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29 de Maio de 2024
  • 2º Grau
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Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região TRT-9 - Recurso Ordinário Trabalhista: ROT XXXXX-87.2017.5.09.0007 - Inteiro Teor

Detalhes

Processo

Órgão Julgador

2ª Turma

Publicação

Julgamento

Relator

ANA CAROLINA ZAINA
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Inteiro Teor

Identificação

PROCESSO nº XXXXX-87.2017.5.09.0007 (RO)

RECORRENTE: JOSE ROBSON FRANCISCO DA SILVA JUNIOR, PULLMANTUR SA, PULLMANTUR CRUZEIROS DO BRASIL LTDA.

RECORRIDO: JOSE ROBSON FRANCISCO DA SILVA JUNIOR, PULLMANTUR SA, PULLMANTUR CRUZEIROS DO BRASIL LTDA.

RELATOR: ANA CAROLINA ZAINA

EMENTA

RELATÓRIO

V I S T O S, relatados e discutidos estes autos de RECURSO ORDINÁRIO (1009), provenientes da MM. 7ª VARA DO TRABALHO DE CURITIBA.

Ação ajuizada em 20 de maio de 2017.

Impende destacar que, em virtude do Ofício Circular GVP 010/2018, oriundo da Vice-Presidência deste TRT9, informando o recebimento do IUJ, suscitado pela 1ª turma nos autos XXXXX-93.2015.5.09.0002, que trata da Legislação aplicável ao trabalhador que presta serviços em navio de cruzeiros em águas nacionais e internacionais, foi determinado o sobrestamento dos presentes autos, até decisão final em referido Incidente.

Para melhor visualização dos autos digitais, os documentos foram convertidos ao formato PDF e as folhas citadas nesta decisão pertencem a esse arquivo único, em ordem crescente.

Inconformada com a r. sentença (fls. 1494-1509), complementada pela decisão resolutiva de embargos (fls. 1565-1566), ambas proferidas pelo Exmo. Juiz do Trabalho RICARDO JOSÉ FERNANDES DE CAMPOS, que acolheu parcialmente os pedidos, recorrem as partes.

O autor, JOSÉ ROBSON FRANCISCO DA SILVA JUNIOR, por meio do RECURSO ORDINÁRIO (fls. 1546-1564), postula a reforma da r. sentença quanto aos seguintes pedidos: a) JUSTIÇA GRATUITA; b) MODALIDADE CONTRATUAL; c) DEVOLUÇÃO DOS DESCONTOS; d) FIXAÇÃO DE JORNADA; e) MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA C.L.T.; f) DANO MORAL PELA EXIGÊNCIA DO EXAME HIV E ENTORPECENTES; g) DANOS EXISTENCIAIS h) HONORÁRIOS; i) IPCA; j) COMPENSAÇÃO E ABATIMENTO.

As rés, PULLMANTUR S.A. e PULLMANTUR CRUZEIROS DO BRASIL LTDA., mediante o RECURSO ORDINÁRIO (fls. 1570-1624), postulam a reforma da r. sentença quanto aos seguintes pedidos: a) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS - DO PARÂMETRO DE ARBITRAMENTO; b) INDEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA - DA CONDENAÇÃO DO RECORRIDO NO PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS; c) INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO - COMPETÊNCIA DO PAÍS DA BANDEIRA DA EMBARCAÇÃO - VIOLAÇÃO À LEI DO PAVILHÃO - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA BRASILEIRA X APLICABILIDADE DA LEI ( CLT X CONVENÇÃO DO TRABALHO MARÍTIMO DA OIT/LEI DO PAVILHÃO)- AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - PREVALÊNCIA HIERÁRQUICA DA LEI DO PAVILHÃO SOBRE A LEI 7.064/1982 E AO PRINCÍPIO DO CENTRO DE GRAVIDADE, DO PRINCÍPIO DA NORMA MAIS BENÉFICA E DO LOCAL DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS - PREVALÊNCIA DA LEI DA BANDEIRA E DA CONVENÇÃO DO TRABALHO MARÍTIMO DA OIT - TESE DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF - PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA - DIREITO MATERIAL APLICADO AOS CONTRATOS INTERNACIONAIS MARÍTIMOS: MLC (CONVENÇÃO DE TRABALHO MARÍTIMO DA OIT) E ACTS INTERNACIONAIS; d) MODALIDADE DE CONTRATAÇÃO - DOS CONTRATOS POR PRAZO DETERMINADO - DAS VERBAS RESCISÓRIAS: FÉRIAS PROPORCIONAIS + 1/3, 13º SALÁRIO PROPORCIONAL, RECOLHIMENTO DO FGTS; e) DA REMUNERAÇÃO; f) DAS HORAS EXTRAS E TEMPO À DISPOSIÇÃO- DO ADICIONAL NOTURNO DO INTERVALO INTERJORNADA - DOS FERIADOS E DSR´S - DO SALÁRIO COMPLESSIVO X DA VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS (LEGALIDADE, PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE, ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, CONGLOBAMENTO E AUTONOMIA DA VONTADE); g) DO INTERVALO INTERJORNADA - DA INCONSTITUCIONALIDADE DA O.J. 355 DO TST - DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE FACE AOS ARTIGOS 66, 67 E 75 DA CLT - DA AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE, ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, CONGLOBAMENTO E AUTONOMIA DA VONTADE; h) DA MULTA DIÁRIA; i) DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS; j) DO PREQUESTIONAMENTO.

O recolhimento do depósito recursal e das custas processuais foi efetuado pelas rés, conforme documentos carreados aos autos fls. 1625-1629.

Contrarrazões apresentadas pelo autor (fls. 1632-1642) e pelas rés (fls. 1644-1672).

Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho, em virtude do disposto nos artigos 28 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria Geral da Justiça do Trabalho e 45 do Regimento Interno deste Tribunal.

FUNDAMENTAÇÃO

ADMISSIBILIDADE

Os recursos e as contrarrazões foram firmados por procuradores com poderes devidamente outorgados pelas partes.

O preparo foi regular (fls. 1625-1629).

As partes foram intimadas da r. sentença em 16 de maio de 2018 e o autor interpôs o recurso de fls. 1546-1564 em 28 de maio de 2018, tempestivamente, portanto.

Em razão dos Embargos de Declaração opostos pelas rés às fls. 1527-1545, as partes foram novamente intimadas da decisão resolutiva de embargos declaratórios em 04 de junho de 2018 e as rés interpuseram o recurso de fls. 1570-1624 em 14 de junho de 2018, tempestivamente, portanto.

Os tópicos da sentença atacados em ambos os recursos impuseram sucumbência, de forma que está presente o interesse em recorrer.

Presentes os pressupostos legais de admissibilidade, ADMITO os recursos ordinários.

Preliminar de admissibilidade

Conclusão da admissibilidade

MÉRITO

Recurso da parte autora - JOSE ROBSON FRANCISCO DA SILVA JUNIOR

a) JUSTIÇA GRATUITA

Ressai da r. sentença:

"O instituto da justiça gratuita consta nos § 3º e 4º do artigo 790 da CLT, cuja redação é a seguinte:

§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

§ 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. (Incluído pela Lei nº 13.467, de 2017).

Pela redação do parágrafo 3º fica claro que para a concessão da justiça gratuita há necessidade de o reclamante receber o máximo de 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social (R$ 2.258,32), eliminando-se a possibilidade de o benefício ser concedido mediante declaração do próprio interessado ou de seu procurador.

Se o reclamante receber salário superior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral da Previdência Social (R$ 2.258,32), incide o disposto no parágrafo 4º, ou seja, há necessidade de comprovação da insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. Veja-se que comprovar não é sinônimo de alegar, não incidindo, assim, o disposto no art. 99, § 3º do CPC.

No caso dos autos, o reclamante narra na peça de ingresso que recebia salário de R$ 8.000,00, pelo que, indefiro os benefícios da justiça gratuita, pois não comprovada a hipossuficiência econômica." (fls. 1494-1495)

Insurge-se o autor. (fls. 1547-1549)

Sustenta que declarou a hipossuficiência econômica, não houve prova nos autos capaz de desconstituí-la, invoca preceito constitucional de igualdade e acesso a justiça, o art. 98 do Código de Processo Civil e o art. 790§ 3º da C.L.T. para querer a reforma da r. sentença com a concessão dos benefícios da justiça gratuita.

Insurgem-se também as rés. (fls. 1577-1578)

Sustentam que, indeferidos os benefícios da justiça gratuita ao autor na decisão de piso, a ele também caberia condenação ao pagamento de custas processuais, em razão de sucumbência, ante o não deferimento de alguns pedidos.

Invocam os artigos 789 e 790, § 1º da C.L.T. requerendo a reforma da r. sentença e a condenação do autor ao pagamento de custas processuais.

Analisa-se.

Inicialmente, importante lembrar a distinção entre justiça gratuita e assistência judiciária gratuita. Esta é gênero e abrange a justiça gratuita e os honorários assistenciais ou advocatícios.

Nesse contexto, para o empregado que percebe além do dobro do mínimo legal, a insuficiência econômica, inicialmente, deveria restar provada mediante atestado fornecido pela autoridade local do Ministério do Trabalho ou, não havendo, pelo Delegado de Polícia da circunscrição onde resida o empregado (§ 3º, artigo 14, Lei 5.584/70).

Entretanto, a Lei 7.115/83, baniu do ordenamento jurídico pátrio o chamado atestado de pobreza, substituindo-o por mera declaração lançada em apartado ou na própria inicial, de próprio punho, pelo interessado ou por procurador, bastando, para este, os poderes contidos na cláusula ad judicia. Cabendo lembrar, ainda, que o Magistrado poderá conceder os benefícios da justiça gratuita ex officio, nos termos do § 3º do art. 790 da C.L.T., acrescentado pela Lei 10.537/2002.

Ademais, consigno, por oportuno, a redação do item I da Súmula 463 do C. T.S.T., que, segundo modulação fixada pela Corte Maior Trabalhista, é aplicada a partir de 26 de junho de 2017:

ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPROVAÇÃO (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-1, com alterações decorrentes do CPC de 2015)- Res. 219/2017, DEJT divulgado em 28, 29 e 30.06.2017

I - A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015); (destaquei)

Impende destacar que a presente demanda teve ação ajuizada em 20 de maio de 2017, portanto, antes da vigência da Lei 13.467/2017. Desse modo, ante o contido no art. 1º da Instrução Normativa nº 41/2018 do C. T.S.T., não se aplicam ao caso as mudanças legislativas promovidas pela pela chamada Reforma Trabalhista:

Art. A aplicação das normas processuais previstas na Consolidação das Leis do Trabalho, alteradas pela Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017 , com eficácia a partir de 11 de novembro de 2017, é imediata, sem atingir, no entanto, situações pretéritas iniciadas ou consolidadas sob a égide da lei revogada. (destaque acrescido)

Ante a declaração de hipossuficiência econômica de fl. 22, firmada de próprio punho pelo autor, com todo respeito ao entendimento prolatado na r. sentença, dou provimento ao recurso do autor para reformar a r. sentença e conceder ao obreiro os benefícios da justiça gratuita.

Considerando todo o exposto, prejudicado o pedido das rés. Rejeita-se o recurso das rés.

Acolhe-se o recurso do autor.

b) MODALIDADE CONTRATUAL - ANÁLISE CONJUNTA

Ressai da r. sentença:

"Aduz o autor que teve reconhecido o vínculo de emprego com as reclamadas nos períodos de 27.12.2013 até 02.08.2014; 25.10.2014 até 06.04.2015; 14.07.2015 até 28.09.2015 e 14.11.2015 até 14.05.2016, por meio da ação XXXXX-57.2016.5.09.0007, e que, após o ajuizamento de tal ação, firmou novo contrato com as reclamadas, no período de 29/10/2016 a 29/04/2017.

Requer, em relação a este último contrato, a declaração de vínculo e da unicidade contratual, com anotação na CTPS de um único contrato de trabalho.

O período do contrato é incontroverso.

Incontroverso também que o autor manteve vínculo de emprego com a primeira reclamada, conforme admitido em defesa.

Quanto ao pedido de unicidade contratual, por outro lado, não prospera, pois, o autor admitiu em seu depoimento que sabia que estava sendo contratado por prazo determinado, e o trabalho prestado em navio autoriza a contratação por prazo determinado, pela própria natureza do serviço. Neste aspecto, peço vênia para utilizar como razões de decidir os fundamentos esposados por este Regional em recente julgado envolvendo a mesma reclamada e idêntico pedido:

"Considerando o princípio da continuidade da relação de emprego, existe uma presunção favorável à obreira de que o contrato de trabalho foi pactuado por prazo indeterminado, cabendo, assim, ao empregador o ônus de provar o contrário, ou seja, que a situação se amolda àquelas previstas no artigo 443, § 2º, a, b e c, da CLT.

In casu, apesar de os contratos internacionais de trabalho estarem em inglês, não podendo ser levados em consideração, já que a reclamada não observou o disposto no artigo 157, do CPC (versão em vernáculo, firmada por tradutor juramentado), a reclamante, em interrogatório (depoimento audiovisual), confirmou que foi contratada por prazo determinado.

Incontroverso que a reclamante foi admitida para trabalhar como esteticista, em cruzeiros marítimos, os quais têm prazo para início e término, tendo ela conhecimento desta provisoriedade.

O fato de a reclamante já sair de um cruzeiro sabendo que seria contratada para trabalhar em outro (como afirmado por ela em seu interrogatório e confirmado pela única testemunha ouvida) não altera a natureza do contrato firmado entre as partes, pois, ao contrário do entendimento esposado pelo MM. Juízo de origem, não há a característica de continuidade, pois além de a reclamante não ficar à disposição da reclamada no período em que não estava embarcada, tampouco restou demonstrada a obrigatoriedade de retornar na próxima embarcação.

Logo, pela natureza da atividade desenvolvida pela reclamada, que tem a característica de sazonalidade, além de a reclamante não ficar à disposição da reclamada nos períodos que em ficava desembarcada, conclui-se pela transitoriedade dos contratos firmados pelas partes.

Nesta toada, considerando que a presente reclamatória foi ajuizada em 13/03/2014, tem-se que apenas o último contrato de trabalho firmado pelas partes não foi abrangido pela prescrição, qual seja, 2 de outubro de 2011 a 13 de abril de 2012 (como constou da inicial (fl. 3) e admitido em contestação - fl. 112).

Assim, ante a ausência de qualquer recibo de pagamento nos autos, mas considerando que o encerramento das relações contratuais deu-se pelo esgotamento do prazo para labor no período de cruzeiro, faz jus a reclamante apenas a férias proporcionais (6/12), 13º proporcional de 2011 (3/12) e 13º proporcional de 2012 (3/12) e FGTS (8%).

Reformo parcialmente a r.sentença, para declarar prescritas as verbas referentes aos contratos por prazo determinado que perduraram de 6/12/2008 a 21/09/2009, 05/12/2009 a 01/05/2010, 03/05/2010 a 16/08/2010, 09/12/2010 a 03/08/2011, e, por conseguinte, restringir o pagamento das verbas rescisórias referente ao contrato que perdurou de 2/10/2011 a 13/04/2012 (férias proporcionais (6/12), 13º proporcional de 2011 (3/12), 13º proporcional de 2012 (3/12) e FGTS (8%)". (TRT: 07558-2014-651-09-00-2 (RO) - 1ª Turma - Pub. 20/10/2015).

Assim, não reconheço a unicidade contratual pleiteada, e acolho o pedido sucessivo de anotação do contrato na CTPS do autor, observando-se as datas de entrada e saída informadas na inicial e a função de garçom.

Quanto à remuneração, a reclamada trouxe aos autos o contrato traduzido (fls. 602/606), o qual não foi destituído por nenhum meio de prova, pelo que, deverá ser anotada a remuneração constante no contrato, devidamente convertida para a moeda nacional, devendo ser utilizado o valor descrito no contrato sob a rubrica" Pagamento Mensal Total ", ou seja, U$ 1.232,00, conforme fl. 602.

O reclamante deverá apresentar sua CTPS, no prazo de 05 (cinco) dias, para que a primeira reclamada proceda à anotação devida no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da ciência da juntada da CTPS aos autos, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), a favor do reclamante.

Caso não seja procedida a anotação num prazo de 30 (trinta) dias, deverá esta ser feita pela Secretaria da Vara, sem prejuízo da execução da multa correspondente.

Tendo em vista que foi reconhecida a validade do contrato por prazo determinado, não há que se falar em aviso prévio indenizado, indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS e pagamento indenizado de seguro desemprego, pedidos que rejeito.

Defiro, entretanto, o pagamento das seguintes verbas referentes ao contrato:

- férias proporcionais a 6/12;

- 13º salário proporcional a 2/12 referente a 2016;

- 13º salário proporcional a 4/12 referente a 2017;

- depósitos do FGTS (8%).

Rejeito o pedido de aplicação da multa prevista no art. 479 da CLT, pois o autor a pleiteou de forma genérica, não tendo havido informação acerca de rescisão antecipada do contrato.

Tendo em vista a controvérsia quanto à remuneração, e, considerando que os holerites traduzidos, juntados pela reclamada a partir da fl. 607, trazem, muitas vezes, discriminação de valores sem constar a que se referem, defiro o pedido do autor feito quando de sua manifestação quanto aos documentos apresentados com a defesa, de que seja considerada a sua remuneração como a média obtida pelos pagamentos discriminados nos holerites, com a conversão para a moeda nacional. Para tanto, deverá ser considerado em cada holerite o valor da rubrica" Pagamento líquido do período em Dólares norte-americanos ".

Assim, as verbas acima deferidas deverão ser calculadas pela média dos salários recebidos durante cada contrato, observando-se as rubricas Pagamento líquido do período em Dólares norte-americanos, com a devida conversão para a moeda nacional.

Acolho em parte, nestes termos." (fls. 1497 -1499)

Insurge-se o autor (fls. 1549-1550):

Pugna pela reforma da r. sentença sob a alegação de que reconhecida a aplicabilidade do ordenamento trabalhista brasileiro, ressalvadas situações excepcionais, nos termos do art. 442 da C.L.T., e seguintes, a regra geral é a a indeterminação do prazo do contrato trabalhista.

Sustenta que a atividade econômica das rés tem caráter ininterrupto, alternando apenas o hemisfério em que operam.

Requer, assim, "a reforma da r. sentença, com a condenação das recorridas ao pagamento de todas as verbas pleiteadas, decorrentes do reconhecimento da vigência do terceiro contrato de trabalho por tempo indeterminado, multa de 40% do FGTS, obrigatoriedade de entrega de guias SD/CD (ou, sucessivamente, expedição de alvará pela Secretaria do Juízo para habilitação no seguro-desemprego) e demais verbas nos termos da inicial e da fundamentação."

Insurgem-se também as rés. (fls. 1608- 1609)

Sustenta que, ante a inaplicabilidade da C.L.T. à presente demanda, não há que se falar no pagamento de verbas rescisórias. Repisam que os direitos previstos na M.L.C., aplicada aos tripulantes dos navios da Pullmantur Cruises Ship Management Ltd., foram todos respeitados, durante e ao final do contrato de trabalho.

Sucessivamente, "requer a consideração dos salários informados na peça defensiva levando-se em conta a data de cotação do dólar como sendo a do início do contrato de trabalho."

Analisa-se.

Assiste parcial razão à parte ré.

Nos autos do processo XXXXX-57.2016.5.09.0007, o autor teve reconhecido o vínculo empregatício, considerando os contratos realizados entre 27/12/2013 a 14/05/2016, com a condenação das rés "ao pagamento das verbas rescisórias devidas e demais direitos decorrentes do contrato de trabalho." (fl. 5) Após o ajuizamento daquela ação, o autor celebrou outro contrato com as rés, relativo ao período de 29/10/2016 a 29/04/2017, para exercer a função de garçom.

O MM. Juízo de origem afirma incontroversas tais alegações:

"O período do contrato é incontroverso.

Incontroverso também que o autor manteve vínculo de emprego com a primeira reclamada, conforme admitido em defesa."

Desse modo, a análise quanto ao vínculo empregatício encontra limite na coisa julgada, não se ignorando, contudo, o direito reconhecido naquela ação, mas avaliando se é possível a unificação do último contrato celebrado aos anteriores, tratados na ação primeira citada.

Como bem destacado na r. sentença, restou incontroverso que o autor manteve formalmente com a primeira ré (PULLMANTUR SHIP) contrato de trabalho no período indicado, 29/10/2016 a 29/4/2017, em sucessão ao contrato findo em 14/05/2016. Tais períodos são tidos como incontroversos.

Em defesa, as rés alegaram que "as temporadas de cruzeiros marítimos ensejam as contratações por prazo determinado, o que é comum nesse ramo de atividade e é perfeitamente válido de acordo com a Convenção sobre Trabalho Marítimo (MLC), aprovada pela Organização Internacional do Trabalho em 2006" (fl. 533) e que "Ainda que as normas pátrias fossem aplicáveis à relação de emprego havida com a Autora - o que se admite apenas para argumentar -, não haveria qualquer irregularidade, pois os cruzeiros marítimos são realizados por temporada (estação do verão no hemisfério Sul e no hemisfério Norte), coincidente com o período em que os turistas costumam usufruir férias, o que ocasiona uma elevação da demanda de mão-de-obra no setor e tipifica as hipóteses legais: CLT, art. 443, § 2º, a e b, e Lei nº 6.019/74, art. ." (fl. 534).

Na prova oral emprestada, a única testemunha que informou algo sobre os contratos a termo determinado foi o Sr. Valério, testemunha indicada pelas rés: "que trabalha para a empresa Royall Caribeen, desde maio de 2001, no Setor de RH; que também trabalhou embarcado, durante vários períodos, até 2010" (...) "que a temporada de cruzeiros no Brasil, vai de dezembro até, no máximo, o mês de abril;" (...) "que o reclamante também fez a rota da Europa, embarcando em Estocolmo e desembarcando em Santos; que a temporada europeia inicia-se no mês de abril; que, na temporada brasileira, o navio atraca a cada 02 dias, em média" (fl. 1405).

Com todo respeito à tese recursal do autor, mas o entendimento que prevalece nesta E. 2ª Turma, perfilha-se ao esposado na r. sentença, no sentido de que as demandadas lograram êxito em demonstrar que o trabalho em navios é sazonal, ou seja, a sua atividade é transitória, o que autoriza a contratação de empregados por prazo determinado, nos termos do art. 443, § 1º e § 2º, 'a' e 'b' da C.L.T. Cita-se o precedente Processo nº XXXXX-71.2017.5.09.0041, cujo voto condutor foi de relatoria da Excelentíssima Desembargadora Claudia Cristina Pereira.

Note-se que o próprio autor informa, na inicial, quanto aos contratos firmados a termo determinado e não há sequer indícios nos autos de que houve prestação de serviços no interregno entre os períodos contratos de trabalho.

Desse modo, considerando-se o enquadramento das rés nas possibilidades de exceção previstas no art. 443 da C.L.T., considerando o entendimento turmário, não merece reforma a r. sentença neste particular.

Quanto à tese recursal apresentada pelas rés, com todo o respeito, mantida a r. sentença quanto à aplicação da legislação é a brasileira, portanto a C.L.T., resultaram prejudicados os argumentos quanto ao pedido principal.

No tocante à pretensão recursal das rés referente ao valor da remuneração - conversão da moeda - merece reparo a r. sentença para que seja observada a cotação do dólar vigente na data da contratação, não só para fins de anotação da C.T. P.S. (como decidiu o Juízo de origem), mas também na apuração dos valores devidos nos presentes autos, ante o entendimento desta C. Turma que se observe da data do contrato para a conversão da moeda.

Isso porque, considerando-se o reconhecimento da aplicabilidade das normas do direito trabalhista brasileiro ao contrato de trabalho, é de se reconhecer que o montante salarial entabulado entre as partes no momento da admissão deve ser convertido para a moeda nacional, observada a cotação vigente naquela ocasião, utilizando-se o resultado como base para o cálculo das demais vantagens deferidas, em observância ao disposto no art. 463 da C.L.T.

Entendimento contrário poderia ensejar violação à garantia de irredutibilidade salarial (art. 7º, inciso VI, da Constituição Federal) ou o enriquecimento sem causa do trabalhador, conforme fosse a flutuação do câmbio durante a contratualidade.

Ante o exposto, reforma-se parcialmente a sentença para estabelecer que o valor do salário pago mensalmente à parte autora deverá ser convertido para a moeda nacional, observando-se o câmbio da data da contratação.

Rejeita-se o pedido da parte autora.

Acolhe-se parcialmente o recurso das rés, dando provimento ao pedido sucessivo, observando-se a data do contrato para conversão da moeda.

c) DEVOLUÇÃO DOS DESCONTOS

Ressai da r. sentença:

"Rejeito o pedido de devolução de descontos, pois o pedido formulado na inicial é genérico, não tendo ficado claro o valor de descontos/reembolsos que o obreiro pretende sejam a si devolvidos.

Além disso, mesmo após apresentados pela reclamada os comprovantes de pagamento, ainda assim o reclamante não apontou um desconto sequer que deveria lhe ser devolvido, ônus que lhe incumbia.

Logo, nada a deferir neste particular." (fl. 1499)

Insurge-se o autor. (fls.1550-1551)

Discorda o autor, argumentando que descreveu os descontos na peça inicial, que eram relativos a passagens aéreas que eram fornecidas para deslocamento até os locais de embarque, citando, exemplificativamente, o holerite de fl. 617-618, de abril de 2017, o desconto no importe de U$ 698,90.

Aprecia-se.

Constou na causa de pedir: "Em relação aos contratos de trabalho, a reclamante teve que arcar com o pagamento da passagem aérea, na medida em que as reclamadas antecipavam o pagamento de referidas passagens e descontavam tais valores, por vezes de forma parceladas, nos comprovantes de pagamentos, sobre as rubricas Airline Ticket Deposit (deposito de passagem aérea) e Tipping Returning Ticket Expenses (despesa de retorno de passagem aérea) ou Sign ON/Sign Off travel Expenses. A reclamada informou que iria efetuar o reembolso dos os valores das passagens, contudo, até o presente momento nada foi pago. (...)" (fls. 13-14).

Compulsando os autos, verifica-se que no holerite de fl. 617, citado em razões recursais e relativo a abril de 2017, realmente consta no campo "deduções" a rubrica "143 Despesas com passagens aéreas de volta mais gorjetas" no valor mencionado no recurso.

Pois bem. Considerando-se que restou declarada pela r. sentença a aplicação, à espécie, da legislação brasileira e não da Convenção sobre o Trabalho Marítimo, bem como que as rés não explicaram tais descontos, entende-se que assiste razão ao obreiro.

O princípio da intangibilidade salarial está insculpido no artigo 462 da C.L.T.:

Art. 462. Ao empregador é vedado efetuar qualquer desconto nos salários do empregado, salvo quando este resultar de adiantamentos, de dispositivos de lei ou convenção coletiva.

