do STF e publicada em 18/2/2005, que declarou a inconstitucionalidade de ato conjunto das Mesa do Senado e da Câmara que dispunham sobre remuneração de servidor:

EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: RESERVA DE LEI. CF, ART. 37, X; ART. 51, IV, ART. 52, XIII. ATO CONJUNTO Nº 01, DE 05.11.2004, DAS MESAS DO SENADO FEDERAL E DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. I. - Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. II. - Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto nº 01, de 05.11.2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. III. - Cautelar deferida. (grifo não presente no original)

Em outras palavras, não tenho dúvidas de que o ato infralegal a ser expedido na forma da Lei 13.464/2017 estaria a regular matéria de estrita reserva legal por força da CF/1988, a extrapolar sua característica de ato regulamentar.

Por essas razões, a decisão adversada, em estrita aderência à jurisprudência do STF, exarou a determinação inserta em seu subitem 9.3, a condicionar a implementação do BEP variável até que sobreviesse lei formal estabelecendo a composição da base de cálculo a que se referem o § 4º do art. 6º e o § 4º do art. 16, ambos da Lei 13.464/2017.

Também, não vejo qualquer semelhança da situação em apreciação com aquela tratada na Lei 10.356/2001, regulamentada pela Resolução TCU 146/2001. Ao contrário da Lei 13.464/2017, que não fixa a base de cálculo nem o valor máximo da rubrica a ser paga a título de BEP, o art. 15, incisos I e II, da Lei 10.356/2001, estipula os percentuais máximos (até 50%) bem como as bases de cálculo (maior vencimento básico do cargo) da gratificação de desempenho devida aos servidores do TCU.

Já a Resolução TCU 146/2001, em seu art. 3º, estabeleceu que a gratificação de desempenho devida aos servidores deveria variar conforme a avaliação de desempenho individual, em percentual a incidir sobre a gratificação de desempenho fixada na Lei 10.356/2001.

Há que se considerar, contudo, como apontado pela AGU em sede recursal, que a determinação acima insculpida acabou por promover, de forma incidental, controle abstrato de constitucionalidade, porquanto, em última análise, o TCU negou vigência a dispositivo legal plenamente válido, vez que regularmente incurso no mundo jurídico, conforme conclusões uníssonas dos pareceres precedentes.

A imposição de termo para condicionar a vigência dos arts. 6º e 16 da Lei 13.464/2017 à edição de nova lei, apesar de adequado materialmente, conforme já amplamente debatido neste voto, consubstancia medida processual fora do alcance desta Corte de Contas.

Com relação ao controle de constitucionalidade concentrado ou em abstrato, trata-se de competência privativa da Corte Suprema a ser exercitada quando da apreciação das ações constitucionais cabíveis, a exemplo da Ação Direta de Inconstitucionalidade Genérica - ADIn (art. 102, inciso I, alínea a, da CF/1988), Ação Direta de Inconstitucionalidade Interventiva - ADIn Interventiva (art. 36, inciso III, da CF/1988), Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão - ADIn por Omissão (art. 103, § 2º, da CF/1988), Ação Declaratória de Constitucionalidade - Adecon ou ADC (art. 102, inciso I, alínea a, da CF/1988), e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF (art. 102, § 1º, da CF/1988).

Nesse sentido, o próprio TCU já reconheceu a impossibilidade de exercitar o controle de constitucionalidade na forma abstrata ou concentrada. Mediante Acórdão 2000/2017-TCU-Plenário - ao apreciar agravo interposto em face de decisão monocrática proferida em sede de representação e que determinava cautelarmente o não pagamento do BEP para inativos e pensionistas, que estaria assegurado pelo Lei 13.464/2017 -, o TCU reconheceu que o controle de constitucionalidade abstrato é competência exclusiva do STF.

Por tal razão, referido decisum revogou medida cautelar anteriormente deferida e determinou que os pagamentos do BEP a aposentados e pensionistas fossem analisados nos casos concretos submetidos ao TCU para fins de registro, oportunidade em que este Tribunal exerceria o controle difuso de constitucionalidade, assegurado, até então, pela Súmula STF 347.

Ocorre que, ainda que o caso ora em análise se cuidasse de controle de constitucionalidade em relação a caso concreto, de que não se trata, a Corte Suprema, diante das competências constitucionais do TCU e do entendimento de que o controle de constitucionalidade é típica atividade jurisdicional, tem defendido que a Súmula STF 347 não se sustenta na ordem constitucional inaugurada pela CF/1988.

