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6 de Maio de 2024

Resumo informativo de jurisprudência do STJ nº 789 - 03 de outubro de 2023.

Compilado das principais decisões da semana no Tribunal da Cidadania

Informativo nº 789
3 de outubro de 2023.

PRIMEIRA SEÇÃO


Processo
Pet 12.329-DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Seção, por unanimidade, julgado em 27/9/2023, publicado em 2/10/2023.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Servidor público. Greve. Desconto dos dias não trabalhados. Legalidade. A impossibilidade de obtenção dos registros acerca dos dias não trabalhados ou das horas compensadas. Irrelevância.

DESTAQUE

A impossibilidade de obtenção dos registros acerca dos dias não trabalhados ou das horas compensadas não pode se tornar um óbice para descontar os dias não trabalhados pelos servidores públicos em decorrência de greve.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 693.456/RJ, sob o regime da repercussão geral, firmou a tese de que "a administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público".

Nesse mesmo sentido, destacam-se os precedentes desta Corte: Pet n. 10.556/RJ, relator Ministro Paulo Sérgio Domingues, Primeira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 2/5/2023 e Pet n. 7.920/DF, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 9/10/2019, DJe de 4/11/2019.

Vale ressaltar que a impossibilidade de obtenção dos registros acerca dos dias não trabalhados ou das horas compensadas não pode tornar-se um óbice para reconhecer o direito da parte autora em descontar os dias não trabalhados pelos servidores públicos, em decorrência da suspensão temporária do contrato de trabalho. Até porque o referido desconto somente será implantado após prévio procedimento administrativo em que será assegurado ao servidor o exercício do contraditório e da ampla defesa.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

PRECEDENTES QUALIFICADOS

RE 693.456/RJ

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SEGUNDA SEÇÃO


Processo
EREsp 1.866.844-SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Rel. para acórdão Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Segunda Seção, por maioria, julgado em 27/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Compra e venda de imóvel. Alienação fiduciária em garantia. Registro do contrato em cartório. Ausência. Efeitos entre os contratantes. Validade. Alienação extrajudicial. Registro. Imprescindibilidade.

DESTAQUE

A ausência de registro do contrato que serve de título à propriedade fiduciária no Registro de Imóveis não retira a validade do ajuste entre os contratantes, bem como não impede o credor fiduciário de, após a efetivação do registro, promover a alienação extrajudicial do bem.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Ainda que o registro do contrato no competente Registro de Imóveis seja imprescindível à constituição da propriedade fiduciária de coisa imóvel, nos termos do art. 23 da Lei n. 9.514/1997, sua ausência não retira a validade e a eficácia dos termos livre e previamente ajustados entre os contratantes, inclusive da cláusula que autoriza a alienação extrajudicial do imóvel em caso de inadimplência.

O reconhecimento da validade e da eficácia do contrato de alienação fiduciária, mesmo sem o registro no Ofício de Registro de Imóveis, opera-se em favor de ambas as partes da relação contratual.

Com efeito, constituída a propriedade fiduciária, com o consequente desdobramento da posse, o credor fiduciário perde o direito de livre disposição do bem. Nessa hipótese, somente se houver inadimplência do devedor fiduciante, e após a consolidação da propriedade, observado o procedimento previsto no art. 26 da Lei n. 9.514/1997, poderá o credor fiduciário alienar o objeto da garantia.

Assim, mesmo na ausência de registro, ao devedor fiduciante deve ser assegurado o direito de não ter o imóvel objeto da garantia alienado fora das hipóteses legalmente admitidas e de obter o termo de quitação após o pagamento integral da dívida e de seus encargos, com vistas à consolidação da propriedade definitiva do imóvel.

Se assim não fosse, o credor fiduciário poderia requerer o distrato mesmo sem o inadimplemento do devedor fiduciário, gerando enorme insegurança jurídica para este último.

Em contrapartida, por se tratar de contrato bilateral, com a assunção de obrigações recíprocas, também deve ser reconhecido o direito de o credor fiduciário utilizar os meios contratuais de execução da garantia em caso de inadimplência do devedor fiduciante, mesmo na hipótese em que a avença não é levada a registro.

Ressalta-se que o registro, conquanto despiciendo para conferir eficácia ao contrato de alienação fiduciária entre devedor fiduciante e credor fiduciário, é, sim, imprescindível para dar início à alienação extrajudicial do imóvel, tendo em vista que a constituição do devedor em mora e a eventual purgação desta se processa perante o Oficial de Registro de Imóveis, nos moldes do art. 26 da Lei n. 9.514/1997.

Assim, admitir a rescisão do contrato de alienação fiduciária de bem imóvel com base nas normas de proteção ao direito do consumidor, ou seja, com a devolução da maior parte dos valores pagos e a retenção de um pequeno percentual a título de ressarcimento de eventuais despesas, seria desvirtuar por completo o instituto, que certamente cairia em desuso, em prejuízo dos próprios consumidores de imóveis, que teriam maior dificuldade de acesso ao crédito e juros mais elevados.

Entende-se, desse modo, que a ausência de registro do contrato que serve de título à propriedade fiduciária no competente Registro de Imóveis não confere ao devedor fiduciante o direito de promover a rescisão da avença por meio diverso daquele contratualmente previsto, tampouco impede o credor fiduciário de, após a efetivação do registro, promover a alienação do bem em leilão para só então entregar eventual saldo remanescente ao adquirente do imóvel, descontados os valores da dívida e das demais despesas efetivamente comprovadas.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 9.514/1997, arts. 23e 26

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Processo CC 183.402-MG, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Seção, por unanimidade, julgado em 27/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL, DIREITO FALIMENTAR

Tema

Tramitação de falências envolvendo empresas pertencentes a um mesmo grupo econômico. Lei n. 11.101/2005. Necessidade de reunião das ações falimentares perante o juízo do local do principal estabelecimento do devedor.

DESTAQUE

A existência de grupo econômico entre as empresas envolvidas impõe que as falências devem ser reunidas perante o juízo onde fica localizado o principal estabelecimento do devedor conforme estabelecido no art. da Lei 11.101/2005.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A prolação de atos judiciais envolvendo ativos relativos às empresas integrantes do mesmo grupo econômico configura a existência de conflito de competência entre os juízos.

Considerando a existência de grupo econômico entre as empresas envolvidas e a configuração do conflito de competência, é impositivo que as falências devam ser reunidas perante o juiz onde fica localizado o "principal estabelecimento do devedor", conforme estabelecido no art. da Lei 11.101/2005, que dispõe: "É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor ou da filial de empresa que tenha sede fora do Brasil".

A Lei de Recuperação de Empresas e Falências, norma especial, previu, inicialmente, a necessidade de se definir o local do "principal estabelecimento do devedor" como referência para a definição da competência (art. 3º), para só depois estabelecer a prevenção daquele juízo que recebeu a primeira distribuição do pedido de falência ou de recuperação judicial (art. 6º, § 8º).

Levando em consideração essa premissa, conforme se depreende dos autos, o local do "principal estabelecimento do devedor" é o situado na Comarca do Rio de Janeiro (RJ), local onde funcionava o "centro de inteligência" ou o "núcleo de comando" do grupo.

Nessa linha, compete ao Juízo estadual processar e julgar conjuntamente as ações falimentares relativas às empresas integrantes do mesmo grupo econômico.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei 11.101/2005, art.

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TERCEIRA SEÇÃO


Processo
AgRg no AREsp 2.119.185-RS, Rel. Ministra Laurita Vaz, Terceira Seção, por unanimidade, julgado em 13/9/2023, DJe 19/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL

Tema

Latrocínio. Subtração de um só patrimônio. Pluralidade de vítimas da violência. Concurso formal impróprio. Descabimento. Overruling. Adequação à jurisprudência do STF.