§ 1º. Em caso de dano causado pelo empregado, o desconto será lícito, desde que esta possibilidade tenha sido acordada ou na ocorrência de dolo do empregado. (Antigo parágrafo único renomeado pelo Decreto-Lei nº 229, de 28.02.1967, DOU 28.02.1967)

Os descontos salariais constituem exceção no contexto do Direito do Trabalho. A questão deve ser analisada de forma estrita, com base no dispositivo legal supracitado, em conjunto com o disposto na Súmula 342 do C. T.S.T. (Descontos salariais efetuados pelo empregador, com a autorização prévia e por escrito do empregado, para ser integrado em planos de assistência odontológica, médico-hospitalar, de seguro, de previdência privada, ou de entidade cooperativa, cultural ou recreativo-associativa de seus trabalhadores, em seu benefício e de seus dependentes, não afrontam o disposto no art. 462 da C.L.T., salvo se ficar demonstrada a existência de coação ou de outro defeito que vicie o ato jurídico).

Ademais, os riscos do negócio devem correr por conta do empregador, não podendo ser transferidos para o empregado.

Nesse contexto, reforma-se a r. sentença para determinar que as rés devolvam ao autor os descontos constantes nos holerites a título de passagens aéreas.

Acolhe-se.

d) FIXAÇÃO DE JORNADA

Ressai da r. sentença:

"Tendo em vista a ausência de juntada de cartões de ponto, passo a fixar a jornada do autor.

Consta na inicial que"Durante todo o liame empregatício a reclamante laborou de segunda a segunda, sob jornada de trabalho média compreendida entre as 6h00/7h00 às 24h00/01h00a.m.a.m do dia seguinte, com intervalo para refeições. Não possuía folga semanal".

A reclamada afirma em sua defesa que o obreiro laborava em média 10 horas por dia.

O reclamante disse em seu depoimento que laborava das 7h à 1h, com 3 intervalos de 2 horas.

As partes acordaram a utilização de prova emprestada, conforme petição de fl. 1395.

A testemunha Alessandra, ouvida a pedido da reclamada disse que"o reclamante era garçom e que trabalhava nos 3 turnos de refeições, sendo que o café da manhã era das 7h às 10h, o almoço de meio-dia às 15h, e o jantar das 19h à meia noite; que entre os intervalos das refeições o autor faria o que quisesse".

A testemunha Valério, também ouvida a pedido da reclamada disse que"que os restaurantes funcionam, para café da manhã, das 7h às 10h; almoço, das 12h às 14h; jantar, das 20h às 24; que, nos navios, existem áreas de lazer e refeição para os tripulantes, cujo uso é liberado por 24h; que, durante o intervalo, o tripulante é livre para fazer o que quiser; que a escala de trabalho nos restaurantes é variável, nunca ultrapassando 11h diárias".

A testemunha Uyaron, ouvida a pedido da parte reclamante, disse que"havia escalas, das 06h às 11h, das 12h30min às 16h30min e depois das 18h30min à 01h da madrugada; todos trabalhavam diariamente nesses 03 turnos citados; não havia folgas; a cada 07 dias folgavam apenas meio período, folgando apenas no horário do almoço acima citado; se estivessem atracados em coincidisse essa folga, poderiam deixar o navio dentro desse horário"

Por fim, a testemunha Allan, também indicada pela parte autora, disse que" a reclamante, assim como os demais assistentes, trabalhava das 6h às 24h, com uma média de 2 intervalos ao longo do dia, com duração de 30 a 60 minutos ".

Desconsidero o depoimento da testemunha Allan no que concerne à jornada, pois destoa dos dizeres das demais testemunhas, e também do depoimento do autor.

Assim, analisando os depoimentos das demais testemunhas, e observando ainda o limite imposto pelo depoimento do próprio reclamante, que afirmou que trabalhava 12 horas por dia (das 7h à 1h com 3 intervalos de 2h), declaro que o obreiro cumpriu jornada das 7h às 10h, das 12h às 15h e das 19h às 24h, totalizando 11 horas de trabalho por dia. Declaro também que o autor laborava diariamente, gozando apenas de uma folga de um período a cada 7 dias, conforme afirmado pela testemunha Uyaron. Assim, deverá ser considerado que a cada 7 dias o autor não laborava no horário das 12h às 15h.

Ainda, no que concerne aos intervalos intrajornadas superiores a duas horas, vez que não previstos em lei ou acordo válido, tenho que representam tempo à disposição do empregador, no que superem 2h, devendo serem remunerados como serviço extraordinário, nos termos da Súmula 118 do TST.

Ressalto que não se pode confundir as violações ao limite máximo do intervalo intrajornada, com os períodos de repouso mencionados na Súmula 96 do TST.

Frente à jornada acima fixada, evidente a prestação de labor em sobrejornada. Assim, defiro o pagamento das horas excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal (não há no contrato previsão de carga horária de 40 horas semanais), de forma não cumulativa.

Para o cálculo deverão ser observadas as jornadas acima fixadas, inclusive o tempo à disposição, divisor 220, adicional legal de 50%, salário global do Reclamante e evolução salarial.

Sobre as horas laboradas após às 22h, deverá incidir o adicional noturno de 20%.

Esclareço que as hora extras pré-contratadas, nos termos dos contratos carreados aos autos, não deverão ser abatidas, pois tratam de salário pactuado no momento da contratação, tendo inclusive já contado tal conclusão no item 03.

Os domingos e feriados laborados sem folga compensatória na mesma semana deverão ser remunerados com adicional de 100%.

Serão considerados feriados civis aqueles previstos em lei federal e a data magna do Estado, fixada em lei estadual (art. da lei n. 9.093/95). Também são considerados feriados religiosos os dias de guarda, declarados em lei municipal, de acordo com a tradição local e em número não superior a quatro, incluída a Sexta-Feira da Paixão (artigo da lei n. 9.035/95). No que tange às segundas e terças-feiras de carnaval, estes dias não devem ser considerados como feriado para fins de apuração das horas extras (OJ EX SE n 17, do TRT da 9ª Região).

Ressalto que a alínea a do § 1º do art. 249 da CLT apenas autoriza o trabalho em domingos para quem executa tarefas de"serviço de quartos e vigilância, movimentação das máquinas e aparelhos de bordo, limpeza e higiene da embarcação, preparo de alimentação da equipagem e dos passageiros, serviço"(sendo pessoal destes e, bem assim, aos socorros de urgência ao navio ou ao pessoal esta a hipótese do Autor que atuava na função de garçom de bar), mas não afasta o direito do trabalhador que atua em tais funções à folga semanal em outro dia da semana, constitucionalmente prevista, o que não havia no caso em tela.

Conforme preconiza a Orientação Jurisprudencial nº 97, da SDI-I, do C. TST:

"Horas extras. Adicional noturno. Base de cálculo. O adicional noturno integra a base de cálculo das horas extras prestadas no período noturno".

O adicional noturno refere-se ao labor prestado em horário mais penoso ao trabalhador (artigo 73 da CLT) e o adicional de horas extras diz respeito ao extrapolamento da jornada normal. Ocorrendo ambas as situações, ambos os adicionais são devidos.

Portanto, o adicional noturno fará parte da base de cálculo das horas extraordinárias realizadas no horário noturno, incluindo sua prorrogação (Súmula 60, do TST), mas sobre elas não reflete, evitando-se bis in iden.

Em relação ao intervalo previsto no art. 384 da CLT, vigente à época do contrato do autor, o E. TRT da 9ª Região publicou a súmula 22, nos seguintes termos:

SÚMULA Nº 22. INTERVALO. TRABALHO DA MULHER. ART. 384 DA CLT. RECEPÇÃO PELO ART. 5º, I, DA CF. O art. 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, o que torna devido, à trabalhadora, o intervalo de 15 minutos antes do início do labor extraordinário. Entretanto, pela razoabilidade, somente deve ser considerado exigível o referido intervalo se o trabalho extraordinário exceder a 30 minutos.

Assim, indevido o pagamento de horas extras por violação ao intervalo previsto no art. 384 da CLT, pois a leitura da súmula acima transcrita deixa claro ser este devido apenas às trabalhadoras.

Defiro, entretanto, o pagamento extraordinário do tempo suprimido do intervalo previsto no art. 66 da CLT, já que o autor laborava até às 24h e iniciava a jornada do dia seguinte às 7h. O critério de apuração aqui é o mesmo.

Nos termos dos arts. 66 e 67 da CLT, tem o empregado direito a um descanso de 24 horas por semana, o qual deve ser seguido por mais 11 horas de intervalo interjornadas, o que totaliza 35 horas. No entanto, o labor em dia de repouso semanal remunerado não caracteriza violação a intervalo, devendo apenas ser remunerado em dobro. Repouso semanal não se confunde com intervalo, já que aquele é remunerado, enquanto este é considerado suspensão do contrato de trabalho (não há trabalho e remuneração). Não existe, pois, base legal para deferir o pagamento de horas pela violação a intervalo de 35 horas, uma vez que já foi deferido o pagamento em dobro das horas laboradas em domingos sem folga compensatória dentro da mesma semana.

Não há falar em aplicação da Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho, pois não ficou comprovado nenhum acordo de compensação ou banco de horas válido, diante da habitualidade de horas extraordinárias.

Também não há deduzir minutos anteriores ou posteriores, segundo a parte final da súmula 366 do TST.

Além disso, os poucos minutos, quando não ultrapassarem a cinco anteriores e posteriores à jornada laboral, conforme limites definidos pela súmula acima, e por meio do art. 58, § 1.º, da CLT, não devem ser computados na jornada laboral, eis que destinados à marcação do cartão de ponto, não se tratando de efetivo tempo de serviço.

Na hipótese dos autos, entretanto, a jornada de trabalho foi fixada de acordo com a prova oral, ausentes cartões de ponto válidos.

Não se cogita, neste contexto, de desconsiderar minutos residuais, na forma prevista no art. 58, § 1.º, da CLT, porque ausente o fundamento fático a justificar a desconsideração do tempo destinado à marcação do cartão de ponto.

Por habituais, de todas as horas extraordinárias deferidas, inclusive as horas extraordinárias pela não concessão de intervalos, cabem reflexos em descanso semanal remunerado (domingos e feriados), em 13º salários, e férias acrescidas de 1/3. Sobre o principal e reflexos incide o FGTS, exceto sobre férias indenizadas. Não haverá reflexo do descanso semanal remunerado nos domingos trabalhados, pois serão remunerados com o adicional de 100%, evitando-se duplo pagamento, ou seja, remuneração do dia com adicional de 100% mais o descanso semanal remunerado.

Quanto aos reflexos do descanso semanal remunerado acrescido das horas extraordinárias em férias, 13º salário, e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço se fazem indevidos, de acordo com a OJ 394 da SDI-1, do TST:

OJ-SDI1-394. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO - RSR. INTEGRAÇÃO DAS HORAS EXTRAS. NÃO REPERCUSSÃO NO CÁLCULO DAS FÉRIAS, DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, DO AVISO PRÉVIO E DOS DEPÓSITOS DO FGTS. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010). A majoração do valor do repouso semanal remunerado, em razão da integração das horas extras habitualmente prestadas, não repercute no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS, sob pena de caracterização de bis in idem.

Para o cálculo do reflexo das horas extras em 13º salário e férias com 1/3, deverá ser observado o disposto na OJ EX SE nº 33 do E. TRT da 9ª Região, in verbis:

VIII - Horas extras. Reflexos. Forma de cálculo. O cálculo da média das horas extras para fins de reflexos em 13º salário, férias e aviso prévio deverá considerar sempre os meses efetivamente trabalhados, nos últimos 12 (doze) que antecedem a exigibilidade das verbas reflexas. (ex - OJ EX SE - 167 e ex - OJ EX SE - 180) RA/SE/004/2009, DEJT, divulgado em 21.10.2009, publicado em 22.10.2009.

Acolho em parte, nestes termos." (fls. 1499 -1502)

Insurge-se o autor.(fls. 1551-1553)

O autor insiste na tese inicial de que laborava das 07h00 às 1h00 do dia seguinte, com três intervalos de 2 horas. Pondera que o ônus quanto à jornada efetivamente praticada era das rés. Cita trechos da prova testemunhal, destacando que as testemunhas indicadas pelas demandadas não trabalharam em embarcações ou não executam tais atividades desde 2010, sendo que o contrato de trabalho em questão foi firmado em 2016; além disso, defende que referidas testemunhas apenas declararam o horário de funcionamento dos restaurantes e não a jornada efetivamente cumprida. Argumenta que a testemunha, Allan Douglas afirmou que a jornada de trabalho iniciava às 6:00, finalizando em média às 24:00 com dois intervalos de 30/60 minutos. A testemunha Uyaron afirmou que "o labor ocorria das 06h às 11h, das 12h30 às 16h30min e depois das 18h30min à 01h da madrugada, todos trabalhavam diariamente nesses 03 turnos citados." Conclui que "à exceção da testemunha Valério, todas as demais confirmaram o intervalo de, no máximo, 2 horas entre os turnos, motivo pelo qual, data vênia, não há fundamentos que justifiquem fixar-se o segundo intervalo como sendo de 4 horas, como fez o juízo a quo.

Ainda, muito embora o juízo de origem tenha desconsiderado o depoimento da testemunha Allan, fixou o horário de fim da jornada do autor como sendo de 00h, sendo que a testemunha Uyaron comprovou que, em verdade, esta acabava 1h da manhã, corroborando com o depoimento obreiro."

Ao final, pretende a reforma da r. sentença para "que seja reconhecida que a jornada exercida pelo reclamente era das 07:00 às 01:00 com dois intervalos de duas horas, para que assim sejam apuradas todas as horas extras e reflexos na forma deferida, nos termos da fundamentação e da exordial" .

Analisa-se.

Na peça inicial, a autora alegou que laborava, de segunda a segunda-feira, das 06h00/07h00 até 24h00/01h00 do dia seguinte, com intervalo para refeições e sem folga semanal (fl. 8).

Conforme apontado pelo MM. Juízo a quo, não foram trazidos aos autos os controles de ponto.

Dessa forma, segundo entendimento consubstanciado na Súmula 338 do C. T.S.T., há presunção relativa de veracidade dos horários de labor declinados na pela inicial, a qual pode ser afastada por prova em contrário, razão pela qual torna-se imperiosa a análise da prova oral.

Inicialmente, cabe destacar ser incontroverso que o autor desenvolvia as funções de garçom (waiter) nos restaurantes das embarcações (fl. 535).

Aberta a instrução processual, conforme consignado na Ata de fls. 1441-1442, as partes foram interrogadas e acordaram pela utilização de prova testemunhal emprestada, cujas atas foram acostadas aos autos ( XXXXX-10.2015.5.02.0070 - fls. 1396-1397; XXXXX-74.2014.5.12.0035 - fls. 1400-1401; 25195-2013-005-09-00-6 - fls. 1402-1403; XXXXX-81.2014.5.02.0017 - fls. 1405-1406).

O autor, inquirido, respondeu: "(...) 21) - havia a chefia que controlava a jornada dizendo que trabalhava das 7h à 1h, com 3 intervalos de 2 horas; 22) - durante o intervalo tinha disponibilidade para refeição e descanso; 23) fazia treinamento duas vezes na semana e nessas ocasiões não poderia desembarcar do navio durante os intervalos; (...)" (fl. 1441).

O preposto, por seu turno, disse: "(...) 12) o reclamante trabalhava em média 10 horas por dia, já inclusas 2 horas extras, em horários variados. (fl. 1442).

Da prova oral emprestada extrai-se:

A testemunha de indicação obreira, Sr. Allan Douglas, que também trabalhou em embarcações como assistente de garçom, disse que a autora trabalhava das 06h00 às 24h00, com uma média de dois intervalos ao longo dia, cada um de 30 a 60 minutos e sem folgas, apenas" mencionando a dispensa para o trabalho em alguns turnos (das 6 às 12h), estimando que em seis a sete por mês "(fl. 1400).

A outra testemunha ouvida, indicada pela parte autora, Sr. Uyaron, que laborou como garçom em embarcações, afirmou que o labor se dava em escalas, das 06h00 às 11h00, das 12h30 às 16h30 e das 18h30 à 01h00 da madrugada, sendo que todos trabalhavam diariamente nesses três turnos e que a cada sete dias folgavam apenas meio período, folgando apenas no horário do almoço citado (fl. 1403).

A testemunha convidada pelas rés, Sra. Alessandra, nunca trabalhou em embarcações, tendo afirmado que a autora trabalhava nos três turnos de refeições," sendo que o café da manhã era das 07h às 10h, o almoço de meio-dia às 15h, e o jantar das 19h à meia-noite "(fl. 1396). Esclareceu, ainda, que os horários mencionados são os de trabalho da autora, visto que o restaurante permanecia aberto em outros períodos (fl. 1397). Disse que" o reclamante não poderia trabalhar além das 11 horas contratadas "(fl. 1397).

A outra testemunha de indicação patronal, Sr. Valério, não trabalha em embarcações desde 2010, tendo declarado que"os restaurantes funcionam, para café da manhã, das 07h às 10; almoço, das 12h às 14h; jantar, das 20h às 24h"(fl. 1405). Informou que" a escala de trabalho nos restaurantes é variável, nunca ultrapassando 11h diárias "(fl. 1405).

Extrai-se da prova oral que o preposto é confesso quanto aos horários de funcionamento dos restaurantes e que os depoimentos prestados pelas testemunhas de indicação patronal devem ser vistos com cautelas, na medida em que não trabalharam com o autor, sendo que a testemunha Alessandra sequer trabalhou em embarcações e a testemunha Valério, embora tenha trabalhado em embarcações até 2010 (de forma não contemporânea com o autor, cujo contrato de trabalho ora analisado data de 2016), somente disse os horários de funcionamento dos restaurantes, não sabendo informar a efetiva jornada de trabalho cumprida pelo autor.

No entanto, fazendo cotejo entre as alegações iniciais, limites impostos pelas informações prestadas em interrogatório pelo autor e a prova testemunhal emprestada, entende-se que merece pequeno reparo a r. sentença quanto ao horário de entrada do terceiro turno.

Com efeito, a jornada foi fixado pelo d. Juízo de origem como sendo às 07h00 às 10h; das 12h às 15h e das 19h às24h. Porém, na peça inicial e em interrogatório, o autor alegou que trabalhava das 07h00 à 1h00, com dois intervalos de 2horas cada um, o que restou confirmado no cotejo da prova testemunhal obtido por meio da prova emprestada, em que as testemunhas indicadas pelo autor desenvolveram as atividades de assistente de garçom e de garçom (a mesma desempenhada pelo autor) em embarcações das rés. Assim, merece reparo apenas quanto ao terceiro turno. Dá-se provimento.

No entanto, reputo correta a r. sentença quanto ao restante da jornada fixada, concessão de folga (conforme depoimento prestado pela testemunha de indicação obreira, Sr. Uyaron e parcialmente confirmado pela outra testemunha convidada pela autora, Sr. Allan Douglas) e quanto aos reflexos. Mantenho.

Dá-se provimento para fixar que o horário de início de labor do autor no terceiro turno de trabalho iniciava às 17h00 e finalizava à 01h00 da madrugada, o que deverá ser considerado para o cálculo das horas extras devidas.

Acolhe-se.

e) MULTAS DOS ARTIGOS 467 E 477 DA C.L.T.

Ressai da r. sentença:

"Ausentes verbas incontroversas, não há que se falar em aplicação da multa prevista no art. 467 da CLT.

De igual forma, entendo ser indevida a multa do artigo 477, § 8º, da CLT, ante a controvérsia da matéria, pois apenas nesse momento processual foi reconhecida a aplicação da legislação brasileira ao contrato do autor e, consequentemente, a obrigação da reclamada ao pagamento das verbas rescisórias.

Rejeito."(fl. 1502)

Insurge-se o autor. (fls. 1553-1556)

Pugna pela reforma da r. sentença, alegando que o"Ao ser declarado nulo o contrato de trabalho realizado entre o recorrente e as recorridas, bem como ante a falta de pagamento das verbas rescisórias, deveria ser aplicada a regra geral de vigência do contrato de trabalho posta na legislação brasileira ( CLT). arts. 467 e 477, com a consequente condenação das recorridas ao pagamento das multas legais previstas, sob pena das reclamadas se valerem de sua própria torpeza sonegando direitos consagrados."

Invoca a Súmula nº 462 do C. TST:

MULTA DO ART. 477, § 8º, DA CLT. INCIDÊNCIA. RECONHECIMENTO JUDICIAL DA RELAÇÃO DE EMPREGO

A circunstância de a relação de emprego ter sido reconhecida apenas em juízo não tem o condão de afastar a incidência da multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT. A referida multa não será devida apenas quando, comprovadamente, o empregado der causa à mora no pagamento das verbas rescisórias.

Requer, desse modo, a condenação das rés"ao pagamento das multas descritas nos arts. 467 e 477, ambos da C.L.T.", em razão da mora no pagamento das verbas rescisórias no contrato de trabalho mantido.

Analisa-se.

Com parcial razão o autor.

Ausentes verbas incontroversas, não há que se falar em aplicação da multa prevista no art. 467 da C.L.T.

Na hipótese do parágrafo 8º do artigo 477 da C.L.T., a única exceção para que o empregador se isente da multa é que o trabalhador, frise-se, comprovadamente dê causa à mora. Não se inclui na exceção relação jurídica controvertida, tampouco discussão em torno da causa de cessação do contrato. E note-se que no final do parágrafo 8º do artigo 477 consolidado o legislador nem mesmo usou o termo empregado, mas trabalhador, estando aí incluído mesmo aquele cuja relação jurídica é controvertida.

Nesse contexto, é entendimento desta e. Segunda Turma que a multa se aplica sempre que constatado atraso no pagamento das verbas rescisórias, mesmo que o vínculo de emprego tenha sido reconhecido em juízo. O fato de o direito às próprias verbas ter nascedouro na decisão judicial não obsta a aplicação da multa, eis que a sentença que reconhece o vínculo de emprego, em razão da sua natureza declaratória, retroage à data do evento, motivo pelo qual se considera que os haveres rescisórios não foram quitados oportunamente de forma integral.

Nesse sentido, a Súmula 26 deste E. Regional:

MULTA DO ART. 477, § 8º DA CLT. VÍNCULO DE EMPREGO RECONHECIDO EM JUÍZO. A multa prevista no art. 477, § 8º, da CLT, somente não é devida quando comprovadamente, o empregado der causa à mora no pagamento das verbas rescisórias, não abrangendo hipótese de diferenças reconhecidas em juízo. Precedentes: RO-39880-2014-004-09-00-4; RO-02199-2015-303-09-00-0; RO-02349-2013-022-09-00-7; RO-43839-2015-088-09-00-7.

Na mesma linha, decisão proferida nos autos TRT-PR XXXXX-2015-041-09-00-0, de minha relatoria e com publicação em 17 de novembro de 2017.

Dou parcial provimento para condenar as rés ao pagamento da multa prevista no art. 477 da C.L.T.

Acolhe-se parcialmente.

f) DANO MORAL PELA EXIGÊNCIA DO EXAME HIV E ENTORPECENTES

Ressai da r. sentença:

"7.1. Danos morais por exigência de exames de HIV, álcool e drogas:

Consta na inicial que "A exigência de a reclamada para o reclamante em submeter a mesma a exame de drogas, álcool e HIV, ocasionou enorme abalo moral e psíquico".

Em resposta, a reclamada afirma que "no que tange ao teste de HIV e drogas a que alega ter sido submetido, este justifica-se, vez que, por o navio ser uma célula autônoma, que passa a maior parte do tempo em alto mar, algumas cautelas devem ser tomadas, de acordo com regramento internacional exigido. Isto se justifica, vez que, por haver limitações ao atendimento e instalações médicas a bordo dos navios, a identificação de um tripulante portador de HIV faz-se necessária, já que as condições de saúde de um indivíduo com HIV são especiais, de modo que o navio deve estar preparado para atendimento deste tipo de paciente. 242.Sendo assim, para garantir a segurança e saúde do tripulante portador de HIV, é que pode-se exigir sua identificação no momento da seleção e eventual contratação".

Entendo assistir razão à reclamada. Neste sentido já decidiu a 1ª Turma deste Regional em recente julgado envolvendo a mesma reclamada, cujos fundamentos peço vênia para utilizar como razões de decidir:

"Por fim, no tocante à apresentação de exames HIV e toxicológicos, não implica, por si só, dano à honra ou imagem, especialmente considerando tratar-se de prática dirigida a todos os empregados. Ademais, como observado pelo MM. Juízo de origem,"a reclamante embarcava num navio e nele trabalhava por vários meses. Atuando nesse tipo de condição é razoável a exigência da reclamada, quando se torna imprescindível garantir a segurança da tripulação e dos passageiros, especialmente quando a empresa é responsável pela segurança de todos dentro da embarcação"(fl. 203). A intimidade e liberdade da reclamante, embora direitos fundamentais, não são absolutos, pois também deve ser observado o meio-ambiente do trabalho livre de riscos, dever do empregador. Assim, o empregador pode, em alguns casos, exigir exames, a fim de resguardar a segurança dos próprios empregados e de terceiros.

Ademais, não se tem notícia de que tais resultados não fossem tratados com sigilo, pois a divulgação dos mesmos, afrontaria, sim, a intimidade e vida privada da reclamada, o que, no caso, não ocorreu.

Mantenho a r.sentença". (TRT: 07558-2014-651-09-00-2 (RO) - 1ª Turma - Pub. 20/10/2015).

Assim, com base no julgado acima transcrito, e considerando ainda que não há nos autos, qualquer prova de que o autor tenha passado por qualquer situação vexatória em razão dos exames solicitados pela reclamada, rejeito o pedido de indenização por danos morais também neste ponto."v (fls. 1502-1503)

Insurge-se o autor. (fls.1554-1557)

Inconformado, o autor sustenta que a ordem constitucional consagra os princípios da dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, o da isonomia," proibindo qualquer discriminação ", e dentre os objetivos principais está a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação". Busca, assim, "garantir a inviolabilidade do direito a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação".

Sustenta evidente que a exigência patronal é abusiva e discriminatória, "obriga os funcionários a tal antes mesmo da contratação. Resta evidente que a reclamada não exige tais exames pensando na integridade física de seus funcionários, e sim somente em eventuais despesas que poderia ter."

Assevera que, do mesmo modo, é discriminatória a exigência de antecedentes criminais e exame de drogas.

Cita jurisprudência do C. TST e da 21ª Vara do Trabalho de Curitiba, que entende corroborar sua tese.

"Requer a reforma da r. sentença, como o reconhecimento dos danos morais por exigência de exame de HIV para admissão, com a condenação equivalente das recorridas, nos termos da inicial e da fundamentação."