Esse posicionamento foi sedimentado, recentemente, quando da apreciação de mérito dos MS 35.410, 35.490, 35.494, 35.498 e 35.500 pelo STF, todos de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes. Transcrevo, por oportuno, trecho do voto do digníssimo relator (peça 190) :

É inconcebível a hipótese de o Tribunal de Contas da União, órgão sem qualquer função jurisdicional, permanecer a exercer controle de constitucionalidade - principalmente, como no presente caso, em que simplesmente afasta a incidência de dispositivos legislativos para TODOS os processos da Corte de Contas - nos julgamentos de seus processos, sob o pretenso argumento de que lhe seja permitido em virtude do conteúdo da Súmula 347 do STF, editada em 1963, cuja subsistência, obviamente, ficou comprometida pela promulgação da Constituição Federal de 1988.

(...)

Exatamente como na presente hipótese, o controle difuso exercido administrativamente pelo Tribunal de Contas traria consigo a transcendência dos efeitos, pois na maioria das vezes, ao declarar a inconstitucionalidade ou, eufemisticamente, afastar incidentalmente a aplicação de uma lei federal, o TCU não só estaria julgando o caso concreto, mas também acabaria determinando aos órgãos de administração que deixassem de aplicar essa mesma lei para todos os demais casos idênticos, extrapolando os efeitos concretos e interpartes e tornando-os erga omnes e vinculantes no âmbito daquele tribunal. (grifo não presente no original)

Assim, apesar de compreender que a Lei 13.464/2017, ao emudecer na questão que trata da base de cálculo do BEP variável, abriu espaço indevido para futura regulamentação autônoma de matéria típica de lei, em face do disposto no art. 37, inciso X, da CF/1988 e da jurisprudência do STF, entendo que ao TCU não seria permitido impor o termo condicionante a regular sua aplicação, tal qual restou decidido no subitem 9.3.

Nesse sentido, alinho-me à conclusão da Serur segundo o qual esta Corte de Contas, ao expedir a determinação ali encartada, estaria a impedir a edição de possível decreto, porquanto ele afrontaria cláusula constitucional lavrada no art. 37, inciso X, da CF/1988, em espécie anômala de controle prévio de constitucionalidade.

Em última análise, a determinação de nítido caráter cautelar de condicionar o pagamento do BEP variável à edição de lei que especifique os componentes da sua base de cálculo teve por consequência prática impedir a atuação do Presidente da República em exercitar o poder regulamentar a ele assegurado pelo art. 84, inciso IV, da CF/1988.

Pelas razões expostas, julgo adequado encaminhar cópia da presente decisão ao Procurador-Geral da República para fins de ciência e, a seu juízo, adotar as medidas que entender pertinentes, diante de eventual edição de futuro decreto autônomo a regular a base de cálculo do BEP variável.

Registro que já tramita no STF a ADI 6.562, proposta pela Procuradoria-Geral da República, que busca a declaração de inconstitucionalidade dos arts. 6º ao 25 da Lei 13.464/2017 na parte que disciplina o pagamento do BEP variável, sob o argumento de afronta ao disposto no art. 39, § 4º, da CF/1988, que proíbe a percepção simultânea de subsídio com outras parcelas remuneratórias.

Em adição, apesar dos alertas que integram este voto, considerando a real possibilidade de expedição de eventual decreto a regular a base de cálculo do BEP variável, dada a possibilidade de questionamento judicial pelas razões aqui expostas, entendo pertinente conferir nova redação ao subitem 9.3 do Acórdão 1921/2019-TCU-Plenário para que seja dado ciência ao Ministério da Economia e à Casa Civil da Presidência da República de que a possível regulamentação de matéria de reserva de lei por ato infralegal, a preencher lacunas observadas nos arts. 6º e 16, ambos da Lei 13.464/2017, está em desacordo com princípio constitucional da estrita reserva legal, conforme vasta jurisprudência do STF.

Deixo de acolher a proposta da unidade instrutiva de propor a conversão da determinação inserta no subitem 9.3 em recomendação, porquanto o tipo de deliberação sugerida, ao tempo em que não se presta a enfrentar a irregularidade decorrente da incompatibilidade entre eventual decreto a regular a base de cálculo do BEP variável prevista na Lei 13.464/2017 e a CF/1988, também não atende ao disposto no art. 11 da Resolução TCU 315/2020.

Observo que o fato de alterar o teor do subitem 9.3, consoante proposta que ora trago a este Plenário, em nada altera os comandos que integram os subitens 9.7 e 9.8 da decisão recorrida, em que são apresentadas as balizas a serem respeitadas na edição de eventual normativo que vier a ser aprovado com a finalidade de permitir a implementação da remuneração variável paga a título de BEP.

Considerando a natureza do BEP, que tem por objetivo incrementar a produtividade futura, nos termos dos arts. 6º e 16 da Lei 13.464/2017, bem como a forma de cálculo de sua parcela variável, que leva em conta o grau de alcance de metas previamente estabelecidas, conforme se observa do disposto no § 2º do art. 6º e § 2º do art. 16 da mesma Lei, há que se registrar a impossibilidade de se prever, em eventual normativo que vier a ser aprovado, o pagamento retroativo a título de BEP variável.