DESTAQUE

Subtraído um só patrimônio, a pluralidade de vítimas da violência não impede o reconhecimento de crime único de latrocínio.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Na origem, houve a condenação por três crimes de latrocínio tentado, em concurso formal impróprio, quando, na verdade, foram atingidos apenas dois patrimônios.

É certo que o entendimento adotado pelas instâncias ordinárias encontra respaldo na jurisprudência do STJ, no sentido de que há concurso formal impróprio no crime de latrocínio quando, não obstante houver a subtração de um só patrimônio, o animus necandi seja direcionado a mais de um indivíduo, ou seja, a quantidade de latrocínios será aferida a partir do número de vítimas em relação às quais foi dirigida a violência, e não pela quantidade de patrimônios atingidos.

No entanto, essa posição destoa da orientação do Supremo Tribunal Federal, que têm afastado o concurso formal impróprio, e reconhecido a ocorrência de crime único de latrocínio, nas situações em que, embora o animus necandi seja dirigido a mais de uma pessoa, apenas um patrimônio tenha sido atingido. Por essa razão, mostra-se prudente proceder ao overruling da jurisprudência deste Tribunal Superior, adequando-a à firme compreensão do STF acerca do tema.

No caso, as instâncias ordinárias afirmaram que houve desígnios autônomos em relação ao animus necandi, motivo pelo qual entenderam pelo concurso formal impróprio, o qual deve ser afastado, nos termos do entendimento do STF. No entanto, é inviável o reconhecimento de crime único, porque foram atingidos dois patrimônios distintos. Nesse contexto, deve ser reconhecida a prática de dois delitos de latrocínio, na forma tentada, em concurso formal próprio, pois não foi mencionado pela Corte de origem que também teria havido autonomia de desígnios em relação às subtrações patrimoniais, mas tão somente no tocante ao animus necandi.

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PRIMEIRA TURMA


Processo
RMS 68.490-RS, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, por unanimidade, julgado em 26/09/2023, DJe 29/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO

Tema

Juiz federal. Averbação de férias adquiridas no exercício da magistratura estadual. Ausência de disposição expressa na Lei Complementar n. 35/1979. Aplicação subsidiária da Lei n. 8.112/1993. Resoluções n. 130/2010 e 764/2022 do Conselho da Justiça Federal. Exigência de vacância por posse em cargo inacumulável. Descabimento. Tratamento distinto a juízes vinculados a ramos diversos do Poder Judiciário. Inteligência do art. 93 da CF.

DESTAQUE

Ao juiz substituto de tribunal de justiça estadual que na mesma data, a um só tempo, é exonerado do cargo anterior e empossado na qualidade de juiz federal substituto, autoriza-se o direito à averbação dos períodos de férias adquiridas e não gozadas, vedada, tão somente, sua posterior conversão em pecúnia ou indenização.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Conquanto o art. 66 da Lei Complementar n. 35/1979 ( Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN) prescreva que os Juízes fazem jus a férias anuais de 60 (sessenta) dias, ausente disposição legal acerca do direito à averbação de repouso anual obtido em cargos públicos anteriores, aplicando-se, por conseguinte, os regramentos da Lei n. 8.112/1990 a título subsidiário.

Em consonância com a Lei n. 8.112/1990, as Resoluções ns. 130/2010 e 764/2022 do Conselho da Justiça Federal-CJF condicionam o direito à transposição de férias adquiridas previamente ao ingresso na Magistratura Federal à vacância do cargo primitivo por posse em outro inacumulável, pressupondo, portanto, a continuidade do vínculo jurídico com a Administração Pública.

À vista do caráter nacional atribuído ao Poder Judiciário pelo art. 93 da Constituição da Republica, inviável prevalecer tal condicionante em hipótese na qual, sem solução de continuidade, exercido o cargo de Juiz Substituto em Tribunal de Justiça anteriormente ao início das funções judicantes no âmbito da Magistratura Federal, sob pena de instituir-se tratamento distinto entre Juízes submetidos a regime jurídico disciplinado de maneira uniforme pela ordem constitucional, desfigurando-se a respectiva unidade sistêmica, sobretudo quando ausente previsão a respeito do instituto da vacância por posse em cargo inacumulável na legislação estadual.

Essa conclusão não se modifica em razão de o desligamento do cargo primitivo decorrer de exoneração, uma vez que tal exigência somente se aplica quando viável ao Magistrado postular pelo término do liame anterior por motivo semelhante, circunstância ausente na hipótese em tela, porquanto a legislação do Estado de Goiás somente passou a prever a vacância por assunção de cargo inacumulável com a vigência da Lei n. 19.156/2015, posteriormente ao desligamento do cargo de Juiz Substituto.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 8.112/1993

Lei Orgânica da Magistratura Nacional - LOMAN, art. 66

Constituição Federal, art. 93.

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SEGUNDA TURMA


Processo
REsp 1.913.122-DF, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023, DJe 15/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO ADMINISTRATIVO, DIREITO CIVIL

Tema

Contrato administrativo. Aplicação supletiva das normas de direito privado. Art. 54 da Lei n. 8.666/1993. Compensação. Possibilidade. Autorização do particular. Prescindibilidade.

DESTAQUE

É possível a compensação de créditos decorrentes da aquisição de imóveis em contrato administrativo firmado entre empresa pública e particular, mesmo sem autorização deste.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No caso, o particular ajuizou ação ordinária com pedido de tutela de urgência, pretendendo reaver valores pagos no contrato de compra e venda do imóvel, considerando que, após a rescisão unilateral do contrato, a empresa pública compensou valores devidos por ele. Sustenta que não requereu nem deu anuência com essa compensação, razão pela qual ela não poderia ocorrer.

Quanto à possibilidade de compensação, o art. 54 da Lei n. 8.666/1993 estabelece que as regras do Direito Privado podem ser utilizadas supletivamente no âmbito dos contratos admirativos.

À luz dessa previsão legal, é possível que o instituto da compensação, modalidade de extinção das obrigações, seja aplicado ao caso concreto, permitindo-se que a recorrente compense seus débitos com os créditos do particular, na forma prevista no art. 368 do Código Civil.

A compensação ocorre quando duas pessoas forem, ao mesmo tempo, credoras e devedoras uma da outra, de modo que as respectivas obrigações se extinguem até onde se compensarem.

Nesse contexto, a norma civilista exclui a possibilidade da compensação, somente no caso de mútuo acordo ou quando ocorrer renúncia prévia de uma das partes, na forma prevista no art. 375 do CC.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 8.666/1993, art. 54

Código Civil ( CC/2002), arts. 368 e 375

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Processo
REsp 1.377.298-RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, por unanimidade, julgado em 5/9/2023, DJe 8/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO TRIBUTÁRIO

Tema

Ganho de capital. Contrato de alienação de participação societária. Remessa do pagamento do Imposto de Renda ao exterior. Alíquota atrelada à data da ocorrência do fato gerador. Tributação favorecida.

DESTAQUE

A alíquota do Imposto de Renda sobre a remessa ao exterior do ganho de capital decorrente da alienação das quotas de sociedade de responsabilidade limitada é atrelada à data da ocorrência do fato gerador do imposto, mesmo que a remessa tenha sido realizada posteriormente.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A discussão gravita em torno da identificação do fato gerador do Imposto de Renda relacionado ao ganho de capital decorrente da alienação das quotas de sociedade de responsabilidade limitada, tendo por consequência a definição da alíquota aplicável à remessa ao exterior a título de pagamento às empresas alienantes.

Ressalta-se de início, que o art. 26 da Lei n. 10.833/2003 não estabeleceu um marco distinto para o fato gerador do Imposto de Renda sobre ganho de capital na hipótese de alienação por pessoa residente no exterior.

Com efeito, a norma em questão apenas instituiu a regra de sujeição passiva tributária, atribuindo ao alienante ou ao procurador no país a responsabilidade pela retenção e recolhimento do Imposto de Renda.