Analisa-se.

Com razão.

Primeiramente, cabe realçar que os danos morais prescindem de prova, pois envolvem sentimentos ligados à subjetividade, cuja manifestação e intensidade variam de indivíduo para indivíduo. Afinal, dor, aflição, constrangimento, honra, autoestima, humilhação, vergonha são fenômenos da alma e, nessa condição, não são suscetíveis de medida objetiva.

A ocorrência do fato que teria desencadeado os danos morais é que tem de estar demonstrada nos autos, cabendo a quem a alega o ônus de prová-la, salvo quando incontroversa (inteligência dos artigos 818 da C.L.T. c/c 373, I, do C.P.C.; esse último de aplicação supletiva ao processo do trabalho, conforme entendimento turmário a que se curva esta Relatora). Em outras palavras, os danos morais decorrem do próprio fato tido como ofensivo - damnum in re ipsa.

Na petição inicial, o autor alegou que "A exigência de a reclamada para a reclamante em submeter a mesma a exame de álcool, drogas e H.I.V., ocasionou enorme abalo moral e psíquico" (fl. 10).

O fato foi confirmado pela testemunha de indicação obreira Allan Douglas (fl. 1400) e pela testemunha indicada pelas rés Valério (fl.1405).

"para a admissão eram realizados exames ósseo e de sangue, este também para identificar portador de HIV e grávida" (fl. 1400, Allan Douglas)

"que a empresa exigia exames de drogas e HIV (opcional)" (fl. 1405 - Valério Emerenciano de Almeida).

Nada obstante o respeito que atribuo à posição adotada pelo MM. Juízo de primeiro grau, a exigência de exame de HIV para a contratação encontra-se vedada pelo art. 2º da Portaria 1246/10 do Ministério do Trabalho e, a meu ver, constitui ilícito suficiente para ensejar a condenação das rés ao pagamento de indenização por danos morais.

Presentes, pois, os requisitos inerentes ao dever de indenizar: dano (abalo moral provocado pela exigência do referido exame), culpa da empregadora e nexo da causalidade entre o dano sofrido e o trabalho.

Destaco que a matéria já foi analisada por esta C. Turma, em idêntica situação, ocasião em que houve condenação ao pagamento de indenização no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Trata-se do RO XXXXX-55.2017.5.09.0006, publicado no DEJT em 19 de agosto de 2019 e relatado pela Exma. Desembargadora Claudia Cristina Pereira, a quem peço venia para transcrever a fundamentação, e também adotá-la como razões de decidir:

"A Lei nº 12.984/2014 define a conduta de"negar emprego ou trabalho"a portadores do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e doentes de AIDS como crime de discriminação, punível com reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa.

Além disso, o art. 2º da Portaria nº 1.246/2010 do Ministério do Trabalho e Emprego dispõe que"não será permitida, de forma direta ou indireta, nos exames médicos por ocasião da admissão, mudança de função, avaliação periódica, retorno, demissão ou outros ligados à relação de emprego, a testagem do trabalhador quanto ao HIV".

O fato de o trabalhador laborar embarcado em cruzeiro marítimo não se enquadra no conceito de distinção fundada em qualificações exigidas para determinado emprego, de que trata o art. 2º da Convenção nº 111 da OIT.

Apesar da tese sustentada pelas reclamadas quanto à suposta dificuldade de atender o tripulante enfermo (fl. 704), é público e notório que os navios de cruzeiro dispõem de serviços de assistência médica a bordo, com profissionais qualificados e equipamentos hospitalares básicos, o que possibilita o pronto atendimento de trabalhadores e passageiros, em caso de problemas de saúde.

Outrossim, restringir o acesso do portador de HIV ao mercado de trabalho apenas reforça o estigma que pesa sobre tal enfermidade. Nesse sentido, pede-se vênia para transcrever o seguinte trecho de publicação do Ministério da Saúde, abordando a questão dos exames anti-HIV e trabalho (Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de DST e Aids. Implicações Éticas do Diagnóstico e da Triagem Sorológica do HIV / Secretaria Vigilância em Saúde, Programa Nacional de DST e Aids. - Brasília: Ministério da Saúde, 2004):

Sendo o direito ao trabalho um dos direitos fundamentais da pessoa humana, evidencia-se que na história da epidemia de aids este tem sido freqUentemente violado: muitas pessoas que vivem com o HIV ou com aids têm sido impedidas de assumir empregos, enquanto outras são demitidas de seus trabalhos ou mesmo sofrem discriminações variadas por parte de colegas ou patrões.

Com base no conceito vigente de capacidade laborativa adotado pela medicina ocupacional, que destaca a importância de se avaliar as qualidades positivas do trabalhador, depreende-se que o que deve estar sob foco é a capacidade para exercer determinada função. Dessa forma, abre-se um leque de possibilidades que favorecem o acesso ao trabalho às pessoas portadoras de deficiência (s), permitindo estender direitos a um número maior de pessoas. No caso da infecção pelo HIV, em que a maioria das pessoas vive muitos anos sem apresentar sintomas clínicos, não existem justificativas científicas que corroborem esse tipo de exclusão social e nem tampouco argumentos que impeçam as habilidades necessárias para determinada função. O mesmo se aplica também para as pessoas que já vivem com aids, quando recuperadas das infecções oportunistas. Aqui cabe destacar que a utilização da terapia anti-retroviral tem assegurado boas condições de saúde para um grande número de pessoas. Já no caso de seqüelas físicas limitantes, a possibilidade de remanejamento de funções poderá ser considerada, assim como já ocorre com várias outras patologias.

A existência de medos infundados, relativos às formas de se contrair o HIV, ainda respondem por um certo pânico em estar próximo às pessoas soropositivas ou com aids, o que às vezes serve de argumento para as triagens sorológicas. Esses fatos foram reforçados pelas inadequadas divulgações iniciais sobre a aids que, principalmente na década de 80, caracterizaram as pessoas nessa condição como" promíscuas/desviantes ", favorecendo visões de que essa patologia seria um castigo para determinados estilos de vida (Birman, 1994). Na atualidade, além de se criticar essas posturas que disseminam condutas discriminatórias e preconceituosas, há a necessidade de se divulgar de forma precisa as formas de transmissão do HIV, afirmando-se que o contato social, incluindo as relações de trabalho, não envolve nenhum risco para a infecção pelo HIV, salvo em acidentes com materiais biológicos humanos.

A justificativa de que empregar pessoas soropositivas - muitas vezes vistas como doentes em potencial - acarretaria despesas e pouca recompensa de produção, não possui base legal. Os custos advindos com os trabalhadores que adoecem, recaem sobre a Seguridade Social, cujos recursos de manutenção dizem respeito ao conjunto dos trabalhadores e patrões. Dessa forma, o ônus do atendimento ao empregado doente não recai fundamentalmente sobre a instituição empregadora. Quanto à possibilidade de adoecimento, esta não é exclusiva de quem vive com o HIV.

Como a CLT omitiu em sua redação inicial as normas para disciplinar os exames médicos relacionados com o trabalho, posteriormente o Decreto-Lei nº 229, de 28.2.1967, explicitou que"Os exames médicos deverão ser orientados no sentido de investigar a capacidade física do empregado para a função que exerça ou venha a exercer."(MS, 1993:15).

Cresce o número de ações trabalhistas relacionadas ao HIV/aids que chegam ao Poder Público.

Existem várias regulamentações direcionadas à prevenção nos locais de trabalho, baseadas no fato de que o enfrentamento da epidemia de aids implica a necessidade de envolvimento de toda a sociedade e de que a informação, a mudança de comportamentos e a solidariedade são pilares fundamentais para que se evitem novos casos de infecção pelo HIV ou de aids.

7.2 - Normatização 7.2.1 - Conselho Federal de Medicina (CFM) - Parecer nº 14/88, aprovado em 20.5.1988 Analisa aspectos éticos da aids quanto à discriminação na relação médico-paciente, instituições, medicina do trabalho e pesquisa.

O tópico" AIDS e Medicina do Trabalho "explicita que" Não há justificativa técnica ou científica para a realização indiscriminada de exames sorológicos ", ressaltando-se que a integração ao trabalho reduz a marginalização e as dificuldades que a pessoa vivendo com HIV enfrenta na sociedade.

Sobre a possibilidade de informar resultados de exames aos patrões, afirma-se que:

"Tal fato configura ilicitude por se constituir em invasão da esfera da privacidade de outrem; o médico que (...) concede estas informações, viola o sigilo profissional, posto que este procedimento não configura nenhuma das hipóteses de exclusão de ilicitude (legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal ou exercício regular de direito)."

Além disso, de acordo com a Organização Mundial de Saúde e Organização Internacional do Trabalho, os trabalhadores infectados pelo HIV assintomáticos ou doentes devem ser tratados de maneira semelhante a qualquer outro trabalhador.

7.2.2 - Portaria Interministerial nº 3.195, de 10.8.1988 - firmada pelos ministros do Trabalho e da Saúde.

Institui em âmbito nacional a Campanha Interna de Prevenção da Aids (CIPAS), que passa a integrar a Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes de Trabalho (CANPAT), devendo ser realizada permanentemente pelos órgãos regionais da Administração Direta e Indireta, empresas públicas e privadas, sob a supervisão da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho do Ministério do Trabalho e do PN-DST/AIDS (op. cit.:711).

7.2.3 - CFM - Parecer 05/89, de 18.2.1989 Explicita que a realização de teste sorológico para aids como exame admissional é violação ao direito do trabalhador e fere a CLT, não encontrando respaldo técnico, científico ou ético. Qualquer informação sobre o empregado ao empregador deve cingir-se à aptidão para o trabalho (op. cit.:848).

7.2.4 - CFM - Resolução 1.665/2003

Art. 4º :" É vedada a realização compulsória de sorologia para HIV ".

7.2.5 - Lei Federal nº 7.670, de 8.12.1988

Estende aos portadores do HIV os benefícios de: licença para tratamento de saúde; aposentadoria; pensão especial; auxílio-doença; levantamento de valores correspondentes ao FGTS e/ou outros tipos de pecúlio, independentemente de rescisão contratual.

7.2.6 - Portaria Interministerial nº 869, de 11.8.1992

Firmada entre os ministros da Saúde e do Trabalho. Regulamenta os exames médicos admissionais, periódicos e demissionários no âmbito do Serviço Público Federal (op. cit.:741). Proíbe o teste anti-HIV nestas três situações, argumentando que: a) os artigos 13 e 14 da Lei nº 8.112/90 exigem somente a apresentação de um atestado de aptidão física e metal para posse em cargo público; b) a sorologia positiva para o HIV em si não acarreta prejuízo da capacidade laborativa de seu portador; c) os convívios social e profissional com portadores do HIV não configuram situações de risco; d) as medidas para o controle da infecção são a correta informação e os procedimentos preventivos pertinentes; e) a solidariedade e o combate à discriminação são os meios pelos quais a sociedade pode minimizar o sofrimento dos portadores do HIV e das pessoas com aids; f) o manejo dos casos de aids deve ser conduzido segundo os preceitos da ética e do sigilo; g) as pesquisas relativas ao HIV vêm apresentando surpreendentes resultados, em curto espaço de tempo, no sentido de melhorar a qualidade de vida dos indivíduos infectados e doentes.

7.2.7 - Lei nº 9.029, de 13.4.1995

Proíbe a exigência de atestados de gravidez e esterilização e outras práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência de relação jurídica de trabalho, e dá outras providências (MS, 2000b:713-715).

7.2.8 - Portaria nº 3.717, de 8.10.1998 Cria o Conselho Empresarial Nacional para Prevenção ao HIV/aids, presidido pelo Ministro da Saúde. Entre as suas competências e atribuições estão as ações de prevenção direcionadas aos trabalhadores das empresas e a colaboração com o Ministério da Saúde na proposição de políticas públicas relacionadas à epidemia (op. cit.:328-329).

7.3 - Comentários finais

Além de se assegurar direitos trabalhistas já conquistados, há de se destacar que à medida que aumentam os casos de infecção pelo HIV ou de aids entre a população mais empobrecida, em face das profundas desigualdades sociais brasileiras e de um mercado recessivo de trabalho, novas estratégias para a extensão dos direitos humanos estão sendo planejadas pelo governo federal:

estratégias de geração de renda, implementação de política de seguridade social, incentivo a cooperativas de trabalho alternativo, aquisição de imóveis a custos populares (individuais ou coletivos), assim como aprimoramento do auxílio-doença para um patamar condizente com a dignidade de condições de vida. (Ferreira, 1999:79-83, 127). (grifos acrescidos)

No âmbito internacional, uma reunião realizada em 1988 pela OIT, em conjunto com a OMS, resultou na Declaração de Reunião Consultiva sobre AIDS no Local de Trabalho, que fixou dentre os princípios básicos a garantia de que os trabalhadores soropositivos que se encontram assintomáticos devem ser tratados como qualquer outro empregado, enquanto que aqueles que apresentam sintomas ou enfermidades relacionadas ao HIV devem receber o mesmo tratamento atribuído a outros empregados, acometidos por uma doença qualquer.

Além disso, o item 3, alínea c, da Recomendação nº 200 da OIT estabelece como princípio geral que não deve existir nenhuma discriminação ou estigmatização de trabalhadores, em especial daqueles que buscam emprego, a pretexto de infecção real ou presumida pelo HIV (there should be no discrimination against or stigmatization of workers, in particular jobseekers and job applicants, on the grounds of real or perceived HIV status or the fact that they belong to regions of the world or segments of the population perceived to be at greater risk of or more vulnerable to HIV infection).

Ao comparar a legislação internacional atinente ao tema com o direito pátrio, ALICE MONTEIRO DE BARROS conclui que a previsão de realização de exame médico por ocasião da admissão do trabalhador (art. 168 da CLT) não legitima a exigência de investigação do vírus HIV (AIDS NO LOCAL DE TRABALHO UM ENFOQUE DE DIREITO INTERNACIONAL E COMPARADO. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg. - Belo Horizonte, julho/dezembro 2000):

Em princípio, essa investigação clínica é legítima, pois o empregador tem o direito de controlar a capacidade física de seus empregados e zelar pela saúde e segurança no ambiente de trabalho.

Entretanto, esses exames não poderão, em princípio, compreender investigações capazes de constatar o vírus da AIDS. No período de soropositividade assintomática, as condições de saúde do obreiro não são afetadas, mantendo-se a aptidão para o trabalho. Logo, a intervenção do empregador é desproporcional ao fim proposto (avaliar a capacidade física do trabalhador), em face das graves consequências que daí advirão, pois a enfermidade tem sido considerada" infamante ", levando as pessoas a adotarem atitudes de desprezo ou de pouca solidariedade para com os que padecem deste mal. Ademais, frise-se, são escassas as vias de transmissão do vírus.

Impende salientar ainda que a aprovação do INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO REGIONAL - Tema 92 (Uniformizar a jurisprudência, nos termos dos artigos 926, § 1º e 927, v, do CPC e da RA 38/2018 deste Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, fixando o presente entendimento, como precedente de uniformização da jurisprudência regional, a ser observado pelos juízes e Tribunal, dar provimento ao recurso da autora, reformando a sentença para fixar que aplicável a legislação brasileira ao trabalhador que presta serviços em navio de cruzeiros que navega em águas internacionais, quando verificada uma das seguintes condições, alternativamente: a) trabalhador brasileiro pré-selecionado por skype ou por agência de seleção de pessoal brasileiro; b) trabalhador nacional que tenha sido selecionado no brasil; ou, c) trabalhador nacional que tenha sido contratado no brasil; ou, d) trabalhador que embarque em porto nacional ou cuja parte do trajeto compreenda navegação em águas nacionais.), que estabelece a aplicação da legislação brasileira ao trabalhador que presta serviços em cruzeiros enquadrado nas condições nele dispostas, reforça a conclusão pelo caráter discriminatório da exigência de exame de HIV para admissão de empregado.

Nessa esteira, faz jus a reclamante à indenização reparatória pretendida. Diante do exposto, reformo para condenar as reclamadas ao pagamento de indenização por dano moral no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser atualizado monetariamente e com juros de mora na forma da Súmula 439 do TST."

Por fim, a fixação do quantum indenizatório deve ser feita mediante avaliação da gravidade do fato, da intensidade e repercussão da ofensa, das circunstâncias pessoais da vítima, do comportamento do ofensor após o fato e do contexto socioeconômico em que se inserem ofensor e ofendido, a fim de que o valor apurado atinja a finalidade compensatória da indenização - sem implicar enriquecimento sem causa do ofendido - bem como sua função pedagógico-preventiva - disciplinando futuras ações voluntárias e conscientes do atual ofensor e inibindo eventual reincidência.

Por fim, destaca-se que a fixação do quantum indenizatório deve ser feita mediante avaliação da gravidade do fato, da intensidade e repercussão da ofensa, das circunstâncias pessoais da vítima, do comportamento do ofensor após o fato e do contexto socioeconômico em que se inserem ofensor e ofendido, a fim de que o valor apurado atinja a finalidade compensatória da indenização - sem implicar enriquecimento sem causa do ofendido - bem como sua função pedagógico-preventiva - disciplinando futuras ações voluntárias e conscientes do atual ofensor e inibindo eventual reincidência.

Nessa linha de raciocínio, levando em consideração não somente as circunstâncias do caso em análise, mas também os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, e, ainda, o entendimento firmado por esta E. Turma em sessão, entende-se correto fixar o valor da indenização em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Diante do exposto, reforma-se a r. sentença para condenar as rés ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$5.000,00 (cinco mil reais), com juros de mora e correção monetária na forma da Súmula 439 do C. T.S.T., em decorrência da exigência de realização de exames de HIV para a contratação.

Acolhe-se.

g) DANOS EXISTENCIAIS

Ressai da r. sentença.

"7.2. Danos existenciais:

Pleiteia o autor indenização por danos existenciais, pois afirma que era submetido à jornada" absurda, extenuante e desumana ".

Rejeito, entretanto, a pretensão, pois, a realização de horas extras, por si só, não enseja o reconhecimento de que houve violação aos direitos da personalidade do reclamante. Ademais, não prospera a alegação do autor de que laborava 19 horas por dia.

Este Regional já indeferiu o mesmo pedido, formulado em face da mesma reclamada, nos seguintes termos:

"A realização de horas extras não autoriza concluir, por si só, que a conduta do empregador ofendeu a intimidade, a vida privada, honra e imagem do reclamante, não sendo suficiente para permitir reconhecimento de ofensa aos direitos personalíssimos.

Note-se que os fatos narrados pelo reclamante não traduzem, em si, ofensa moral, não podendo ser taxados como lesivos a sua honra ou boa fama, de modo a sujeitar o empregador ao pagamento da indenização outra que não a legalmente prevista.

Há que se consignar que a violação a direitos trabalhistas não configura, por si só, motivo para a condenação ao pagamento de indenização por danos morais. De ordinário, eventual descumprimento de norma laboral ensejará a condenação na obrigação correspondente fixada pelo texto consolidado, e não indenização fundada na responsabilização civil, prevista nos artigos 186 e 927 do Código Civil, a não ser que reste demonstrada efetiva ofensa a bens e direitos imateriais do suposto ofendido. No presente caso, não existem elementos que evidenciem violação ao patrimônio imaterial do reclamante, a ensejar a condenação dos réus ao pagamento de indenização.

Rejeito, neste particular". (TRT: 30039-2013-001-09-00-1 (RO) - 5ª Turma - Pub. 25/11/204).

Logo, ante ao exposto, e valendo-me também dos fundamentos esposados no julgado acima transcrito, rejeito também pedido de indenização por danos existenciais.

Nada a deferir a título de indenizações por danos morais e existenciais, portanto." (fls. 1503-1504)

Insurge-se o autor. (fl. 1557)

Privado do convívio familiar e social, ainda sujeito a jornada extenuante, sustenta o autor "esteve exposto a jornada extenuante, e, ainda, privado do convívio familiar e social durante o período. Laborando de sete dias por semana, conforme reconhecido, inquestionável que ficava totalmente impossibilitado de dedicar-se à sua vida privada, seus projetos e até mesmo lazer."

Assegura que, ainda que detenha o poder diretivo, há limites para impedir a "arbitrariedade patronal.":

"Vale dizer que qualquer empreendimento ou organização empresarial deve respeitar as condições mínimas de proteção ao trabalhador, sob pena de configurar abuso de direito. Assim, os direitos fundamentais servem como um parâmetro e um balizador na preservação do princípio da igualdade face aos atos discriminatórios."

Sustenta, sob qualquer ótica, haver causa, nexo de causalidade e dano à obreira. Cita jurisprudência desta E. 2ª Turma que entende corroborar sua tese.

Postula a reforma da r. sentença, reconhecendo-se os danos existenciais com a respectiva condenação das rés.

Analisa-se.

Com razão.

Com o escopo de resguardar a incolumidade física e psíquica do trabalhador e aumentar a sua qualidade de vida, o Direito do Trabalho garantiu os chamados períodos de descanso, como os intervalos intra e entre jornadas, bem como coibiu o trabalho em sobrejornada superior a duas horas diárias, salvo em casos excepcionais (art. 59 da C.L.T.). Tais garantias buscam evitar jornadas extenuantes que privem o trabalhador do convívio social e familiar, prática de lazer, atividades culturais, estudos, entre outros.

Os problemas advindos do trabalho extraordinário habitual vão além da mera inadimplência das parcelas relativas ao elastecimento da jornada, pois impõem ao empregado o sacrifício do desfrute de sua própria existência. Tal circunstância é característica nos casos de labor em sobrejornada além dos limites legais, bem como nos caso de acúmulo de funções e de alcance de metas rigorosas que envolvem o cotidiano do trabalhador mesmo fora do local de trabalho e após o término do expediente formal e, ainda, nos casos em que o trabalho enseja a exaustão física e/ou psicológica do trabalhador, de modo que não tenha condições de desfrutar do seu tempo livre.

A consequência dessa hiperexploração do trabalhador passou a ser denominada pela doutrina de dano existencial. A racionalidade utilitarista que acarreta o dano existencial fere os valores ínsitos ao trabalho humano e sacrifica a vida pessoal do trabalhador, que se submete a essa exploração pela necessidade de acréscimo salarial ou em face do temor de perder o emprego. Em última análise, o trabalhador se vê despojado de seu direito à liberdade e à dignidade humana.

Assim, caracteriza-se o dano existencial quando o empregador impõe um volume excessivo de trabalho ao empregado, impossibilitando-o de desenvolver seus projetos de vida nos âmbitos profissional, social e pessoal.

Ressalte-se que a Constituição Federal estabelece em seu art. 6º como direitos sociais fundamentais: "a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos". Quanto às relações desamparados, na forma desta Constituição familiares, a Constituição Federal expressamente estatui que "a entidade familiar, base da sociedade, tem especial proteção do estado" (art. 226).

O C. T.S.T. admite a indenização por dano existencial nas relações de trabalho, conforme fundamentos expressos na seguinte ementa:

DANO MORAL. DANO EXISTENCIAL. SUPRESSÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS. NÃO CONCESSÃO DE FÉRIAS. DURANTE TODO O PERÍODO LABORAL. DEZ ANOS. DIREITO DA PERSONALIDADE. VIOLAÇÃO. 1. A teor do artigo 5º, X, da Constituição Federal, a lesão causada a direito da personalidade, intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas assegura ao titular do direito a indenização pelo dano decorrente de sua violação. 2. O dano existencial, ou o dano à existência da pessoa, "consiste na violação de qualquer um dos direitos fundamentais da pessoa, tutelados pela Constituição Federal, que causa uma alteração danosa no modo de ser do indivíduo ou nas atividades por ele executadas com vistas ao projeto de vida pessoal, prescindindo de qualquer repercussão financeira ou econômica que do fato da lesão possa decorrer." (ALMEIDA NETO, Amaro Alves de. Dano existencial: a tutela da dignidade da pessoa humana. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 6, n. 24, mês out/dez, 2005, p. 68.). 3. Constituem elementos do dano existencial, além do ato ilícito, o nexo de causalidade e o efetivo prejuízo, o dano à realização do projeto de vida e o prejuízo à vida de relações. Com efeito, a lesão decorrente da conduta patronal ilícita que impede o empregado de usufruir, ainda que parcialmente, das diversas formas de relações sociais fora do ambiente de trabalho (familiares, atividades recreativas e extralaborais), ou seja que obstrua a integração do trabalhador à sociedade, ao frustrar o projeto de vida do indivíduo, viola o direito da personalidade do trabalhador e constitui o chamado dano existencial. 4. Na hipótese dos autos, a reclamada deixou de conceder férias à reclamante por dez anos. A negligência por parte da reclamada, ante o reiterado descumprimento do dever contratual, ao não conceder férias por dez anos, violou o patrimônio jurídico personalíssimo, por atentar contra a saúde física, mental e a vida privada da reclamante. Assim, face à conclusão do Tribunal de origem de que é indevido o pagamento de indenização, resulta violado o art. 5º, X, da Carta Magna. ( RR - XXXXX-76.2011.5.24.0002; Ministro Hugo Carlos Scheuermann; 1ª Turma; DEJT 28/06/2013).

A fim de manter uma coerência discursiva, é pertinente estabelecer a diferença entre o dano moral e o dano existencial. O dano moral resulta da infringência de um direito imaterial ou extrapatrimonial do empregado, ao passo que ao dano existencial se acrescenta o fato de ser constatado de forma objetiva, porquanto importa em uma sequência de alterações prejudiciais ao cotidiano, com a consequente perda da qualidade de vida do trabalhador, visto que obstado o seu direito de exercer uma determinada atividade ou de participar de uma forma de convívio inerente à vida privada.Nesse sentido, são ponderosas as considerações de Jorge Cavalcanti Boucinha Filho e Rúbia Zanotelli Alvarenga (acesso em http://www.lex.com.br/doutrina_24160224.

A reparação por dano moral visa a compensar, ainda que por meio de prestação pecuniária, o desapreço psíquico representado pela violação do direito à honra, liberdade, integridade física, saúde, imagem, intimidade e vida privada. O dano existencial, por sua vez, independe de repercussão financeira ou econômica, e não diz respeito à esfera íntima do ofendido (dor e sofrimento, características do dano moral). Trata-se de um dano que decorre de uma frustração ou de uma projeção que impedem a realização pessoal do trabalhador (com perda da qualidade de vida e, por conseguinte, modificação in pejus da personalidade).

Dessa forma, a principal diferença entre os institutos reside no fato de que o dano moral se refere ao sentimento da vítima, de modo que sua dimensão é subjetiva e existe in re ipsa. Por outro lado, o dano existencial diz respeito às alterações prejudiciais no cotidiano do trabalhador, quanto ao seu projeto de vida e suas relações sociais, de modo que sua constatação é objetiva.