Com relação aos subitens 9.4, 9.5, 9.6 e 9.13 da decisão combatida, acolho in totum a análise empreendida pela unidade instrutiva que pugna pela rejeição das razões recursais a eles atinentes.

As deliberações encartadas em tais subitens buscam a plena adequação das despesas previstas na Lei 13.464/2017 e da renúncia de receita por ela veiculada às regras que visam à responsabilidade na gestão fiscal estipuladas na LRF, tendo por um dos fundamentos a orientação normativa constante do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário.

A referida decisão, ao responder consulta formulada pelo então Ministro da Fazenda, reiterou a necessidade de que, mesmo as medidas legislativas que forem aprovadas sem a devida observância aos requisitos fiscais e orçamentários previstos na CF/1988 (arts. 167 e 113 do ADCT) e na LRF (arts. 15, 16 e 17) , podem ser aplicadas se forem satisfeitos os requisitos previstos na citada legislação.

O espaço de aplicação da decisão supra não pode ser reduzido como quer o recorrente a alcançar apenas leis instituidoras de subvenções, benefícios e isenções fiscais.

Primeiro pois, apesar de a motivação administrativa para consulta ao TCU se fundar em caso concreto em específico, a resposta a ela tem caráter normativo e constitui prejulgamento de tese, mas não do caso concreto, nos termos do art. 264, § 3º, do RITCU.

Nesse cenário, o caso concreto subjacente surge apenas como elemento informativo à boa compreensão do objeto sobre o qual a consulta se refere, objeto este que deve ser informado de modo preciso, a teor do disposto no art. 264, § 1º, do RITCU. A dúvida, respondida mediante o Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, foi a seguinte:

Nos casos em que medidas legislativas forem aprovadas sem a devida adequação orçamentária e financeira, e em inobservância ao que determina a legislação vigente (art. 167 da CF/88, art. 113 do ADCT, arts. 15, 16 e 17 da LRF, art. 112 da LDO), configurando claro conflito de normas, quais os procedimentos a serem adotados pelo gestor público?

Veja que a própria pergunta ali veiculada já esclarece que a adequação de medida legislativa às regras fiscais-orçamentárias traçadas na legislação mencionada passa pela solução do conflito de normas, cujo desfecho apontado pelo TCU na resposta à consulta, deu-se pela aplicação da teoria dos fatos jurídicos de Pontes de Miranda.

Na ocasião, o Ministro-Relator Raimundo Carreiro, em voto esclarecedor, cuidou da análise das medidas legislativas de amplo aspecto, porquanto teceu sua argumentação quanto à adequação dessas normas aos planos de existência, validade e eficácia. Para não deixar qualquer dúvida a esse respeito, transcrevo trecho do voto condutor do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário:

A entrada no plano da existência ocorre com a promulgação da norma, ao passo que o plano da validade é alcançado com a compatibilidade da aludida norma com as demais normas do ordenamento jurídico. A norma, no entanto, somente entrará no plano da eficácia se houver a ocorrência concreta dos fatos que constituem o suporte fático da norma. Caso contrário, enquanto não ocorrer o suporte fático, a norma será existente, válida, mas ineficaz, na medida em que seus comandos normativos não serão capazes de produzir consequências jurídicas no mundo dos fatos (cf. MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da eficácia. 8.ed. São Paulo: Saraiva, 2013.p. 17) .

Portanto, a decisão combatida, a exemplo do Acórdão 1907/2019-TCU-Plenário, não defendeu, mesmo que indiretamente, a existência de hierarquia entre lei e lei complementar, como alega o recorrente, mas sim, in casu, a compatibilidade da Lei 13.464/2017 com as demais normas do ordenamento jurídico relacionadas às finanças públicas, em especial aquelas insculpidas na LRF. Não se cuida, ademais e por decorrência lógica, de controle de constitucionalidade como defende o recorrente, até porque, não se está negando vigência a dispositivos da Lei 13.464/2017.

De igual modo, não procede o argumento da AGU segundo o qual a exclusão do BEP da base de cálculo da contribuição previdenciária constitui hipótese de não-incidência e não de isenção tributária, a afastar a necessidade de se prever medidas de compensação previstas no art. 14 da LRF.

De forma concisa e para evitar repetição de argumentos já trazidos pela unidade instrutiva, a diferença entre ambos os institutos tributários é clara. Na isenção, causa de exclusão do crédito tributário, nos termos do art. 175 do Código Tributário Nacional ( CTN), forma-se a obrigação tributária, com a ocorrência do fato gerador, mas o contribuinte fica dispensado do pagamento do tributo correspondente, por força de lei. Na não-incidência, o fato gerador deixa de ocorrer, ou seja, o fato material não se enquadra na hipótese de incidência, a afastar o surgimento da obrigação tributária.