Acerca da incidência do Imposto de Renda sobre ganho de capital auferido por não residente, o art. 18 da Lei n. 9.249/1995 determina expressamente a observância das regras aplicáveis aos residentes no país.

Em se tratando de Imposto de Renda, o art. 43 do CTN adota como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica da renda ou de proventos de qualquer natureza, dentre os quais se inclui o ganho de capital, consubstanciado na diferença positiva entre o valor da alienação de bens e direitos e o respectivo custo de aquisição.

As pessoas jurídicas, em regra, são submetidas ao regime de competência, de modo que os efeitos financeiros das transações são reconhecidos no período em que ocorrem independentemente do pagamento ou recebimento dos valores.

No caso, o fato gerador do Imposto de Renda sobre o ganho de capital auferido pelas empresas recorrentes não foi o momento da remessa do pagamento ao exterior, mas a alienação da participação societária, quando houve a efetiva incorporação de direitos ao patrimônio da adquirente.

Nesse diapasão, a retenção do Imposto de Renda sobre a remessa ao exterior, ainda que esta tenha sido realizada posteriormente, deve estar atrelada à data da ocorrência do fato gerador, tal como preceitua o art. 144 do CTN.

Considerando que o fato gerador ocorreu na celebração do negócio jurídico, época em que as empresas recorrentes estavam sediadas nas Bahamas, a alíquota de IRRF aplicável é a de 25% sobre o ganho de capital auferido com a alienação das quotas da sociedade de responsabilidade limitada, nos termos do art. 47 da Lei n. 10.833/2003.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 10.833/2003, arts. 26 e 47

Lei n. 9.249/1995, art. 18

Código Tributário Nacional ( CTN/1966), art. 43 e 144

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TERCEIRA TURMA


Processo
REsp 1.994.565-MG, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Condomínio e sucessão. Ação de cobrança de despesas condominiais. Bem imóvel objeto de partilha. Regência pelas regras do condomínio até a partilha. Partilha realizada na hipótese. Subsistência da copropriedade por ato voluntário dos coproprietários. Solidariedade quanto às despesas condominiais. Obrigação de natureza propter rem.

DESTAQUE

Subsistindo o condomínio sobre determinado bem imóvel após a partilha, por ato voluntário dos coerdeiros que aceitaram a herança, os sucessores coproprietários do imóvel respondem solidariamente pelas respectivas despesas condominiais, independentemente da expedição do formal de partilha, resguardado o direito de regresso constante do art. 283 do CC.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia recursal consiste em definir se a responsabilidade solidária ou divisível é limitada ao respectivo quinhão de cada herdeiro pelas despesas condominiais relativas ao bem imóvel herdado, na hipótese em que homologada judicialmente a partilha, mas não expedido o formal de partilha.

Com efeito, a morte da pessoa natural tem como uma de suas consequências jurídicas a abertura da sucessão, transferindo-se, de imediato, a posse e a propriedade dos seus bens e direitos aos respectivos sucessores, à luz do princípio da saisine positivado no art. 1.784 do CC, neste termo.

Na hipótese, depreende-se que a responsabilidade pelos débitos provenientes do falecido e por aqueles cujo fato gerador se der após a abertura da sucessão, mas antes da partilha, recaem sobre a massa indivisível e unitária representativa da herança, a qual pertence aos sucessores e é administrada pelo inventariante até a homologação da partilha (art. 1.991 do CC).

Após a partilha, a responsabilidade recai sobre os herdeiros, na proporção da parte da herança que lhe toca e limitada ao respectivo quinhão, de modo que a expedição do formal de partilha constitui, precipuamente, mero procedimento solene destinado à regularização da posse e propriedade dos bens herdados, procedendo-se à transcrição no Registro de Imóveis, quanto aos bens imóveis, e serve de fundamento à eventual propositura de execução forçada pelo sucessor.

Como visto, é a morte do de cujus o fato gerador da posse e propriedade dos bens da herança pelos sucessores, à luz do princípio da saisine, cessando a indivisibilidade sobre esses bens com a homologação da partilha, em que se define o quinhão cabente a cada herdeiro, independentemente da expedição do formal.

Além disso, ressalte-se que, na sucessão mortis causa, não se aplica a regra prescrita no art. 1.227 do CC, segundo a qual a constituição ou transmissão dos direitos reais sobre imóveis só se efetiva com o registro no Cartório de Registro de Imóveis, porquanto restrita aos atos de constituição ou transmissão entre vivos

De outro lado, quando na herança houver bem imóvel do qual decorram despesas condominiais, deve-se atentar para a natureza propter rem dessas obrigações, emanando da própria coisa, independentemente da manifestação de vontade do seu proprietário de assunção da respectiva dívida, a possibilitar ao credor voltar-se contra quem quer esteja na sua propriedade, ante o seu caráter ambulatório.

Infere-se que a solidariedade, neste caso, resulta da própria lei, na medida em que o art. 1.345 do CC admite a responsabilização do atual (ou dos atuais) proprietário (s) do imóvel no que concerne às despesas condominiais, inclusive pelos débitos pretéritos à aquisição do bem, afigurando-se decorrência lógica desse dispositivo a possibilidade de cobrança da integralidade da dívida de quaisquer dos coproprietários de uma mesma unidade individualizada, ressalvando-se o direito de regresso do condômino que satisfez a dívida por inteiro contra os demais codevedores, nos termos do art. 283 do CC.

Aliás, dispõe o art. 275 do CC, ao disciplinar a solidariedade passiva, que "o credor tem direito a exigir e receber de um ou de alguns dos devedores, parcial ou totalmente, a dívida comum; se o pagamento tiver sido parcial, todos os demais devedores continuam obrigados solidariamente pelo resto".

Havendo, nesse contexto, solidariedade entre os coproprietários de unidade individualizada pelas despesas condominiais após a partilha, revela-se inaplicável o disposto no art. 1.792 do CC, segundo o qual o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança.

Conclui-se, portanto, que, subsistindo o condomínio sobre determinado bem imóvel após a partilha, não mais por disposição legal, mas por ato voluntário dos coerdeiros que aceitaram a herança, respondem solidariamente os sucessores coproprietários do imóvel pelas respectivas despesas condominiais, independentemente da expedição do formal de partilha, aí não se aplicando a regra legal de que o herdeiro somente responde pelas forças da herança, resguardado o direito de regresso constante do art. 283 do CC.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código Civil, art. 1.784

Código Civil, art. 1.991

Código Civil, 283

Código Civil, art. 1.345

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Processo
REsp 1.848.863-SP, Rel. Min. Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Liquidação de sentença. Violação de patentes. Apuração da indenização por danos materiais. Realização de perícia contábil tão somente. Necessidade de realização de perícia com conhecimento específico na área técnica das patentes. Instrução probatória insuficiente. Violação dos arts. 208 e 210 da Llei n. 9.279/1996 e do art. 373, § 1º, do CPC.

DESTAQUE

A previsão do art. 210 da Lei n. 9.279/1996 de que o cálculo dos lucros cessantes será realizado pelo critério mais favorável ao prejudicado não pode levar à adoção de métodos arbitrários para sua aferição, sem ter havido perícia com conhecimento específico na área técnica das patentes em questão.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia em análise discutiu-se a respeito da (im) possibilidade de utilização de documento unilateralmente produzido para comprovar o percentual de royalties, bem como a inexistência de indicação dos critérios técnicos utilizados pelo perito.

No caso, argumenta-se que a perícia teria desconsiderado o fato de que algumas das brocas e dos punhos por ela comercializados não infringiriam as patentes do recorrido, sustentando, ainda, que as hastes de perfuração de furo de gusa seriam compostas não apenas pelo punho e pela broca, mas também pela haste, que estaria fora do escopo de proteção das patentes da recorrida.