Quanto aos elementos integrantes do danos existencial, além dos requisitos inerentes à qualquer forma de dano, como o prejuízo, o ato ilícito e o nexo causal, o conceito é integrado por outros dois elementos: o projeto de vida e a vida de relações. Sobre esses elementos do dano existencial são pertinentes as seguintes considerações:

O primeiro deles Júlio César Bebber associa a tudo aquilo que determinada pessoa decidiu fazer com a sua vida. Como bem pondera o aludido autor, o ser humano, por natureza, busca sempre extrair o máximo das suas potencialidades, o que o leva a permanentemente projetar o futuro e realizar escolhas visando à realização do projeto de vida. Por isso afirma que qualquer fato injusto que frustre esse destino, impedindo a sua plena realização e obrigando a pessoa a resignar-se com o seu futuro, deve ser considerado um dano existencial. Ainda sobre o mesmo elemento, Hidemberg Alves da Frota, observa que o direito ao projeto de vida somente é efetivamente exercido quando o indivíduo se volta à própria autorrealização integral, direcionando sua liberdade de escolha para proporcionar concretude, no contexto espaço-temporal em que se insere, às metas, aos objetivos e às ideias que dão sentido à sua existência.

Quanto à vida de relação, o dano resta caracterizado, na sua essência, por ofensas físicas ou psíquicas que impeçam alguém de desfrutar total ou parcialmente, dos prazeres propiciados pelas diversas formas de atividades recreativas e extralaborativas tais quais a prática de esportes, o turismo, a pesca, o mergulho, o cinema, o teatro, as agremiações recreativas, entre tantas outras. Essa vedação interfere decisivamente no estado de ânimo do trabalhador atingindo, consequentemente, o seu relacionamento social e profissional. Reduz com isso suas chances de adaptação ou ascensão no trabalho o que reflete negativamente no seu desenvolvimento patrimonial. Em suma, o dano à vida de relação, ou dano à vida em sociedade, com bem observa Amaro Alves de Almeida Neto: "indica a ofensa física ou psíquica a uma pessoa que determina uma dificuldade ou mesmo a impossibilidade do seu relacionamento com terceiros, o que causa uma alteração indireta na sua capacidade de obter rendimentos" (BOUCINHAS FILHO, Jorge Cavalcanti e ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de http://www.lex.com.br/doutrina_24160224)

Na espécie dos autos, o dano existencial é objetivo, porque a pessoa se ativava das 7h00 às 10h00, das 12h às 15h e das 17h00 às 01h00, (conforme fixado em item próprio d) trabalhando de segunda a segunda, apenas, portanto com intervalo intrajornada, e, semanalmente das 12 às 15 horas, conforme fixado pela r. sentença. Ainda que nesse intervalo pudesse usufruí-lo como desejasse, inclusive desembarcando, quando possível. O descumprimento das regras de limitação de jornada dá-se por labor efetivo em jornada muito superior ao limite de 10 horas diárias, mesmo em se supondo houvesse intervalo intrajornada. Nesta hipótese, havia prestação de serviços por mais de 12 horas diárias. O dano existencial é objetivo, porque, conforme se apurou, o trabalho se dava das 07h00 às 01h00, sete vezes por semana, apenas com intervalo intrajornada, conforme analisado no item d. Portanto, concluiu-se ser devida indenização por dano existencial fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Reforma-se a r. sentença para condenar as rés ao pagamento de indenização por dano existencial fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Acolhe-se.

h) HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS - ANÁLISE CONJUNTA

Ressai da r. sentença:

"Para que não fiquem dúvidas, esclareço que os honorários assistenciais não foram revogados pela Lei 13.467/2017, subsistindo tanto os honorários assistenciais e de sucumbência.

Nos termos do art. 791-A da CLT, ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

O § 2o do referido artigo diz que ao fixar os honorários, o juízo observará o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.

Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

A norma tem aplicação imediata ao processo do trabalho, diante do princípio do isolamento dos atos processuais, consagrado nos artigos 14, parte final e art. 1.046 do CPC e 915 da CLT.

Nesse sentido é a decisão unânime da primeira turma do E. STF que analisou a questão à luz da Lei 13.467/2017, cujo teor é o seguinte:

Ementa: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DO TRABALHO. ART. 791-A DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, INTRODUZIDO PELA LEI 13.467/2017. INAPLICABILIDADE A PROCESSO JÁ SENTENCIADO.

1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente - a Lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada"Reforma Trabalhista".

2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.

3. Agravo interno a que se nega provimento.( AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.014.675, DOU 12/04/2018).

Portanto, condeno as reclamadas ao pagamento de honorários de sucumbência aos procuradores do reclamante, no importe de 5% sobre o valor de liquidação da sentença, excluídos os valores de terceiros (contribuições previdenciárias e imposto de renda), com base nos parâmetros dispostos no § 2º do art. 791-A da CLT.

Tendo em vista que o autor está assistido por sindicato, deverão também as reclamadas quitar honorários assistenciais no mesmo valor já acima estabelecido, em favor da entidade sindical.

Para que não fiquem dúvidas, esclareço que os honorários assistenciais não foram revogados pela Lei 13.467/2017, subsistindo tanto os honorários assistenciais e de sucumbência.

Em relação ao reclamante, como a petição inicial não apresenta pedidos líquidos, os honorários de sucumbência serão fixados por arbitramento.

Logo, considerando também os parâmetros do § 2º do art. 791-A da CLT e também considerando que o reclamante foi sucumbente em mais da metade de seus pedidos, arbitro os honorários de sucumbência no importe líquido de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Não havendo o pagamento espontâneo dos honorários, o valor será deduzido do crédito do reclamante nestes autos ou em outra reclamatória existente." ( fls. 1504-1505)

Insurge-se o autor. (fls. 1557-1560)

Sustenta ser "incompatível com o processo do trabalho a fixação de honorários de sucumbência ao obreiro que tem pedidos rejeitados, porquanto representa obstáculo ao pleno exercício do direito de ação perante ramo do poder jurisprudencial responsável por restaurar e afirmar a proteção do trabalhador, vale dizer, por concretizar direitos fundamentais de sujeitos partícipes de relação jurídica material que se submetem ao mando de outrem, em disparidade de poder consagrada pelo direito."

Assevera inaplicável a disposição do Código de Processo Civil, pois afrontaria o art. 769 da C.L.T., bem como a Súmula nº 219 do C. T.S.T.. Ainda, inaplicável as modificações trazidas pela Lei nº 13.467/2017 no art. 790 da C.L.T. ante o ajuizamento da ação ser anterior à vigência da citada lei.

Cita precedente do T.S.T. e requer a reforma da r. sentença para afastar a condenação que lhe foi imputada.

Insurgem-se também as rés.(fls. 1574-1577)

Sustentam que, proferida a r. sentença na vigência da Lei 13.467/2017, merece reforma acerca do quantum indenizatório. Sugerem o percentual de "15% do benefício econômico a ser calculado sobre o valor liquidado dos pedidos". (destaque no original)

"Analisando-se o valor requerido na exordial apenas para o título de danos existenciais, tendo em vista que o Autor alega que recebia salário no valor de R$ 8.000,00 e pleiteia valor equivalente à 100 (cem) vezes o seu salário, verifica-se o valor equivalente à R$ 800.000,00, além dos valores em decorrência dos demais pleitos, que também foram indeferidos."

Analisa-se.

Assiste razão à parte autora.

Nos termos da Instrução Normativa nº 41/2018 do C. T.S.T., em seu artigo , assiste razão ao autor no que diz respeito à não incidência da Lei 13.467/2017 ao caso sub judice, pois o ajuizamento da ação ocorreu em 2016, portanto, como asseverado em recurso, anteriormente ao advento da invocada norma.

O entendimento que prevalece no âmbito desta E. Turma é no sentido de que os requisitos para o acolhimento de honorários advocatícios há muito são regidos pela Lei nº 5.584/1970, pela Súmulas nº 219 e 329, ambas do C. T.S.T., e pela Súmula nº 17 deste Tribunal Regional.

A Lei nº 13.467/2017, que alterou uma série de dispositivos da C.L.T., entrou em vigor em 11 de novembro de 2017 e trouxe mudanças na sistemática afeta aos honorários advocatícios no âmbito da Justiça do Trabalho. O art. 791-A da C.L.T., acrescido pela Lei nº 13.467/2017, possui o seguinte teor:

Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

§ 1º - Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua categoria.

Há, como seria previsível, grande celeuma em face da profunda modificação perpetrada, especialmente no que tange à aplicação do novo comando aos processos que se encontram em curso.

Em minucioso estudo a respeito da matéria, o eminente magistrado e doutrinador Eduardo Milléo Baracat (Honorários de sucumbência recíproca na Justiça do Trabalho Lei nº 13.467/2017: segurança jurídica, aplicação intertemporal e critérios de fixação, in http://www.amatra9.org.br/honorarios-de-sucumbencia-reciproca-na-justica-do-trabalholei-no-13-4672017-seguranca-juridica-aplicacao-intertemporalecriterios-de-fixacao-eduardomilleo-baracat/) faz considerações acerca da segurança jurídica como mito, como valor, como princípio e como direito fundamental. E assevera que, conquanto prevaleça no direito processual civil brasileiro, o sistema do isolamento do ato processual, as regras processuais que aplicam a esse sistema devem ser interpretadas sob os influxos dos princípios constitucionais, como o da segurança jurídica.

Segue o doutrinador observando que, "de qualquer forma, a própria regra processual, no caso particular o art. 14 do CPC, atende explicitamente o comando constitucional de se respeitar o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada" e acentua que o art. 14 do CPC dispõe que a lei nova não prejudicará o ato processual realizado, nem a situação jurídica consolidada.

Acerca desse aspecto, especificamente, pondera ser "necessário compreender que a petição inicial, enquanto ato processual, cria uma situação jurídica que vincula autor e juiz, e atribui a esses sujeitos processuais, poderes e deveres que deverão ser realizados com vistas à prestação jurisdicional" (sem grifos no original) e que "a situação jurídica consolidada, portanto, não é aquela que já foi concluída, mas, sim, aquela que está apta a atribuir poderes e deveres aos sujeitos processuais".

No que se refere ao entendimento preconizado pelo Superior Tribunal de Justiça a respeito da matéria, endende-se ser inaplicável, pois considera, exclusivamente, o sistema de isolamento dos atos processuais, sem interpretar a regra do art. 791-A à luz da situação jurídica consolidada e do princípio da segurança jurídica. Oportuno, a esse respeito, transcrever outro trecho do artigo já mencionado:

Não há qualquer sentido a apreciação dessa questão à luz da jurisprudência do STJ, na medida em que, naquela corte, por questões de competência material ( Constituição, art. 114), jamais se discutiu o cabimento dos honorários de sucumbência numa relação processual entre empregado e empregador, em que se admite o jus postulandi das partes. Adotar pura e simples entendimento do STJ, nesse tema, significaria negar todo o sistema principiológico do Direito do Trabalho, como também diminuir a importância da jurisprudência construída ao longo de décadas no âmbito do TST.

A conclusão, com esteio nas ponderosas considerações doutrinárias reproduzidas, é de que o art. 791-A da C.L.T., com redação dada pela Lei nº 13.467/2017, não se aplica aos processos iniciados antes de sua vigência, "visto que havia situação jurídica consolidada com base em norma de direito material vigente à época decorrente de entendimento jurisprudencial consolidado na Súmula nº 219 do T.S.T., segundo o qual na Justiça do Trabalho, os honorários de sucumbência não decorrem pura e simplesmente da sucumbência e são devidos honorários de sucumbência apenas ao reclamante, quando sucumbente o reclamado, mesmo parcialmente" (ibid).

Além disso, o art. 6º da Instrução Normativa nº 41/2018 afasta a aplicação da Lei 13.467/2017 às ações ajuizadas anteriormente à vigência desta.

Prevalece, portanto, para a hipótese dos autos, o disposto na Lei nº 5.584/1970 e na Súmula nº 219 do c. T.S.T., com a interpretação que se lhe vinha aplicando até o momento.

Em razão de todo exposto, impende a rejeição do pedido recursal das rés.

Nesse passo, reformo a r. sentença para excluir a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios.

Rejeita-se o recurso das rés.

Acolhe-se o recurso do autor.

i) IPCA-E

Ressai da r. sentença:

"O valor da condenação deverá ser corrigido monetariamente desde o inadimplemento das verbas até a data do efetivo pagamento do débito. Sendo assim, para efeito da correção monetária, fixo o termo a quo no dia do vencimento da obrigação, vez que só incorre em mora o devedor ao não efetuar o pagamento no tempo devido (artigo 397 do Código Civil e Súmula 381 do C. TST). No procedimento da atualização monetária, deverá ser utilizada a tabela única de atualização de débitos trabalhistas a que alude a Resolução no. 8/2005 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho.

Responderá a parte reclamada pelo pagamento dos juros de mora devidos a partir da data em que foi ajuizada a ação (artigo 883 da CLT). Para tanto, os juros referidos incidirão sobre a importância da condenação já corrigida monetariamente nos termos da Súmula 200 do C. TST, calculados na base de 1% a.m. (um por cento ao mês), de forma simples (não capitalizados), e aplicados pro rata die, nos termos do parágrafo primeiro, do artigo 39, da Lei 8.177/91. Na eventualidade de haver adimplementos parciais do crédito exeqüendo, o valor parcialmente adimplido deve ser abatido, proporcionalmente, tanto do valor já corrigido monetariamente, como do respectivo valor dos juros.

A respeito do critério de cálculo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço cumpre esclarecer que em se tratando de valores do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço não recolhidos a tempo, sendo a verba deferida judicialmente, submete-se ela aos mesmos critérios de atualização dos débitos trabalhistas.

Somente os valores do fundo de garantia que se encontram depositados na CEF pelo empregador, ao longo do contrato de trabalho, sofrem a correção monetária com os índices editados pela entidade gestora.

A correção monetária e os juros incidirão até a data do efetivo pagamento, conforme Súmula 5 do E. Regional." (fl. 1505)

Insurge-se o autor (fls. 1560-1561).

O autor pretende a reforma do decisum para que a atualização monetária seja feita com base no IPCA-E, alegando não atender à manutenção do poder de compra dos valores de natureza alimentar, inerente ao crédito trabalhista. Assim, ao adotar a taxa referencial - TR resulta ofensa ao direito do credor, em violação à própria efetividade do título judicial. Cita decisões do C. STF sobre o tema: ADINs 4357, 4372, 4400 e 4425 e do C. T.S.T.

Analisa-se.

A análise da pretensão importa numa digressão dos fatos. Em 31 de agosto de 2015 o C.S.J.T. disponibilizou a nova tabela de atualização monetária de débitos trabalhistas. O novo índice deveria ser aplicado sobre os valores devidos a partir de 30 de junho de 2009 e decorreu da decisão proferida em 4 de agosto de 2015 (processo ArgInc- XXXXX-60.2011.5.04.0231), com efeito modulatório, em que o Pleno do Tribunal Superior do Trabalho (TST) declarou inconstitucional a atualização dos valores pela Taxa Referencial (TR), índice previsto no artigo 39 da Lei 8.177/1991, e que vinha sendo aplicado desde então. Em substituição à TR, foi determinada a adoção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo- Especial (IPCA-E). Segundo argumentos do c. TST, "a medida visa corrigir a injustiça ocasionada pelo índice adotado até então, uma vez que a TR é prefixada, ou seja, com variação divulgada para o mês seguinte, o que dificultava a definição de índices diários do mês corrente. Já o IPCA-E é calculado com base na inflação do mês anterior e, assim, vigora fixo no mês inteiro, calculando-se apenas os juros até a data do pagamento".

Nesse sentido, destaco, após esse breve retrospecto histórico, que a TR - Taxa referencial - é uma taxa de juros criada pela Lei 8.177/91, que instituiu regras para a desindexação da economia, e extinguiu outros índices (MVR, BTN e BTN Fiscal). Para atualização dos débitos trabalhistas, o art. 39 da Lei 8177/91 expressamente determina a utilização da TR.

Ao julgar as ADI 493, ADI 4357 e 4425, o STF declarou a inconstitucionalidade por arrastamento da utilização da TR para atualização dos débitos a serem pagos por meio de precatórios. Portanto, a partir de 25/3/2015 passaram a ser atualizados pelo IPCA-e.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, o Tribunal Pleno do TST, no julgamento da ArgInc nº XXXXX-60.2011.5.04.0231 afastou a aplicação da Taxa Referencial (TR) e passou a considerar o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-e) como o índice adequado para incidência da correção monetária dos débitos trabalhistas, a partir de 14/8/2015, editando tabelas de atualização. Cita-se:

ARGUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. EXPRESSÃO "EQUIVALENTES À TRD" CONTIDA NO ARTIGO 39 DA LEI Nº 8.177/91. RATIO DECIDENDI DEFINIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE POR ARRASTAMENTO, POR ATRAÇÃO, CONSEQUÊNCIA, DECORRENTE OU REVERBERAÇÃO NORMATIVA. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO. MODULAÇÃO DE EFEITOS AUTORIZADA PELA INTEGRAÇÃO ANALÓGICA PREVISTA NO ARTIGO 896-C,M § 17, DA CLT, INTRODUZIDO PELA LEI Nº 13.015/2014. RESPEITO AO ATO JURÍDICO PERFEITO. (...) Em conclusão: declara-se a inconstitucionalidade por arrastamento da expressão "equivalentes à TRD", contida no caput do artigo 39 da Lei nº 8.177/91; adota-se a técnica de interpretação conforme a Constituição para o texto remanescente do dispositivo impugnado, a preservar o direito à atualização monetária dos créditos trabalhistas; define-se a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) como fator de atualização a ser utilizado na tabela de atualização monetária dos débitos trabalhistas na Justiça do Trabalho; e atribui-se efeito modulatório à decisão, que deverá prevalecer a partir de 30 de junho de 2009 (data de vigência da Lei nº 11.960/2009, que acresceu o artigo 1º-F à Lei nº 9.494/1997, declarado inconstitucional pelo STF, com o registro de que essa data corresponde à adotada no Ato de 16/04/2015, da Presidência deste Tribunal, que alterou o ATO.TST.GDGSET.GP.Nº 188, de 22/4/2010, publicado no BI nº 16, de 23/4/2010, que estabelece critérios para o reconhecimento administrativo, apuração de valores e pagamento de dívidas de exercícios anteriores - passivos - a magistrados e servidores do Tribunal Superior do Trabalho), observada, porém, a preservação das situações jurídicas consolidadas resultantes dos pagamentos efetuados nos processos judiciais em virtude dos quais foi adimplida a obrigação, em respeito à proteção ao ato jurídico perfeito, também protegido constitucionalmente (art. 5º, XXXVI). ( ArgInc - XXXXX-60.2011.5.04.0231 , Relator Ministro: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 04/08/2015, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DEJT 14/08/2015).

Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, em liminar proferida em 14.10.2015 na reclamação constitucional apresentada pela FEDERAÇÃO NACIONAL DOS BANCOS - FENABAM ( RCL 22012 MC/RS), decidiu que a Corte Trabalhista usurpou a competência do Pretório Excelso, pois se manifestou sobre matéria constitucional não submetida à repercussão geral, bem como declarou a inconstitucionalidade de norma, que, no entender do Ministro DIAS TOFFOLI - Relator da decisão em comento -, não possui dependência com os dispositivos declarados inconstitucionais pelo STF nas ADI"s Nº 4357 e 4372. Por fim, ressaltou o Ministro Relator que o próprio Supremo, nas referidas decisões, declarou expressamente a inconstitucionalidade por arrastamento apenas do art. da Lei 9.494/1997, o qual se refere a créditos devidos por entes públicos, existindo, portanto, um limite objetivo, a ser respeitado pelo TST.

Dessa forma, permaneceu o entendimento de que o índice de correção monetária aplicável aos débitos trabalhistas é o fixado no art. 39 da Lei 8.177/1991, como sendo a taxa referencial. No mesmo sentido é o teor da OJ 300, da SDI-1/TST, in verbis:

300. EXECUÇÃO TRABALHISTA. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. LEI Nº 8.177/91, ART. 39, E LEI Nº 10.192/01, ART. 15 (nova redação) - DJ 20.04.2005. Não viola norma constitucional (art. 5º, II e XXXVI) a determinação de aplicação da TRD, como fator de correção monetária dos débitos trabalhistas, cumulada com juros de mora, previstos no artigo 39 da Lei nº 8.177/91 e convalidado pelo artigo 15 da Lei nº 10.192/01.

Contudo, o mérito da reclamação foi julgado improcedente pela 2ª Turma do STF em 5.12.2017 e, como consequência, foi revogada a liminar anteriormente deferida, de modo que se restabeleceu a decisão do TST de aplicação do IPCA-e aos débitos trabalhistas.

A propósito, cumpre destacar a notícia extraída do site oficial do STF:

"Terça-feira, 05 de dezembro de 2017

2ª Turma julga improcedente ação da Fenaban sobre atualização de débitos trabalhistas

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) julgou improcedente, na sessão desta terça-feira (5), a Reclamação (RCL) 22012, ajuizada pela Federação Nacional dos Bancos (Fenaban) contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que determinou a adoção do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) no lugar da Taxa Referencial Diária (TRD) para a atualização de débitos trabalhistas. Prevaleceu o entendimento de que a decisão não configura desrespeito ao julgamento do STF nas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) 4357 e 4425, que analisaram a emenda constitucional sobre precatórios.

A decisão do TST e a tabela única editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) estavam suspensas desde outubro de 2015 por liminar do ministro Dias Toffoli, relator da RCL 22012. O mérito começou a ser julgado em setembro, e o relator, em seu voto, rejeitou a conclusão do TST de que a declaração de inconstitucionalidade da expressão "equivalentes à TRD", no caput do artigo 39 da Lei 8.177/1991, ocorreu por arrastamento (ou por atração) da decisão do STF nas ADIs 4357 e 4425.

Na sessão de hoje, o ministro Gilmar Mendes apresentou voto-vista acompanhando o relator, por considerar que a decisão do TST extrapolou os limites de sua competência, ao aplicar entendimento firmado pelo Supremo em controle abstrato de inconstitucionalidade, com efeito vinculante a hipótese não abrangida.

Na conclusão do julgamento, porém, prevaleceu a divergência aberta pelo ministro Ricardo Lewandowski em setembro, no sentido da improcedência da reclamação. Ele citou diversos precedentes das duas Turmas no sentido de que o conteúdo das decisões que determinam a utilização de índice diverso da TR para atualização monetária dos débitos trabalhistas não possui aderência com o decidido pelo STF nas duas ADIs. Seguiram a divergência os ministros Celso de Mello e Edson Fachin, formando assim a corrente majoritária no julgamento."

Por conseguinte, fica restabelecida a decisão adotada pelo Pleno do colendo TST no julgamento da Arguição de Inconstitucionalidade (ArgInc) XXXXX-60.2011.5.04.0231, que afastou o uso da TRD, determinando a adoção do IPCA-E para atualização dos créditos trabalhistas."

Em consulta ao andamento processual da Rcl 22012/RS (http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=22012&classe=Rcl- MC&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M) verifica-se que a certidão de julgamento foi divulgada no dia 13 de dezembro de 2017 no DJE nº. 288, página 97, Ata nº. 35, e publicada no dia 14 de dezembro de 2017.

Todavia, devo registrar a superveniência de decisão do TST, no sentido de que deve ser mantida a aplicação da TRD para as verbas trabalhistas devidas até 24/03/2015 e que, a partir de 25/03/2015, aplica-se o IPCA-E:

"CORREÇÃO MONETÁRIA. IPCA-E. CORREÇÃO MONETÁRIA.IPCA-E. 1. O Supremo Tribunal Federal, nos autos das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nos 4.357, 4.372, 4.400 e 4.425, reconheceu a inconstitucionalidade da regra inserida no art. 100 da CF, por força da Emenda Constitucional nº 62, especificamente do seu § 12, no tocante à expressão"índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança"nele abrigada. 2. Esta Corte Superior, em sua composição plenária, nos autos do processo nº TST - ArgInc - XXXXX-60.2011.5.04.0231, analisou a constitucionalidade da diretriz insculpida no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/91, na parte em que determina a utilização da variação acumulada da TRD para fins de atualização monetária, à luz da interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal, consoante suso mencionado. Na ocasião, declarou-se a inconstitucionalidade, por arrastamento, da expressão"equivalentes à TRD", contida no caput do art. 39 da Lei nº 8.177/91; adotou-se a técnica da interpretação conforme a Constituição para manter o direito à atualização monetária dos créditos trabalhistas mediante a incidência do índice que reflita a variação plena da inflação; definiu-se a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) como fator de atualização a ser utilizado na tabela de atualização monetária dos débitos trabalhistas na Justiça do Trabalho; e determinou-se a modulação dos efeitos para que, nos processos em curso, incidisse a aplicação do IPCA-E como parâmetro de atualização monetária a partir de 30 de junho de 2009, singularidade da decisão em que fiquei vencida, porquanto entendi ser aplicável a modulação dos efeitos da decisão a contar de 26 de março de 2015. 3. Entretanto, posteriormente à decisão plenária desta Corte Superior trabalhista, o Supremo Tribunal Federal, em 14/10/2015, por meio de decisão monocrática da lavra do Ministro Dias Toffoli, nos autos da Reclamação nº 22.012, ajuizada pela Federação Nacional dos Bancos, deferiu liminar para suspender os efeitos da decisão proferida por esta Corte na Arguição de Inconstitucionalidade nº TST- ArgInc-XXXXX-60.2011.5.04.0231, bem como da tabela única editada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho. 4. Em sede de embargos de declaração, e diante da decisão monocrática supramencionada, o Pleno desta Corte Superior, ao julgar os embargos de declaração opostos à decisão proferida no processo nº TST - ArgInc - XXXXX-60.2011.5.04.0231, concluiu pela modulação dos efeitos da decisão a contar de 26 de março de 2015. 5. Logo, esta Turma, tendo em vista a decisão do STF mencionada, vinha entendendo que o art. 39 da Lei nº 8.177/91 permanecia em plena vigência, razão pela qual devia ser mantida a Taxa Referencial como índice de atualização dos créditos trabalhistas. 6. Entretanto, esta Turma, alterando o posicionamento suso mencionado e acompanhando a jurisprudência desta Corte Superior, passou a adotar a tese de que, na correção dos créditos trabalhistas, observa-se o art. 39 da Lei nº 8.177/1991, aplicando-se a TR até 24/3/2015 e o IPCA a partir de 25/3/2015, com fundamento, justamente, na decisão do Tribunal Pleno desta Corte Superior (TST - ArgInc - XXXXX-60.2011.5.04.0231 e ED - ArgInc - XXXXX-60.2011.5.04.0231). Agravo de instrumento conhecido e não provido." (TST-IRR XXXXX-43.2015.5.24.0091, Data de Julgamento: 07/03/2018, Relatora Ministra: Dora Maria da Costa, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 09/03/2018).