É dizer que a norma que cria isenção pode, a critério do legislador e após a formação da obrigação tributária, impedir o nascimento do crédito tributário, seja excluindo parcelas de rendas, como se observa na hipótese ora analisada, pessoas ou bens.

No âmbito do regime próprio de previdência social (RPPS) , tratado no art. 40 da CF/1988 e aplicável aos servidores públicos ocupantes de cargos de provimento efetivo, é a Lei 10.887/2004 que disciplina, em seu art. , a composição da base de cálculo de incidência da contribuição social.

O § 1º do art. 4º da citada Lei exclui da base de cálculo diversas rubricas, seja em razão da sua natureza indenizatória ou transitória. O art. 25 da Lei 13.464/2017 modificou o dispositivo em comento e incluiu, nessa relação, o BEP devido aos servidores das carreiras Tributária e Aduaneira da Receita Federal do Brasil e Auditoria-Fiscal do Trabalho.

É dizer portanto que o BEP, num primeiro momento, enquadrar-se-ia nas hipóteses de constituição da base de cálculo da contribuição previdenciária devida no âmbito do RPPS, nos termos do caput do art. da Lei 10.887/2004, porquanto constitui parcela remuneratória. Contudo, o próprio legislador tratou de excluí-lo da base de cálculo, como já mencionado, em verdadeira hipótese de isenção tributária.

Por outro lado, as hipóteses de não-incidência, como defendido pela recorrente e de que não se cuida o caso em apreciação, em regra, vêm definidas na norma pelo uso da expressão" não incidirá "para afastar a incidência de determinado tributo nos negócios jurídicos a que se referem, a exemplo do que se observa dos arts. 149, § 2º, inciso I, 153, § 3º, inciso III, § 4º, inciso II, 155, § 2º, inciso X, todos da CF/1988.

Com relação à natureza jurídica da renúncia fiscal associada ao pagamento do BEP e as repercussões previdenciárias associadas, acolho as propostas da Serur e do MPTCU e deixo, nesta oportunidade, de aprofundar sua análise, em razão de que o presente processo cuida da instituição do citado Bônus sob os aspectos da adequação fiscal, orçamentária e financeira, cujas principais regras balizadoras encontram-se na LRF.

Aliás, a natureza jurídica do BEP e as repercussões decorrentes devem ser analisadas de forma detida no âmbito do TC Processo XXXXX/2018-0, atualmente sobrestado aguardando decisão definitiva do STF acerca de questões similares tratadas nos MS 35.410, 35.490, 35.494, 35.498 e 35.500, razão pela qual entendo que cópia da presente decisão deve ser anexada àqueles autos.

Diante do exposto, não tenho dúvidas de que a exclusão do BEP da base de cálculo da contribuição previdenciária constitui hipótese de isenção tributária, a caracterizar renúncia de receita de sorte a ensejar a adoção de medida de compensação, nos termos do disposto no art. 14 da LRF, conforme determinação encartada no subitem 9.4 da decisão combatida.

Ademais, enquanto perdurar o pagamento do BEP fixo, por constituir despesa de natureza obrigatória de caráter continuado, torna-se necessário indicar as medidas compensatórias por meio do aumento permanente de receitas ou redução permanente de despesas, em montante equivalente, a teor do disposto no inciso II do art. 31 da Lei 13.844/2019, combinado com o § 2º do art. 17 da Lei Complementar 101/2000, conforme restou determinado pelo subitem 9.5 da decisão adversada.

Por essas razões, uma vez mantidos incólumes os subitens 9.4 e 9.5, também não cabe revisão da medida encartada no subitem 9.6 da mesma decisão para que fosse informado ao Ministério da Economia que eventual não implementação das medidas compensatórias exigidas pela legislação, na forma dos subitens 9.4 e 9.5 acima, pode acarretar a incidência do disposto nos arts. 14, § 2º, e 15, da Lei Complementar 101/2000, a ensejar a suspensão dos pagamentos.

Em derradeiro, proponho tornar sem efeito o item 9.9 tendo em vista a apreciação pelo TCU do parecer prévio das contas do Presidente da República relativas a 2019.Ante o exposto, pugno para que, no mérito, seja dado provimento parcial ao pedido de reexame interposto pela AGU, nos termos do que restou assentado neste voto.

Com essas considerações, VOTO para que o Tribunal aprove a minuta de Acórdão que ora submeto à consideração deste Colegiado.

TCU, Sala das Sessões Ministro Luciano Brandão Alves de Souza, em 28 de abril de 2021.

Ministro VITAL DO RÊGO

Relator

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