Além disso, houve realização somente de perícia meramente contábil, o que gerou debates sobre não ter havido perícia com conhecimento específico na área técnica das patentes em questão. Exatamente para apurar tal assertiva da recorrente de que há produtos por ela comercializados que, apesar de se referirem também a brocas e a punhos utilizados na perfuração de furo de gusa, não infringiriam as patentes.

Importa, assim, asseverar que a previsão da Lei n. 9.279/1996 de que o cálculo dos lucros cessantes será realizado pelo critério mais favorável ao prejudicado (art. 210) não pode levar à adoção de métodos arbitrários para sua aferição, sob pena de enriquecimento sem causa. Portanto, a distribuição dinâmica do ônus da prova demanda respeito ao contraditório, o que não foi observado no caso.

Assim, percebe-se objetivamente que está caracterizada a ausência de amplo exercício de contraditório e ampla defesa, em decorrência da necessidade de realização de perícia técnica com conhecimento específico na área técnica das patentes, além do importante debate trazido de utilização de documento unilateralmente produzido pelo recorrido para comprovar o percentual de royalties.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 9.279/1996, arts. 208e 210

Código de Processo Civil, art. 373, § 1º

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Processo
REsp 2.077.205-GO, Rel. Ministro Humberto Martins, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 26/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Cumprimento espontâneo de sentença. Ação de reembolso. Ausência de impugnação tempestiva por parte do credor. Preclusão. Configuração.

DESTAQUE

No cumprimento de sentença, na hipótese de o credor não manifestar oposição aos termos do requerimento de cumprimento espontâneo apresentado pelo devedor, cabe ao juiz declarar satisfeita a obrigação e extinguir o processo em razão da preclusão.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Trata-se, na origem, de cumprimento de sentença que tem por objeto ação de reembolso julgada procedente para reembolsar a sócio as ações a que tem direito em decorrência da sua saída do quadro societário de sociedade anônima, conforme o valor patrimonial destas, a serem avaliadas por ocasião do pagamento.

A sociedade empresária deu início ao cumprimento espontâneo da sentença, informando que o seu balanço patrimonial estava negativo, motivo pelo qual nada haveria a ser reembolsado. Intimado, o sócio retirante nada requereu, mesmo tendo feito carga dos autos.

Nessa linha, apresentados os cálculos pela sociedade anônima, ainda que negativos e conforme interpretação unilateral da sentença, uma vez que devidamente intimado e silente o recorrido, somente se apresentava uma solução ao magistrado: a homologação dos cálculos.

Sendo assim, ainda que ausente a declaração de homologação acima descrita, uma vez que não se poderia chegar a resultado diverso, cumpre reconhecer haver-se operado a preclusão temporal quanto a eventual direito de impugnação acerca dos cálculos e termos do cumprimento de sentença apresentados, o que, em última análise, convola-se em coisa julgada, preclusão máxima.

Não por outro motivo, o CPC/2015 deu vida ao art. 526, §§ 1º e 3, do CPC, determinando que, não havendo oposição aos termos do requerimento de cumprimento espontâneo apresentado pelo devedor, cabe ao juiz declarar satisfeita a obrigação e extinguir o processo.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil ( CPC), art. 526, §§ 1º e 3

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QUARTA TURMA


Processo
REsp 2.059.278-SC, Rel. Ministro Marco Buzzi, Rel. para acórdão Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, por maioria, julgado em 23/5/2023, DJe 12/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL

Tema

Contribuições condominiais. Cumprimento de sentença. Natureza propter rem do débito. Alienação fiduciária em garantia. Penhora do imóvel. Possibilidade.

DESTAQUE

Em execução por dívida condominial movida pelo condomínio edilício, é possível a penhora do próprio imóvel que dá origem ao débito, ainda que esteja alienado fiduciariamente, devendo o condomínio exequente promover a prévia citação também do credor fiduciário, a fim de que venha integrar a execução, facultando-lhe a oportunidade de quitar o débito condominial.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça que entende que não é possível a penhora do imóvel alienado fiduciariamente em execução de despesas condominiais de responsabilidade do devedor fiduciante, na forma dos arts. 27, § 8º, da Lei nº 9.514/1997 e 1.368-B, parágrafo único, do CC/2002, uma vez que o bem não integra o seu patrimônio, mas sim o do credor fiduciário. Admitindo-se, contudo, a penhora do direito real de aquisição derivado da alienação fiduciária, de acordo com os arts. 1.368-B, caput, do CC/2002, c/c o art. 835, XII, do CPC ( REsp 2.036.289/RS, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 18/4/2023, DJe 20/4/2023). Tal solução se mostra correta para o contexto, para um credor comum, o credor normal de um condômino, naquela situação. O credor não poderá penhorar o imóvel do devedor, por estar o bem alienado fiduciariamente ao credor fiduciário, sendo este o titular da propriedade resolúvel da coisa imóvel.

Porém, quando o credor do condômino devedor é o próprio condomínio a solução não se ajusta. É que relativamente ao próprio condomínio-credor, dada a natureza propter rem das despesas condominiais, nos termos do art. 1.345 do Código Civil, haverá necessidade de se promover a citação, na ação de execução, também do credor fiduciário no aludido contrato para que venha integrar a lide, possibilitando ao titular do direito previsto no contrato de alienação fiduciária quitar o débito condominial existente e, em ação regressiva, tentar obter do devedor fiduciante o retorno desses valores.

A razão para tanto está em que não se pode cobrir o credor fiduciário de imunidade contra dívida condominial, outorgando-lhe direitos maiores do que aqueles que tem qualquer proprietário. Quer dizer, o proprietário fiduciário não é um proprietário especial, detentor de maiores direitos do que o proprietário comum de imóvel em condomínio edilício

A natureza propter rem se sobreleva ao direito do próprio credor fiduciário, dado que não é justo que se coloque nos ombros dos demais condôminos a obrigação de arcar com o rateio daquelas despesas, tendo em vista que, de um lado, o devedor fiduciante se sente confortável em não pagar, porque sabe que o apartamento não poderia ser objeto de nenhuma constrição. E, de outro lado, o credor fiduciário se sente tranquilo também, porque, recebendo o dinheiro correspondente ao empréstimo que realizou, não será importunado no seu direito de propriedade, apesar da existência de débitos condominiais que pairam sem uma definição de pagamento.

Dessa forma, é dever de o condomínio exequente promover a citação do credor fiduciário a fim de que ele venha integrar a execução, facultando-lhe a oportunidade de quitar o débito condominial para não ver o imóvel ser arrematado em praça na execução e, assim, se creditar para, em ação regressiva, buscar o ressarcimento desse valor junto ao devedor fiduciante.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código Civil ( CC), art. 1.345

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Processo
REsp 1.847.105-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023, DJe 19/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO CIVIL, DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Averbação premonitória. Processo de conhecimento. Tutela provisória de urgência cautelar. Poder geral de cautela. Eficácia do processo de conhecimento.

DESTAQUE

Embora a previsão da averbação premonitória seja ordinariamente reservada à execução, pode o magistrado, com base no poder geral de cautela e observados os requisitos previstos no art. 300 do CPC, deferir tutela provisória de urgência de natureza cautelar no processo de conhecimento, com idêntico conteúdo à medida prevista para a demanda executiva (art. 829 do CPC).

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A medida executiva prevista no art. 828 do CPC possui duas funções nítidas, a saber: I) de um lado, tornar pública a existência de demanda executiva em face do devedor, de forma a presumir de maneira absoluta que a alienação do bem, se o conduzir à insolvência, constituirá fraude à execução e tornará ineficaz o negócio jurídico praticado; II) ao tornar pública a existência da demanda executiva, prevenir a dilapidação patrimonial que possa levar o devedor à insolvência e, assim, orientar outros credores quando negociarem com o devedor.