Desse modo, deve-se aplicar o IPCA-E como índice de correção monetária a partir de 25/03/2015.

Por fim, não se cogita a aplicação do novel parágrafo 7º do art. 879 da C.L.T., introduzido pela Lei 13.467/2017 (Reforma Trabalhista), pois já houve a declaração de inconstitucionalidade da aplicação da T.R.pelo S.T.F., conforme acima explanado.

Quanto ao entendimento de que a decisão do S.T.F. não é vinculante, cabem algumas ponderações. Dispõe o parágrafo único do art. 949 do C.P.C./2015:

Se a arguição for:

I - rejeitada, prosseguirá o julgamento;

II - acolhida, a questão será submetida ao plenário do tribunal ou ao seu órgão especial, onde houver.

Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário ou ao órgão especial a arguição de inconstitucionalidade quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão.

Entendo que o dispositivo libera este Colegiado de submeter ao Pleno ou ao Órgão Especial a arguição de inconstitucionalidade incidental. Conquanto se possa vislumbrar, na inovação produzida pela lei, uma tentativa de atribuir, mesmo que indiretamente, efeito vinculante às decisões do STF, é de se reconhecer que simplifica o controle de constitucionalidade das leis, em homenagem aos princípios da economia e da celeridade processual.

Ainda na vigência do C.P.C. de 1973, o entendimento desta relatora era de que tais princípios inspiraram o acréscimo de um parágrafo único ao art. 481, dispensando expressamente os órgãos fracionários dos tribunais de remeter ao Pleno, ou ao Órgão Especial ( CF, art. 97) as arguições de inconstitucionalidade, quando sobre a questão já se houverem pronunciado o próprio tribunal ou o Supremo Tribunal Federal.

Ademais, foi declarada a inconstitucionalidade do parágrafo 7º do art. 879 da C.L.T. pelo E. Tribunal Pleno deste Regional, nos autos do processo nº XXXXX-18.2018.5.09.0000, publicado em 01/02/2019.

ADMITIR a Arguição de Inconstitucionalidade. No mérito, DAR-LHE PROVIMENTO para declarar a inconstitucionalidade material do § 7º do art. 879 da CLT, incluído pela Lei nº 13.467/2017, nos termos da fundamentação.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso ordinário para determinar a utilização do IPCA-E.

Acolhe-se.

j) COMPENSAÇÃO E ABATIMENTO

Ressai da r. sentença:

"Relativamente ao abatimento de valores adimplidos parcialmente em relação às verbas aqui deferidas, meu entendimento é no sentido de que os abatimentos de valores adimplidos sob títulos idênticos devem ser feitos independentemente do mês de pagamento, de forma global, sobre a totalidade do crédito, a fim de evitar o enriquecimento sem causa de uma das partes.

Assim, eventual pagamento a maior efetuado pelo empregador num mês gerará saldo residual em seu favor e será transferido para o mês seguinte, de modo que o credor receba apenas o que lhe é devido, e nada mais.

Nesse sentido cito a OJ 415 da SBI-1 do TST e a Súmula 29 do TRT da 9ª Região, respectivamente, com o seguinte teor:

415. HORAS EXTRAS. RECONHECIMENTO EM JUÍZO. CRITÉRIO DE DEDUÇÃO/ABATIMENTO DOS VALORES COMPROVADAMENTE PAGOS NO CURSO DO CONTRATO DE TRABALHO. A dedução das horas extras comprovadamente pagas daquelas reconhecidas em juízo não pode ser limitada ao mês de apuração, devendo ser integral e aferida pelo total das horas extraordinárias quitadas durante o período imprescrito do contrato de trabalho. (publicada no DETST - Diário Eletrônico do TST nº 919, dia 14.02.2012)

CRITÉRIO DE DEDUÇÃO/ABATIMENTO DE VALORES COMPROVADAMENTE PAGOS NO CURSO DO CONTRATO DE TRABALHO. Abatimentos de parcelas salariais pagas mensalmente deverão ser realizados pelo critério global (integral), aferidas pelo total dessas mesmas verbas quitadas durante o período laboral imprescrito, observando-se a equivalência dos títulos a serem liquidados e abatidos.

Portanto, o abatimento dos valores pagos deve ser feito de forma a que todo o valor recebido pelo empregado seja deduzido do montante apurado na fase de liquidação, observando-se apenas a equivalência dos títulos." (fls. 1507-1508)

Em sede de Embargos de Declaração, o MM. Julgador decidiu:

"Relativamente ao abatimento de valores adimplidos parcialmente em relação ás verbas aqui deferidas, meu entendimento é no sentido de que os abatimentos de valores adimplidos sob títulos idênciticos devem ser feitos independentemente do mês de pagamento, de forma global, sobre a totalidade do crédito, a fim de evitar o enriquecimento sem causa de uma das partes. Em relação às férias, tal dedução se faz frente à parcela" Leave Pay ".(fl. 1567)

Insurge-se o autor. (fl.1563)

Inconformado, o autor sustenta que não há que se considerar que as recorridas tenham adimplido qualquer das verbas pleiteadas na presente ação, vez que, todos os valores por ele auferidos durante a contratualidades, na realidade, constituem salário. Argumenta que, conforme os recibos de pagamento, há ausência de correspondência entre o contratado e o efetivamente adimplido. Ademais, as verbas descritas nos comprovantes de pagamento são todas pré contratadas, não decorreram da ocorrência de nenhum fato gerador ou aquisição de direito.

Ressalta que competia às rés demonstrarem a legitimidade dos pagamentos e a legalidade de cada título pelo princípio da aptidão do ônus da prova, para a verificação de quais títulos efetivamente foram adimplidos. Assim, pretende o afastamento da determinação de abatimento global de verbas.

Requer, portanto, a reforma da r. decisão de origem afastando a possibilidade de abatimento global.

Analisa-se.

Assiste razão ao autor.

Conforme visto nos itens anteriores, foi fixado que a remuneração da autora, para fins de apuração das horas extras, aquele descrita nos contratos sob a rubrica" ordenados mensais totais ", ou seja, a soma das rubricas pré contratadas, portanto previsto nos contratos de trabalho, conforme o item d. Assim, esta C. Turma já considerou que todos os títulos descritos nos contratos (horas extras, sábados/domingos/feriados, bonificação extra, licenças...) representavam, na verdade, salário, tendo feito expressa exceção ao abatimento das horas extras pré-contratadas.

Nesse contexto, com o máximo respeito ao entendimento prolatado na r. sentença, entende-se que assiste razão ao recorrente quanto à impossibilidade de abatimento das verbas pagas comprovadamente sob o mesmo título, visto que houve pré-contratação de parcelas, com o pagamento de salário complessivo, razão pela qual restou reconhecido por esta C. Turma que a totalidade do valor contratado correspondia a salário. Não há, pois, como se determinar o abatimento sem saber ao certo o que efetivamente foi pago e a que título à obreira, ônus que competia à empregadora.

Diante do exposto, dou provimento para afastar a determinação de abatimento global.

Acolhe-se.

Conclusão do recurso

Recurso da parte ré - PULLMANTUR S.A. e PULLMANTUR CRUZEIROS DO BRASIL LTDA.

a) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS - DO PARÂMETRO DE ARBITRAMENTO

Ante a identidade da matéria, foi realizada análise conjunta ao pedido recursal do autor, item h, ao qual se reporta por economia processual.

b) INDEFERIMENTO DA JUSTIÇA GRATUITA - DA CONDENAÇÃO DO RECORRIDO NO PAGAMENTO DE CUSTAS PROCESSUAIS

Em razão da identidade da matéria, o pedido recursal das rés será analisado em conjunto com o recurso do autor (item a), ao qual se reporta por economia processual.

c) INCOMPETÊNCIA MATERIAL DA JUSTIÇA DO TRABALHO - COMPETÊNCIA DO PAÍS DA BANDEIRA DA EMBARCAÇÃO - VIOLAÇÃO À LEI DO PAVILHÃO - INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA BRASILEIRA X APLICABILIDADE DA LEI ( CLT X CONVENÇÃO DO TRABALHO MARÍTIMO DA OIT/LEI DO PAVILHÃO)- AUSÊNCIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL - PREVALÊNCIA HIERÁRQUICA DA LEI DO PAVILHÃO SOBRE A LEI 7.064/1982 E AO PRINCÍPIO DO CENTRO DE GRAVIDADE, DO PRINCÍPIO DA NORMA MAIS BENÉFICA E DO LOCAL DA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS - PREVALÊNCIA DA LEI DA BANDEIRA E DA CONVENÇÃO DO TRABALHO MARÍTIMO DA OIT - TESE DE REPERCUSSÃO GERAL DO STF - PRINCÍPIO DA AUTONOMIA PRIVADA COLETIVA - DIREITO MATERIAL APLICADO AOS CONTRATOS INTERNACIONAIS MARÍTIMOS: MLC (CONVENÇÃO DE TRABALHO MARÍTIMO DA OIT) E ACTS INTERNACIONAIS

Ressai da r. sentença:

"Em relação às diversas matérias preliminares invocadas pelas reclamadas, peço vênia para utilizar como razões de decidir os fundamentos adotados por este Regional em recente julgado envolvendo as mesmas reclamadas e as mesmas matérias, por adequarem-se perfeitamente com o entendimento deste magistrado:

"O MM. Juízo de origem decidiu pela competência desta Justiça Especializada para processar e julgar esta lide, ao fundamento de que a reclamante embarcava no Brasil, fazendo a temporada brasileira que durava cerca de três meses, estendendo-se até a Europa, onde encerravam as atividades. Consignou, ainda, que os documentos constantes dos autos indicam que a contratação se deu no Brasil (São Paulo/SP). Assim, concluiu que"considerando que a reclamante prestou serviços tanto no Brasil como no exterior, bem como que as pretensões da reclamante se baseiam na CLT, presume-se que a legislação brasileira é mais favorável (no mesmo sentido a Lei nº 7.064/1982, artigo 14 e o artigo 12, caput do mesmo Decreto-lei), sendo a Justiça do Trabalho competente para julgar e processar a demanda."- fl. 193.

A reclamada não se conforma com essa r.decisão. Sustenta, em suma, tratar-se de contrato internacional de trabalho, uma vez que a reclamante não foi contratada para trabalhar no Brasil, mas, sim, em águas estrangeiras, como reconhecido em exordial, e as relações trabalhistas dos tripulantes das embarcações são regidas pela legislação correspondente à bandeira do navio, conforme previsto no Código de Bustamonte (recepcionado pelo ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 18.871/29) e não pela Consolidação das Leis do Trabalho ( CLT).

Acrescenta que o contrato foi assinado a bordo do navio, conforme confessado pela reclamante, em interrogatório, o que confirma a tese de defesa de que os contratos são e sempre foram assinados sob jurisdição totalmente diferente da brasileira. Ainda. Assevera que" próprio TAC firmado com o Ministério Público do Trabalho prevê a possibilidade através de contrato internacional, desde que, a prestação de serviços não se dê somente em temporada brasileira. "- fl. 221.

Afirma que o contrato de trabalho ora em análise é regulado nacionalmente pela Resolução Normativa nº 71/06, do Ministério do Trabalho e Emprego - Conselho Nacional de Imigração, que dos termos do artigo 8º, em sendo incontroverso que a prestação de serviços não se deu de forma exclusiva em águas brasileiras, conclui-se que a reclamante foi contratada para ativar-se em contratos de trabalho internacional, por tempo determinado.

Por fim, defende a efetividade/aplicabilidade imediata das convenções internacionais da OIT ratificadas pelo Brasil como fonte formal de direito, equivalente às emendas constitucionais, como previsto na Constituição Federal (fls. 217/233).

Pois bem.

Incontroverso que a reclamante trabalhou em cruzeiros da reclamada não só em águas nacionais, mas, também, em águas estrangeiras (interrrogatório da reclamante - depoimento audiovisual - e contestação - fls. 113/114). Além de grande parte do trabalho ter sido realizado em águas brasileiras, inclusive na temporada brasileira, reclamante e reclamada também são nacionais (fl. 138).

Ainda. Como observado pelo MM. Juízo de origem, o documento de fls. 50/51 (o qual trata da documentação, exames e formulários necessários para a contratação) consigna endereço de São Paulo no rodapé, concluindo-se que a contratação ocorreu no Brasil. O fato de parte da documentação ser entregue no embarque não altera tal entendimento, pois parte dela era entregue antes na empresa ShipJobs, em São Paulo, sob pena de o embarque sequer ser autorizado, conforme expressamente consignado no documento (fl. 51). Assim, força concluir que a contratação efetiva se dava no Brasil, e tão-somente a formalização ocorria a bordo.

Mesmo que assim não fosse, apesar de o artigo 9º, da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro (LINDB), fixar a competência pelo local de constituição da obrigação, no âmbito trabalhista há regra própria, fixando a competência pelo local da prestação do serviços, tendo sido consagrado o princípio da territorialidade no ordenamento justrabalhista.

Outrossim, em que pese alegue a reclamada que constou do contrato de trabalho que qualquer situação envolvendo as partes seria submetida à jurisdição e legislação referente à bandeira do navio (fls. 222/223), os documentos trazidos aos autos encontram-se redigidos em língua estrangeira (inglês), sem a observância, portanto, ao disposto no artigo 157, do CPC (versão em vernáculo, firmada por tradutor juramentado). Por isso, tais documentos não podem ser considerados.

Ressalte-se que o artigo 8º, da Resolução Normativa nº 71/06, do Conselho Nacional de Imigração, mencionado pela reclamada, assim dispõe:

"Os brasileiros recrutados no Brasil e embarcados para laborar apenas durante a temporada de cruzeiros marítimos pela costa brasileira deverão ser contratados pela empresa estabelecida no Brasil ou na ausência desta, pelo agente marítimo responsável pela operação da embarcação, cujo contrato de trabalho será vinculado à legislação trabalhista brasileira aplicável à espécie.

Parágrafo Único. Considera-se temporada de cruzeiros marítimos pela costa brasileira o período compreendido entre 30 (trinta) dias antes da partida da embarcação para o primeiro porto brasileiro até 30 (trinta) dias depois da saída do último porto brasileiro, incluindo neste período eventuais ausências das águas jurisdicionais brasileiras."(grifos acrescidos).

Portanto, ainda que o navio não tenha navegado somente em águas brasileiras, consoante dispositivo legal transcrito supra, isso não impede a aplicação do ordenamento jurídico brasileiro, pois a reclamante trabalhou também na temporada brasileira de cruzeiros marítimos.

O Termo de Ajuste de Conduta mencionado pela reclamada reforça a aplicação da lei brasileira no caso, já que estabeleceu o compromisso de observar a legislação trabalhista do Brasil quando firmados nacionais para laborar em cruzeiros na temporada brasileira, hipótese em análise.

Aliás, também o c. TST entende que a contratação do empregado para iniciar a prestação de serviços em território brasileiro impõe a aplicação da legislação brasileira, conforme e observa da seguinte ementa:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL E QUE DESENVOLVEU PARTE DO CONTRATO DE TRABALHO EM ÁGUAS TERRITORIAIS BRASILEIRAS. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. INAPLICABILIDADE DA ANTIGA SÚMULA 207/TST (HOJE, INCLUSIVE, JÁ CANCELADA). A jurisprudência trabalhista, sensível ao processo de globalização da economia e de avanço das empresas brasileiras para novos mercados no exterior, passou a perceber a insuficiência e inadequação do critério normativo inserido na antiga Súmula 207 do TST (lex loci executionis) para regulação dos fatos congêneres multiplicados nas duas últimas décadas. Nesse contexto, já vinha ajustando sua dinâmica interpretativa, de modo a atenuar o rigor da velha Súmula 207/TST, restringido sua incidência, ao mesmo tempo em que passou a alargar as hipóteses de aplicação das regras da Lei n. 7.064/1982. Assim, vinha considerando que o critério da lex loci executionis (Súmula 207) - até o advento da Lei n. 11.962/2009 - somente prevalecia nos casos em que foi o trabalhador contratado no Brasil para laborar especificamente no exterior, fora do segmento empresarial referido no texto primitivo da Lei n. 7064/82. Ou seja, contratado para laborar imediatamente no exterior, sem ter trabalhado no Brasil. Tratando-se, porém, de trabalhador contratado no País, que aqui tenha laborado para seu empregador, sofrendo subsequente remoção para país estrangeiro, já não estaria mais submetido ao critério normativo da Convenção de Havana (Súmula 207), por já ter incorporado em seu patrimônio jurídico a proteção normativa da ordem jurídica trabalhista brasileira. Em consequência, seu contrato no exterior seria regido pelo critério da norma jurídica mais favorável brasileira ou do país estrangeiro, respeitado o conjunto de normas em relação a cada matéria.

Mais firme ainda ficou essa interpretação após o recente cancelamento da velha Súmula 207/TST. No caso concreto, ficou evidenciado que o Reclamante foi contratado no Brasil e que parte do tempo de duração do contrato de trabalho desenvolveu-se em águas territoriais brasileiras. Não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui a decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido"( AIRR - XXXXX-64.2008.5.02.0445. Data de Julgamento: 13/08/2013, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 3ª Turma, Data de Publicação: DEJT 16/08/2013), grifos acrescidos Assim, considerando que a reclamante foi contratada no Brasil, desempenhando grande parte do trabalho em águas territoriais brasileiras, inclusive, na temporada brasileira, bem assim, que reclamante e reclamada são brasileiros, esta Justiça Especializada é a competente para apreciar a lide.

Registre-se, por fim e por oportuno, que a reclamada trouxe longo arrazoado acerca da aplicação das Convenções da OIT ao ordenamento jurídico brasileiro, que, a despeito de não ter sido invocado em contestação, em se tratando de normas que ingressam no direito pátrio com status constitucional, afigura-se possível a análise neste momento processual. Todavia, o fato é que a reclamada restringiu-se a elencar algumas Convenções ratificadas pelo Brasil, sem esclarecer em que ponto elas se aplicariam ao caso em análise, o que torna despicienda a sua análise. Mantenho a r. sentença, portanto". (TRT: 07558-2014-651-09-00-2 (RO) - 1ª Turma - Pub. 20/10/2015).

No caso, veja-se que a reclamada não logrou êxito em destituir a informação do autor de que foi contratado em Recife, tendo a testemunha Allan afirmado que a contratação se dava antes de entrar no navio. Ainda, a testemunha Alessandra, indicada pelas próprias reclamadas, embora tenha dito que a contratação se dava no navio, confirmou que havia uma espécie de "pré-contratação" no Brasil, pelo que, reconheço que o obreiro foi contratado em solo brasileiro.

A prova oral também confirmou que havia labor em águas brasileiras, pelo que, aplicam-se plenamente ao autor os fundamentos esposados no julgado acima transcrito.

Assim, rejeito as preliminares arguidas, declarando a competência desta justiça especializada, com a consequente aplicação da legislação trabalhista nacional."(fls. 1495-1497)

Insurgem-se as rés. (fls. 1578-1608)

Inconformadas, as rés sustentam que"se faz mister a aplicação da legislação internacional da OIT (Convenção do Trabalho Marítimo - MLC) fundamentada no respeito à Lei do Pavilhão, convenção internacional ratificada pelo Brasil. Qualquer outro entendimento abalizado em legislação ordinária (7.064/82) ou princípios estranhos a nosso direito (como o Princípio do Centro de Gravidade) ferem os princípios constitucionais da legalidade e sua hierarquia legal, além da isonomia e não discriminação entre nacionalidades e da autonomia da vontade". Pretendem a aplicação da Convenção do Trabalho Marítimo da OIT de 2006, ratificada no direito interno de Malta e da Lei do Pavilhão. Ponderam que os serviços não foram prestados em um país fixo, mas dentro de embarcações privadas que trafegam por águas internacionais. No caso ora analisado, informam que o autor" laborou em alto-mar em navio que perfez trajetória em países da Europa e da América do Sul. "Transcrevem julgados que entendem favoráveis à tese recursal. Defendem que" Não se deve justificar o desrespeito às convenções internacionais evocando princípios estranhos ao direito pátrio (centro de gravidade) ou legislação interna infraconstitucional ( CLT e Lei 7.064/1982). ". Asseveram que"tendo em vista que a Recorrida atuou majoritariamente em território internacional, deve aplicar a legislação internacional a qual determina que a competência material é do país da bandeira da embarcação (Malta). Invocam os princípios constitucionais da igualdade e não discriminação, os arts. 5º, II e III; 178 da CF/88, mencionando decisão do C. STF a respeito da supremacia hierárquica das convenções internacionais ratificadas pelo Brasil como tese de repercussão geral, bem como fazendo referência ao Código de Bustamante, ratificado pelo Brasil por meio do Decreto 18.871/1929. Alegam que houve violação dos arts. e 14 da Lei 7.064/1982.

Sustentam que há ofensa ao princípio da autonomia privada coletiva: "A imperiosidade da aplicação do Princípio da Autonomia da Vontade salta aos olhos no caso destes autos. O Recorrido celebrou contrato de trabalho com a PULLMANTUR CRUISES SHIP MANAGEMENT LTD., demonstrando sua plena satisfação com os ditames contratuais (salários em dólar, vida a bordo, direitos marítimos, jornadas, alimentação à bordo, repatriação, dentre outros) e os prós e contras de toda e qualquer relação jurídico-contratual, regras estas diga-se, estabelecidas pela OIT.", citando a cláusula 18 do contrato de trabalho, que determina o foro do Estado de bandeira da embarcação. Argumentam, ainda, que há afronta aos princípios da igualdade e da não discriminação entre nacionalidades, bem como à Convenção 111 da OIT e à declaração relativa aos princípios fundamentais do trabalho da OIT. Insistem em que se aplica, in casu, a Convenção de Trabalho Marítimo da OIT e os Acordos Coletivos Internacionais de Trabalho.

Analisa-se.

Sem razão as rés.

De início, verifica-se que, a despeito do alegado em sede recursal pelas rés, a prova documental demonstra que os trâmites para a contratação do autor se deram no Brasil, o que é reforçado pela prova oral e admitido pelas próprias rés em vários pontos das razões recursais.

Nesse sentido, foram colhidos os interrogatórios das partes (fls. 1441-1442):

Interrogatório do autor: 1) - o depoente foi entrevistado pelo agente de recrutamento da segunda reclamada; 2) - Monica foi a primeira entrevistadora via skype e Tadeu foi o segundo; 3) - a agência ISMBR entrou em contato com o depoente para participar de processo seletivo; 4) - depois que passou na primeira fase do processo seletivo fez a segunda fase com a Monica; 5) - quando da entrevista somente foi solicitada a experiência na função; 6) - após a aprovação no processo seletivo recebeu e-mail da segunda reclamada solicitando passaporte, STCW mais exames médicos; 7) - foi solicitado um check up geral, teste de HIV, sífiles, exames de cabeça e coração; 8) - diz que após a entrevista recebeu o contrato para ser assinado; 9) - após a entrevista foi dito que no final de semana seria informado se seria contratado ou não, sendo que depois recebeu o contrato através de e-mail da segunda reclamada, dizendo que havia sido aprovado com cópia do contrato em anexo; 10) - o contrato foi assinado na cidade de Recife;

Interrogatório do preposto: 1) - para contratações a reclamada contrata uma agência que faz a seleção dos candidatos; 2) - os curriculos que preenchem as exigências da reclamada são encaminhados para os navios e cada RH do navio chama os candidatos para entrevista; 3) - se o candidato foi aprovado e tiver interesse começa a trabalhar; 4) - a reclamada emite um documento para o candidato poder ter acesso ao navio para a entrevista; 5) - o documento se chama carta de empregabilidade; 6) - a carta é somente para acesso ao navio, sendo que a contratação depende da entrevista; 7) - o reclamante não embarcou em nenhum dos contratos no Brasil; 8) - com a carta de empregabilidade o reclamante consegue visto para entrar no País onde iria embarcar;

Houve ainda acordo pela utilização de prova testemunhal emprestada, cujas atas foram acostadas aos autos ( XXXXX-10.2015.5.02.0070 - fls. 1396-1397; XXXXX-74.2014.5.12.0035 - fls. 1400-1401; 25195-2013-005-09-00-6 - fls. 1402-1403 ; XXXXX-81.2014.5.02.0017 - fls. 1405-1406).

As testemunhas de indicação obreira confirmaram que o contrato de trabalho foi assinado no Brasil, sendo exigência para que o empregado pudesse embarcar.

A testemunha convidada pelas rés, Sra. Alessandra, analista de RH, embora tenha dito que o contrato de trabalho era assinado no navio, relatou que não trabalha dentro do navio, residente e domiciliada em Suzano-SP. Informou que existiam duas etapas para a contratação, sendo que a pré-contratação ocorria no Brasil.

"que a contratação é feita em duas etapas; que a pré contratação pode ser feita por contato via Skype, com um recrutador que se estabelece em Madri e que no Brasil essa pré-seleção consiste em saber se o trabalhador detém conhecimentos específicos, tais como a fluência do idioma, bem como conhecimentos de garçom, mas que a palavra final é dada pelo recrutador anteriormente mencionado." (fl. 311)

A testemunha Sr. Valério, residente e domiciliado na Avenida Ipiranga, em São Paulo, capital, informou que trabalha no RH das rés desde 2001, trabalhou embarcado até 2010, e desde então permanece trabalhando para as rés fora da embarcação como gestor de RH.

Portanto, demonstrado que o processo seletivo e a contratação do autor se deram no Brasil.

No mesmo passo, diante do conjunto probatório, é incontroverso que, ao menos por algum período, a prestação de serviços pelo autor se deu em águas territoriais brasileiras.

Observa-se também, com todo o respeito à tese recursal das rés, que com o cancelamento da Súmula 207 do C. T.S.T. e com a alteração do artigo da Lei 7.064/1982, verifica-se que a regra da territorialidade foi substituída pela regra da aplicação da norma mais benéfica ao trabalhador. Veja-se o que dispõe o referido dispositivo legal:

Art. 3º - A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços:

I - os direitos previstos nesta Lei;

II - a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria.

O objetivo de tal alteração legislativa, a meu ver, é evitar que sejam aplicadas a um caso específico normas estrangeiras que contrariem ou impossibilitem a aplicação da legislação brasileira aos contratos de trabalho que vierem a ser executados no Brasil. Desse modo, não se pode afirmar, de modo indistinto, que as embarcações, ainda que civis, seriam um prolongamento da bandeira alienígena que ostentam, na medida em que prevalece a legislação mais favorável ao trabalhador.