O caráter preventivo da medida, na forma disciplinada pelo novo estatuto processual, dispensa até mesmo a deliberação judicial sobre da expedição da certidão premonitória, porquanto atribui a competência ao escrivão ou diretor de secretaria após a aceitação da ação de execução.

Com isso, tão logo seja admitida a execução pelo magistrado competente - única condição para a deflagração da posição jurídica -, surge para o credor exequente o direito potestativo de obter a certidão acerca da existência da demanda executiva para averbá-la no registro competente, não havendo necessidade de nenhuma cognição judicial acerca da existência ou não do direito do exequente.

Assim, preenchidos os requisitos legais, a simples aceitação da ação de execução já autoriza o desencadeamento do procedimento legal para a expedição da certidão premonitória para averbação na matrícula do imóvel de propriedade do devedor, no registro de veículos ou de outros bens sujeitos a penhora, arresto ou indisponibilidade.

A questão discutida, contudo, relaciona-se ao deferimento de tutela provisória de urgência em processo de conhecimento com a finalidade de averbar a existência da demanda na matrícula de imóvel pertencente aos demandados, de forma semelhante à averbação premonitória prevista no art. 828 do CPC para as ações de execução.

A decisão foi proferida com base nos requisitos previstos no art. 300 do CPC, consubstanciados na probabilidade do direito e no perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

O CPC prevê de maneira expressa o poder geral de cautela - que já deflui do texto constitucional -, em seu art. 301, ao prever que a tutela de urgência de natureza cautelar pode ser efetivada mediante arresto, sequestro, arrolamento de bens, registro de protesto contra alienação de bem e qualquer outra medida idônea para asseguração do direito. O poder geral de cautela assegura ao magistrado o deferimento de todas as medidas que se revelarem adequadas ao asseguramento da utilidade da tutela principal, ainda que sejam coincidentes com aquelas previstas especialmente para a execução.

Embora o art. 301 do CPC preveja algumas medidas cautelares (típicas ou nominadas no sistema processual de 1973), a cláusula geral constante ao final no dispositivo legal qualquer outra medida idônea para asseguração do direito autoriza que sejam adotadas quaisquer medidas com a finalidade precípua de garantia da eficácia do processo e da tutela jurisdicional a ser concedida.

Nesse sentido, sobressai o caráter instrumental da providência de natureza cautelar, que visa à garantia do próprio instrumento, no exato sentido de assegurar a efetividade do processo judicial.

A abrangência do dispositivo destina-se, pois, a dotar o magistrado de instrumentos suficientes e adequados a garantir a eficácia do processo e, assim, assegurar a utilidade da tutela de mérito a ser ao final concedida.

A determinação judicial no presente processo, diferentemente da averbação premonitória prevista no art. 828 do CPC, foi concedida após deliberação judicial da sua adequação para a garantia da eficácia do processo de dissolução de sociedade em conta de participação, porquanto o imóvel em cuja matrícula se averbou a certidão expedida seria o único de propriedade da sócia ostensiva.

Por fim, a base legal para o deferimento da medida, em verdade, não é o citado art. 828, senão os arts. 300 e 301 do CPC, embora seja em tudo similar àquela prevista para a execução, é dizer, a possível extensão da disciplina específica da averbação premonitória aos processos de conhecimento encontra seu assento no poder geral de cautela.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil ( CPC), art. 300 e 301

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Processo
REsp 1.848.292-MT, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023, DJe 19/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Recuperação judicial. Assembleia geral de credores. Representante legal. Ausência de assinatura na lista de presença. Exigência legal. Caso concreto. Circunstâncias particulares que autorizam a participação da credora. Finalidade da norma. Proporcionalidade.

DESTAQUE

A presença de procurador de instituição financeira em assembleia, comprovada por sua assinatura, ainda que ocorra apenas no campo relativo aos demais representados, permite sua participação nas deliberações e votações, considerando-se essa ocorrência mera irregularidade.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A assembleia geral de credores é órgão deliberativo de capital importância no processo de recuperação judicial com a atribuição nuclear de aprovar, rejeitar ou modificar o plano de recuperação judicial. A aprovação do plano de soerguimento da sociedade empresária, por conseguinte, depende da deliberação assemblear, ao permitir a continuidade de suas atividades econômicas, ou mesmo a decretação da quebra da sociedade devedora, na hipótese de rejeição do plano de recuperação judicial (art. 73, III, da Lei n. 11.101/2005).

Na assembleia geral de credores, a deliberação e votação ocorre por classes, com imposição legal de deliberação dentro de cada grupo, observados os percentuais dos credores presentes no momento da sessão. Por essa razão, é relevante que seja verificado o comparecimento de credores ou representantes legais presentes, o que ocorre, por exigência legal, pela assinatura da lista de presença, que será encerrada no momento da instalação da Assembleia.

Quanto o credor for representado por mandatário ou representante legal, este deverá entregar ao administrador judicial, até 24 (vinte e quatro) horas antes da data prevista no aviso de convocação, documento hábil que comprove seus poderes ou a indicação das folhas dos autos do processo em que se encontre o documento, como determina o art. 37, § 4º, da Lei n. 11.101/2005.

No caso em análise, a procuradora da instituição financeira representava também credores trabalhistas e assinou a lista nesta qualidade, constando sua presença na ata da assembleia geral de credores.

Nesse sentido, apesar de vir disposto no art. 37, § 3º, da Lei 11.101/2005 a obrigatoriedade da assinatura da lista de presença até a instalação da assembleia, consideradas as circunstâncias particulares do caso, é imperiosa a conclusão no sentido de que estava comprovada à saciedade a presença da procuradora durante a realização da Assembleia, devendo a aposição da assinatura somente no campo relativo aos demais representados ser tomada como mera irregularidade, que não impede sua participação nas deliberações e votações em favor da instituição financeira representada.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 11.101/2005, art. 73, III

Lei n. 11.101/2005, art. 37, § 4º

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Processo
REsp 1.864.618-RJ, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023, DJe 19/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO EMPRESARIAL

Tema

Sociedade simples. Registro extemporâneo de transformação societária. Prazo de 30 (trinta dias). Efeitos a partir do registro. Art. 1.150 e 1.151 do Código Civil e art. 36 da lei n. 8.934/1994. Natureza declaratória do registro em relação ao exercício da atividade econômica. Teoria da empresa. Irrelevância para a produção de efeitos externos dos atos de alteração do contrato social.

DESTAQUE

Embora a alteração no contrato social da sociedade empresária possa produzir efeitos desde logo, antes mesmo de seu registro na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, a produção de efeitos externos, em relação a terceiros, pressupõe que seja adequadamente formalizada e publicizada por intermédio de seu registro.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A transformação do tipo de sociedade para sociedade simples transfere seu registro da Junta Comercial para o Registro Civil das Pessoas Jurídicas. A partir da transformação societária, os atos passaram a ser registrados tão somente no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, não tendo sido registrados na Junta Comercial, continuando a figurar a autora como sócia administradora da pessoa jurídica

Os atos de alteração no contrato social produzem efeitos a partir da data em que foram praticados, se levados a registro nos 30 (trinta) dias seguintes, ou da data do registro, no caso de inobservância deste prazo. Inteligência dos arts. 1.150 e 1.151 do Código Civil e 36 da Lei n. 8.934/1994.

No caso, as alterações que resultaram na transformação foram levadas a registro na Junta Comercial muito tempo depois, o que ensejou o redirecionamento de execuções fiscais e atingimento da pessoa da sócia administradora em virtude da desconsideração da personalidade jurídica da sociedade.

O registro possui, em regra, natureza declaratória, o que permite a caracterização do empresário individual ou da sociedade empresária e sua submissão ao regime jurídico empresarial, em virtude do exercício da atividade econômica. No entanto, os atos de modificação societária exigem publicidade pelo registro para produzirem efeitos contra terceiros.

As modificações nos atos constitutivos da pessoa jurídica produzem efeitos intra-societários ou externos, em relação a terceiros. Naqueles, ainda é importante distinguir os atos entre os sócios, que os vinculam, e aquelas relações entre os sócios e a própria sociedade empresária, que pressupõem a incorporação aos seus atos constitutivos pelo registro.

Nesse sentido, é possível supor que eventual alteração no contrato social possa produzir efeitos desde logo, antes mesmo de seu registro na Junta Comercial ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas. No entanto, a produção de efeitos em relação a terceiros pressupõe que seja adequadamente formalizada e publicizada por intermédio de seu registro.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código Civil ( CC), arts. 1.150 e 1.151

Lei n. 8.934/1994, art. 36

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Processo
REsp 1.864.620-SP, Rel. Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tema

Penhora. Patrimônio. Terceiro. Grupo econômico. Pessoa jurídica executada. Desconsideração da personalidade jurídica. Incidente processual. Necessidade de instauração.

DESTAQUE

Uma empresa do mesmo grupo econômico da parte executada só pode ter seus bens bloqueados se o incidente de desconsideração da personalidade jurídica for previamente instaurado, não sendo suficiente mero redirecionamento do cumprimento de sentença contra quem não integrou a lide na fase de conhecimento.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A previsão de responsabilidade civil subsidiária, inerente ao direito material, não exclui a observância das normas processuais, garantidoras do contraditório e da ampla defesa, incluindo, entre outras, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Nesse aspecto, numa interpretação sistemática do Código de Defesa do Consumidor, é possível observar que a previsão de responsabilidade civil subsidiária das sociedades integrantes de um mesmo grupo encontra-se inserida na seção que trata da desconsideração da personalidade jurídica.

Dessa forma, para que uma empresa, pertencente ao mesmo grupo econômico da executada, sofra constrição patrimonial, é necessária prévia observância dos procedimentos específicos da desconsideração da personalidade jurídica, que pode ser instaurada, inclusive, na fase de cumprimento de sentença ou na execução fundada em título executivo extrajudicial, nos termos do art. 134 do CPC.

Ressalte-se que a instauração do incidente de desconsideração é norma processual de observância obrigatória, como forma de garantir o devido processo legal.

Nesse sentido, a Terceira Turma desta Corte manifestou-se quanto à impossibilidade de mero redirecionamento do cumprimento de sentença àquele que não integrou a lide na fase de conhecimento: Uma vez formado o título executivo judicial contra uma ou algumas das sociedades, poderão responder todas as demais componentes do grupo, desde que presentes os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, na forma do art. 28, § 2º, do CDC, sendo inviável o mero redirecionamento da execução contra aquela que não participou da fase de conhecimento. ( AgInt no REsp 1.875.845/SP, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 16/5/2022, DJe 19/5/2022.)

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Civil ( CPC), art. 134

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QUINTA TURMA


Processo
HC 837.239-RJ, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 26/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Acordo de não persecução penal. Ausência de remessa dos autos ao Ministério Público. Inexistência de confissão formal e circunstanciada nos autos. Obstáculo inexistente. Possibilidade de a confissão ser registrada perante o parquet. Relevância e multiforma da confissão espontânea. Observância do princípio da não autoincriminação e da ampla defesa.

DESTAQUE

A ausência de confissão formal e circunstanciada no curso da ação penal não impede a remessa dos autos ao Parquet para avaliar a possibilidade de propositura do acordo de não persecução penal, uma vez que essa confissão pode ser formalizada perante o Ministério Público, no ato de assinatura do acordo.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

O acordo de não persecução penal, previsto no art. 28-A do CPP, tem lugar "Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime".

Sobre o tema, a Quinta Turma do STJ, no julgamento do AgRg no REsp 2.016.905/SP, Rel. Ministro Messod Azulay Neto, estabeleceu que, em casos de alteração do enquadramento jurídico ou desclassificação do delito, é possível aplicar o ANPP, desde que preenchidos os requisitos legais. Esse precedente reconheceu incidir, extensivamente, às hipóteses de ANPP, o Enunciado n. 337 da Súmula do STJ, que prevê ser cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e procedência parcial da pretensão punitiva, devendo os autos do processo retornarem à instância de origem para aplicação desses institutos.

Oportuno lembrar, também, que no julgamento do REsp 1.972.098/SC, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, a Quinta Turma decidiu que "o réu fará jus à atenuante do art. 65, III, 'd', do CP quando houver admitido a autoria do crime perante a autoridade, independentemente de a confissão ser utilizada pelo juiz como um dos fundamentos da sentença condenatória, e mesmo que seja ela parcial, qualificada, extrajudicial ou retratada", o que sobrelevou e desburocratizou o reconhecimento e a importância da confissão para o deslinde do processo penal.

No caso, o Tribunal de origem asseverou que o óbice ao encaminhamento dos autos ao Ministério Público para que se manifestasse sobre a proposição do ANPP seria a ausência de confissão formal e circunstanciada, haja vista o exercício, pelo denunciado, no curso da ação penal, do direito ao silêncio.

Contudo, é de se destacar que, ao tempo da opção pela não autoincriminação, não estava no horizonte do acusado a possibilidade de entabulação do acordo de não persecução penal, uma vez que a denúncia não postulou o reconhecimento da minorante do tráfico de drogas, o que só se tornou possível com a prolação da sentença penal condenatória que aplicou em seu favor a causa de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006.

O direito à não autoincriminação, vocalizado pelo brocardo latino nemo tenetur se detegere, não pode ser interpretado em desfavor do réu, nos termos do que veicula a norma contida no inciso LXIII do art. 5º da Constituição da Republica e no parágrafo único do art. 186 do Código de Processo Penal. Assim, a invocação do direito ao silêncio durante a persecução penal não pode impedir a incidência posterior do ANPP, caso a superveniência de sentença condenatória autorize objetiva e subjetivamente sua proposição.

Lado outro, sequer a negativa de autoria é capaz de impedir a incidência do mencionado instituto despenalizador, não se podendo olvidar, como afirmado em doutrina, que o acordo de não persecução penal é medida de natureza negocial, cuja prerrogativa para o oferecimento é do Ministério Público, cabendo ao Judiciário a homologação ou não dos termos ali contidos.

Deve-se, por conseguinte, diferenciar a postura legítima do réu que nega envolvimento com crime apurado em ação penal com a posição de parte do ANPP, certamente muito mais favorável do que aquela que lhe valeria o cumprimento de pena privativa de liberdade nos estabelecimentos penais à disposição nesse país, devendo lhe ser permitida a confissão, tal qual àquele que nega a conduta no interrogatório policial e, em juízo, a confessa, contradição que não impossibilita o reconhecimento da atenuante em seu favor.

A dúvida remanescente residiria sobre o momento a formalização da confissão para fins do ANPP diferido, ao que se responde prontamente: no ato da assinatura do acordo. O Código de Processo Penal, em seu art. 28-A, não determinou quando a confissão deve ser colhida, apenas que ela deve ser formal e circunstanciada. Isso pode ser providenciado pelo próprio órgão ministerial, se decidir propor o acordo, devendo o beneficiário, no momento de firmá-lo, se assim o quiser, confessar formal e circunstanciadamente, perante o Parquet, o cometimento do crime.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Penal ( CPP), art. 28-A e art. 186, parágrafo único

Código Penal ( CP), art. 65, inciso III, d

Constituição Federal ( CF), art. 5º, inciso LXIII

SÚMULAS

Sumula 337 do STJ

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Processo
Processo em segredo de justiça, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, por unanimidade, julgado em 5/9/2023, DJe 12/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Condenação lastreada em fatos não descritos na denúncia. Hipótese de mutatio libelli. Apelação da defesa. Nulidade da sentença. Absolvição do réu. Pretensão de anulação da sentença para que se observe em primeira instância o rito do art. 384 do CPP. Impossibilidade.