No que diz respeito ao período em que houve labor em águas internacionais, considerando que a contratação do autor ocorreu no Brasil e que houve prestação de serviços na costa brasileira, há inevitável atração e conexão com a legislação nacional. Nesse sentido, colaciono as seguintes ementas de julgados do T.S.T., cujos fundamentos adoto como razão de decidir:

TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO - EMPREGADO PRÉ-CONTRATADO NO BRASIL - CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL 1. O princípio do centro de gravidade, ou, como chamado no direito norte-americano, most significant relationship, afirma que as regras de Direito Internacional Privado deixarão de ser aplicadas, excepcionalmente, quando, observadas as circunstâncias do caso, verifica-se que a causa tem uma ligação muito mais forte com outro direito. É o que se denomina "válvula de escape", dando maior liberdade ao juiz para decidir que o direito aplicável ao caso concreto. 2. Na hipótese, em se tratando de empregada brasileira, pré-contratada no Brasil, para trabalho parcialmente exercido no Brasil, o princípio do centro de gravidade da relação jurídica atrai a aplicação da legislação brasileira. MULTA DOS ARTIGOS 477 E 467 DA CLT - FUNDADA CONTROVÉRSIA Não se conhece do Recurso de Revista que não logra demonstrar divergência jurisprudencial específica e não aponta violação legal ou contrariedade a súmula. Recurso de Revista não conhecido ( ED-RR - XXXXX-42.2006.5.02.0446 Data de Julgamento: 06/05/2009, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/05/2009).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. EMPREGADO CONTRATADO NO BRASIL E QUE DESENVOLVEU PARTE DO CONTRATO DE TRABALHO EM ÁGUAS TERRITORIAIS BRASILEIRAS. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. INAPLICABILIDADE DA ANTIGA SÚMULA 207/TST (HOJE, INCLUSIVE, JÁ CANCELADA). A jurisprudência trabalhista, sensível ao processo de globalização da economia e de avanço das empresas brasileiras para novos mercados no exterior, passou a perceber a insuficiência e inadequação do critério normativo inserido na antiga Súmula 207 do TST (lex loci executionis) para regulação dos fatos congêneres multiplicados nas duas últimas décadas. Nesse contexto, já vinha ajustando sua dinâmica interpretativa, de modo a atenuar o rigor da velha Súmula 207/TST, restringido sua incidência, ao mesmo tempo em que passou a alargar as hipóteses de aplicação das regras da Lei n. 7.064/1982. Assim, vinha considerando que o critério da lex loci executionis (Súmula 207) - até o advento da Lei n. 11.962/2009 - somente prevalecia nos casos em que foi o trabalhador contratado no Brasil para laborar especificamente no exterior, fora do segmento empresarial referido no texto primitivo da Lei n. 7064/82. Ou seja, contratado para laborar imediatamente no exterior, sem ter trabalhado no Brasil. Tratando-se, porém, de trabalhador contratado no País, que aqui tenha laborado para seu empregador, sofrendo subsequente remoção para país estrangeiro, já não estaria mais submetido ao critério normativo da Convenção de Havana (Súmula 207), por já ter incorporado em seu patrimônio jurídico a proteção normativa da ordem jurídica trabalhista brasileira. Em consequência, seu contrato no exterior seria regido pelo critério da norma jurídica mais favorável brasileira ou do país estrangeiro, respeitado o conjunto de normas em relação a cada matéria. Mais firme ainda ficou essa interpretação após o recente cancelamento da velha Súmula 207/TST. No caso concreto, ficou evidenciado que o Reclamante foi contratado no Brasil e que parte do tempo de duração do contrato de trabalho desenvolveu-se em águas territoriais brasileiras. Não há como assegurar o processamento do recurso de revista quando o agravo de instrumento interposto não desconstitui a decisão denegatória, que subsiste por seus próprios fundamentos. Agravo de instrumento desprovido. ( AIRR - XXXXX-64.2008.5.02.0445 , Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 13/08/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: 16/08/2013).

Ainda, por oportuno, cito precedente desta E. Turma:

"APLICABILIDADE DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA EM CONTRATO DE TRABALHO EM NAVIO DE BANDEIRA ESTRANGEIRA. EXPLORAÇÃO ECONÔMICA DA EMBARCAÇÃO POR EMPRESA BRASILEIRA. CONTRATAÇÃO DA TRABALHADORA NO BRASIL. PARTE DO TRABALHO EM ÁGUAS NACIONAIS. AFASTAMENTO DA LEI DO PAVILHÃO (CÓDIGO DE BUSTAMANTE). Aplica-se a legislação brasileira, em prejuízo da Lei do Pavilhão (Código de Bustamante - que prevê a aplicabilidade da legislação da bandeira do navio aos contratos de trabalho), mesmo em se tratando de embarcação de bandeira estrangeira, quando a exploração econômica do navio se dá por empresa brasileira, assim como a contratação da trabalhadora se realiza no Brasil e parte do desenvolvimento de suas atividades laborais se dá em águas nacionais" (RO XXXXX-9, Relator Desembargador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, DEJT XXXXX-07-2017)

No mesmo sentido, a brilhante decisão do Exmo. Desembargador Cássio Colombo Filho em caso análogo, proferida nos autos nº 13190-2015-084-09-00-4 (RO 1728/2017), publicado em 27 de junho de 2017, a quem peço vênia para transcrever e adotar como razões de decidir:

A Convenção de Direito Internacional Privado de Havana, firmada em 20.02.1928 (conhecida como Código de Bustamante) e promulgada pelo Decreto nº 18.871 de 13 de agosto de 1929 estabelece, em seus arts. 274, 279 e 281, que se aplica a lei do pavilhão aos oficiais e tripulantes de navios e aeronaves, a qual, por sua vez, é definida pela nacionalidade do respectivo registro:

Art. 274. A nacionalidade dos navios prova-se pela patente de navegação e a certidão do registro, e tem a bandeira como sinal distintivo aparente.

Art. 279. Sujeitam-se tambem à lei do pavilhão os poderes e obrigações do capitão e a responsabilidade dos proprietários e armadores pelos seus atos.

Art. 281. As obrigações dos oficiais e gente do mar e a ordem interna do navio subordinam-se à lei do pavilhão.

Por outro lado, os arts. 182 e 198 do diploma legal em questão dispõem que se aplica a legislação do local da prestação dos serviços, no que se refere à extinção do contrato de trabalho, acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador:

Art. 182. As demais causas de rescisão e sua forma e efeitos subordinam-se à lei territorial.

Art. 198. Também é territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador.

Trata-se da regra geral da territorialidade, consagrada na legislação pátria pelo disposto no art. 651 da Consolidação das Leis do Trabalho, in verbis: "A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro".

Diante do exposto tem-se que, como regra geral, o trabalho marítimo é regido pela lei do pavilhão, no entanto esta pode ser relativizada pela regra da territorialidade, determinando-se a lei a ser aplicável de acordo com o local da prestação dos serviços.

Neste sentido, oportuno transcrever os esclarecimentos do MM. Juiz do Trabalho FABIANO COELHO DE SOUZA, do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, extraídos de publicação no blog Saber Direito, havida em 18.10.2011 (http://fabianocoelhosouza.blogspot.com.br/2011/10/lei-do-pavilhaoeprincipio-do-centro.html - consulta em 23.03.2017):

O trabalho marítimo ou aeronáutico, rege-se pela denominada lei do pavilhão ou bandeira. Por esta, a norma aplicável aos contratos de trabalho em tais meios de transporte seria do país em que se encontra registra da a aeronave ou embarcação. Esta conclusão decorre da aplicação da Convenção Internacional de Direito Internacional Priva (Código Bustamante, em seus artigos 279, 281 e 282). No entanto, a lei do pavilhão encontra ressalvas que devem ser ora pontuadas.

Na realidade, o empregador do trabalhador marítimo é o armador, e não o navio. Não bastasse, ocorre do armador eleger seu centro principal de negócios localidade diversa do registro da embarcação. Nestas situações, a lei do pavilhão deve ser relativizada, de modo a aproximar a situação com a regra geral da territorialidade, definindo a regência normativa do contrato pelas leis do local em que o empregado fica habitualmente à disposição do empregador antes ou depois da realização das viagens.

Caso esteja evidenciada a intenção fraudulenta, a questão resolve-se pelo art. da CLT, a impedir a frustração dos direitos trabalhistas conferidos ao empregado brasileiro, aplicando-se a legislação nacional. É o que ocorre para as situações de "bandeiras de favor", amplamente denunciadas no Direito Marítimo, prática pela qual o navio é registrado intencionalmente num determinado país em razão de legislação mais permissiva a uma determinada conduta (geralmente considerada irregular nas legislações nacionais), pretendida pelo empresário.

Não bastasse, imaginemos um navio estrangeiro presente em águas brasileiras com a finalidade de desenvolver atividades comerciais (de turismo, por exemplo) e, para tanto, contrata trabalhadores brasileiros. Neste caso, não seria razoável excluir o critério da territorialidade apenas pelo fato de que a embarcação esteja registrada em outro país, já que o trabalhador terá sido admitido no Brasil, e aqui prestou serviços, ainda que posteriormente desenvolva atividades em águas internacionais ou mesmo vinculadas a outro país. Este entendimento faz-se necessário para que a legislação laboral não seja desvirtuada, deixando contratos de trabalho sem o necessário amparo da legislação brasileira. É que a regra do pavilhão foi consagrada como forma justamente de beneficiar o trabalhador, não podendo ser, assim, invocada para frustrar as proteções legais mínimas que conferem dignidade ao trabalho. E, fixada a legislação brasileira aplicável a tais contratos, poderá ser aplicada a lei 7.064/82 de forma a considerar a prestação de serviços em águas internacionais ou estrangeiras como sendo situação de transferência de empregado brasileiro para o exterior, de modo a incidir a teoria do conglobamento por instituto para identificação das normas aplicáveis ao contrato neste período, elegendo a legislação brasileira ou da lei da bandeira do navio, de acordo com o que for mais favorável por instituto. A solução proposta evidencia aplicação do denominado princípio do centro da gravidade, pelo qual, dada a relevância do direito, é possível afastar a aplicação das regras de direito internacional privado. (grifos acrescidos)

Pois bem.

No caso em apreço, restou sobejamente comprovado que a reclamante participou de processo seletivo realizado no Brasil, onde foi contratada, tendo prestado serviços em território nacional durante boa parte da contratualidade.

Com efeito, extrai-se dos autos que a reclamante foi contratada pela primeira reclamada, PULLMANTUR SHIP MANAGEMENT LTDA., para exercer a função de "bartender", no período de 11.11.2012 a 14.07.2013, na embarcação denominada M/V EMPRESS, com bandeira da República de Malta (fls. 25/27).

A documentação apresentada juntamente com a petição inicial comprova que a contratação da reclamante foi intermediada pela empresa ISMBR, sediada em Curitiba/PR, a qual não só noticiou à reclamante que esta havia sido aprovada para trabalhar em um dos navios da frota da PULLMANTUR (e-mail constante à fl. 30), como também informou os documentos necessários para o embarque, bem como os procedimentos a serem observados na chegada ao destino final (e-mail constante à fl. 31).

Não bastasse isso, consta dos autos que, durante o período da contratualidade, o navio EMPRESS percorreu diversos itinerários, com destinos nacionais a exemplo de Recife, Salvador, Búzios e Rio de Janeiro, bem como internacionais, tais como Málaga (Espanha), Copenhague (Dinamarca), Montevidéu (Uruguai), Buenos Aires (Argentina), Estocolmo (Suécia) e Trondheim (Noruega), dentre outros.

Em que pese seja evidente que parte da prestação de serviços tenha se dado no exterior, as planilhas de rotas existentes nos autos (fls. 384/393) permitem concluir que a embarcação em comento permaneceu ancorada em território nacional durante significativos lapsos de tempo, a exemplo do que se observa nos seguintes períodos, identificados pela cor verde (=ANCHOR): a) de 12.03.2012 a 07.04.2012 (em que alternou a permanência entre Santos, Búzios e Cabo Frio); b) de 29.11.2012 a 07.01.2013 (em que alternou a permanência entre Itajaí, São Francisco do Sul, Búzios, Ilhabela, Rio de Janeiro e Santos); e c) de 13.03.2013 a 13.04.2013 (em que alternou a permanência entre Itajaí, Búzios, Ilhabela e Santos).

Note-se que apesar de as recorrentes terem sustentado que, quando não estava atracada nos portos nacionais, a embarcação estaria fora do que se considera como mar territorial (correspondente à faixa de águas costeiras que alcança 12 milhas náuticas a partir do litoral, considerada como parte do território soberano nacional), o fato é que os croquis de navegação apresentados juntamente com a defesa referem-se exclusivamente aos deslocamentos entre Búzios e Ilhabela (fl. 377) e Ilhabela e Santos (fl. 378), não havendo nos autos qualquer informação a respeito dos demais locais em que havia a previsão de ancoragem, nos destinos nacionais.

Sendo assim, agiu com acerto a MM. Juíza de origem ao concluir que a reclamante trabalhou em território brasileiro, durante grande parte do período contratual.

Diante de tais circunstâncias, é possível concluir que a reclamante foi contratada em território nacional e aqui iniciou a prestação de serviços, tendo sido transferida posteriormente para o exterior, circunstância que se enquadra na hipótese de que trata o inciso I, do art. , da Lei nº 7.064/1982 (Art. 2º - Para os efeitos desta Lei, considera-se transferido: I - o empregado removido para o exterior, cujo contrato estava sendo executado no território brasileiro; [...]), sendo-lhe aplicável, portanto, a legislação pátria de proteção ao trabalho, nos termos do art. 3º, inciso II, do referido diploma legal (Art. 3º - A empresa responsável pelo contrato de trabalho do empregado transferido assegurar-lhe-á, independentemente da observância da legislação do local da execução dos serviços: [...] II - a aplicação da legislação brasileira de proteção ao trabalho, naquilo que não for incompatível com o disposto nesta Lei, quando mais favorável do que a legislação territorial, no conjunto de normas e em relação a cada matéria [...]).

Ante o exposto, correta a sentença também no que se refere ao reconhecimento da aplicabilidade da legislação pátria.

Aliás, cumpre destacar que esta E. Segunda Turma já teve a oportunidade de apreciar a questão da legislação aplicável aos tripulantes de cruzeiros marítimos, conforme se observa no Acórdão nº 7835/2016, publicado em 15.03.2016, de relatoria do MM. Juiz Convocado CARLOS HENRIQUE DE OLIVEIRA MENDONÇA (TRT-PR-25195-2013-005-09-00-6), envolvendo as mesmas reclamadas, cuja fundamentação peço vênia para transcrever e adotar como razões de decidir:

A regra geral determina que a legislação aplicável é a do local da prestação de serviços. Essa questão é tratada no Código Bustamante, aplicável no Brasil desde a ratificação pelo Decreto nº 18.871, de 13/08/1929, consoante se verifica nos seguintes dispositivos:

"Art. 182. As demais causas de rescisão e sua forma e efeitos subordinam-se à lei territorial."

"Art. 198. Também é territorial a legislação sobre acidentes do trabalho e proteção social do trabalhador."

O princípio da territorialidade também é especificado no art. 651 da CLT ("Art. 651. A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro").

A Súmula nº 207 do C. TST seguia essa mesma linha ("CONFLITOS DE LEIS TRABALHISTAS NO ESPAÇO. PRINCÍPIO DA 'LEX LOCI EXECUTIONIS' - A relação jurídica trabalhista é regida pelas leis vigentes no país da prestação de serviço e não por aquelas do local da contratação"). Porém, em face da dinâmica das relações, referido verbete foi cancelado, passando a jurisprudência a se atentar para outros elementos adicionais no que tange à legislação aplicável, ou seja, não há mais que se ater apenas ao local da prestação laboral, devendo ser analisada a totalidade da situação, inclusive o local da contratação ou pré-contratação. Nesse sentido a jurisprudência refletida no seguinte aresto:

TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO - EMPREGADO PRÉ-CONTRATADO NO BRASIL - CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL 1. O princípio do centro de gravidade, ou, como chamado no direito norte-americano, "most significant relationship", afirma que as regras de Direito Internacional Privado deixarão de ser aplicadas, excepcionalmente, quando, observadas as circunstâncias do caso, verifica-se que a causa tem uma ligação muito mais forte com outro direito. É o que se denomina "válvula de escape", dando maior liberdade ao juiz para decidir que o direito aplicável ao caso concreto. 2. Na hipótese, em se tratando de empregada brasileira, pré-contratada no Brasil, para trabalho parcialmente exercido no Brasil, o princípio do centro de gravidade da relação jurídica atrai a aplicação da legislação brasileira [...] ( ED-RR - XXXXX-42.2006.5.02.0446 , Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 06/05/2009, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/05/2009).

Posto isso, é de se ver que o autor, contratado temporariamente pela ré em três oportunidades para exercer a função de assistente de garçom, prestou-lhe serviços em embarcação privada, com bandeira oriunda do País de Malta.

Com base apenas nisso não há como atender o pedido da ré de aplicação da legislação alienígena. Para tanto, seria necessário fechar os olhos e de forma automática declarar a aplicação da legislação internacional pelo simples fato de que ela é empresa com sede fora do Brasil. Essa situação não é possível, mormente tendo em conta a legislação vigente e a jurisprudência predominante, acima demonstrada.

De outro lado, o contexto fático-jurídico é favorável ao autor.

Com efeito, em relação ao local de contratação, as partes divergem. O autor diz ter sido contratado em território nacional, enquanto a ré defende que apenas procedimentos prévios relativos à contratação teriam sido realizados no Brasil, sendo que a finalização do contrato teria ocorrido a bordo dos navios "M/V Sovereing" e "M/V Zenith". Contudo, a empregadora não produziu qualquer prova acerca de suas alegações. E, de outro lado, a única testemunha ouvida afirmou que ela, como garçom, assinou seu contrato em Curitiba, PR, e que "não é possível nem subir no navio sem o contrato assinado" (fl. 171), o que corrobora a tese do autor. Em sendo fato impeditivo do direito obreiro, cumpria à ré comprovar que a contratação não ocorreu no Brasil, ônus do qual não se desvencilhou, razão pela qual se tem que o autor foi, de fato, contratado em território nacional.

Ainda que não o fosse, mesmo a pré-contratação (aliada a outros fatores) em território nacional viabilizaria a aplicação das regras trabalhistas ao contrato de trabalho, conforme linha jurisprudencial nesse sentido, tal como o julgado do C. TST supratranscrito.

Além disso, os documentos de fls. 192/198 e 245/251 evidenciam que a embarcação passava tanto por águas brasileiras, como internacionais, o que traduz forte indício de que, durante todo o período, o autor prestou serviços em favor da ré. De toda sorte, como fato impeditivo do direito do autor, incumbia a esta demonstrar robustamente que, durante o percurso em águas brasileiras, o autor não lhe prestava serviços, ao que não procedeu. Tem-se, então, que o autor prestou seus serviços em ambos os territórios.

Assim, porque a contratação se efetivou no Brasil, e, durante parte do pacto, as rotas efetuadas foram em território brasileiro, tem-se que a legislação aplicável é a CLT, sendo competente a Justiça do trabalho para o exame e julgamento dos pedidos.

Diante do exposto, mostra-se irretocável a r. sentença na parte em que declarou a aplicabilidade da legislação nacional ao caso vertente e a competência da Justiça do Trabalho para o exame do feito.

REJEITA-SE. (grifos acrescidos)

Neste mesmo sentido já decidiram outras turmas deste E. 9º Regional, a exemplo do que se observa no subsídio jurisprudencial apresentado juntamente com a petição inicial (fls. 61/85), bem como nos seguintes julgados:

TRABALHO A BORDO DE NAVIOS. CRUZEIROS MARÍTIMOS. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. De acordo com o art. 651, § 2º, da CLT, a justiça brasileira é competente para julgar ação de trabalhador brasileiro contratado no Brasil por empresa estrangeira para prestar serviços no exterior. Quando o trabalho é exercido em águas territoriais brasileiras - ainda que não somente brasileiras - como é o caso, o Brasil detém jurisdição para apreciação da lide. De acordo com o colendo TST, as embarcações privadas estrangeiras não são extensões do território do país de sua bandeira quando navegam em águas territoriais brasileiras. Tratando-se de navios privados, e não militares, somente representarão prolongamento do território do país cuja bandeira ostentam se navegarem em alto mar. Dessa forma, competente a Justiça do Trabalho para apreciação da demanda. Sentença mantida. TRABALHO A BORDO DE NAVIOS. CRUZEIROS MARÍTIMOS. APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. A autora foi contratada diversas vezes pela ré como camareira, para trabalhar a bordo de navios em cruzeiros marítimos, tendo, a contratação, ocorrido em solo brasileiro, e o trabalho, por sua vez, sido executado em águas nacionais e internacionais. Em decorrência do cancelamento da Súmula 207 do TST (princípio "Lex loci execucionis"), incide ao caso o previsto na Lei 7.064/82 (alterada pela Lei 11.962/2009), que "dispõe sobre a situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior", e que determina a observância da legislação nacional, quando mais favorável, aos empregados contratados no Brasil para prestarem serviços no exterior. Todavia, não houve nenhuma demonstração de que a legislação internacional, considerada em seu conjunto, e não a partir de cláusulas isoladas, seria efetivamente mais favorável à reclamante se comparada à CLT. Destaque-se, nesse contexto, o caráter protetivo de nosso Direito do Trabalho, pelo qual se busca um amparo preferencial ao trabalhador no exame da relação de emprego, estando assegurados direitos tais como 13º salário e férias, assim como o recolhimento de INSS e do FGTS. Não bastasse, tendo a autora formulado pedidos com base na legislação pátria, tal circunstância sinaliza que é essa normativa que lhe é mais favorável. Deve prevalecer, assim, o direito fundamental do acesso à justiça. Recurso da ré a que se nega provimento. (TRT-PR-14661-2015-651-09-00-0-ACO-07239-2017 - 6A. TURMA - Relator: SUELI GIL EL RAFIHI - Publicado no DEJT em XXXXX-03-2017)

TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO. PRÉ-CONTRATAÇÃO NO BRASIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NA COSTA BRASILEIRA. LEI DO PAVILHÃO OU DA BANDEIRA. INAPLICÁVEL. A Convenção Internacional de Direito Internacional Privado de Havana, conhecida como "Código de Bustamante", incorporada ao ordenamento jurídico pelo Decreto n.º 18.871, de 13 de agosto de 1929, ao regulamentar o trabalho marítimo, consagra a lei do pavilhão ou da bandeira que, adotando o critério da territorialidade, determina a aplicação da legislação do país em que se encontra matriculada a embarcação. Essa regra não tem caráter absoluto, podendo ser afastada diante das circunstâncias do caso concreto, quando verificada estreita ligação com outra ordem jurídica, sobretudo porque a relação contratual não se forma necessariamente entre tripulante e proprietário do navio, mas com aquele que explora economicamente a embarcação. As tratativas para a contratação do reclamante iniciadas em território brasileiro e o trânsito do navio pela costa brasileira indicam a existência de uma forte ligação com o ordenamento jurídico pátrio, constituindo elementos de conexão a atrair a incidência das normas de direito nacional. Recurso ordinário da reclamada conhecido e desprovido. (TRT-PR-45364-2014-003-09-00-2-ACO-04101-2017 - 7A. TURMA - Relator: ALTINO PEDROZO DOS SANTOS - Publicado no DEJT em XXXXX-02-2017)

TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO. PRÉ-CONTRATAÇÃO EM TERRITÓRIO NACIONAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS, AINDA QUE PARCIALMENTE, EM ÁGUAS TERRITORIAIS BRASILEIRAS. CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO BRASILEIRA. INCIDÊNCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. APLICAÇÃO DO ARTIGO DA LEI 7.064/82. Em que pese o Direito Internacional consagre, para os casos de trabalho envolvendo marítimo, realizado preponderantemente em alto-mar, a lei do pavilhão ou da bandeira, de acordo com a qual aplicar-se-ia a legislação do país no qual está matriculado o navio, essa regra não possui, como sói ocorrer com a maciça parcela dos institutos jurídicos, caráter absoluto, já que comporta exceções, que exsurgem de acordo com o caso concreto. Na presente hipótese a reclamante laborava em embarcação privada suíça, passando tanto por águas brasileiras quanto internacionais. Contudo, não há que se falar em aplicação ao caso da legislação alienígena, vez que o navio estrangeiro era privado, o que enseja a aplicação da legislação brasileira enquanto a embarcação estiver em território nacional. No que diz respeito ao período em que houve labor em águas internacionais, considerando que a pré-contratação da autora ocorreu no Brasil, que seu embarque ocorreu em Santos e que houve prestação de serviços na costa brasileira (por aproximadamente três semanas), há inevitável atração e conexão com legislação nacional. Nesse diapasão, pelo princípio do centro de gravidade, a legislação do Brasil, por estar intimamente conectada à relação jurídica formada, atrai para si o campo de incidência. Assim sendo, tanto a lei aplicável como o Tribunal competente (jurisdição) são os brasileiros. (TRT-PR-06873-2012-195-09-00-4-ACO-36491-2013 - 4A. TURMA - Relator: ADILSON LUIZ FUNEZ - Publicado no DEJT em XXXXX-09-2013).

Oportuno citar, ainda, o seguinte julgado do C. TST a respeito do tema:

TRABALHO EM NAVIO ESTRANGEIRO - EMPREGADO PRÉ-CONTRATADO NO BRASIL - CONFLITO DE LEIS NO ESPAÇO - LEGISLAÇÃO APLICÁVEL 1. O princípio do centro de gravidade, ou, como chamado no direito norte-americano, most significant relationship, afirma que as regras de Direito Internacional Privado deixarão de ser aplicadas, excepcionalmente, quando, observadas as circunstâncias do caso, verifica-se que a causa tem uma ligação muito mais forte com outro direito. É o que se denomina "válvula de escape", dando maior liberdade ao juiz para decidir que o direito aplicável ao caso concreto. 2. Na hipótese, em se tratando de empregada brasileira, pré-contratada no Brasil, para trabalho parcialmente exercido no Brasil, o princípio do centro de gravidade da relação jurídica atrai a aplicação da legislação brasileira. MULTA DOS ARTIGOS 477 E 467 DA CLT - FUNDADA CONTROVÉRSIA Não se conhece do Recurso de Revista que não logra demonstrar divergência jurisprudencial específica e não aponta violação legal ou contrariedade a súmula. Recurso de Revista não conhecido. ( ED-RR-XXXXX-42.2006.5.02.0446, Relatora Ministra: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 06/05/2009, 8ª Turma, Data de Publicação: DEJT 22/05/2009)

Diversamente do que tentam fazer crer as recorrentes, não há falar em violação aos princípios constitucionais da hierarquia e legalidade (art. 5º, caput e §§ 2º e 3º da Constituição Federal), nem se cogita de afronta ao disposto no art. 178 da Constituição Federal, tendo à vista que a aplicação da legislação trabalhista pátria, em detrimento das convenções internacionais relacionadas ao trabalho marítimo, está pautada no princípio protetivo, que rege o Direito e o Processo do Trabalho.