DESTAQUE

Reconhecido, em recurso exclusivo da defesa, que a sentença condenou o réu por fatos que não estavam descritos na denúncia, cabe ao Tribunal somente anular a sentença e absolver o réu, mas não determinar o retorno dos autos ao primeiro grau.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

No Tribunal de origem foi reconhecida a ofensa ao princípio da correlação, por ter sido o réu condenado por fatos diversos daqueles que foram imputados na denúncia.

Nos temos do art. 384 do CPP, "encerrada a instrução probatória, se entender cabível nova definição jurídica do fato, em consequência de prova existente nos autos de elemento ou circunstância da infração penal não contida na acusação, o Ministério Público deverá aditar a denúncia ou queixa, no prazo de 5 (cinco) dias, se em virtude desta houver sido instaurado o processo em crime de ação pública", ou seja, o momento para o aditamento da denúncia é o encerramento da instrução.

Assim, correto o entendimento do Tribunal a quo, pois, em sede de apelação defensiva, tendo sido reconhecido que a sentença condenou o réu por fatos que não estavam descritos na denúncia, cabe ao Tribunal, somente, anular a sentença e absolver o réu, mas não determinar o retorno dos autos ao primeiro grau, como pretende o Parquet.

Nesse sentido, frise-se que, "No julgamento de apelação interposta pela defesa, constatada a ofensa ao princípio da correlação, não cabe reconhecer a nulidade da sentença e devolver o processo ao primeiro grau para que então se observe o art. 384 do CPP, uma vez que implicaria prejuízo para o réu e violaria o princípio da non reformatio in pejus." ( AgRg no HC 559.214/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quinta Turma, DJe de 13/5/2022).

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Código de Processo Penal ( CPP), art. 384, caput

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SEXTA TURMA


Processo
HC 834.126-RS, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, julgado em 5/9/2023, DJe 13/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO CONSTITUCIONAL, DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL, DIREITOS HUMANOS

Tema

Tráfico de drogas. "Nemo tenetur se detegere". Direito de mentir. Inexistência. Suposta mentira do réu interrogatório. Falsa atribuição de crime a outrem. Dosimetria. Aumento da pena-base. Valoração como circunstância judicial negativa. Impossibilidade. Fato não comprovado e posterior ao delito imputado.

DESTAQUE

O fato de o réu mentir em interrogatório judicial, imputando prática criminosa a terceiro, não autorização a majoração da pena-base.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A questão cinge-se a definir se é possível a majoração da pena-base, pela valoração negativa da culpabilidade, pelo fato de o réu ter mentido em interrogatório judicial.

Ainda que o falseamento da verdade eventualmente possa, a depender do caso e se cabalmente comprovado, justificar a responsabilização do réu por crime autônomo, isso não significa que essa prática, no interrogatório, autorize a exasperação da pena-base do acusado.

O conceito de culpabilidade, como circunstância judicial prevista o artigo 59, do Código Penal, portanto, está relacionado com a reprovabilidade/censurabilidade da conduta do agente, de forma que deve o magistrado, quando da aplicação da pena-base, dimensioná-la pelo nível de intensidade da reprovação penal e expor sempre os fundamentos que lhe formaram o convencimento. Trata-se de aferir o grau de reprovabilidade do fato criminoso praticado pelo réu.

No caso, a culpabilidade do acusado foi valorada negativamente sob o argumento de que tentou se furtar à responsabilização penal, imputando falsamente a um terceiro (vizinho) a responsabilidade por ter plantado drogas e armas em sua casa na noite anterior ao cumprimento do mandado de busca e apreensão pela polícia.

Ainda que se pudesse considerar provado que o réu atribuiu falsamente crime a terceiro no interrogatório, isso não diria respeito à sua culpabilidade, a qual relaciona-se ao grau de reprovabilidade pessoal da conduta imputada ao acusado. Isso porque o interrogatório constitui fato posterior à prática da infração penal, de modo que não pode ser usado retroativamente para incrementar o juízo de reprovabilidade de fato praticado no passado.

Com efeito, o exame da sanção penal cabível deve ser realizado, em regra, com base somente em elementos existentes até o momento da prática do crime imputado, ressalvados, naturalmente: a) o exame das consequências do delito, que, embora posteriores, representam mero desdobramento causal direto dele, e não novas e futuras condutas do acusado retroativamente valoradas; b) o superveniente trânsito em julgado de condenação por fato praticado no passado, uma vez que representa a simples declaração jurídica da existência de evento pretérito.

Nem mesmo nas circunstâncias da personalidade ou da conduta social seria possível considerar desfavoravelmente a mentira do réu em interrogatório judicial. O paralelo feito por alguns doutrinadores com a confissão (se a confissão revela aspecto favorável da personalidade e atenua a pena, a mentira supostamente revelaria o oposto e poderia autorizar o seu aumento), embora interessante, é assimétrico e não permite que dele se extraia tal conclusão.

A confissão e diversos outros institutos que permitem o abrandamento da sanção (colaboração premiada, arrependimento posterior etc.) integram o chamado Direito penal premial e se justificam como ferramentas para valorizar e estimular a postura que o réu adota depois da prática do delito para mitigar seus efeitos ou facilitar a atividade estatal na sua persecução. Diferente, porém, é a análise sobre o que pode legitimar o incremento da sanção penal, a qual, nos termos dos mais basilares postulados penais e processuais penais, não pode ficar ao sabor de eventos futuros, incertos e não decorrentes diretamente, como desdobramento meramente causal, do fato imputado na denúncia (por exemplo, nos termos acima esclarecidos, as consequências do crime).

O que deve ser avaliado é se, ao praticar o fato criminoso imputado, a culpabilidade do réu foi exacerbada ou se, até aquele momento, ele demonstrava personalidade desvirtuada ou conduta social inadequada, o que não pode ser aferido retroativamente com base em fato diverso que só veio a ser realizado em tempo futuro, às vezes longos anos depois.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Constituição Federal ( CF), art. 5º, LXIIIe XLVI

Código Penal ( CP), art. 59

Código de Processo Penal ( CPP), art. 387

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Processo
REsp 2.036.072-MG, Rel. Ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 22/8/2023, DJe 30/8/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Lei Maria da Penha. Medidas protetivas de urgência. Natureza jurídica inibitória. Inquérito policial ou processo-crime em curso. Desnecessidade. Validade enquanto perdurar a situação de perigo. Cláusula rebus sic stantibus. Modificação ou revogação. Contraditório prévio. Necessidade.

DESTAQUE

A natureza jurídica das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha é de tutela inibitória e não cautelar, inexistindo prazo geral para que ocorra a reavalição de tais medidas, sendo necessário que, para sua eventual revogação ou modificação, o Juízo se certifique, mediante contraditório, de que houve alteração do contexto fático e jurídico.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

Cinge-se a controvérsia a definir a natureza jurídica das medidas protetivas de urgência previstas na Lei n. 11.340/2006, se de tutela inibitória ou cautelar e o prazo de vigência das referidas medidas.

Depreende-se que a a Lei n. 11.340/2006 teve o intuito de proteger a mulher da violência doméstica e familiar que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial, no âmbito da unidade doméstica, da família ou em qualquer relação íntima de afeto. As medidas protetivas de urgência, por conseguinte, foram criadas com a finalidade de impedir que o referido ilícito (violência doméstica e familiar) ocorra ou se perpetue.

O art. 4.º da Lei Maria da Penha, a propósito, preceitua que, "Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar". A referida regra hermenêutica exige que, ao interpretar os dispositivos legais previstos na Lei n. 11.340/2006, seja assegurada, em especial, a tutela efetiva do direito fundamental das mulheres a uma vida livre de violência.

Desse modo, afigura-se inviável sustentar a natureza estritamente acessória do referido instrumento protetivo. É certo que, na maioria das vezes, o pedido de imposição de medidas protetivas está vinculado à suposta prática de delito no âmbito doméstico. No entanto, é possível a existência de violência doméstica sem que se tenha praticado, no caso, eventual ilícito penal.

Não há, na Lei n. 11.340/2006, nenhuma indicação expressa de que as medidas protetivas de urgência teriam natureza cautelar, e que, desse modo, deveriam estar atreladas a algum processo principal ou a eventual inquérito policial.

Ademais, ao prever o crime de Descumprimento de Medidas Protetivas de Urgência (art. 24-A da Lei n. 11.340/2006), o Legislador expressamente consignou, no § 1.º do art. 24-A da Lei Maria da Penha que "A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas", o que confirma a conclusão de que é desnecessária, para o deferimento das referidas medidas, a existência de inquérito ou processo criminal.

Assim, deve prevalecer a orientação de que "as medidas protetivas impostas na hipótese de prática de violência doméstica e familiar contra a mulher possuem natureza satisfativa, motivo pelo qual podem ser pleiteadas de forma autônoma, independentemente da existência de outras ações judiciais" ( AgRg no REsp 1.783.398/MG, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, DJe de 16/4/2019).

Portanto, vê-se que as medidas protetivas de urgência possuem natureza inibitória, pois têm como finalidade prevenir que a violência contra a mulher ocorra ou se perpetue. Por conseguinte, a única conclusão admissível é a de que as medidas protetivas eventualmente impostas têm validade enquanto perdurar a situação de perigo. Perde sentido, dessa forma, a discussão acerca da necessidade de fixação de um prazo de vigência, pois é impossível saber, a priori, quando haverá a cessação daquele cenário de insegurança.

A decisão judicial que impõe as medidas protetivas de urgência submete-se à cláusula rebus sic stantibus, ou seja, para sua eventual revogação ou modificação, mister se faz que o Juízo se certifique de que houve a alteração do contexto fático e jurídico.

Nesse cenário, torna-se imperiosa a instauração do contraditório antes de se decidir pela manutenção ou revogação do referido instrumento protetivo. Em obediência ao princípio do contraditório, as partes devem ter a oportunidade de influenciar na decisão, ou seja, demonstrar a permanência (ou não) da violência ou do risco dessa violência, evitando, dessa forma, a utilização de presunções, como a mera menção ao decurso do tempo, ou mesmo a inexistência de inquérito ou ação penal em curso.

A fim de evitar a inadequada perenização das medidas, nada impede que o juiz, caso entenda prudente, revise periodicamente a necessidade de manutenção das medidas protetivas impostas, garantida, sempre, a prévia manifestação das partes, consoante entendimento consolidado pela Terceira Seção do STJ, no sentido de que "a revogação de medidas protetivas de urgência exige a prévia oitiva da vítima para avaliação da cessação efetiva da situação de risco à sua integridade física, moral, psicológica, sexual e patrimonial" ( AgRg no REsp 1.775.341/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Terceira Seção, DJe de 14/4/2023).

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Constituição Federal ( CF), art. 226, § 8º

Lei n. 11.340/2006, art. , art. 19, §§ 2º e , art. 22 e art. 24-A, § 1º

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Processo
HC 663.265-SP, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, Sexta Turma, por unanimidade, julgado em 12/9/2023, DJe 20/9/2023.

Ramo do Direito

DIREITO PENAL, DIREITO PROCESSUAL PENAL

Tema

Tráfico de drogas. art. 41 da Lei n. 11.343/2006. Causa de diminuição de pena. Colaboração premiada. Identificação dos demais coautores e recuperação do produto do crime. Requisitos alternativos, e não cumulativos, para a aplicação do benefício.

DESTAQUE

Os requisitos legais previstos no art. 41 da Lei n. 11.343/2006, que trata da causa de diminuição da pena por colaboração premiada, são alternativos e não cumulativos.

INFORMAÇÕES DO INTEIRO TEOR

A controvérsia cinge-se em determinar se os requisitos legais previstos no art. 41 da Lei n. 11.343/2006, que trata da causa de diminuição por colaboração premiada, são alternativos ou cumulativos.

Diz o art. 41 da Lei n. 11.343/2006 que "O indiciado ou acusado que colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais coautores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois terços".

Naturalmente, não há como negar que a leitura do referido dispositivo legal aponta, ao menos à primeira vista, para a cumulatividade dos requisitos legais ali estabelecidos, em razão do emprego da conjunção coordenada aditiva e entre eles.

Entretanto, a interpretação gramatical de um dispositivo legal nem sempre reflete a mais adequada exegese para dele extrair a norma jurídica pertinente. Trata-se de método hermenêutico que, muitas vezes, acaba por ignorar lição fundamental de Teoria Geral do Direito segundo a qual o ato normativo não se resume à mera dicção explícita de sua literalidade, pois o texto só se converte em norma depois de interpretado. Assim, é necessário interpretar os dispositivos legais principalmente à luz da sistemática em que estão inseridos, a fim de dar coerência e integridade ao ordenamento.

Nesse passo, cumpre lembrar que o atual art. 41 da Lei de Drogas tem origem no antigo art. 32, § 2º, da Lei n. 10.409/2002, o qual trazia a conjunção "ou" entre os requisitos para a colaboração premiada, ao dispor que "O sobrestamento do processo ou a redução da pena podem ainda decorrer de acordo entre o Ministério Público e o indiciado que, espontaneamente, revelar a existência de organização criminosa, permitindo a prisão de um ou mais dos seus integrantes, ou a apreensão do produto, da substância ou da droga ilícita, ou que, de qualquer modo, justificado no acordo, contribuir para os interesses da Justiça".

Ademais, além de não se identificar nenhuma justificativa para que tal mudança gramatical decorresse de eventual propósito deliberado do legislador e nada há na Exposição de Motivos da Lei n. 11.343/2006 que o indique, não se pode desconsiderar o advento da Lei n. 12.850/2013, que cuidou de definir, regular e sistematizar diversos aspectos relativos ao instituto da colaboração premiada, oportunidade em que, ao estabelecer seus requisitos no art. , fê-lo de forma alternativa.

Essa consideração ganha dimensão ainda mais significativa se ponderado que os crimes da Lei de Organizacoes Criminosas são plurissubjetivos, isto é, de concurso necessário de pessoas e, mesmo assim, o legislador não impôs obrigatoriamente a identificação dos demais coautores e partícipes, de modo que não se mostra razoável exigi-lo compulsoriamente nos crimes contidos na Lei de Drogas, em que o concurso de pessoas é meramente eventual.

Trata-se de interpretação mais consentânea ao princípio da proporcionalidade, pois não desconsidera a relevante colaboração do réu com o Estado-acusação, dá maior efetividade a esse meio de obtenção de prova estabelecido pelo legislador e ainda evita a indevida confusão entre delação premiada e colaboração premiada, uma vez que a delação de comparsas é apenas uma das formas pelas quais o indivíduo pode prestar colaboração.

Assim, tanto sob a perspectiva de uma interpretação histórica, quanto à luz de uma interpretação sistemática - em consonância com o tratamento geral que a Lei n. 12.850/2013 posteriormente conferiu à matéria -, é mais adequado considerar alternativos, e não cumulativos, os requisitos legais previstos no art. 41 da Lei n. 11.343/2006 para redução da pena.

Isso não significa, frise-se, conceder ao acusado que identifica seus comparsas e ainda ajuda na recuperação do produto do crime o mesmo tratamento conferido àquele que só realiza uma dessas duas condutas, pois os distintos graus de colaboração podem (e devem) ser sopesados para definir a fração de redução da pena de um a dois terços, nos termos da lei.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

LEGISLAÇÃO

Lei n. 11.343/2006, art. 41

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Fonte: https://processo.stj.jus.br/jurisprudencia/externo/informativo/








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