De fato, pelo princípio do centro da gravidade, é possível afastar a aplicação das regras de Direito Internacional Privado, desde que se verifique uma forte ligação com outro ramo do direito, a exemplo do Direito do Trabalho. Na situação em análise, constatou-se que a reclamante foi contratada no Brasil e prestou serviços não só em águas internacionais ou sem jurisdição, mas também em território nacional, o que autoriza a aplicação da legislação pátria.

Melhor sorte não assiste às recorrentes quanto à alegada superioridade hierárquica das convenções internacionais, tendo à vista que, apesar de a Constituição Federal prestigiar a autonomia coletiva de vontades, através do reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho (artigo 7º, inciso XXVI), não se pode olvidar que as classes econômicas e profissionais não podem, em normas coletivas, regular livremente a própria relação jurídica de trabalho, uma vez que os acordos e convenções coletivos estão limitados pelo conjunto mínimo de direitos constitucionais e infraconstitucionais, na forma do art. 7º, caput, parte final, da Constituição.

Também não se constata afronta ao princípio da igualdade e da não discriminação entre as nacionalidades (artigos 3º, inciso IV; 4º, incisos V e IX; e 5º, caput, todos da Constituição Federal e art. 1º da Convenção nº 111 da OIT) pois, conforme bem observou a MM. Juíza de origem, "se havia empregados de diversas nacionalidades, obviamente que a cada um deles se apresenta uma realidade existencial e profissional diversa, não se tratando de iguais, portanto, mas de desiguais, que admitem tratamento desigual". Outrossim, não se pode confundir a aplicação da norma mais favorável ao trabalhador com tratamento desigual ou discriminatório motivado por questões de nacionalidade, notadamente considerando que o fator determinante para se afastar a legislação internacional foi a circunstância em que se deu a contratação e a prestação de serviços pela trabalhadora, em território nacional.

Por fim, não há como acolher a alegação de que a legislação internacional seria mais favorável à reclamante, tão somente por ser mais específica. De igual forma, não vislumbro a possibilidade de estabelecer a legislação mais benéfica tão somente com base na moeda utilizada para remunerar os tripulantes. Considerando que as reclamadas não demonstraram, objetivamente, que as condições de trabalho estabelecidas na legislação internacional seriam mais favoráveis à reclamante do que aquelas prescritas na legislação pátria, prevalece a conclusão posta na sentença, no sentido de que a pretensão deduzida na petição inicial baseou-se nesta última, "por entender ser esta mais benéfica ou por lhe garantir melhor acesso à justiça".

Por todo o exposto, mantenho a sentença quanto ao reconhecimento de aplicação da legislação pátria.

Nesse contexto, prevaleceu o entendimento da Turma, de que é a Justiça do Trabalho do Brasil é competente para conhecer, processar e julgar o presente feito, sendo aplicável à hipótese a legislação brasileira.

Peço venia para registrar entendimento diverso, pois considero que a atividade empresarial pode sofrer prejuízos extremos, além de certa insegurança jurídica, em decorrência da aplicação da norma nacional de cada empregado que contrate para prestar serviços em suas embarcações. Comungo do entendimento de que se aplicam, à hipótese dos autos, o art. 12 da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro e o art. 21 do Novo Código de Processo Civil, assim redigidos:

Art. 12. É competente a autoridade judiciária brasileira, quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui tiver de ser cumprida a obrigação.

Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:

I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;

II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;

III - o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.

Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.

De toda sorte, prevaleceu o entendimento da maioria, a que me curvo, no sentido de que, com o cancelamento da Súmula 207 do C. T.S.T. e com a alteração do artigo da Lei 7.064/1982, a regra da territorialidade foi substituída pela regra da aplicação da norma mais benéfica ao trabalhador.

Ademais, fui uniformizado o entendimento, no âmbito deste Regional acerca do tema, com a aprovação da seguinte tese jurídica:

Pet XXXXX-24.2018.5.09.0000 - AP ROVAÇÃO DE TESE JURÍDICA (RA 38/2018 do Tribunal Pleno) no Tema 92:UNIFORMIZAR a jurisprudência, nos termos dos artigos 926, § 1º e 927, V, do CPC e da RA 38/2018 deste Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, fixando o presente entendimento, como precedente de uniformização da jurisprudência Regional, a ser observado pelos Juízes e Tribunal, DAR PROVIMENTO ao recurso da autora, reformando a sentença para fixar que APLICÁVEL A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA AO TRABALHADOR QUE PRESTA SERVIÇOS EM NAVIO DE CRUZEIROS QUE NAVEGA EM ÁGUAS INTERNACIONAIS, QUANDO VERIFICADA UMA DAS SEGUINTES CONDIÇÕES, ALTERNATIVAMENTE: A) TRABALHADOR BRASILEIRO PRÉ-SELECIONADO POR SKYPE OU POR AGÊNCIA DE SELEÇÃO DE PESSOAL BRASILEIRO; B) TRABALHADOR NACIONAL QUE TENHA SIDO SELECIONADO NO BRASIL; OU, C) TRABALHADOR NACIONAL QUE TENHA SIDO CONTRATADO NO BRASIL; OU, D) TRABALHADOR QUE EMBARQUE EM PORTO NACIONAL OU CUJA PARTE DO TRAJETO COMPREENDA NAVEGAÇÃO EM ÁGUAS NACIONAIS.

Nesse contexto, data venia, a Justiça do Trabalho do Brasil é competente para conhecer, processar e julgar o presente feito, sendo aplicável à hipótese a legislação brasileira.

Diante do exposto, nada a reparar.

Rejeita-se

d) MODALIDADE DE CONTRATAÇÃO - DOS CONTRATOS POR PRAZO DETERMINADO - DAS VERBAS RESCISÓRIAS: FÉRIAS PROPORCIONAIS + 1/3, 13º SALÁRIO PROPORCIONAL, RECOLHIMENTO DO FGTS

Em razão da identidade da matéria, o pedido recursal das rés foi analisado em conjunto com o recurso do autor (item b), ao qual se reporta por economia processual.

e) DA REMUNERAÇÃO

Ressai da r. sentença:

"Quanto à remuneração, a reclamada trouxe aos autos o contrato traduzido (fls. 602/606), o qual não foi destituído por nenhum meio de prova, pelo que, deverá ser anotada a remuneração constante no contrato, devidamente convertida para a moeda nacional, devendo ser utilizado o valor descrito no contrato sob a rubrica"Pagamento Mensal Total", ou seja, U$ 1.232,00, conforme fl. 602.

O reclamante deverá apresentar sua CTPS, no prazo de 05 (cinco) dias, para que a primeira reclamada proceda à anotação devida no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da ciência da juntada da CTPS aos autos, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), a favor do reclamante.

Caso não seja procedida a anotação num prazo de 30 (trinta) dias, deverá esta ser feita pela Secretaria da Vara, sem prejuízo da execução da multa correspondente.

Tendo em vista que foi reconhecida a validade do contrato por prazo determinado, não há que se falar em aviso prévio indenizado, indenização de 40% sobre os depósitos do FGTS e pagamento indenizado de seguro desemprego, pedidos que rejeito.

Defiro, entretanto, o pagamento das seguintes verbas referentes ao contrato:

- férias proporcionais a 6/12;

- 13º salário proporcional a 2/12 referente a 2016;

- 13º salário proporcional a 4/12 referente a 2017;

- depósitos do FGTS (8%).

Rejeito o pedido de aplicação da multa prevista no art. 479 da CLT, pois o autor a pleiteou de forma genérica, não tendo havido informação acerca de rescisão antecipada do contrato.

Tendo em vista a controvérsia quanto à remuneração, e, considerando que os holerites traduzidos, juntados pela reclamada a partir da fl. 607, trazem, muitas vezes, discriminação de valores sem constar a que se referem, defiro o pedido do autor feito quando de sua manifestação quanto aos documentos apresentados com a defesa, de que seja considerada a sua remuneração como a média obtida pelos pagamentos discriminados nos holerites, com a conversão para a moeda nacional. Para tanto, deverá ser considerado em cada holerite o valor da rubrica" Pagamento líquido do período em Dólares norte-americanos ".

Assim, as verbas acima deferidas deverão ser calculadas pela média dos salários recebidos durante cada contrato, observando-se as rubricas Pagamento líquido do período em Dólares norte-americanos, com a devida conversão para a moeda nacional.

Acolho em parte, nestes termos." (fls. 1498-1499)

Insurgem-se as rés. (fls. 1609-1612)

Irresignadas, as rés insistem na tese a aplicação da legislação brasileira ao contrato de trabalho, só foi reconhecida em juízo, portanto não podem ser cobradas por tal aplicação em período anterior ao da r. sentença, não cabendo "falar em invalidade da formas de discriminação apontada nos contratos de trabalho, sob a alegação de que os recibos de pagamento não apresentassem discriminação de verbas pagas".

Sustenta que as gorjetas, "apesar de integrarem o salário, conforme disposto no artigo 457 da C.L.T., não podem servir de base para cálculo para parcelas de aviso prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado." Invocam a Súmula nº 354 do C. T.S.T. e requerem a sua aplicação.

Asseveram que "ao não separar os valores pagos a título de salário e àqueles efetuados a título de horas extras e DRS's, conforme indicam os contratos de trabalho, implicará em bis in idem, tendo em vista que o valor percebido pelo Recorrido, já comporta o pagamento de tais títulos." e que, desta forma, a não discriminação de tais valores, implicará na base de cálculos para a liquidação das horas extras em valores já pagos sob o mesmo título.

Cita jurisprudência da 7ª Turma deste TRT9, proferida em 2017, que entende corroborar com sua tese.

Sucessivamente, requer seja "considerado o valor para fins de salário contido em cada contrato e convertido para real na data do contrato."

Analisa-se.

Inicialmente, impende destacar que o fato de ter sido reconhecida pela r. sentença a aplicação da legislação brasileira ao contrato celebrado com o autor, não desonera a obrigação de as rés observarem tal regramento desde o princípio, eis que sua aplicabilidade remonta à origem do contrato de trabalho.

No tocante à aplicação da legislação brasileira, resultaram prejudicados os argumentos das rés quanto à desnecessidade de observação das normas previstas na C.L.T. e ao pagamento das verbas rescisórias. Além disso, caberia às rés o ônus de comprovar que as verbas rescisórias foram todas quitadas, do qual não se desincumbiram.

Em segundo plano, melhor sorte não socorre as recorrentes quanto à insurgência referente ao valor do salário recebido pela autora, não prevalecem as condições contratuais internacionais, devendo-se aplicar a legislação brasileira, na medida em que restou incontroverso, pela prova documental, como bem exposto na r. sentença, que o autora recebeu os salários constantes no contrato de trabalho e nos holerites colacionados aos autos, havendo apenas necessidade de conversão para a moeda nacional.

Assim, correto o entendimento do d. Juízo, notadamente ao indicar deva ser observado o valor descrito no contrato sob a rubrica "devendo ser utilizado o valor descrito no contrato sob a rubrica"Pagamento Mensal Total"", ante a aplicação do art. da CLT, que prima pela descrição das verbas que estão sendo pagas ao trabalhador, trazendo assim maior transparência na quitação dos haveres do empregado em razão do trabalho.

Ademais, ainda que conste na defesa que o salário contratado abrangia horas extras e horas trabalhadas em domingos e feriados, tal prática, de qualquer forma, representa salário complessivo, sendo sua prática vedada, conforme entendimento consubstanciado na Súmula 91 do C. T.S.T.: "Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador.".

Por fim, cabe lembrar que o salário foi fixado de acordo com a prova documental trazida com a defesa das rés, razão pela qual não representa enriquecimento ilícito do autor. Mantém-se a r. sentença.

Rejeita-se.

f) DAS HORAS EXTRAS E TEMPO À DISPOSIÇÃO- DO ADICIONAL NOTURNO DO INTERVALO INTERJORNADA - DOS FERIADOS E DSR´S - DO SALÁRIO COMPLESSIVO X DA VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS (LEGALIDADE, PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE, ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, CONGLOBAMENTO E AUTONOMIA DA VONTADE)

Ressai da r. sentença:

"Tendo em vista a ausência de juntada de cartões de ponto, passo a fixar a jornada do autor.

Consta na inicial que"Durante todo o liame empregatício a reclamante laborou de segunda a segunda, sob jornada de trabalho média compreendida entre as 6h00/7h00 às 24h00/01h00a.m.a.m do dia seguinte, com intervalo para refeições. Não possuía folga semanal".

A reclamada afirma em sua defesa que o obreiro laborava em média 10 horas por dia.

O reclamante disse em seu depoimento que laborava das 7h à 1h, com 3 intervalos de 2 horas.

As partes acordaram a utilização de prova emprestada, conforme petição de fl. 1395.

A testemunha Alessandra, ouvida a pedido da reclamada disse que"o reclamante era garçom e que trabalhava nos 3 turnos de refeições, sendo que o café da manhã era das 7h às 10h, o almoço de meio-dia às 15h, e o jantar das 19h à meia noite; que entre os intervalos das refeições o autor faria o que quisesse".

A testemunha Valério, também ouvida a pedido da reclamada disse que"que os restaurantes funcionam, para café da manhã, das 7h às 10h; almoço, das 12h às 14h; jantar, das 20h às 24; que, nos navios, existem áreas de lazer e refeição para os tripulantes, cujo uso é liberado por 24h; que, durante o intervalo, o tripulante é livre para fazer o que quiser; que a escala de trabalho nos restaurantes é variável, nunca ultrapassando 11h diárias".

A testemunha Uyaron, ouvida a pedido da parte reclamante, disse que"havia escalas, das 06h às 11h, das 12h30min às 16h30min e depois das 18h30min à 01h da madrugada; todos trabalhavam diariamente nesses 03 turnos citados; não havia folgas; a cada 07 dias folgavam apenas meio período, folgando apenas no horário do almoço acima citado; se estivessem atracados em coincidisse essa folga, poderiam deixar o navio dentro desse horário"

Por fim, a testemunha Allan, também indicada pela parte autora, disse que" a reclamante, assim como os demais assistentes, trabalhava das 6h às 24h, com uma média de 2 intervalos ao longo do dia, com duração de 30 a 60 minutos ".

Desconsidero o depoimento da testemunha Allan no que concerne à jornada, pois destoa dos dizeres das demais testemunhas, e também do depoimento do autor.

Assim, analisando os depoimentos das demais testemunhas, e observando ainda o limite imposto pelo depoimento do próprio reclamante, que afirmou que trabalhava 12 horas por dia (das 7h à 1h com 3 intervalos de 2h), declaro que o obreiro cumpriu jornada das 7h às 10h, das 12h às 15h e das 19h às 24h, totalizando 11 horas de trabalho por dia. Declaro também que o autor laborava diariamente, gozando apenas de uma folga de um período a cada 7 dias, conforme afirmado pela testemunha Uyaron. Assim, deverá ser considerado que a cada 7 dias o autor não laborava no horário das 12h às 15h.

Ainda, no que concerne aos intervalos intrajornadas superiores a duas horas, vez que não previstos em lei ou acordo válido, tenho que representam tempo à disposição do empregador, no que superem 2h, devendo serem remunerados como serviço extraordinário, nos termos da Súmula 118 do TST.

Ressalto que não se pode confundir as violações ao limite máximo do intervalo intrajornada, com os períodos de repouso mencionados na Súmula 96 do TST.

Frente à jornada acima fixada, evidente a prestação de labor em sobrejornada. Assim, defiro o pagamento das horas excedentes da 8ª diária e da 44ª semanal (não há no contrato previsão de carga horária de 40 horas semanais), de forma não cumulativa.

Para o cálculo deverão ser observadas as jornadas acima fixadas, inclusive o tempo à disposição, divisor 220, adicional legal de 50%, salário global do Reclamante e evolução salarial.

Sobre as horas laboradas após às 22h, deverá incidir o adicional noturno de 20%.

Esclareço que as hora extras pré-contratadas, nos termos dos contratos carreados aos autos, não deverão ser abatidas, pois tratam de salário pactuado no momento da contratação, tendo inclusive já contado tal conclusão no item 03.

Os domingos e feriados laborados sem folga compensatória na mesma semana deverão ser remunerados com adicional de 100%.

Serão considerados feriados civis aqueles previstos em lei federal e a data magna do Estado, fixada em lei estadual (art. da lei n. 9.093/95). Também são considerados feriados religiosos os dias de guarda, declarados em lei municipal, de acordo com a tradição local e em número não superior a quatro, incluída a Sexta-Feira da Paixão (artigo da lei n. 9.035/95). No que tange às segundas e terças-feiras de carnaval, estes dias não devem ser considerados como feriado para fins de apuração das horas extras (OJ EX SE n 17, do TRT da 9ª Região).

Ressalto que a alínea a do § 1º do art. 249 da CLT apenas autoriza o trabalho em domingos para quem executa tarefas de"serviço de quartos e vigilância, movimentação das máquinas e aparelhos de bordo, limpeza e higiene da embarcação, preparo de alimentação da equipagem e dos passageiros, serviço"(sendo pessoal destes e, bem assim, aos socorros de urgência ao navio ou ao pessoal esta a hipótese do Autor que atuava na função de garçom de bar), mas não afasta o direito do trabalhador que atua em tais funções à folga semanal em outro dia da semana, constitucionalmente prevista, o que não havia no caso em tela.

Conforme preconiza a Orientação Jurisprudencial nº 97, da SDI-I, do C. TST:"Horas extras. Adicional noturno. Base de cálculo. O adicional noturno integra a base de cálculo das horas extras prestadas no período noturno".

O adicional noturno refere-se ao labor prestado em horário mais penoso ao trabalhador (artigo 73 da CLT) e o adicional de horas extras diz respeito ao extrapolamento da jornada normal. Ocorrendo ambas as situações, ambos os adicionais são devidos.

Portanto, o adicional noturno fará parte da base de cálculo das horas extraordinárias realizadas no horário noturno, incluindo sua prorrogação (Súmula 60, do TST), mas sobre elas não reflete, evitando-se bis in iden.

Em relação ao intervalo previsto no art. 384 da CLT, vigente à época do contrato do autor, o E. TRT da 9ª Região publicou a súmula 22, nos seguintes termos:

SÚMULA Nº 22. INTERVALO. TRABALHO DA MULHER. ART. 384 DA CLT. RECEPÇÃO PELO ART. 5º, I, DA CF. O art. 384 da CLT foi recepcionado pela Constituição Federal, o que torna devido, à trabalhadora, o intervalo de 15 minutos antes do início do labor extraordinário. Entretanto, pela razoabilidade, somente deve ser considerado exigível o referido intervalo se o trabalho extraordinário exceder a 30 minutos.

Assim, indevido o pagamento de horas extras por violação ao intervalo previsto no art. 384 da CLT, pois a leitura da súmula acima transcrita deixa claro ser este devido apenas às trabalhadoras.

Defiro, entretanto, o pagamento extraordinário do tempo suprimido do intervalo previsto no art. 66 da CLT, já que o autor laborava até às 24h e iniciava a jornada do dia seguinte às 7h. O critério de apuração aqui é o mesmo.

Nos termos dos arts. 66 e 67 da CLT, tem o empregado direito a um descanso de 24 horas por semana, o qual deve ser seguido por mais 11 horas de intervalo interjornadas, o que totaliza 35 horas. No entanto, o labor em dia de repouso semanal remunerado não caracteriza violação a intervalo, devendo apenas ser remunerado em dobro. Repouso semanal não se confunde com intervalo, já que aquele é remunerado, enquanto este é considerado suspensão do contrato de trabalho (não há trabalho e remuneração). Não existe, pois, base legal para deferir o pagamento de horas pela violação a intervalo de 35 horas, uma vez que já foi deferido o pagamento em dobro das horas laboradas em domingos sem folga compensatória dentro da mesma semana.

Não há falar em aplicação da Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho, pois não ficou comprovado nenhum acordo de compensação ou banco de horas válido, diante da habitualidade de horas extraordinárias.

Também não há deduzir minutos anteriores ou posteriores, segundo a parte final da súmula 366 do TST. Além disso, os poucos minutos, quando não ultrapassarem a cinco anteriores e posteriores à jornada laboral, conforme limites definidos pela súmula acima, e por meio do art. 58, § 1.º, da CLT, não devem ser computados na jornada laboral, eis que destinados à marcação do cartão de ponto, não se tratando de efetivo tempo de serviço.

Na hipótese dos autos, entretanto, a jornada de trabalho foi fixada de acordo com a prova oral, ausentes cartões de ponto válidos.

Não se cogita, neste contexto, de desconsiderar minutos residuais, na forma prevista no art. 58, § 1.º, da CLT, porque ausente o fundamento fático a justificar a desconsideração do tempo destinado à marcação do cartão de ponto.

Por habituais, de todas as horas extraordinárias deferidas, inclusive as horas extraordinárias pela não concessão de intervalos, cabem reflexos em descanso semanal remunerado (domingos e feriados), em 13º salários, e férias acrescidas de 1/3. Sobre o principal e reflexos incide o FGTS, exceto sobre férias indenizadas. Não haverá reflexo do descanso semanal remunerado nos domingos trabalhados, pois serão remunerados com o adicional de 100%, evitando-se duplo pagamento, ou seja, remuneração do dia com adicional de 100% mais o descanso semanal remunerado.

Quanto aos reflexos do descanso semanal remunerado acrescido das horas extraordinárias em férias, 13º salário, e Fundo de Garantia por Tempo de Serviço se fazem indevidos, de acordo com a OJ 394 da SDI-1, do TST:

OJ-SDI1-394. REPOUSO SEMANAL REMUNERADO - RSR. INTEGRAÇÃO DAS HORAS EXTRAS. NÃO REPERCUSSÃO NO CÁLCULO DAS FÉRIAS, DO DÉCIMO TERCEIRO SALÁRIO, DO AVISO PRÉVIO E DOS DEPÓSITOS DO FGTS. (DEJT divulgado em 09, 10 e 11.06.2010). A majoração do valor do repouso semanal remunerado, em razão da integração das horas extras habitualmente prestadas, não repercute no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS, sob pena de caracterização de bis in idem.

Para o cálculo do reflexo das horas extras em 13º salário e férias com 1/3, deverá ser observado o disposto na OJ EX SE nº 33 do E. TRT da 9ª Região, in verbis:

VIII - Horas extras. Reflexos. Forma de cálculo. O cálculo da média das horas extras para fins de reflexos em 13º salário, férias e aviso prévio deverá considerar sempre os meses efetivamente trabalhados, nos últimos 12 (doze) que antecedem a exigibilidade das verbas reflexas. (ex - OJ EX SE - 167 e ex - OJ EX SE - 180) RA/SE/004/2009, DEJT, divulgado em 21.10.2009, publicado em 22.10.2009.

Acolho em parte, nestes termos." (fls. 1499 -1502)

Insurgem-se as rés. (fls. 1612 - 1615)

Insurgem-se as rés, argumentando que a r. sentença fere os princípios da razoabilidade, proporcionalidade, vedação do enriquecimento ilícito, conglobamento e autonomia da vontade coletiva. Aduzem que "Deve-se pontuar que a vedação ao pagamento salarial complessivo, em que pese sua importância para o ambiente juslaboral, deve ser tratado de forma relativa, com parcimônia e razoabilidade e conjuntamente aos princípios constitucionais em vigor. (...) Para se ter ideia da total ausência de razoabilidade ao se deferir horas extras neste formato, estar-se-ia autorizando o pagamento das horas extras em caráter exponenciais, pois a armadora internacional já calcula os adicionais sobre o salário-base e agora novamente seriam calculadas novas horas extras sobre o salário base e horas extras já pagas.". Insistem em que pagam as horas extras conforme A. C.T. internacional, que entendem aplicável à espécie. Assim, pretendem a compensação dos valores pagos sob o mesmo título.

Aprecia-se.

Não assiste razão às rés.

Inicialmente, conforme visto nos itens anteriores, a legislação aplicável à hipótese em comento é a brasileira, sendo portanto, com todo o respeito, inaplicáveis os A. C.T. internacionais citados pelas rés, devendo as horas extras seguir o regime jurídico brasileiro.

Conforme constou na r. sentença, parcialmente reformada no item d do recurso do autor, foi fixada a jornada em tempo superior a 12 horas, reconhecida, portanto, a realização de trabalho extraordinário pelo autor.

Verificados os recibos de pagamento (fls. 607 e seguintes), a título de exemplo, cito o demonstrativo de pagamento relativo ao mês de janeiro de 2017, em que, embora cite as rubricas "003 salário hora extra", "017 comissões" e "016 pagamentos adicionais" não há indicativo que demonstre a correspondência de tais valores a eventos que os tenham ensejado.

Desse modo, depreende-se haver um valor pré-estipulado para o pagamento de horas extras, sem contudo haver proporcionalidade, pois, não se levou em conta o número de horas extras de fato laboradas pelo autor, mas um valor mensal a que se atribuiu a esse trabalho, independentemente do quanto labor extraordinário realizasse; do mesmo modo as comissões e pagamentos adicionais. Ao caso, aplica-se a Súmula 91 do C. T.S.T., que alude às hipóteses nas quais não é possível identificar quais as verbas, que estão sendo quitadas, sob a mesma rubrica:

Súmula nº 91 do TST

SALÁRIO COMPLESSIVO (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003

Nula é a cláusula contratual que fixa determinada importância ou percentagem para atender englobadamente vários direitos legais ou contratuais do trabalhador.

A situação que se apresenta já é conhecida deste Colegiado. Nesse passo, quanto ao pagamento de horas extras contratuais, peço venia para adotar como fundamento as razões apontadas no Acórdão de relatoria do Excelentíssimo Desembargador Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, no processo XXXXX-57.2016.5.09.0016 (RO), in verbis:

"Da análise dos holerites apresentados nos autos (fls. 708/734), observo que, enquanto trabalhou como garçom assistente, a Autora recebia os salários de forma complessiva, constando valor fixo de horas extras, inicialmente de 3,02 e depois de 3,99, comissões variadas e a rubrica"pagamentos adicionais"que abrangia quase a integralidade do salário.

Já quando iniciou as atividades como fotógrafa, em abril de 2016, sua remuneração passou a ser discriminada, com as seguintes rubricas (fls. 727/734):

*Pagamento mensal total;

*Hora extra GTD

*Salário Hora Extra

*Pagamento inicial por horas extras

*Licença remunerada

*Bônus

*Comissões

Com exceção das comissões, que eram variáveis, todas as demais verbas eram pagas de forma fixa, considerando a" unidade ", equivalente à quantidade de dias.

Havia, portanto, previsão de pagamento prévio de horas extras em valor fixo, além de licença remunerada e bônus, também sempre em igual valor, independentemente do total de horas que eram efetivamente trabalhadas ou do alcance de alguma meta, configurando-se a conhecida prática de pré-contratação de horas extras, antes muito comum nos Bancos.

O pagamento fixo de horas extras, licença e bônus evidencia a desvinculação do pagamento realizado com a efetiva jornada realizada, com a existência de licenças ou com o atingimento de metas, mostrando-se proporcionais aos dias trabalhados no mês. Caracterizada a pré-contratação das horas extraordinárias, confere-se às parcelas pagas a partir de abril de 2016 o caráter de verdadeiro salário mascarado na forma de pagamento de labor extra. Entendo, assim, que os valores pagos sob as rubricas" Pagamento mensal total "," Hora extra GTD "," Salário Hora Extra "," Pagamento inicial por horas extras "," Licença remunerada "e" Bônus ", devem compor o salário base de 04/2016 até 07/2016.

Ressalto o que determina o parágrafo primeiro do art. 457 da CLT:"Integram o salário não só a importância fixa estipulada, como também as comissões, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador."Perfeitamente cabível, assim, o pedido do reconhecimento dos valores pagos nas rubricas citadas como salário em sentido estrito, impondo-se, por conseguinte, a condenação do empregador ao pagamento das horas extras tomando como base este salário.

Para os demais períodos laborados, em que consta a rubrica" pagamentos adicionais ", constantes nos recibos de maio de 2015 até outubro de 2015 e de fevereiro de 2016 até início de abril do mesmo ano, observo tratar-se da rubrica indicada para quase a totalidade dos proventos, complementada pelo pagamento de comissões e horas extras fixas. Para tais períodos, entendo que as horas extras devem ser calculadas tomando como base a rubrica" pagamentos adicionais ".

Quanto à anotação em CTPS, carece de interesse recursal, uma vez que para tal fim o julgado acolheu os valores indicados na inicial.

Por todo o exposto, nego provimento ao recurso das Reclamadas e dou parcial provimento ao recurso da Autora para reconhecer que as horas extras deverão ser calculadas da seguinte forma: de 18/04/2015 até 17/10/2015 e de 17/01/2016 até 02/04/2016, tomando por base as rubricas" pagamentos adicionais "e" salário hora extra ", como salário base; de 03/04/2016 até 16/07/2016, considerando as rubricas" Pagamento mensal total "," Hora extra GTD "," Salário Hora Extra "," Pagamento inicial por horas extras "," Licença remunerada "e" Bônus "para compor o salário base."

A respeito da remuneração, a ré trouxe aos autos demonstrativos de pagamento traduzidos às fls. 607 e seguintes. Assim, feita a análise dos valores ali constantes à luz da legislação aplicada ao caso.

Com o máximo respeito à tese recursal, repisa-se, o fato de ter sido reconhecida a aplicação da legislação brasileira em juízo não significa que ela não devesse ser observada desde o princípio.

Ante o exposto, não merece reparo a r. sentença.

Rejeita-se.

g) DO INTERVALO INTERJORNADA - DA INCONSTITUCIONALIDADE DA O.J. 355 DO TST - DA VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE FACE AOS ARTIGOS 66, 67 E 75 DA CLT - DA AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE, ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, CONGLOBAMENTO E AUTONOMIA DA VONTADE

Ressai da r. sentença:

"Defiro, entretanto, o pagamento extraordinário do tempo suprimido do intervalo previsto no art. 66 da CLT, já que o autor laborava até às 24h e iniciava a jornada do dia seguinte às 7h. O critério de apuração aqui é o mesmo.

Nos termos dos arts. 66 e 67 da CLT, tem o empregado direito a um descanso de 24 horas por semana, o qual deve ser seguido por mais 11 horas de intervalo interjornadas, o que totaliza 35 horas. No entanto, o labor em dia de repouso semanal remunerado não caracteriza violação a intervalo, devendo apenas ser remunerado em dobro. Repouso semanal não se confunde com intervalo, já que aquele é remunerado, enquanto este é considerado suspensão do contrato de trabalho (não há trabalho e remuneração). Não existe, pois, base legal para deferir o pagamento de horas pela violação a intervalo de 35 horas, uma vez que já foi deferido o pagamento em dobro das horas laboradas em domingos sem folga compensatória dentro da mesma semana.

Não há falar em aplicação da Súmula 85 do Tribunal Superior do Trabalho, pois não ficou comprovado nenhum acordo de compensação ou banco de horas válido, diante da habitualidade de horas extraordinárias.

Também não há deduzir minutos anteriores ou posteriores, segundo a parte final da súmula 366 do TST.

Além disso, os poucos minutos, quando não ultrapassarem a cinco anteriores e posteriores à jornada laboral, conforme limites definidos pela súmula acima, e por meio do art. 58, § 1.º, da CLT, não devem ser computados na jornada laboral, eis que destinados à marcação do cartão de ponto, não se tratando de efetivo tempo de serviço.

Na hipótese dos autos, entretanto, a jornada de trabalho foi fixada de acordo com a prova oral, ausentes cartões de ponto válidos.

Não se cogita, neste contexto, de desconsiderar minutos residuais, na forma prevista no art. 58, § 1.º, da CLT, porque ausente o fundamento fático a justificar a desconsideração do tempo destinado à marcação do cartão de ponto. (...)" (fls. 1501-1502)

Insurgem-se as rés. (fls. 1617-1619)

Insurgem-se as rés, argumentando que a r. sentença "não encontra amparo na legislação vigente, ferindo o princípio da legalidade, previsto no artigo 5º, inciso II da CF/88, bem como os princípios da razoabilidade, proporcionalidade, vedação do enriquecimento ilícito (do bis in idem), conglobamento e autonomia da vontade coletiva."

Aduzem que "Por certo, que se o legislador quisesse atribuir ao artigo 66 da C.L.T. penalidade direta, o teria feito nos moldes do artigo 71 do mesmo diploma legal, e assim, não o fazendo, a única interpretação cabível é a de que em caso de não observância ao intervalo de 11 horas entre uma jornada e outra, será aplicado ao infrator a multa administrativa disposta no artigo 75 do Texto Consolidado Trabalhista."

Acrescenta que a equivocada interpretação acerca da punição com horas extras, acrescidas de 50% pela supressão do intervalo entrejornadas, assim como a OJ 355 do C. T.S.T., "bem como a interpretação analógica do parágrafo IV do artigo 71 da CLT ferem a Constituição Federal em seu princípio da legalidade (pela exegese dos artigos 75, 66 e 67, além dos artigos 248 a 252 todos da CLT), previsto no artigo 5º, inciso II da CF/88, bem como viola os princípios constitucionais da razoabilidade, da proporcionalidade e da vedação ao enriquecimento ilícito (do bis in idem), do conglobamento e da autonomia da vontade coletiva."

Aprecia-se.

Inicialmente, conforme visto nos itens anteriores, a legislação aplicável à hipótese em comento é a brasileira, sendo portanto, com todo o respeito, inaplicáveis os A. C.T. internacionais citados pelas rés, devendo as horas extras seguir o regime jurídico brasileiro.

Em segundo plano, destaca-se que não houve condenação ao pagamento de horas extras decorrentes de violação do intervalo do art. 67 da C.L.T., nada restando a ser apreciado nesse particular. Nada a prover.

No tocante à condenação ao pagamento das horas extras decorrentes da violação do intervalo previsto nos art. 66 da C.L.T., data venia das recorrentes, reputa-se correto o entendimento a quo tendo em vista a jornada fixada em sentença e ligeiramente ampliada por esta E. Turma.

A violação ao intervalo interjornada implica pagamento das horas subtraídas como labor suplementar, pois retira do empregado a oportunidade assegurada legalmente de restaurar suas energias para uma nova jornada, expondo-o a riscos em face do pequeno período para descanso e à inobservância ao intervalo mínimo previsto pela legislação Consolidada.

Ademais, saliento não traduzir bis in idem o deferimento do pagamento do intervalo interjornadas suprimido e a condenação relativa ao pagamento das horas extras efetivamente laboradas no referido período. Embora oriundos de um mesmo fato gerador, tratam-se de direitos diversos, não se cogitando de enriquecimento sem causa da parte autora.

No entendimento desta e. Turma, a violação do intervalo entrejornadas não configura mera infração administrativa, na medida em que o disposto no artigo 66 da C.L.T. tem por fim assegurar preceito constitucional voltado à "redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança" (artigo 7º, XXII), configurando, portanto, medida que ratifica princípios constitucionais, como o da dignidade humana e o da valorização do trabalho. Se o empregador exige trabalho nos períodos legalmente destinados ao descanso interjornada diário e semanal, está cometendo atentado à higidez do empregado e, em consequência, deve arcar não só com o pagamento como extra do tempo trabalhado nesse período (art. 71, § 4º da C.L.T.), assim como, também, pela infração administrativa.

A esse respeito, MAURÍCIO GODINHO DELGADO (Jornada de Trabalho e Descansos Trabalhistas", 2ª edição. São Paulo, Editora LTr, p. 113):

"não desapareceu a infração administrativa, é óbvio. Ela continuará a existir, caso desrespeitado o intervalo intrajornada imperativo (art. 75, CLT). A norma jurídica concernente a tais intervalos, afinal, é de saúde e segurança laborais, imantada pela própria Constituição da Republica (art. 7º, XXII). Apenas ficou definido que o reconhecimento da infração administrativa não elide a necessidade de específica sobre-remuneração ao obreiro, decorrente esta da disponibilidade temporal frustrada no interior da jornada".

Sobre a matéria, a Orientação Jurisprudencial 355 da SDI-1 do C. TST estabelece:

INTERVALO INTERJORNADAS. INOBSERVÂNCIA. HORAS EXTRAS. PERÍODO PAGO COMO SOBREJORNADA. ART. 66 DA CLT. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO § 4º DO ART. 71 DA CLT. DJ 14.03.2008. O desrespeito ao intervalo mínimo interjornadas previsto no art. 66 da CLT acarreta, por analogia, os mesmos efeitos previstos no § 4º do art. 71 da CLT e na Súmula nº 110 do TST, devendo-se pagar a integralidade das horas que foram subtraídas do intervalo, acrescidas do respectivo adicional.

Pondera-se que, assim como ocorre com o intervalo previsto no artigo 71 da C.L.T. (intrajornada), a necessidade de concessão de tempo intervalar mínimo para descanso na forma prevista no artigo 66 (entrejornadas) da C.L.T. é de caráter higiênico e visa ao bem-estar do empregado. Quando não concedido esse intervalo o serviço torna-se mais penoso ao trabalhador.

Eventual obrigação de remuneração decorrente da violação do intervalo entrejornadas, como a que se discute nos autos, não tem como fim compensar o trabalho realizado durante o período, mas sim a supressão ou restrição do direito ao descanso, pelo maior esforço que é exigido do empregado.

Ante o exposto, não há ofensa ao art. 5º, II da CF/88. Nada a reparar.

Rejeita-se.

h) DA MULTA DIÁRIA

Ressai da r. sentença:

" Assim, não reconheço a unicidade contratual pleiteada, e acolho o pedido sucessivo de anotação do contrato na CTPS do autor, observando-se as datas de entrada e saída informadas na inicial e a função de garçom Quanto à remuneração, a reclamada trouxe aos autos o contrato traduzido (fls. 602/606), o qual não foi destituído por nenhum meio de prova, pelo que, deverá ser anotada a remuneração constante no contrato, devidamente convertida para a moeda nacional, devendo ser utilizado o valor descrito no contrato sob a rubrica "Pagamento Mensal Total", ou seja, U$ 1.232,00, conforme fl. 602.

O reclamante deverá apresentar sua CTPS, no prazo de 05 (cinco) dias, para que a primeira reclamada proceda à anotação devida no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da ciência da juntada da CTPS aos autos, sob pena de multa diária de R$ 50,00 (cinquenta reais), a favor do reclamante.

Caso não seja procedida a anotação num prazo de 30 (trinta) dias, deverá esta ser feita pela Secretaria da Vara, sem prejuízo da execução da multa correspondente."(fl. 1498)

Insurgem-se as rés. (fls. 1619-1620)

Sustentam incorreta a condenação, pois a anotação na C.T. P.S. pode ser realizada pela própria Secretaria da Vara do Trabalho, nos seguintes termos:

"141. A astreinte tem por objetivo compelir a empresa ao cumprimento das obrigações de fazer ou não fazer impostas por instrumento normativo ou autoridade competente, ou seja, são cabíveis para forçar a prática do ato ou sua omissão, sendo efetiva forma de coação, porém reservada aos casos em que somente o empregador pode dar cumprimento à obrigação, atuando como taxa de reparação do dano ou mesmo como seu equivalente monetário.

142. Não é o caso dos autos, uma vez que a anotação na Carteira de Trabalho pode ser suprida pela Secretaria da Vara, nos termos do artigo 39, § 2º da CLT. Requer-se, portanto, a modificação da r. sentença para se excluir a astreintes da condenação imposta às Recorrentes.

Sucessivamente, em caso de manutenção da r. sentença, requerem o elastecimento do prazo.

Analisa-se.

De acordo com o entendimento desta E. Segunda Turma, o comando legal previsto no artigo 39, § 1º, da C.L.T.:

"Verificando-se que as alegações feitas pelo reclamado versam sobre a não existência de relação de emprego ou sendo impossível verificar essa condição pelos meios administrativos, será o processo encaminhado à Justiça do Trabalho ficando, nesse caso, sobrestado o julgamento do auto de infração que houver sido lavrado.

§ 1º. Se não houver acordo, a Junta de Conciliação e Julgamento, em sua sentença, ordenará que a Secretaria efetue as devidas anotações uma vez transitada em julgado, e faça a comunicação à autoridade competente para o fim de aplicar a multa cabível"

Desse modo, tal dispositivo não tem o condão de eximir o empregador do cumprimento do dever de anotar a C.T. P.S. do empregado, sendo aplicável somente diante da impossibilidade de cumprimento ou quando configurado o não cumprimento espontâneo da determinação de anotação pelo empregador.

Desse modo, reconhecida em sentença a necessidade de anotação da C.T. P.S., cabe à empregadora dar cumprimento ao julgado, procedendo às respectivas anotações na C.T. P.S. ou, assim não fazendo, deixar a critério do magistrado a aplicação do disposto no mencionado artigo 39, § 1º, a qual não exclui a possibilidade de cominação de multa diária, que encontra previsão no artigo 536, §§ 1º e , do C.P.C. de 2015, norma aplicável supletivamente ao Processo do Trabalho, por força do que dispõe o artigo 769 da C.L.T., sendo certo que a C.L.T. é omissa com relação aos mecanismos de que se pode valer o magistrado para que seja dado cumprimento às suas determinações.

Frisa-se que a atuação da Secretaria da Vara do Trabalho e a execução da multa só ocorrerão no caso de a parte ré deixar de cumprir sua obrigação de proceder às devidas anotações na C.T. P.S. do autor.

Por derradeiro, as rés não justificam o pedido de prorrogação do prazo para que sejam efetuadas as anotações na C.T. P.S. do autor, razão pela qual nada a prover.

Rejeita-se.

i) DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - ASSISTENCIAIS

Extrai-se da r. sentença:

"9. HONORÁRIOS DE ADVOGADO:

Para que não fiquem dúvidas, esclareço que os honorários assistenciais não foram revogados pela Lei 13.467/2017, subsistindo tanto os honorários assistenciais e de sucumbência.

Nos termos do art. 791-A da CLT, ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15% (quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa.

O § 2o do referido artigo diz que ao fixar os honorários, o juízo observará o grau de zelo do profissional, o lugar de prestação do serviço, a natureza e a importância da causa e o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço. Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência recíproca, vedada a compensação entre os honorários.

Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário.

A norma tem aplicação imediata ao processo do trabalho, diante do princípio do isolamento dos atos processuais, consagrado nos artigos 14, parte final e art. 1.046 do CPC e 915 da CLT.

Nesse sentido é a decisão unânime da primeira turma do E. STF que analisou a questão à luz da Lei 13.467/2017, cujo teor é o seguinte:

Ementa: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DO TRABALHO. ART. 791-A DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, INTRODUZIDO PELA LEI 13.467/2017. INAPLICABILIDADE A PROCESSO JÁ SENTENCIADO.

1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente - a Lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada"Reforma Trabalhista".

2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei.

3. Agravo interno a que se nega provimento.( AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO 1.014.675, DOU 12/04/2018).

Portanto, condeno as reclamadas ao pagamento de honorários de sucumbência aos procuradores do reclamante, no importe de 5% sobre o valor de liquidação da sentença, excluídos os valores de terceiros

(contribuições previdenciárias e imposto de renda), com base nos parâmetros dispostos no § 2º do art. 791-A da CLT.

Tendo em vista que o autor está assistido por sindicato, deverão também as reclamadas quitar honorários assistenciais no mesmo valor já acima estabelecido, em favor da entidade sindical.

Para que não fiquem dúvidas, esclareço que os honorários assistenciais não foram revogados pela Lei 13.467/2017, subsistindo tanto os honorários assistenciais e de sucumbência.

Em relação ao reclamante, como a petição inicial não apresenta pedidos líquidos, os honorários de sucumbência serão fixados por arbitramento.

Logo, considerando também os parâmetros do § 2º do art. 791-A da CLT e também considerando que o reclamante foi sucumbente em mais da metade de seus pedidos, arbitro os honorários de sucumbência no importe líquido de R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Não havendo o pagamento espontâneo dos honorários, o valor será deduzido do crédito do reclamante nestes autos ou em outra reclamatória existente." (fls. 1504-1505)

Insurgem-se as rés. (fls. 1620-1623, destaque acrescido)

Sustentam que, contrariamente ao entendimento pacificado pelo C. T.S.T., o d. julgador de origem condenou as rés ao pagamento de honorários advocatícios.

Invocam a Súmula nº 329 do C. T.S.T., a qual revalida após a promulgação da Constituição Federal/1988, o teor da Súmula nº 219 daquele mesmo órgão, que exige a assistência sindical para ensejar tal condenação.

Asseveram, na hipótese dos autos, inexiste assistência sindical:

"147. Por outro lado, destaque-se que inexiste in casu assistência sindical, sendo inservível a suposta credencial declaração postumamente acostada à inicial, já que pela própria leitura do referido documento, o Sindicato não está prestando qualquer auxílio ao Recorrido, tratando-se de mero estratagema com o fito de ser deferido o pagamento de honorários advocatícios ao profissional contratado de forma particular pelo Recorrido.

148. Destaca-se que os documentos de fls.402 e seguintes dizem respeito ao Sindicato de trabalhadores em empresas de serviços contábeis, assessoramento, pericias, informações, pesquisas em empresas prestadoras de serviço, totalmente estranhas a categoria que eventualmente poderia se enquadrar o Recorrido."

Invocam, ainda, a OJ nº 57 deste E. T.R.T.9., que, asseguram, apresenta como requisitos par o deferimento de honorários assistenciais a declaração de insuficiência econômica (de próprio punho ou pelo advogado), ou a percepção de até dois salários mínimos legais e a assistência sindical.

Requerem, assim, seja afastada a condenação da parte ré ao pagamento de honorários assistenciais.

Analisa-se.

Sem razão as recorrentes.

Inicialmente, insta ressaltar que os honorários advocatícios diferenciam-se dos honorários assistenciais, mormente quando tratados no âmbito desta Justiça Especializada. Assim, os honorários advocatícios não são, em regra, devidos no processo do trabalho (exceção quanto às ações especiais), visto que decorrem da sucumbência da parte, aplicando-se o Código de Processo Civil. Já os honorários assistenciais são aqueles devidos em razão da gratuidade da justiça ou da assistência judiciária gratuita deferida à parte, normalmente, obreira.

Feito esse primeiro esclarecimento, analisa-se a insurgência recursal.

A sistemática legal da assistência judiciária gratuita e honorários foi modificada pela Lei 10.537/2002, que conferiu nova redação ao artigo 789 da C.L.T., dispositivo que, em conjunto com a Lei 1060/1950, passa a reger a assistência judiciária gratuita no processo do trabalho (gênero que compreende a justiça gratuita e os honorários assistenciais ou advocatícios).

Primeiramente, a Lei 10.288/2001 introduziu o § 10 no artigo 789 da C.L.T. (O sindicato da categoria profissional prestará assistência judiciária gratuita ao trabalhador desempregado ou que perceber salário inferior a cinco salários mínimos ou que declare, sob responsabilidade, não possuir, em razão dos encargos próprios e familiares, condições econômicas de prover à demanda), passando a regular integralmente a assistência judiciária, portanto esse dispositivo derrogou o artigo 14, caput e § 1º da Lei 5.584/1970. Entretanto, um ano após, foi editada a Lei 10.537/2002, que determinou nova redação ao mesmo artigo 789 da C.L.T., sem mencionar o aludido § 10, que restou, dessa forma, revogado tacitamente pela lei nova.

Atualmente, é o artigo 790, § 3º que trata da concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.

O entendimento pessoal desta relatora é de que, interpretado sistematicamente, esse comando legal permite concluir que restou suprimida a assistência judiciária como monopólio da entidade sindical profissional, de forma a tornar possível o pagamento de honorários advocatícios ao beneficiário da justiça gratuita.

Todavia, cedo passo ao entendimento da maioria dos integrantes deste Colegiado, no sentido de que a Súmula 219, do T.S.T., item I, condiciona o deferimento da verba ao preenchimento dos dois requisitos ali mencionados: a declaração de insuficiência de recursos financeiros e a assistência sindical (Res. 204/2016, DEJT divulgado em 17, 18 e 21.03.2016). A sustentar essa posição, menciono precedentes do Tribunal Superior do Trabalho: RR XXXXX-59.2003.5.09.0651, DEJT 25/02/2011, 1ª Turma - Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa; RR XXXXX-46.2002.5.09.0068, DEJT 25/03/2011, 2ª Turma, Rel. Min Renato de Lacerda Paiva; RR XXXXX-06.2008.5.09.0660, DEJT 18/03/2011, 3ª Turma, Rel. Min. Alberto Luiz Bresciani de Fontan Pereira.

Da mesma forma, este é o entendimento contido na Súmula 17 deste E. T.R.T., publicada no DEJT em 2.09.2011, 5.09.2011 e 6.9.2011:

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. JUSTIÇA DO TRABALHO. LIDES DECORRENTES DA RELAÇÃO DE EMPREGO. LEIS N. 5.584/70 E 10.537/02. O deferimento dos honorários advocatícios na Justiça do Trabalho, em lides decorrentes da relação de emprego, pressupõe o preenchimento concomitante dos requisitos da insuficiência econômica e da assistência sindical, nos moldes do disposto no art. 14, parágrafo primeiro, da Lei 5.584/1970, mesmo após a vigência da Lei 10.537/2002.

O autor declarou seu estado de hipossuficiência econômica à fl. 22 e é beneficiário da justiça gratuita, conferida por este Colegiado no item a do Recurso do autor. Além disso, comprovou estar assistido pelo Sindicato de sua categoria (fl. 404), motivo pelo qual faz jus aos honorários assistenciais.

Por fim, cumpre destacar que as rés não lograram êxito em desconstituir o termo de credenciamento de fl. 404, seja quanto sua legitimidade, seja quanto à abrangência da categoria.

Diante do exposto, não há contrariedade à OJ 305 da SDI-1 do C. T.S.T..

Rejeita-se.

j) DO PREQUESTIONAMENTO

As rés requerem sejam enfrentadas todas as teses desenvolvidas na peça recursal, nos seguintes termos:

"171. Na hipótese de manutenção da decisão Recorrida, requerem as Recorrentes o enfrentamento de todas as teses desenvolvidas nessa peça recursal, notadamente dos dispositivos legais invocados e vulnerados pela sentença hostilizada, para fins de prequestionamento." (fl. 1719)

Analisa-se.

Para fins de prequestionamento, faz-se necessário adotar tese a respeito da questão trazida a julgamento e explicitar o motivos pelos quais se chegou à conclusão que traduz a prestação jurisdicional.

No caso ora sob apreciação, com os fundamentos expostos na r. sentença e no presente v. acórdão, entende-se que ficaram prequestionadas todas as matérias e as questões objeto de recurso, tendo sido aplicadas as legislações constitucional e infraconstitucional e as normas convencionais tidas como cabíveis.

Considerando que houve a devida exposição de tese jurídica para que as partes interessadas tenham ciência dos motivos pelos quais o Órgão julgador aplicou determinado entendimento, declaro prequestionadas todas as matérias trazidas a julgamento.

Declara-se que estão prequestionadas todas as matérias invocadas.

Conclusão do recurso

ACÓRDÃO

Cabeçalho do acórdão

Acórdão

Em Sessão Ordinária realizada nesta data, sob a Presidência do Excelentíssimo Desembargador Cassio Colombo Filho; presente a Excelentíssima Procuradora Margaret Matos de Carvalho, representante do Ministério Público do Trabalho; computados os votos dos Excelentíssimos Desembargadores Ana Carolina Zaina, Cassio Colombo Filho e Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, sustentou oralmente o advogado Anderson Preres da Silva inscrito pela parte recorrente Jose Robson Francisco da Silva Junior; ausente a advogada Luana Pancaro Faber inscrita pela parte recorrente Pullmantur Cruzeiros do Brasil Ltda.; ACORDAM os Desembargadores da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, por unanimidade de votos, CONHECER DO RECURSO ORDINÁRIO DO AUTOR E DAS RÉS. No mérito, por maioria de votos, vencido parcialmente o Exmo. Des. Ricardo Tadeu Marques da Fonseca, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO AUTOR para: a) conceder ao obreiro os benefícios da justiça gratuita; b) fixar que o horário de início de labor do autor no terceiro turno de trabalho iniciava às 17h00 e finalizava à 01h00 da madrugada, o que deverá ser considerado para o cálculo das horas extras devidas; c) condenar as rés ao pagamento da multa prevista no art. 477 da C.L.T.; d) condenar as rés ao pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$5.000,00 (cinco mil reais), com juros de mora e correção monetária na forma da Súmula 439 do C. T.S.T., em razão da exigência de realização de exames de HIV para a contratação; e) condenar as rés ao pagamento de indenização por dano existencial fixada em R$ 10.000,00 (dez mil reais); f) excluir a condenação do autor ao pagamento de honorários advocatícios; g) determinar a utilização do IPCA-E; h) afastar a determinação de abatimento global e i) determinar a devolução dos valores descontados a título de passagens aéras. Sem divergência de votos, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DAS RÉS para: a) para o cálculo das verbas deferidas na presente ação, seja observada a data do contrato para a conversão da moeda; b) declarar que estão prequestionadas todas as matérias invocadas. Tudo nos termos da fundamentação.

Custas acrescidas em R$ 400,00 (quatrocentos reais) em razão do valor provisoriamente majorado da condenação em R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

Intimem-se.

Curitiba, 24 de setembro de 2019.

Assinatura

ANA CAROLINA ZAINA

Relatora

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